Depois da explosão causada por fascistas integralistas na porta da produtora Porta dos Fundos, no Rio de Janeiro, em dezembro de 2019, mais um atentado a bomba foi realizado nesse domingo, 28 de junho, contra um alvo identificado com a esquerda. Desta vez o alvo foi a residência da professora Marienne Guioto, presidenta do PT de Nuporanga, interior de São Paulo. A fuga dos terroristas do local, numa viatura da Polícia Militar, foi flagrada em vídeo, segundo a deputada Maria Izabel Azevedo Noronha, a professora Bebel, do PT de São Paulo.
Vídeo: Viatura da PM participa de atentado a bomba contra casa de professora, presidenta do PT de Nuporanga
Imagens mostram homem entrando em viatura após atentado contra a casa da professora Marienne Guioto, presidenta do PT de Nuporanga
Uma viatura da Polícia Militar aparece em um vídeo divulgado nas redes sociais que mostra um atentado à bomba contra a professora Marienne Guioto, presidenta do PT de Nuporanga, que faz parte da Região Metropolitana de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.
Segundo informações divulgadas pela deputada Maria Izabel Azevedo Noronha, a professora Bebel (PT-SP), o atentado aconteceu na madrugada deste domingo (28), “onde a casa de nossa colega da APEOESP e Presidenta Municipal do Partido dos Trabalhadores, professora Marienne Guioto, foi atacada com bombas atiradas por pessoas utilizando uma viatura da Polícia Militar, como mostram imagens de vídeo”.
“Exigimos do Governador João Doria a completa elucidação desses fatos, que os responsáveis sejam identificados e punidos na forma da lei, e que sejam asseguradas condições de segurança para a professora Marienne”, escreveu a deputada ao divulgar o vídeo.
Entrevista exclusiva a Nícolas Horácio/EstopimColetivo
“O povo brasileiro não é como Bolsonaro. Dos 55% de votos que ele teve, seguramente, o núcleo duro dele é de 15 a 20 milhões de votos. Esse é o eleitorado que abraça as teses de violência pra resolver o problema da segurança, de preconceito, de racismo, de desqualificação da mulher, de desprezo pela democracia, pela liberdade de expressão, a visão pró norte-americana e esse abraço de urso ao neoliberalismo de mercado, que é, na verdade, entregar o país ao capital financeiro, na nossa opinião, evidentemente. Acho que nós temos que fazer essa disputa também com o eleitorado dele. O eleitorado não vai ficar com ele” (José Dirceu)
Ele esteve no centro do poder no governo Lula e foi cogitado para a sucessão presidencial depois de chefiar a Casa Civil, um dos mais estratégicos ministérios do país. Condenado a mais de 30 anos de prisão, teve a trajetória política interrompida e, no estilo Graciliano Ramos, escreveu um livro de memórias no período do cárcere. Fundador do PT, ex-militante do PCB e da luta armada, José Dirceu responde os processos em liberdade como um dos mais polêmicos personagens da política brasileira na atualidade. Por fora do tabuleiro político, continua atuando como um importante intelectual para a militância do PT, através de sua força e influência.
Em Florianópolis desde o dia 15 de novembro, foi recepcionado pela amiga e ex-ministra Ideli Salvatti, conversou com lideranças de outros partidos da esquerda, como PSOL e PCdoB, com militantes da juventude do PT e dos partidos aliados. Na segunda-feira (19/11), realizou sessão de autógrafos do livro “Zé Dirceu – Memórias Volume 1”, no qual narra momentos importantes da história brasileira e deixa seu ponto de vista sobre a conquista do poder pelo Partido dos Trabalhadores, o legado dos seus dois governos e a análise do processo intervencionista que culminou com a violação da democracia.
Em entrevista ao Estopim Coletivo, de Florianópolis, Dirceu conta detalhes do livro que será lançado em pelo menos 25 capitais brasileiras e indica como o PT, agora na oposição, deve se comportar nos próximos anos.
A Entrevista
No lançamento do seu livro em Brasília, você disse que o PT está em uma defensiva e precisa de estratégia política. Qual deve ser essa estratégia? E qual a sua participação nela?
Zé Dirceu: Minha participação vai ser como filiado. Eu não pretendo, nem devo voltar para a direção do PT e muito menos participar diretamente do partido.
Eu quero andar pelo Brasil, lançar meu livro, fazer palestras e participar de seminários. Quero estar com os movimentos, com a CUT, o MST, os partidos aliados. Eu tenho diálogo com PCdoB, com PSB e quero estar com a juventude. Eu tenho priorizado esses três eixos.
Quando eu digo que estamos em uma defensiva, não é só o PT.
Essa coalizão que elegeu Bolsonaro não é só uma coalizão religiosa, com os setores militares e partidos. Ela tem uma cabeça que é o capital financeiro internacional e tem uma política que é pró Estados Unidos.
É uma coalizão que pretende fazer grandes mudanças no Brasil, basta olhar a pauta dele. Começa pela política externa, que ele vai virar totalmente, não só a nossa política externa, como a dos tucanos também. Por isso que pelo menos alguns tucanos estão contra.
Nós temos força, mas nós viemos sofrendo derrotas desde 2013.
Você se refere às grandes manifestações de 2013?
Zé Dirceu: Sim, porque eram manifestações contra o aumento das tarifas em São Paulo e foram capturadas, com papel muito forte da Rede Globo e dos setores que financiaram aquela mobilização, para um movimento contra o governo da Dilma, o PT e que com a Lava Jato fez uma escalada de criminalização do PT e do próprio Lula, levando ao impeachment da Dilma e a prisão do Lula, que culmina com a eleição do Bolsonaro.
Nesse sentido, nós temos que reconhecer a derrota, ao mesmo conhecer as nossas forças e a necessidade de repensar o que vamos fazer nos próximos anos.
Temos algumas tarefas óbvias: a liberdade do Lula; a oposição a pautas como Escola sem Partido que, na verdade, é escola com partido, o deles.
Por outro lado, o governo vai anunciar uma série de medidas, nós temos que apontar alternativas. Não podemos apenas ficar contra. Se ele vai fazer uma Reforma Tributária, temos que apresentar nossa visão e para a Reforma na Previdência, a mesma coisa.
Você vem articulando essas conversas nos estados?
Zé Dirceu: Não. Eu não articulo. Eu Tenho relações, porque desde 1965 eu sou militante político e eu participei dos principais eventos do país a partir de 1979.
Participei da clandestinidade, da luta armada, participei da geração de 1968, fui do PCB, depois, fui um dos fundadores do PT, então tenho muitas relações.
Procuro, sou procurado e converso, exponho a minha opinião e tentando ajudar nesse sentido, nessa linha.
Mas exerce influência, certo?
Zé Dirceu: É. Influência eu exerço, mas não significa que eu vá participar de direções do PT, disputar mandatos ou participar de governos. Eu nem posso, porque estou inelegível.
Aqui em Santa Catarina você fez algumas conversas com militantes de outros partidos. Sentiu possibilidade de unificação da esquerda aqui? Há caminhos pra isso?
Lançamento e palavra de resistência em Florianópolis
Zé Dirceu: Eu acredito que há sim, na base. Temos que começar pelas lutas concretas em cada cidade, em cada estado, pelas agendas que estão colocadas.
Acho que a Reforma da Previdência é uma questão fundamental, a Escola sem Partido é outra, a defesa da liberdade de manifestação, esses ataques ao MST, ao MTST, ao João Pedro Stédile e ao Guilherme Boulos, nós não podemos aceitar.
A agenda da anulação da condenação do Lula é importante e nós devemos construir uma agenda a partir dos sindicatos e da juventude, da luta das mulheres.
Nós devemos construir uma agenda de oposição, porque temos legitimidade e fomos para oposição por decisão do eleitorado. Nós temos 47 milhões de brasileiros e brasileiras para representar e, no caso do PT, um mínimo de 30 milhões, que foi a votação do Haddad no 1° turno em aliança com PCdoB e com o PROS.
Então, nós temos obrigação de exercer essa oposição, essa fiscalização, apresentando propostas e alternativas e temos que resolver nossos problemas, como a debilidade na área das redes.
Quais redes? As redes sociais?
Zé Dirceu: Isso. Elas são importantes desde 2008, na eleição de Obama, depois na eleição do Trump, que gerou uma crise internacional, e quando chega a eleição aqui nós não estamos preparados?! Alguma coisa tá errada.
Mesma coisa a nossa presença nos bairros, na luta do dia a dia do povo trabalhador no bairro. Temos que analisar e tomar medidas com relação a isso.
Você acha que faltou ser mais presente nas redes sociais para ganhar o público?
Zé Dirceu: Sem dúvida nenhuma. A rede social é um potencializador e quando você tá ausente também lá no bairro, o potencial aumenta, porque você não tem como contraditar e responder. Se você não responde nas redes, não responde nas casas, na igreja, na lotérica, no açougue, no cabeleireiro, no supermercado.
Depois que nós saímos na rua com o Vira Voto, nós crescemos muito. Porque é sempre importante o contato pessoal, o diálogo, o olho no olho, o debate, a reunião, a experiência de vida em comum. Eu aposto muito também na juventude nesse sentido. Acho que ela pode e dever ter um papel importante.
Você disse recentemente que o PT perdeu a eleição ideologicamente. O povo brasileiro é como o Bolsonaro?
Zé Dirceu: O povo, não é como Bolsonaro. Dos 55% de votos que ele teve, seguramente, o núcleo duro dele é 15 a 20 milhões de votos. Esse é o eleitorado que abraça as teses de violência pra resolver o problema da segurança, de preconceito, de racismo, de desqualificação da mulher, de desprezo pela democracia, pela liberdade de expressão, a visão pró norte-americana e esse abraço de urso ao neoliberalismo de mercado, que é, na verdade, entregar o país ao capital financeiro, na nossa opinião, evidentemente.
Acho que nós temos que fazer essa disputa também com o eleitorado dele. O eleitorado não vai ficar com ele. Essa questão dos médicos cubanos, que é uma coisa totalmente estúpida que ele fez, porque os médicos nunca se envolveram em política no Brasil, nunca participaram de nenhuma atividade que não fosse trabalho médico, ele não pensou nos 30 milhões de brasileiros, brasileiras, as famílias, as mães, os idosos, as crianças que são atendidos por esses médicos.
Essa história de que os médicos cubanos foram nomeados no lugar dos brasileiros, todo mundo sabe que não é verdade, porque os médicos não querem ir para essas cidades.
Dois terços [dos recursos] vão para o governo, mas os filhos deles estudam em escolas públicas até o ensino universitário. Eles têm hospitais públicos fantásticos. Em Cuba tem atendimento, o país não tem violência. O país tem segurança e um bem estar básico.
As dificuldades e a escassez ocorrem em parte por causa do bloqueio e por uma série de questões que os cubanos estão procurando resolver agora.
Poucos sabem que os cubanos estão fazendo uma Constituinte, agora, que se discute em todos os bairros, fábricas, escritórios, lojas, no campo. Milhões e milhões de cubanos estão discutindo a Constituição do país. Poucos sabem disso.
O que o Brasil vai descobrir no seu livro? O que há de novo nele, por exemplo, em relação ao seu processo?
Zé Dirceu: Eu procuro contar a história do Brasil, contando a minha história e da minha geração, que lutou contra a ditadura e foi pra clandestinidade, participou de ações armadas de resistência.
Depois as vitórias do MDB, o que foram os governos militares, particularmente, o governo Geisel e, depois, o que foi o surgimento da luta contra a carestia, das pastorais, das comunidades eclesiásticas de base, do sindicalismo autêntico, do PT, da CUT.
O livro passa pelas Diretas, o Collor e o impeachment dele e conta a trajetória das eleições até o Lula ser presidente. Eu procuro sempre mostrar como o Brasil era no cinema, no teatro, na música, como eram os meios de comunicação.
Existe algum fato na sua biografia que ninguém sabia ainda?
Zé Dirceu: Tem fatos que eu relato pela primeira vez, como o dia em que eu pedi demissão e eu conto como foi a reunião. Chorei naquele momento e explico o que significava aquilo para mim. Foi uma reunião com Lula feita para concretizar minha demissão.
O depoimento do Carlos Cachoeira, que mostra toda a operação Valdomiro Diniz, CPI dos correios, mensalão, hotel Naoum, foram tudo escutas telefônicas dirigidas contra o PT negociadas com a direção da Veja, o Policarpo Jr. com o Cachoeira, com os Arapongas, com escutas ilegais para montar fatos políticos negativos pra fazer matérias contra os adversários deles.
Veja passou impune. A CPI não teve condições de convocar o Roberto Civita. O Policarpo Jr. nunca respondeu perante a justiça sobre isso.
Contando o que vivi, busco contar a história do Brasil, tentando tirar lições disso. Conto, por exemplo, como foi possível lutar e derrotar uma ditadura e de onde surgiu a luta.
Nós vamos enfrentar esse problema agora. Como lutar? De que forma lutar? Com quem lutar? Eu procuro, na verdade, transmitir para as novas gerações a minha experiência, com erros, acertos e a experiência do PT, da esquerda, inclusive recontando a experiência do Brasil com relação à esquerda, o papel do PCB.
Os tenentes, qual foi o papel dos tenentes? O que foram as Forças Armadas da República até a Constituição de 1988? Elas sempre foram uma força determinante na disputa política brasileira.
A revolução de 1930 foi uma revolução militar e civil. Toda a luta dos tenentes, a Coluna Prestes também é, 1935 é, 1932 é, 1937 é, 1946 é.
Em 1950 e 1955 eles tentam dar o golpe. Em 1961, eles tentam dar o golpe e a resistência popular armada impede e, em 1964 eles dão, governam o país até 1985 e voltam agora a exercer um papel moderador no país.
Depois de espancar um casal de trabalhadores que saía do comício de Lula, no sábado, 24, em Florianópolis, gangue fascista de Bolsonaro se vangloria de sua “coragem” nas redes sociais. Comentários sádicos dos líderes da violência fornecem as provas que a assessoria jurídica do PT estadual precisava para identificá-los e processá-los por crime de lesão corporal dolosa, danos morais e formação de quadrilha. Amparada pelo marido, Rogerio Messias, 39 anos, cozinheiro, negro, Juliana Impaléa, 40 anos, professora de Direitos humanos da rede pública estadual, passou mal com o calor e retirou-ser do ato mais cedo. Foram atacados por 15 agressores que os cegaram com spray de pimenta nos olhos para facilitar o linchamento. Rogério está afastado do trabalho e corre o risco de ter os movimentos limitados pelas pancadas que recebeu na coluna, e Juliana desencadeou síndrome de pânico. Todos os envolvidos nas agressões são eleitores de Bolsonaro associados aos movimentos Vem Pra Rua e MBL, que se organizaram pela internet para invadir o comício de Lula. Na quarta-feira, os telefonemas solidários da senadora Gleisi Hoffmann e de Lula reanimaram no casal o propósito de fazer da covardia um caso exemplar de combate à impunidade do fascismo no Brasil.
Casal espancado passou a semana entre o hospital, Delegacia de Polícia e assessoria jurídica
“Ah, tudo que receberam ontem foi com muito amor, tá?”, comentou Ruth Dutra na sua página do Facebook. “Com o maior carinho e respeito”, responde Diego Annes. Não foi preciso muito trabalho para chegar aos autores do espancamento do casal Juliana Impaléa e Rogério Messias, encurralados e linchados por cerca de 15 seguidores de Bolsonaro na tarde do dia 24 de março, em torno de 14h30min, durante o discurso de Lula no Largo da Catedral, em Florianópolis. Depois de agredirem os dois com chutes, pontapés, socos e pauladas, usando a própria bandeira do Brasil, da qual tanto essas milícias neofascistas se orgulham, os criminosos foram para as redes sociais se gabar da crueldade. Eles aplicaram algo parecido com gás de pimenta nos olhos das vítimas para que não pudessem se defender e, enquanto uns os prendiam pelas costas, outros os espancavam. “Tudo com muito amor”, repetiram durante os diálogos nas redes sociais, com se fossem fanáticos de uma seita satânica. “Nessas horas a gente solta pombinhas brancas com velas”, reforçou a loira Ruth Dutra, que aparece em seu perfil apontando uma arma e ostentando o lema “Sou do exército Bolsonaro”.
Defesa da liberação do porte de arma; divulgação de calúnias contra a vereadora do PSOL assassinada, Marielle Franco; pedidos de intervenção militar e incitação ao ódio contra o PT, Lula e seus defensores estão entre as postagens de Ruth Dutra, que se autodenomina “da turma das perfumadas”, o que para Juliana pode ser uma indicação do uso de gás de pimenta em suas vítimas.O mesmo post publicado nas páginas de Ruth Dutra e Déby Kuster, assume a autoria do espancamento do casal
No mesmo dia, depois de sair do Hospital Celso Ramos, onde foi atendido na emergência, o casal agredido divulgou nas redes sociais o espancamento. Logo em seguida, amigos e usuários contrários às agressões fascistas durante a passagem pela Caravana da Esperança no Sul do Brasil começaram a investigar a rede e a enviar diálogos que ajudaram a chegar aos autores do crime.
Num dos posts printados, Ruth Dutra, uma moradora do bairro Campeche, assume claramente participação no espancamento. Como prova de sua valentia, ao lado do relato, ela publica uma imagem posando com a amiga na área isolada pelo cordão policial e a foto do pixuleco com o sarrafo.
Ao comentar o espancamento, os bolsonistas contam tanta vantagem sobre a covardia que a assessoria jurídica do Diretório Estadual do PT já tem todas as informações e provas em mãos contra os líderes da violência fornecidas por eles mesmos. Com o exame de corpo de delito mostrando os danos físicos da agressão e os prints das páginas dos agressores devidamente autenticados em cartório, os advogados Rosângela de Souza e seu assessor Matheus Amaral Ribeiro orientaram as vítimas a registrarem um Boletim de Ocorrência na 6ª DP, Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso da Capital, no bairro Agronômica. Rogerio Boletim de Ocorrência
No Boletim de Ocorrência são citados coletivamente por danos morais e lesão corporal dolosa grave com tortura praticada de forma coletiva Ruth Dutra, Isabel Cristina Beck, Diego Annes, Deby Kuster e Pedro Correa. Destes, Deby Kuster e Pedro Correa foram identificados de imediato pela polícia com nome, sobrenome, CPF e endereço e citados individualmente, mas todos devem ser processados em separado na vara cível e criminal.
Nos comentários de Facebook, os fascistas se autodelatam e se parabenizam pela agressão, chamando-se de “guerreira que luta com tudo”, “aguerrida”, “linda guerreira”, “corajosos”, “bravos intervencionistas”, entre outros adjetivos. Como atestado de intolerância e ódio racial, também recomendam “vacina antirábica”, “sal grosso” e “banho de álcool” para os que passaram perto da “peteba”, como classificam suas vítimas, a quem chamam também de “petista apedeuta” e”velho pingunço”, “gente suja”, “ordinária”, “feia”, “gente horrenda”, “povo fedido”, “mal cuidado” e “mal educado”. As vuvuzelas, símbolo do patriotismo fascista, também serviram de instrumento para acertar o rosto dos encurralados, segundo os relatos.
Um vídeo gravado desavisadamente por um site independente mostra Rogério Messias (de camiseta preta) desesperado, se debatendo enquanto é agarrado e empurrado por dois homens, um de cada lado, e surrado por vários outros que portam a camisa de Bolsonaro e adereços do candidato e tentam arrancar sua bandeira. Nos últimos segundos, fica nítida a imagem de Ruth Dutra quebrando nas costas de Juliana Impaléa a bandeira do pixuleco. Assista ao vídeo de Marcelo Luiz, do Portal Desacato, já com o corte nas cenas finais.
GALERIA DOS CITADOS POR LESÃO CORPORAL DOLOSA
Ainda sentindo muitas dores, sobretudo na cabeça, na coluna e nos braços, na terça-feira, 27, Juliana e Rogério fizeram exame de Corpo de Delito. Ela tem um calombo de cinco centímetros no braço esquerdo e um galo na cabeça, mas voltou ao trabalho na segunda-feira para não prejudicar os alunos. Neste final de semana, começou a apresentar sinais de síndrome de pânico e crise de ansiedade. “Na segunda vou ao psiquiatra porque não é fácil lidar com a violência de um linchamento”, disse ela. “Os sinais físicos vão passar, mas as marcas psicológicas não sei”.
Rogério, que é negro e foi o mais agredido, apresenta hematomas nos braços e pernas, lesões no joelho, nas costas e sinais de estiramento de nervos e tecido muscular na coluna. Em entrevista aos Jornalistas Livres, ele afirmou que está aguardando o resultado dos exames de tomografia realizados durante a semana para saber qual a extensão das lesões. O teor da queixa-crime, segundo os advogados, vai depender, portanto, do andamento do seu estado de saúde. Pode haver um dano mais grave ou permanente na coluna, que leve à limitação dos movimentos e mesmo a uma aposentadoria por invalidez, avaliam os juristas, com base no laudo médico.
Com cinco dias de atestado, e tomando remédios fortes, Rogério teme que a necessidade de prorrogação da licença de saúde por maior tempo o faça perder os empregos. “Trabalho em dois restaurantes pequenos como cozinheiro que serão obrigados a me substituir”, explicou Rogério, lembrando que não pode atuar com facão e fogo estando sob efeito de medicamento. Ao contrário das suas vítimas, que xingam de vagabundos e acusam de “mamar nas tetas do Estado”, os agressores não apresentam formação nem ocupação nos seus perfis. Sua atividade profissional é um mistério a ser desvendado pela polícia.
Os advogados estão reunindo provas testemunhais, vídeos, documentos, postagens na internet para formalizar ainda acusação de formação de quadrilha pela internet. Professora do conteúdo de Direitos Humanos, Juliana se diz ainda vítima de injúria e difamação. Para justificar a violência nas redes sociais, Ruth Dutra, que se apresenta pelos comentários como uma expoente da agressão, justifica o fato de ter “quebrado o pixuleco nas costas da peteba” afirmando: “Ela estava agredindo um idoso, lhe quebrou o braço”.
Não há, contudo, registro de agressão com fratura do braço pela polícia, nem queixa na DP, tampouco ocorrência no Posto de Saúde local ou fotos e vídeos publicados pelos próprios agressores que fundamentem essa denúncia. “Dessa forma, ela passa a ser vista como calúnia”, acrescenta. Ao contrário, o vídeo postado no dia 24 pelo Portal Desacato mostra que Juliana andava desnorteada de um lado para outro, tentando salvar o marido, que era segurado de costas por alguns e espancado de frente por outros, quando foi agredida pelas costas por Ruth Dutra. Até a publicação desta matéria, as imagens e comentários exibidos pelos próprios agressores ainda estavam em suas páginas do Facebook.
Chamada de “petista apedeuta” (ignorante, sem instrução) pelos bolsonaristas, Juliana, natural de Florianópolis, é graduada em Língua e Literatura em Português pela UFSC, pós-graduada em Docência do Ensino Superior-Uniasselvi e está concluindo o mestrado em Educação pela Universidade Nacional de Rosário (UNR), instituição pública da Argentina. Trabalha como professora de Línguas e Literaturas Vernáculas para alunos de ensino fundamental e médio do Instituto Estadual de Educação da rede pública de Santa Catarina. Música, compositora e produtora cultural, ela também é professora de Alfabetização e Letramento no Curso de Magistério.
Músico também, como Juliana, Rogério Messias, natural de Santos (SP), com dois filhos, mantém jornada dupla de trabalho diário como cozinheiro profissional nos restaurantes do sistema Sesi/Senai e da Faculdade Cesusc/Colégio Cruz e Sousa. Estudante de Biblioteconomia da UFSC, trancou a matrícula por causa do trabalho. Ambos são eleitores de Lula e participavam da Caravana em Florianópolis, mas há muitos anos não militavam no partido.
PM ASSISTIU DE LONGE AO LINCHAMENTO
Casados há 10 anos, os dois chegaram ao Largo da Catedral por volta das 10h15min da manhã, “para garantir uma recepção calorosa ao Lula”, explica Juliana. Até o início do discurso do ex-presidente, foram em torno de quatro horas sob um sol de 33°. Sentindo-se emocionada com as primeiras palavras do candidato, Juliana, que tem sobrepeso, passou mal com um princípio de desmaio. Atendida no Posto de Saúde do próprio evento, verificou que a pressão estava baixa. Decidiram então seguir a orientação médica e voltar para casa. Contudo, para ter acesso rápido ao local onde haviam estacionado o carro, em frente à Alfândega, precisavam ultrapassar a barreira da rua Arcipreste Paiva, em frente ao antigo Palácio do Governo, onde um pelotão da Polícia Militar continha uma concentração de cerca de 200 manifestantes ameaçadores do Vem Pra Rua e MBL, a maioria com camiseta e adereços de Bolsonaro, provocando a plateia lulista com ofensas e palavras de baixo calão e prontos para entrar em choque. Para evitar conflitos, Juliana e Rogério preferiram seguir um atalho por dentro da Praça XV, e sair mais adiante na mesma rua, já fora da área de maior aglomerado e risco. Observe a cena no vídeo completo de Marcelo Luiz, do Desacato.
“Este vídeo mostra a covardia. Reparem eu e minha mulher companheira de vida Juliana Impaléa, andávamos em direção a praça da Alfândega, onde deixamos o carro, de repente a correria, ai já paro e fico esperando o pior… Um medo incrível me assola por não poder defender minha mulher companheira de vida Juliana Impaléa…”, publicou Rogério em sua página.
Ao avistarem os dois atravessando a rua com a bandeira lilás do coletivo feminino do PT sobreposta à imagem de Lula, um grupo de fascistas já começou os xingamentos contra o casal e seu candidato. Eles contam que de longe retrucaram as ofensas verbais, mas se mantiveram a caminho do estacionamento, sem corresponder às ameaças de agressão física. “De repente, vejo um grupo furioso de mais de dez vindo em nossa direção. Só deu tempo de empurrar Juliana para trás de mim e esperar o pior”, contou Rogério.
O que mais indignou os dois foi a covardia do bando: “Para nos cegar e facilitar o espancamento, alguns homens e mulheres jogavam gás de pimenta nos nossos olhos. Enquanto a gente se contorcia de dor, recebia socos, chutes e pauladas em todo corpo”, conta Rogério, que apanhou mais. Ele chegou a ser segurado por um grupo para que outro o espancasse e espancasse sua esposa. Impressionou-o o fanatismo político dos agressores, vestidos de verde e amarelo e empunhando a bandeira do Vem pra Rua, MBL e Bolsonaro. “O que eles mais queriam era arrancar de nós a bandeira do PT e destruí-la de qualquer jeito”.
A atuação da Polícia Militar nesse caso foi no mínimo omissa, segundo os relatos das vítimas e das testemunhas. “Eles assistiram de longe a correria dos fascistas em nossa direção, ouviram os gritos e não fizeram nada”, afirmam os dois. Até então, a corporação estava sendo elogiada pelos próprios simpatizantes de Lula por conter uma ação violenta com as mesmas milícias de Bolsonaro, Vem Pra Rua e MBL, que insultavam os apoiadores de Lula e ameaçavam invadir a Assembleia Legislativa de Santa Catarina, ali perto, onde Lula se reunira com dirigentes de educação pública federal antes do ato no Largo da Catedral. Outros relatos de agressão em bando a militantes e passantes comuns foram registrados na área da mídia independente durante o dia e denunciados ao microfone durante o comício.
Para Juliana, que desenvolve com os alunos de Ensino Fundamental e Médio o conteúdo da Constituição e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, foi difícil ser alvo do fascismo que ela busca combater em sala de aula com lições sobre democracia e alteridade (respeito ao outro). “Como a gente vai passar para esses jovens uma confiança no futuro quando esse ódio está destruindo a possibilidade de diálogo democrático no país?” Depois de passar as últimas semanas ajudando os alunos a refletirem sobre a chacina de Marielle e a assimilarem o trauma da violência política com desenhos, painéis e debates, ela própria se viu alvo dela.
A filósofa Maria Borges, que trabalhou com Juliana na Secretaria de Cultura e Arte da UFSC, registrou: “Não há mais dúvidas: estamos frente a um movimento fascista, violento e perigoso, como jamais vimos no Brasil. Minha solidariedade a Juliana Impaléa e seu companheiro Rogério Messias, que foram violentamente agredidos na saída do comício do Lula. Podia ter sido qualquer um de nós. Eu estava no comício perto deles. Tive sorte de não ter encontrado os fascistas no meu caminho de volta para casa”. Para a antropóloga Sonia W Maluf, todos que atuam no campo da luta política e da militância social em defesa das minorias, da democracia e dos direitos humanos precisam compreender o modus operandi dos neofascistas: “O objetivo deles é intimidar, deixar as pessoas com medo. É uma tática fascista que volta à tona com tudo. Por isso é muito importante levar adiante a investigação e não deixar passar”.
ÂNIMO DOBRADO COM TELEFONEMA DE LULA
No domingo à noite, um dia após a agressão, o casal recebeu a visita do presidente do Diretório Estadual do PT, Carlos Eduardo da Silva (Cadu), que ofereceu todo apoio e assessoria jurídica do partido. Mas a grande surpresa e sentimento de compensação ocorreria na quarta-feira, 28, com o telefonema solidário da senadora Gleisi Hoffmann e do presidente Lula. Ambos falaram pessoalmente com Juliana e Rogério, oferecendo apoio jurídico e psicológico e incentivando-os a levar adiante a denúncia e o processo.
“É sério: o Lula e a Gleisi Hoffmann acabaram de nos ligar… A esquerda é rígida! Com o corpo quebrado, mas a alma lavada. A esquerda é rigorosa”, escreveu Juliana no seu Facebook, ao compartilhar a notícia do telefonema. “Eu nem me surpreendi com a atitude deles, mas ouvir a voz do Lula e receber a solidariedade de ambos, reforçou a minha certeza de estar ao lado certo da história”. Rogério divulgou a notícia com emoção: “Com o corpo quebrado, mas de alma lavada. Acabei de receber o telefonema do nosso presidente Lula, querendo saber do ocorrido comigo e minha mulher”. Conta que o longo telefonema de Lula e Gleisi despertaram “uma fera” dentro dele no sentido de fazê-lo voltar à luta política. Ele conta que quando menino, aos 11 anos, fez boca de urna para Lula em Santos.
Mais tarde ajudou a criar o Grêmio Estudantil da escola e participou de protestos contra as privatizações das estatais no governo FHC, mas depois as pauladas da vida o fizeram se acomodar. “Agora, eu prometi ao Lula que vou voltar à militância pela democracia”, empolga-se o músico-cozinheiro. Ele me disse que nós vamos derrotar o fascismo na luta e me fez ver que a denúncia do nosso espancamento pode ser um caso exemplar para combater a impunidade do fascismo”.
GANGUE ESPANCA E EXIBE PROVAS DO CRIME
Postagens do casal em 24 de março:
Juliana Impaléa: Eu e meu companheiro, ambos trabalhadores, saíamos da recepção ao Lula em Floripa que, diga-se de passagem, estava lotada e linda, quando um grupo do MBL nos encurralou e nos torturou com socos, pontapés e spray de pimenta – a linguagem deles. Estamos os dois machucados (meu marido mais do que eu, espancado por mais de dez bolsominions), mas cientes de que a luta contra a ignorância e a favor da democracia deve continuar, pela inclusão, pelos programas sociais, pela reparação histórica e pelos direitos humanos que, afinal, beneficiam a todos e todas, inclusive os raivosos que debocham da vida e da dignidade do próximo. Mais uma professora e um trabalhador torturados pela burrice, pela ignorância e comodidade das elites…
Rogério Messias: Hoje vou usar as redes sociais para externar minha indignação e tristeza com o radicalismo que nos encontramos, acabei de ser espancado na saída do ato grandioso de recepção ao melhor presidente que este país já teve, quando passando por trás da Praça XV, em Florianópolis, fui espancado junto com minha mulher Juliana Impaléa, em meio aos chutes desferidos pelos coxinhas do movimento MBL, mais força se enchia meu coração, não calarão a voz do povo, meu corpo machucado vai curar, mas a alma pequena de quem defende falsos mitos, não curarão, na defesa do povo trabalhando como povo sofrido que somos, não aceitarei tal situação, trabalhando em dois empregos, das 7 da manhã as 22 h, não aceitarei ser espancado por coxinhas bem nascidos que acham que com sua fúria radical, cega e doentia vão conseguir calar a vontade popular, e mais Lula é o melhor presidente que este país já teve, e isso coxinha nenhum vai conseguir deturpar. Estou muito bem, corpo de trabalhador dolorido um pouco mais que o normal do dia a dia, mas a mente certa na transformação social pelo povo trabalhador como eu e minha mulher, Juliana Impaléa, também covardemente espancada quando íamos embora depois de passarmos pelo posto médico do ato, pelo excesso de sol e corpo cansado pelo trabalho.
Lula você é e sempre será a esperança do povo sofrido deste país, o Brasil está contigo.