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  • Certidão de óbito de Merlino reconhece crime do Estado

    Certidão de óbito de Merlino reconhece crime do Estado

    Na próxima quarta-feira, em cerimônia solene na sede do Ministério Público Federal, em São Paulo, os familiares de Luiz Eduardo Merlino vão receber a certidão de óbito do jornalista corrigida, que vai constar a verdadeira razão da sua morte:

    “em razão de morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985″

    A decisão foi do Corregedor Geral de Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco, e foi divulgada, 24 horas depois de o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, não receber denúncia do Ministério Público Federal contra os agentes do responsáveis pelo morte de Merlino (ver mais abaixo o caso). Esta denúncia compreendia também a acusação do médico Abeylard de Queiroz Orsini, à época legista, acusado pelo crime de falsidade ideológica, decorrente da falsificação do laudo necroscópico do jornalista, emitido em 1976, onde constava que Merlino morreu de “anemia aguda traumática”.

    A cerimônia vai acontecer, na quarta-feira (18.11.2019) às 11h da manhã, e deve contar com a presença de Gianpaolo Poggio Smanio, Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, e com os familiares e amigos de Luiz Eduardo Merlino.

    Um longo caminho para obter a certidão de óbito

    A família de Merlino luta por justiça desde de sua morte em 1971. Sua mãe dona Iracema, conseguiu enterrar o filho por que um tio de Merlino Delegado de Polícia, conseguiu recuperar o corpo. Não fosse por isso, sua família não teria nem a certeza da sua morte, e ele estaria entre os desaparecidos. 

    São quase 50 anos de luta, mas a partir de 1995 o Estado Brasileiro passou a reconhecer pela a LEI Nº 9.140 que:

    dezenas de pessoas que, em razão de participação ou acusação de participação em atividades políticas no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, encontravam-se desaparecidas ou mortas. A mesma Lei previu a criação de uma Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos que, entre outras atribuições, tinha as competências para proceder ao reconhecimento de outras pessoas desaparecidas; proceder ao reconhecimento de pessoas que, por terem participado ou terem sido acusadas de participação em atividades políticas, faleceram, por causas não naturais, em dependências policiais ou assemelhadas; localizar os corpos de pessoas desaparecidas no caso da existência de indícios quanto ao local de ocultação ou sepultamento.
    Texto do site do: MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS 

    Nos anos seguintes, depois de muita luta dos familiares, da assinatura de tratados internacionais, da instauração das Comissões Nacionais e Estaduais da Verdade e dos trabalhos da Comissão da Anistia, pode-se dizer que o Brasil passou a adotar uma política de reparação e ações que são configuradas como justiça de transição:

    Os direitos da Justiça de Transição – direito à Memória e à Verdade, à Justiça, à Reparação e à Reforma Institucional – promovem o reconhecimento lidam com o legado de atrocidades de um passado violento ao qual não se quer regressar e de um presente e futuro que precisam ser diferentes para que realmente se possa dizer: “nunca mais!”.

    A mudança na certidão foi requerida à CEMDP (Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos) durante a gestão da procuradora regional da República Eugênia Augusta Gonzaga, demitida do cargo em julho deste ano pelo presidente Jair Bolsonaro.

    Uma resolução de 2017 da CEMDP é que permitiu criar um mecanismo para a modificação de atestados de óbito com base nas apurações da comissão ou da CNV (Comissão Nacional da Verdade).

    A burocracia pra chegar à certidão

    Quando o atestado da CEMDP (Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos) foi emitido para a família Merlino, reconhecendo a morte do jornalista, o cartório onde havia sido registrado o documento foi oficiado para providenciar um novo assento (registro no livro do cartório) e a nova certidão de óbito, mas a Oficial do Registro Civil recusou as alterações, alegando que a questão era subjetiva, decisão mantida pela juíza corregedora permanente. 

    A família Merlino recorreu e o corregedor encaminhou o caso para a análise da juíza assistente Stefânia Costa Amorim Requena, que reconheceu o pleito da família Merlino. 

    Segundo o parecer da juíza, a Corregedoria Nacional de Justiça já havia reconhecido que os atestados emitidos pela CEMDP são “títulos hábeis para a retificação administrativa dos assentos de óbito”, ou seja, quando os cartórios recebem esses atestados, devem providenciar a mudança do assento de óbito e emitir nova certidão (com informações de Marcelo Oliveira do Uol).


    A BUSCA POR JUSTIÇA NO CASO MERLINO

    O crime ocorreu em 1971, nas dependências do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), centro de tortura comandado pelo Coronel Brilhante Ustra entre outubro de 1969 e dezembro de 1973. 

    O coronel foi condenado em primeira instância mas recorreu. Em 2008, em outro processo, Ustra foi declarado torturador pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em ação movida pela família Teles. 

    Em 2010 o STF (Supremo Tribunal Federal), julgou constitucional a Lei de Anistia de 1979 e isso tem sido usado como justificativa para que os torturadores não sejam culpados. 

    Em 2012, no caso de Merlino, a Justiça negou o recurso de Ustra e manteve a decisão de condenação, mas como o coronel morreu em 2015 a ação contra ele foi extinta.

    MAIS SOBRE O CASO EM:
    https://jornalistaslivres.org/luiz-eduardo-merlino-morre-mais-uma-vez/

    https://jornalistaslivres.org/assassinato-de-luiz-eduardo-merlino-volta-a-justica-na-proxima-quinta-10-10/

    coletivomerlino.org

    A família de Merlino, moveu ações contra o Coronel Alberto Brilhante Ustra, comprovadamente mandante do assassinato do Luiz Eduardo Merlino e também contra os outros agentes responsáveis diretamente à morte do jornalista:  o delegado aposentado Aparecido Laertes Calandra e o delegado da Polícia Civil de São Paulo Dirceu Gravina, acusados de homicídio doloso qualificado (com intenção de matar), por motivo torpe e com emprego de tortura que impossibilitou a defesa da vítima. O médico Abeylard de Queiroz Orsini, à época, legista, é acusado pelo crime de falsidade ideológica, decorrente da falsificação do laudo.

    MAIS SOBRE AS DECISÕES JUDICIAIS MAIS RECENTES
    https://jornalistaslivres.org/tribunal-de-sp-tortura-e-mata-novamente-o-jornalista-luiz-eduardo-merlino/

    https://jornalistaslivres.org/assassinato-de-luiz-eduardo-merlino-pela-ditadura-tem-novo-julgamento/

    A NOVA GESTÃO DA CEMDP 

    A atual gestão da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) provavelmente não deverá prosseguir com a política de retificação dos atestados de óbito iniciada pela gestão anterior. 

    Em ação recente os representantes atuais da CEMDP tentaram transferir a pesquisa forense das ossadas da Vala de Perus, do Caaf/Unifesp de São Paulo para Brasília, mas não obtiveram êxito.

    MAIS EM:

    https://jornalistaslivres.org/ditadura-nunca-mais-aberta-a-ultima-caixa-da-vala-clandestina-de-perus/

    https://jornalistaslivres.org/luiz-eduardo-merlino-morre-mais-uma-vez/

    Em reportagem para Marcelo Oliveira, Angela Mendes de Almeida, viúva de Merlino  afirmou:


    “A luta vai continuar, independente de mim, porque o passado sempre volta, como está acontecendo hoje na Espanha, onde os restos mortais do ditador Francisco Franco estão retirados do Vale dos Caídos (memorial em homenagem aos heróis da Guerra Civil Espanhola), que terminou em 1939”.

  • TODO APOIO À AMELINHA TELES e SUA FAMÍLIA

    TODO APOIO À AMELINHA TELES e SUA FAMÍLIA

    Amélia Teles, mais conhecida por Amelinha, é uma guerreira imprescindível para o Brasil. Para alertar o país sobre a barbárie que foi a Ditadura Militar, ela contou sua história de resistência e sofrimento no horário eleitoral do candidato Fernando Haddad. Amelinha foi torturada pelo coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o ídolo de Bolsonaro. Agora está sofrendo ataques pessoais pelas redes sociais e por whatsapp pelos apoiadores do candidato do PSL.

    Ela e sua família têm sido alvo de ameaças, xingamentos e agressões. Também circula no Facebook uma foto de Amelinha com texto contendo acusações mentirosas sobre violências que ela teria cometido quando militava contra a ditadura. No processo que respondeu por conta de sua atuação política no período, contudo, não há nenhuma referência aos supostos crimes.

    Amelinha é um exemplo de resistência e perseverança incansável na defesa dos Direitos Humanos. Foi uma das mulheres à frente dos movimentos de defesa de mortos e desaparecidos na Ditadura Militar. Ela defendeu o combate à tortura no Brasil e o resgate histórico da memória, verdade e justiça.

    Em 2008, em uma decisão inédita, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra foi declarado torturador pela primeira vez. A decisão foi referendada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Esse reconhecimento mais do que necessário só ocorreu graças à luta e ao processo movido pela família Teles, que venceu processo judicial em todas as instâncias contra o ídolo do presidenciável.

    Neste momento, até a mídia “mais tradicional” como o Jornal Estado de São Paulo veio a público esclarecer e desmentir a campanha de difamação. As agências de checagem de fake news também denunciaram a farsa.

    No dia 17.10.2018, o Tribunal de Justiça de São Paulo (veja neste link sobre a decisão), deu uma passo para trás no caso movido pela família do jornalista Luis Eduardo Merlino, Amelinha estava presente e comentou a sentença neste vídeo:

     

    Leia também o manifesto em solidariedade de Amelinha Teles e de seus familiares:

     O MANIFESTO 

    Nós, familiares de mortos e desaparecidos políticos, defensores de direitos humanos, organizações e entidades abaixo-assinadas, nos solidarizamos com Amelinha Teles, ex-presa política e histórica defensora de direitos humanos e sua filha Janaína Teles, historiadora e defensora de direitos humanos. Ambas vêm sendo alvo de uma onda de ataques nas redes sociais.

    VEJA OS DEPOIMENTOS em VÍDEO:

     

    Entenda o caso:

    As agressões a Amelinha começaram após ela gravar um depoimento ao lado de sua filha Janaína sobre as torturas às quais foram submetidas durante a Ditadura Militar. Amelinha relata o momento em que seus dois filhos foram levados ao centro de torturas, o DOI-Codi, em São Paulo. As duas crianças não reconheceram a própria mãe por conta dos hematomas e condições físicas em ela ficou após as sessões de tortura. Janaína, por sua vez, conta como foi ver, aos cinco anos de idade, seus pais torturados. Os testemunhos foram ao ar durante o programa eleitoral do presidenciável Fernando Haddad (PT).

    No momento em que há um presidenciável que defende a tortura e tem como ídolo um torturador da ditadura declarado, é fundamental reforçar nosso repúdio à Ditadura Militar. O regime autoritário que perseguiu, estuprou, sequestrou, torturou, assassinou e ocultou os corpos de opositores políticos jamais pode voltar.

    Queremos agradecer à Amelinha Teles por sua incansável luta por memória, verdade e justiça em relação aos crimes contra a humanidade cometidos por agentes do Estado.

    Ditadura nunca mais!

    Tortura nunca mais

    Apoie Amelinha assinando AQUI

     

  • Coronel Ustra pode ser condenado esta semana por tortura e assassinato

    Coronel Ustra pode ser condenado esta semana por tortura e assassinato

    O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) marcou para a próxima quarta-feira, 17 de outubro, a audiência de julgamento da apelação da defesa do coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra pela tortura e assassinato do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, em julho de 1971. O coronel foi condenado em primeira instância mas recorreu.

    O crime ocorreu nas dependências do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), centro de tortura comandado por Ustra entre outubro de 1969 e dezembro de 1973.

    Em 2008, em outro processo, Ustra foi declarado torturador pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em ação movida pela família Teles. Em 2012, a Justiça negou o recurso do coronel reformado e manteve a decisão. Ustra morreu em 2015.

    O Coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, o mesmo que continua sendo homenageado pelo candidato Jair Bolsonaro, quando foi major do Exército e comandante do DOI-Codi, entre setembro de 1970 a janeiro de 1974, usava os codinomes de “Dr. Tibiriçá” ou “Dr. Silva” para suas ações criminosas.

    A Comissão Nacional da Verdade registrou pelo menos 502 casos de tortura e mais de 40 assassinatos ocorridos no DOI-Codi sob o comando do Ustra, incluindo a tortura sofrida Dilma Roussef entre outros. A Comissão disponibilizou um canal no Youtube em que é possível assistir uma série de depoimentos, inclusive a do torturador (clique para acessar)

    A luta das famílias

    A ação judicial movida por estas duas famílias (Teles e Merlino), tem um sentido especial de justiça e reparação moral e política, e é uma iniciativa pioneira e inusitada no Brasil, o único país da América Latina que não tem nenhum torturador da época da ditadura militar condenado. 

    Luiz Eduardo da Rocha Merlino, foi sequestrado em sua casa em Santos, em 15 de Junho de 1971, e torturado por 24 horas seguidas e abandonado numa solitária. Morreu em decorrência da omissão e dos graves ferimentos que sofreu por tortura. Conheça mais sobre a história de Merlino e a luta por justiça no site coletivomerlino.org .

    Assista à vídeo-biografia, onde Celso Frateschi relata em primeira pessoa como foi a morte de Merlino. Acesso o link do relatório final produzido pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo da Verdade Rubens Paiva.

     

     

    A série de vídeo-biografias tem uma playlist específica,

    Tortura e Assassinato

    Trechos da matéria de Tatiana Merlino e André Caramante disponível no site.

    Caixão lacrado

     A notícia da morte de Merlino chegou à família por meio de um telefonema ao seu cunhado, Adalberto Dias de Almeida, que era delegado da Polícia Civil. Adalberto e tios de Merlino foram ao IML (Instituto Médico Legal) de São Paulo onde foram informados de que lá não havia nenhum morto com esse nome. Usando da sua condição de delegado, Adalberto foi em busca do corpo do cunhado. Abrindo uma por uma as portas das geladeiras, localizou o corpo de Luiz Eduardo com marcas evidentes de tortura e sem identificação. O corpo foi entregue à família num caixão lacrado.

    A versão que foi dada à família foi a de que Merlino teria se suicidado ao jogar-se embaixo de um caminhão na BR-116, na altura de Jacupiranga, quando estava sendo transportado para Porto Alegre para a identificação de militantes. Tal versão consta do laudo necroscópico assinado por Abeylard Orsini e Isaac Abramovitch. O veículo que o teria atropelado nunca foi identificado e tampouco foi realizada uma ocorrência no local do fato.

    40 anos de luta por verdade e justiça

    A família de Merlino luta há 40 anos por justiça, ainda em 1979, a mãe do jornalista, Iracema da Rocha Merlino, já falecida, moveu uma ação declaratória na área cível, mas foi rejeitada, sob a alegação de prescrição.

    Em 2008, a família moveu uma nova ação declaratória na área cível, que não pretendia nenhuma indenização pecuniária, apenas o reconhecimento moral de que ele foi morto em decorrência das terríveis torturas que sofreu nas dependências do DOI-CODI de São Paulo, mas o processo foi extinto na primeira instância, não chegando sequer a ser julgado em seu mérito.

    Através de seus advogados Fábio Konder Comparato, Claudineu de Melo e Aníbal Castro de Souza, os familiares de Merlino recorreram ao Superior Tribunal de Justiça, mas o relator do caso não considerou o recurso e arquivou o processo em março de 2010.

    Em 2010, os advogados dos familiares de Merlino entraram com uma nova ação, ainda na área cível, desta vez por danos morais, contra o coronel Ustra. Também neste caso os advogados do coronel encaminharam ao Tribunal de Justiça de São Paulo um recurso (“agravo de instrumento”), tentando bloquear o seguimento do processo. Porém não obtiveram sucesso. E finalmente, em 27 de julho de 2011 a juíza Claudia de Lima Menge ouviu as seis testemunhas arroladas pelos familiares de Merlino.

    O coronel Ustra havia indicado como suas testemunhas de defesa algumas pessoas que deveriam depor por carta precatória em seus estados, pois nenhuma residia em São Paulo,  algumas delas declinaram da convocação, como o senador José Sarney, por exemplo. Por fim uma única testemunha falou em sua defesa, depondo em Brasília: o general Paulo Chagas declarou não ter notícia de nenhum ato de tortura praticado pelo coronel Ustra e também que o Exército brasileiro nunca tinha dado nenhuma ordem escrita para torturar presos. A juíza proferiu a sentença de condenação na primeira instância, para que o coronel Brilhante Ustra  pagasse uma indenização à família de Merlino.

     

    Com trechos do relatório da Comissão da Verdade do Estado e São Paulo Rubens Paiva , do site Memórias da Ditadura e do site www.coletivomerlino.org

  • O que vem por aí

    O que vem por aí

    Reação na Paulista aos votos de Bolsonaro, Jandira Feghali e Jean Wyllys expõe claramente o que esperar dos golpistas

    https://www.youtube.com/watch?v=bRkB1GzfCaU

    paulista2 (1)

    A estratégia do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, de separar por estados os votos pela admissibilidade do processo de impeachment da Presidenta Dilma Roussef, começando pelo Sul onde teria mais votos a favor, e depois por ordem alfabética, colocou na sequência as falas de três parlamentares do Rio de Janeiro, todos de posições firmes e ideológicas: Jair Bolsonaro, Jandira Feghali e Jean Wyllys. E a reação do público na Paulista que assistia à votação nos telões e palco montados pela Federação das Indústrias de São Paulo são um claro indicativo do que os golpistas preparam para aqueles que não comungam do seu ideário. Tudo sob aplausos e vaias de milhares de brasileiros enfeitiçados por retóricas vazias de hipócritas que, sob os holofotes da imprensa venal, dedicavam seus votos a deus e à família.

    O palco em frente à Fiesp, entidade cujo presidente em 1964 pagou US$ 1 milhão ao ex-ministro da guerra e comandante do 2º Exército Amaury Kruel para trair o
    Presidente da República João Goulart e consolidar o golpe (camara.sp.gov.br/blog/fiesp-pagou-us-1-milhao-para-ajudar-golpe-de-64-diz-coronel/), foi montado do lado direito do grande pato amarelo “contra os impostos” cujo design foi plagiado do artista holandês Florentijn Hofman (bbc.com/portuguese/noticias/2016/03/160329_pato_fiesp_fs). Entre pato e palco, um varal trazia cópias de capas e recortes de artigos e “reportagens” de veículos como Veja, Estadão e outros acusando o governo e, principalmente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de corrupção.
    Bem no meio a montagem com a imagem de Lula vestindo uma camisa listrada de “presidiário” que serviria de inspiração para o boneco inflável cuja presença é indispensável nos protestos contra o governo. Uma bem traçada estratégica midiática-imagética cujo objetivo final, mais do que derrubar o atual governo, é eliminar o ex-presidente da disputa política.

    Em cima do palco, um animador de público contratado para comentar os votos, puxar gritos de guerra, vaias e aplausos vibra quando Bolsonaro diz que seus adversários “perderam em 64, perderam agora em 2016”e quando dedica seu voto à “memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Roussef”, fazendo referências a um dos pouquíssimos assassinos e torturadores do regime militar reconhecido como criminoso condenado pela justiça brasileira a indenizar a família de uma das vítimas (http://brasil.elpais.com/brasil/2015/10/15/politica/1444927700_138001.html). Em seguida puxa um “quem não pula é petista, quem não pula é petista”.

    paulista1No meio da fala da deputada pelo PCdoB Jandira Feghali, o animador “informa” a plateia que ela é “a socialista que tem loja que vende a Coca Cola a R$ 9,00” pouco antes de puxar uma vaia e em seguida orquestrar um novo coro para o público: “Não é mole, não. É socialista de iPhone e de carrão”. O pior, entretanto, ainda estava por vir. Ao ouvir o nome do próximo deputado a votar, o animador dá um gritinho: “ ahhh Jean Wyyyylyyyyyyyyyysssssss”. E pede “a maior vaia que essa avenida Paulista já deu! Cadê, cadê, cadê? Vaia, vaia, vaia! Vaia nele, vaia nele, vaia nele! Não deixa ele falar, não!! Não deixa ele falar, UUUUUUUUUUUU!!! A maior vaia da Paulista, agora, agora agora!!!”. E a única coisa que o povo em frente à Fiesp conseguiria ouvir, se tivesse interesse, seria a última frase do deputado pelo Psol: “Durmam com essa, canalhas!!”.

    Bolsonaro está certo em uma coisa. As forças democráticas perderam em 1964. Muitas vozes, como a de Jean Wyllys hoje, foram silenciadas durante a ditadura. Não por vaias, mas por torturadores e assassinos como Ustra, em associação com empresários da Fiesp como Henning Boilesen, então presidente da Ultragaz, que ajudou a financiar a Operação Bandeirantes (Oban) que serviria como modelo para as ações dos DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações-Coordenação de Defesa Interna) e famoso por fazer questão de assistir pessoalmente as sessões de tortura (https://www.youtube.com/watch?v=U4O0_BqNZKQ ) de dissidentes comunistas e socialistas como são hoje Feghali e Wyllys.

    Mas 2016 não é 1964. A vitória ainda não está dada. Já há luta, resistência e organização que só aconteceriam na ditadura a partir de 1968. Além disso, ainda que percamos a guerra no final, vale sempre a pena lembrar a famosa citação do antropólogo Darcy Ribeiro que, aliás, foi ministro da Educação e Chefe da Casa Civil de João Goulart até o golpe de 31 de março:

     

    “Fracassei em tudo o que tentei na vida.

    Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.

    Tentei salvar os índios, não consegui.

    Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.

    Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.

    Mas os fracassos são minhas vitórias.

    Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.”

    paulista3