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  • Cortes e crueldade colocam educação em Mato Grosso a um passo do abismo

    Cortes e crueldade colocam educação em Mato Grosso a um passo do abismo

    Há apenas quatro anos, a Universidade Federal de Mato Grosso era umas instituições públicas de ensino superior que mais cresciam no país. Com os investimentos realizados nos governos petistas, a UFMT chegou aos atuais 25 mil alunos em 133 cursos de graduação e 66 de pós-graduação. São incontáveis as pesquisas realizadas e as diversas iniciativas de extensão que atingem toda a comunidade matogrossense, como foi provado no evento #BalbúrdiaUFMT. Mas, desde as restrições orçamentárias iniciadas em 2014 e principalmente a partir do corte de 30% nas verbas de custeio realizadas em março desse ano, chegou-se a uma situação sem precedentes.

    https://www.facebook.com/pamela.saunders.7/videos/2665189320160502/

    Vídeo: @ferpakkj

    Hoje, por volta das 10:00, enquanto as aulas corriam normalmente, a concessionária de energia do estado, Energisa, simplesmente cortou a luz dos cinco campi mais importantes da instituição, incluindo o de Cuiabá. Alunos, professores e funcionários sabiam que havia contas pendentes de pagamento e uma negociação aberta com a empresa que já havia ameaçado realizar o corte em junho. Mas ninguém foi avisado sobre o dia e o horário, havendo, inclusive, uma reunião marcada para essa tarde entre os gestores das duas instituições. Professores e alunos foram pegos de surpresa no meio da aula, o que aumentou ainda mais a ansiedade geral da comunidade acadêmica já afetada pelo anúncio da reunião dos reitores no MEC, realizada essa tarde, cuja pauta era confusa e não resultou efetivamente em nada. Amanhã pela manhã (9:00hs) faremos um ato em defesa da Universidade, do ensino público gratuito e contra os cortes:

     

    A verdadeira balbúrdia na educação, no entanto, não está restrita às universidades públicas. O ensino estadual, especialmente o secundário, também tem sido alvo de embate, e crueldade, pelo poder público, como relata abaixo o colaborador dos Jornalistas Livres, Francisco Miguel:

    GOVERNO DE MT MANDA CORTAR EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PARA PROFESSORES GREVISTAS QUE JÁ PEDEM NOS SINALEIROS

    Os grevistas, que tiveram o ponto ilegalmente cortado por determinação do governador Mauro Mendes (DEM) – e que ilegitimamente foi autorização pelo Poder Judiciário -, também não estão conseguindo mais acesso ao crédito consignado. A medida é mais uma retaliação do Governo aos grevistas que já estão há cerca de 55 dias em greve. Ao entrarem em contato com a Coordenadoria de Controle e Fiscalização das Consignações, os profissionais foram informados que a margem de empréstimo foi zerada para todos os servidores que tiveram o ponto cortado.


    “Fomos informados que o corte aconteceu apenas para os servidores da Educação. Isso caracteriza claramente a perseguição aos professores e o esforço pessoal dele de humilhar e deixar os professores em situação de fome”, afirmou uma servidora.
    O corte de ponto deixou 15.211 profissionais da educação que estão em greve desde 27 de maio sem salários neste mês. O número inclui professores, técnicos e profissionais de apoio das escolas públicas estaduais de Mato Grosso.

    CAMPANHA DE DOAÇÃO SOLIDÁRIA AOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO, SUA CONTRIBUIÇÃO FAZ TODA DIFERENÇA PARA OS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO EM GREVE
    Os profissionais da Educação da rede estadual e o seu sindicato – Sintep MT, têm-se mobilizado, diariamente, na área central de Cuiabá, fazendo pedágio em frente ao Banco do Brasil de manhã e, posteriormente, na Praça Ipiranga. Além de pedirem nos sinaleiros, este ato de arrecadação mais ativo por parte destes profissionais, é composto por outras duas formas, um primeiro designado de ‘alimente quem te alimenta de conhecimento’ no qual a comunidade pode contribuir em dinheiro diretamente no Banco do Brasil, e um outro, em que todos podem doar alimentos não perecíveis junto do Sintep.


    GRANDE ATO, PRÓXIMA QUARTA-FEIRA, ‘PELA EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO
    Sob o lema: ‘A Nossa Luta Unificou! É o Estudante, Funcionário e Professor!’, um Grupo de Estudantes da Baixada Cuiabana, estão organizando e marcaram já para a próxima quarta-feira, mais um grande ato, às 14 h, no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) em frente ao Shopping Pantanal, aqui em Cuiabá. Todas as semanas, depois das Assembleias Gerais – geralmente lotadas, que têm deliberado seguidamente pela continuidade da greve dos trabalhadores na Educação da rede estadual, têm acontecido passeatas pelas as ruas de Cuiabá com milhares de pessoas. Todas as semanas essas passeatas têm sido muito grandes e todas as semanas a imprensa de MT as tem ignorado veementemente.

     

    NOTA DE SOLIDARIEDADE À UFMT

    O Movimento Enfrente se solidariza aos estudantes e servidores da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) em razão do corte no fornecimento de energia elétrica, que causa diversos prejuízos, sobretudo, a perda de materiais e amostras de importantes pesquisas realizadas pela instituição.

    Entendemos como muito grave a situação que as Universidades estão chegando diante da austeridade praticada pelo governo Bolsonaro e lembramos que desde o anúncio do corte de verbas a reitora Myrian Thereza havia informado que a Universidade só teria condições para funcionar até o mês de julho, assim como em outros estados esse fato deve se repetir.

    Repudiamos, mais uma vez, o projeto de desmonte das políticas sociais e os cortes de verbas na educação pública que visam o sucateamento e, por fim, a privatização.

    No dia 13 de agosto estaremos novamente nas ruas resistindo pela Educação pública, gratuita e de qualidade, democrática, popular, inclusiva e emancipadora, e defendendo que o quadripé ensino, pesquisa, extensão e permanência seja o caminho de um futuro melhor para os e as estudantes!

    #MovimentoEnfrente #ME #EnfrentePelaEducacao #NaoMateNossoFuturo #DevolvaNossoFuturo #UNE #13A

    Instagram: https://www.instagram.com/p/Bz_RhBQlUvv

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  • Universidades públicas X universidades particulares, uma discussão bem antiga

    Universidades públicas X universidades particulares, uma discussão bem antiga

     

    Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia, com charge de Brum

     

    Desde a minha época de vestibular que a discussão “universidade pública X universidade particular” desperta paixões. Lembro que antes de ser aprovado no vestibular da UFRJ, lá no distante 2005, ganhei uma bolsa integral numa faculdade particular. Eu morria de medo de precisar estudar lá. Tinha preconceito mesmo. Todo preconceito é tolo, pois bebe na fonte da ignorância.

    Hoje, 14 anos depois, acho que consigo dizer algo sobre o assunto com alguma sobriedade e propriedade.

    É que fui aluno de universidade pública da graduação ao doutorado. Fui professor de universidade particular durante cinco anos. Atualmente, sou professor de uma das mais importantes universidades federais do Brasil.

    Como acontece em quase tudo na vida, o ideal é o meio termo, a justa medida. Não sou daqueles que demonizam as universidades particulares, negando a elas qualquer importância e relevência social. Também não estou entre os que idealizam as universidades públicas.

    Há muitos problemas nas universidade públicas. Apesar dos avanços da última década, o ambiente ainda é elitizado e muitas vezes hostil aos alunos trabalhadores.

    Alguns colegas, inconscientemente ou deliberadamente, ainda reproduzem algumas máximas pra lá de excludentes, como, por exemplo, a divisão dos alunos em dois grupos: os que têm perfil pra atividade acadêmica (aqueles que seguirão carreira científica nos cursos de pós-graduação) e os que têm perfil, “apenas”, para o mercado de trabalho. Marcadores de raça e classe servem como critérios para essa divisão.

    Os cursos noturnos, ocupados quase exclusivamente por alunos trabalhadores e pobres, ainda encontram muitas dificuldades em seu funcionamento: falta a devida estrutura administrativa, em alguns casos não existe isonomia curricular com os cursos diurnos, é pequena a oferta de disciplinas eletivas e atividades extracurriculares.

    Com todas essas ressalvas, a absoluta maioria dos alunos matriculados nas universidades públicas pertencem às classes D e E. Essa realidade é resultado da implantação do sistema de cotas e do Sistema de Seleção Unificada (SISU).

    Apesar de todos os problemas, universidades públicas, são, sim, espaços de acolhimento para os filhos das classes trabalhadoras. Formação acadêmica de excelência e contato cotidiano com as maiores inteligências do país modificam radicalmente o horizonte de expectativas dos nossos alunos.

    Depois de alguns anos na universidade pública, meninos e meninas criados para serem trabalhadores manuais começam a sonhar mais alto: viagens internacionais, pesquisa científica, produção intelectual. Questionam estruturas de opressão que antes pareciam naturais.

    Grande parte da pesquisa científica e inovação tecnológica produzidas no Brasil são desenvolvidas nas universidades públicas. Não tenho dúvida de que, se puder escolher, desejarei que meu filho se forme numa universidade pública. É gratuita e tem qualidade, tem excelência.

    Sim, a universidade pública é melhor que a universidade particular. Não é mais preconceito. É conceito e experiência.

    Já as universidades particulares estão, sim, mais para escolões de ensino superior do que propriamente para universidades. Falta estabilidade funcional para os professores, que têm seus salários calculados sobre a quantidade de turmas. Isso produz toda uma política interna na qual, nem sempre, o professor em sala de aula é a melhor opção acadêmica para aquela disciplina.

    Os currículos são rígidos demais, o calendário muito amarrado, provas objetivas e controladas pela burocracia da empresa. Enfim, pouca autonomia intelectual. Sem autonomia, estabilidade salarial e valorização do professor, não existe excelência acadêmica.

    No entanto, aconteceu nos últimos anos algo um tanto contraditório. A ampliação da população universitária promovida nos governos do PT se deu, em maior parte, no aumento de vagas nas universidades particulares.

    Também teve expansão nas universidades públicas. Mas em números absolutos, a expansão das universidades particulares foi maior, muito maior mesmo. Isso levou às universidades particulares um exército de lumpemproletários.

    Faxineiras, atendentes de call center, pedreiros e mecânicos.

    Uma camada social semiletrada que não sobreviveria um semestre nas universidades públicas, justamente pelo ambiente acadêmico um tanto elitizado.

    Nos anos em que fui professor de universidade particular, tive a experiência de ensinar para alunos que mal sabiam ler e escrever. Fico imaginando a reação dos meus professores e da maioria dos meus colegas se tivessem contato com esse perfil de aluno: sairiam bufando, resmungando, dizendo “essas pessoas não deveriam estar aqui”.

    Por muito menos, já vi isso acontecer, vejo isso acontecer.

    Na universidade particular, não é possível sair bufando e resmungando. Se o funcionário faz isso, ele é demitido. Simples assim.

    Em ambiente empresarial, portanto, esse lumpemproletariado, alçado à condição de cliente, foi acolhido, teve que ser acolhido. Ironicamente, a lógica do mercado criou condições para o acolhimento.

    O resultado foi um processo civilizatório impressionante.

    A maioria dos meus ex-alunos da universidade particular não está trabalhando na área de formação, porque, infelizmente, não tem condições de sobreviver em um mercado de trabalho em retração e extremamente competitivo. Mas todos saíram bem melhor que entraram. Formação e conhecimento fazem milagres. Vi muitos pequenos milagres acontecer.

    Um processo civilizatório!

    São pais, mães, filhos, sobrinhos, primos, levando algo diferente para suas famílias, para o bairro, para a igreja. Não é possível precisar numericamente esse alcance social, mas ele é muito grande, muito grande mesmo.

    Se tivéssemos um governo digno e honesto, a solução seria corrigir os erros cometidos pelo PT e continuar investindo nas universidades públicas, ampliar seus quadros docentes e administrativos, democratizá-la e popularizá-la ainda mais.

    Tudo isso para acolher o lumpemproleteriado que, muitas vezes, é explorado e enganado pelas empresas privadas de ensino superior.

    Como o governo não é sério, o movimento é o contrário do que deveria ser. O lobby das empresas privadas de ensino superior está na base dos ataques às universidades públicas. O objetivo é universalizar a precariedade intelectual. Pra isso, precisam nos destruir, nos aniquilar.

    Não dá pra saber se eles terão sucesso. Dá pra saber que vamos resistir. Ninguém aqui vai pro abate calado, como se fosse boi manso.