Jornalistas Livres

Tag: constituinte

  • JORNALISTAS LIVRES NA COBERTURA DAS ELEIÇÕES REGIONAIS VENEZUELANAS

    JORNALISTAS LIVRES NA COBERTURA DAS ELEIÇÕES REGIONAIS VENEZUELANAS

     

    Por Juliana Medeiros para os Jornalistas Livres

    No próximo domingo a Venezuela escolhe governadores de 23 estados em eleições marcadas por um passado recente de tensão e atos de violência por parte de organizações ligadas à oposição que tentaram, sem sucesso, impedir a realização da eleição para a Assembleia Constituinte em 30 de julho deste ano (veja em nosso site a cobertura especial dos Jornalistas Livres sobre o tema).

    O nível extremado de violência perpetrado pelos partidos que integram a chamada MUD (Mesa de Unidade Democrática), parecem ter surpreendido até mesmo aqueles cidadãos que se posicionavam contra o governo de Nicolás Maduro. O fato ficou evidenciado depois que se verificaram os números de votantes em estados tradicionalmente dominados pela oposição (na Venezuela o voto não é obrigatório) indicando que apesar de não terem reconhecido oficialmente, não puderam impedir que suas bases legitimassem o processo constituinte.

    Para esse pleito, também o discurso dos candidatos oposicionistas se modificou, já que passaram a chamar o povo a votar, ao contrário do que fizeram no anterior. O ex-candidato à presidência, Henrique Capriles, é um dos mais frequentes a convocar na TV, seus eleitores a saírem de casa.

    A antecipação da convocação para essas eleições (a 22ª em 18 anos de chavismo), prevista inicialmente para dezembro, foi uma decisão justamente dos membros da Assembleia recém-eleita, como destacou nesta sexta-feira a presidenta do órgão constituinte Delcy Rodríguez.

    Segundo ela, com isso se pretendia consolidar a paz lograda quase que imediatamente depois de 4 de agosto, quando tomaram posse os membros eleitos da Assembleia Constituinte.

    “Para nós é muito importante, como poder constituinte, sermos vigilantes sobre a garantia de paz na Venezuela. Nossas últimas eleições, como se sabe, foram marcadas por muita violência e também pela negativa da oposição em participar, tentando impedir que suas bases fizessem parte desse exercício pacifico e democrático”, acentuou Rodríguez.

    Apesar dos protestos iniciais, a estratégia de fato serviu para uma espécie de trégua geral, já que candidatos de direita e de esquerda precisaram se concentrar em suas campanhas.

    Além disso, os líderes opositores parecem ter se dado conta de que não foi uma boa estratégia ter optado por ficar fora do processo e, apesar de terem tentado desde sempre deslegitimar o CNE, inscreveram seus candidatos imediatamente após o início do prazo para registro eleitoral.

    Em todos os canais (a esmagadora maioria, privados e de oposição), foi possível ver os spots de propaganda eleitoral obrigatória – encerrada nesta quinta-feira (12) – de candidatos das várias correntes políticas e partidos. Com destaque para os de oposição que concentram os discursos não em suas regiões, mas na disputa ideológica presente no cenário político nacional, com frases como “abaixo a esquerda”.

    Além disso, 1.200 observadores nacionais e 67 acompanhantes internacionais, de 22 países, participam de todo o processo para garantir a transparência.

    O pleito, marcado para o próximo domingo, vai eleger governadores em todas as regiões da República Bolivariana, exceto na capital, Caracas. Isso se deve à Constituição do país que considera o presidente a maior força política do chamado “Distrito Capital” – sede de todos os órgãos do Poder Nacional – e que por isso, não possui governador, sendo a função acumulada pelo presidente.

    No entanto, com o objetivo de evitar que se repitam os atos de violência ocorridos durante a eleições anteriores, o Ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, afirmou nesta sexta-feira (13) em coletiva de imprensa que será garantida a tranquilidade do país, “não importa qual seja o resultado eleitoral”.

    Já a Presidenta da Assembleia Constituinte, Delcy Rodriguez, chamou a oposição à razoabilidade: “para os que buscam refúgio em poderes antinacionais ou imperiais, novamente lhes dizemos que esta é a via, o caminho eleitoral, o caminho democrático, tal como está contemplada em nossa Constituição”

    Na coletiva de imprensa realizada hoje, as autoridades venezuelanas também aproveitaram para rechaçar completamente a declaração do Departamento de Estado norteamericano que questiona a transparência do CNE.

    “Preocupa os Estados Unidos que uma série de ações por parte do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) questionem a imparcialidade do processo eleitoral”, afirmou Heather Nauert, porta-voz do Departamento de Estado.

    A resposta veio forte da presidenta do CNE, Tibsay Lucena: “essa agressão coincide com uma campanha de permanentes agressões ao poder popular, fundamentada em mentiras e manipulações”.

    Nas últimas eleições regionais em 2012, o PSUV conquistou 20 dos 23 governos estaduais, mas a derrota na composição da Assembleia Nacional abalou o chavismo e abriu caminho para a crise que vem sendo aos poucos, controlada pelo presidente Nicolás Maduro.

    A grande pergunta no ar, em razão da aparente calmaria, contrastante com o último período eleitoral, é sobre qual será a reação popular refletida nas urnas, em um país onde o povo está culturalmente habituado a participar de consultas, referendos e processos eleitorais e evidentemente, cansado de guerra.

  • A CONSTITUINTE VENEZUELANA É CONSTITUCIONAL?

    A CONSTITUINTE VENEZUELANA É CONSTITUCIONAL?

    Por Herminio Porto, dos Jornalistas Livres

    A Venezuela vive hoje a maior crise política desde a tentativa de deposição do presidente Hugo Chávez em 2002, por meio de um Golpe de Estado. Desde que os protestos contra o governo de Nicolás Maduro começaram, convocados pela oposição agregada na MUD (Mesa da Unidade Democrática), mais de uma centena de pessoas morreram, gerando alvoroço internacional. Greves, prisões de líderes opositores e crise de abastecimento ocupam espaço nos mais diversos veículos de imprensa. Como resposta à crise, o presidente da República Bolivariana da Venezuela convocou uma Assembleia Constituinte a fim de pacificar os ânimos políticos e redefinir os rumos do Estado. A reação foi imediata na Venezuela. Maduro tem sido acusado de golpista e ditador por vozes que ecoam por todo mundo, inclusive no Brasil.
    Este artigo pretende contribuir com o debate se debruçando na seguinte questão: a Assembleia Constituinte é constitucional? A pergunta, em que pese seu caráter técnico jurídico, é essencial para uma compreensão política do que é o governo Maduro: se a resposta for “não”, entenderemos que é uma ditadura despótica; se “sim”, é um governo constitucional submetido a leis. Este autor recorrerá às lições de Hans Kelsen (1881 – 1973), maior jurista do século XX, cuja importância no direito jamais foi superada. Para responder à pergunta formulada acima, consultei a “Constituição” da Venezuela e o livro “Teoria Pura do Direito”, de Kelsen (Ed. Martins Fontes, tradução de João Baptista Machado).
    Como pretendo fazer um juízo de valor baseado no Direito é preciso estabelecer o que é o direito, livre de interpretações ideológicas estranhas à ciência jurídica. Sem isto, não podemos saber o que é ou não legal nesta celeuma. Vejamos como o austríaco Hans Kelsen define o “direito”:
    “Na verdade, o Direito, que constitui o objeto deste conhecimento, é uma ordem normativa da conduta humana, ou seja, um sistema de normas que regulam o comportamento humano. Com o termo ‘norma’ se quer significar que algo deve ser ou acontecer, especialmente que um homem se deve conduzir de determinada maneira”. (Pág. 5).
    Ora, é direito um “Sistema de normas” e não uma série de exigências políticas feitas pela oposição venezuelana. Parece óbvio, e deveria de fato ser! Mas quando se trata da Venezuela, o que se vê é a reprodução de narrativas políticas e ideológicas (à direita e à esquerda) que forçam uma ideia de que o que é justo para uns deve ser compreendido como direito vigente. Se a ordem neoliberal é tida como a mais justa, isto nada tem a ver com o direito. O mesmo poderia ser dito sobre uma ordem socialista. Quando se trata de “justiça”, o debate se torna mais político, moral ou teológico, que efetivamente jurídico. Se a Constituinte é legal ou não, não se pode avaliar em termos de “justiça”. Se Nicolás Maduro gosta ou não de Leopoldo López, isto não importa para uma análise estritamente jurídica.
    Neste caso, vale dizer, que o que importa aqui são as normas venezuelanas, e não brasileiras ou americanas. Temos valores diferentes e isto não pode contaminar a nossa noção de direito a respeito do país vizinho. O que é legal aqui pode ser ilegal lá, e o que é legal lá pode ser ilegal aqui, sem que nenhum cidadão de um ou outro país possa dizer que o outro não tem uma “ordem” constitucional vigente.
    Por falar em “Ordem”, vale a pena se debruçar nesta palavra. Nosso país vizinho teria ainda uma ordem, em meio a tantas mortes e depredações? A resposta é afirmativa, por mais contraditório que possa parecer. O fato de existirem pessoas contrárias a uma ordem não significa que esta não exista. O “ser” (fato) nem sempre está associado ao “dever ser” (norma). Se Leopoldo López é ou não um criminoso que deve ser preso, isto tem a ver com uma determinada “ordem” posta que é ou não contrariada. Nada tem a ver com a opinião de Maduro ou Capriles. Alguém pode ser um criminoso a depender da vigência de leis no tempo e espaço. Recolher gravetos para se aquecer no frio não é crime no Brasil (espaço) do Século XXI (tempo), mas era na Alemanha do século XIX. Ordem não tem a ver com o quanto determinado grupo político acha que a “casa está arrumada”, usando uma metáfora doméstica. Para o jurista austríaco é o seguinte:
    “Uma ‘ordem’ é um sistema de normas cuja unidade é constituída do fato de todas elas terem o mesmo fundamento de validade”. (Pág. 33)
    O chavista Orlando José Figuera, queimado vivo por oposicionistas, em 4/6 
    Derrubar o governo Maduro não é este “fundamento de validade” de que fala o texto. Incendiar alguém ou arremessar bombas contra a Suprema Corte não pode ser considerado válido, por mais que os opositores assim entendam, em nome do imperativo da “democracia” e “liberdade”. Serei direto: o fundamento de validade das normas e das ações na Venezuela é a Constituição promulgada em 1999. Qualquer juízo que passe disto não é jurídico.
    Mas quanto ao governo de Nicolás Maduro, agiu de forma válida ao convocar uma Assembleia Constituinte que serve para criar outra Constituição que vai se colocar no lugar desta que é o “fundamento de validade” da ordem venezuelana? Seria possível propor uma nova ordem que suceda a presente sem feri-la? Sim, é possível. E não sou eu que digo, mas a própria Constituição venezuelana:
    Artigo 347. O povo da Venezuela é o depositário do poder constituinte originário. No exercício de tal poder, pode convocar uma Assembleia Nacional Constituinte com o objetivo de transformar o Estado, criar um novo ordenamento jurídico e redigir uma nova Constituição.
    Artigo 348. A iniciativa de convocar a Assembleia Nacional Constituinte poderá tê-la o Presidente ou Presidenta da República no Conselho de Ministros; a Assembleia Nacional, mediante acordo de dois terços de seus integrantes; os Conselhos Municipais em cabildos, mediante o voto de dois terços dos mesmos; e 15% dos eleitores inscritos e eleitoras no registro eleitoral.
    Artigo 349. O Presidente ou Presidenta da República não poderá contestar a nova Constituição.
    Os poderes constituídos não poderão de forma alguma impedir as decisões da Assembleia Constituinte. Para  efeitos da promulgação da nova Constituição, esta se publicará na Gazeta Oficial da República de Venezuela ou na Gazeta da Assembleia Constituinte.
    Artículo 350. O povo da Venezuela, fiel à sua tradição republicana, à sua luta pela independência, pela paz e pela liberdade, desconhecerá qualquer regime, legislação ou autoridade que contrarie os valores, princípios e garantias democráticas ou menospreze os direitos humanos.
    Em quatro artigos compreendemos que (art. 347) o povo é depositário do poder Constituinte Originário, que é a capacidade de criar nova Constituição, ( Art. 348) o presidente da República tem o poder de convocar uma Assembleia Constituinte, (Art. 349) sem que ele ou qualquer poder constituído (legislativo ou judiciário) possa se opor. O art. 350, por sua vez, determina a permanência de valores democráticos e direitos humanos na Constituição.
    Alguém poderia objetar que Maduro poderia ter escolhido outro caminho para a paz, como a renúncia, já que a constituição não o obriga a seguir o caminho que ele escolheu. Mas “uma norma pode não só comandar, mas também permitir e, especialmente, conferir a competência ou o poder de agir de certa maneira” (pág. 6).

    Juízos de Valor – Maduro é “bom”

    Kelsen, em sua teoria, estabelece dois tipos de juízo de valor: o objetivo e o subjetivo. Por questão de prudência é importante identificar em qual dos dois grupos se encaixa o nosso juízo, e dos outros, neste delicado debate.
    “Quando o juízo segundo o qual uma determinada conduta humana é boa traduz que ela é correspondente a uma norma objetivamente válida, e o juízo segundo o qual uma determinada conduta humana é má traduz que tal conduta contraria uma norma objetivamente válida, o valor “bom” e o desvalor “mau” valem em relação às pessoas cuja conduta assim é apreciada ou julgada, e até em relação a todas as pessoas cuja conduta é determinada como devida (dever ser) pela norma objetivamente válida, independentemente do fato de elas desejarem ou quererem esta conduta ou a conduta diversa”. (Pág. 22).
    Kelsen prossegue ainda:
    “A sua conduta tem um valor positivo ou negativo, não por ser desejada ou querida –ela mesma ou a conduta oposta -, mas porque é conforme uma norma ou a contradiz”.
    Em termos práticos: afirmar que Maduro cumpriu a Constituição ao convocar a Constituinte é um juízo de valor objetivo, pois seu ato é analisado tendo por base a norma constitucional que lemos acima. Dizer que Maduro é um ditador por ter convocado a Constituinte para se “perpetuar no poder” é um juízo de valor subjetivo, cuja importância para o direito se compara ao julgamento estético de seu bigode, ou seja, não tem o menor significado jurídico. Deste modo, o que fez é “bom” do ponto de vista jurídico. Você discordar disto seria um valor subjetivo, baseado em sua vivência, ideologia, religião ou moral.
    Não pretendemos dizer aqui que tudo vai bem na República Bolivariana. Não vai! Mas não é por causa da Constituinte. É prematuro acusar de ditador um cumpridor da Constituição, dado que faltaria um elemento fundamental para caracterizar Maduro deste modo: o despotismo, que é o desrespeito à lei. Se os países do Mercosul suspenderam a Venezuela, não é por romper com cláusula democrática ao convocar a Constituinte. O dispositivo legal está lá há anos: se este é “antidemocrático”, por que não repararam nisso antes?
    Quanto aos brasileiros que gritam golpe “lá” e pediram golpe “aqui”, nada podemos esperar de coerência moral, política ou jurídica.

     

  • COMITÊ BRASILEIRO PELA PAZ NA VENEZUELA LANÇA MANIFESTO

    COMITÊ BRASILEIRO PELA PAZ NA VENEZUELA LANÇA MANIFESTO

    O documento defende a “autodeterminação de nossos irmãos venezuelanos”, protagonistas do vitorioso processo de eleição dos deputados constituintes, levado a cabo no domingo (30/7), além de denunciar a postura do governo ilegítimo de Michel Temer em relação ao tema. O Brasil tem se alinhado automaticamente aos incessantes ataques imperialistas, conduzidos pela Casa Branca em aliança com a elite venezuelana e as grandes corporações midiáticas, que insuflam o ódio e o caos no país.

    O comitê é formado por 28 entidades, partidos políticos, organizações sociais e pela mídia alternativa: Seção brasileira dos movimentos sociais da ALBA, Brasil de Fato, Brasil Justo para todos e para Lula, Caros Amigos, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Conselho Mundial da Paz (CMP), Consulta Popular, Democracia no Ar, Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Fundação Perseu Abramo, Instituto Astrojildo Pereira, Intersindical – Central da Classe Trabalhadora, Jornalistas Livres, Levante Popular da Juventude, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Opera Mundi, Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido dos Trabalhadores (PT), Resistência, Sindicato dos Arquitetos, Sindicato dos Bancários de Santos, União Brasileira de Mulheres (UBM), União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), União da Juventude Socialista (UJS) e a União Nacional dos Estudantes (UNE).

    Para assinar o manifesto, envie e-mail para paznavenezuelabr@gmail.com.

    Confira a íntegra do manifesto a seguir:

    MANIFESTO PELA PAZ NA VENEZUELA

    O povo venezuelano, livre e soberano, retomou em suas mãos o poder originário, elegendo massivamente representantes para a Assembleia Nacional Constituinte.

    Mais de oito milhões compareceram às urnas, apesar do boicote e da sabotagem de grupos antidemocráticos, em um processo acompanhado por personalidades jurídicas e políticas internacionais que atestaram lisura e transparência.

    Todas as cidades, classes e setores estão presentes, com seus delegados, na máxima instituição da democracia venezuelana.

    A Constituinte é o caminho para a paz e a normalidade, para retomar o caminho do desenvolvimento e da prosperidade, para superar a crise institucional e construir um programa que reunifique a pátria vizinha.

    De forma pacífica e democrática, milhões de cidadãos e cidadãs disseram não aos bandos terroristas, às elites mesquinhas, aos golpistas e à ingerência de outros governos.

    Homens e mulheres de bem, no mundo todo, devem celebrar esse gesto histórico de autodeterminação da Venezuela, repudiando as ameaças intervencionistas e se somando a uma grande corrente de solidariedade.

    Também no Brasil se farão ouvir as vozes que rechaçam a violência e a sabotagem contra o governo legítimo do presidente Nicolás Maduro.

    Qual moral tem um usurpador como Michel Temer para falar em democracia, violando a própria Constituição de nosso país, ao adotar posições que ofendem a independência venezuelana?

    O Brasil não pode passar pela infâmia de se aliar a governos que conspiram contra uma nação livre e se associam a facções dedicadas a tomar o poder de assalto, apelando para o caos e a coação.

    Convocamos todos os brasileiros e brasileiras à defesa da democracia e da autodeterminação de nossos irmãos venezuelanos, ao seu direito de viver em paz e a definir o próprio destino.

    Repudiamos as manobras de bloqueio e agressão que estão sendo tramadas nas sombras da Organização dos Estados Americanos (OEA), sob a batuta da Casa Branca e com a cumplicidade do governo golpista de nosso país.

    Denunciamos o comportamento repulsivo dos meios de comunicação que manipulam informações e atropelam a verdade, para servir a um plano de desestabilização e isolamento.

    Declaramos nossa solidariedade ao bravo povo de Bolívar. Sua luta pela paz também é nossa.

    COMITÊ BRASILEIRO PELA PAZ NA VENEZUELA

  • VENEZUELA – Somos povo, constituinte e soberano.

    VENEZUELA – Somos povo, constituinte e soberano.

    Nesse texto, publicado pela Embaixada da Venezuela no Brasil, é possível compreender melhor o processo Constituinte que o país vem conduzindo e que será realizado efetivamente no dia 30 de julho próximo. Enquanto alguns países, especialmente do Mercosul, fazem o cerco para que o governo Maduro desista do processo, o povo venezuelano referenda o mesmo em encontros prévios realizados nos bairros e cidades, com a participação massiva de vários setores da sociedade. Aliás, são esses setores que estarão presentes na formação da Assembleia Constituinte, o que demonstra claramente o motivo pelo qual o processo vem sendo rechaçado pela oposição do país. Confira no texto abaixo como se dará o mecanismo constitucional:

    O que é a Assembleia Constituinte

    O processo eleitoral marcado para o dia 30 de julho, é o resultado da primeira ativação de um mecanismo constitucional definido em 1999. Suas condições e requisitos têm fundamento no texto constitucional, nos artigos 347, 348 e 349, no Diário de Debates (registro histórico dos debates da constituinte de 1999) e no funcionamento das instituições competentes do Estado venezuelano.

    É um processo eleitoral que responde a um contexto que se faz necessário como espaço para o encontro político. A controvérsia requer debate para construir regras de convivência e apagar a violência do radicalismo, o que faz do mecanismo constituinte tão urgente quanto o resguardo da paz.  Os elementos associados à sua convocatória — que têm sido amplamente discutidos na esfera pública venezuelana, especialmente a consulta prévia que faz parte do debate atual – também foram discutidos na época e o resultado é expresso no Diário de Debates que reflete o espírito do corpo constituinte naquele momento.

    Uma vez aprovada esta figura pela Assembleia Nacional Constituinte (ANC), no debate do dia 9 de novembro de 1999, o constituinte Manuel Quijada fez a proposta para adicionar um artigo que incluísse o referendo para fazer a convocatória. O artigo expressa o reconhecimento da vontade de um povo de convocar esta assembleia e a forma de convocá-la. É o poder futuro, poder permanente de construção para o futuro.

    Este chamado para uma nova constituinte é a primeira ativação desse mecanismo constitucional, em condições especialmente exigentes no campo político; suas bases e procedimentos devem atender ao respeito do modelo constitucional de 1999 e ser pertinente, ao mesmo tempo, quanto ao momento histórico que estamos vivendo. Este processo deve ser espaço oportuno para o diálogo e ferramenta para o aprofundamento e consolidação da democracia participativa onde o povo é protagonista, como projetado na Constituição da República Bolivariana da Venezuela. A proposta da Assembleia Nacional Constituinte, seguindo as mesmas diretrizes e desenho constitucional é nova e se faz em dois níveis, territorial e setorial. As origens setorial e territorial propostas para a integração têm sido construídas precisamente para equilibrar as categorias de protagonismo e participação.

    Distinguir entre os setores empresariais, pessoas com deficiência, aposentados, camponeses, pescadores, estudantes, trabalhadores e conselhos comunais, não faz mais do que valorizar sua importância na vida social e no nosso modelo republicano, reconhece sua contribuição específica e seu significado dentro da representação de República que continuamos a construir. Neste caso, com os setores se apela aos membros de cada um deles: o camponês ou camponesa, pescador ou pescadora que vai para a ANC a se representar e a representar seu setor.

    Pela primeira vez, ao nível territorial todos e cada um dos municípios do país estão representados. Em outras constituintes não foi desse jeito a representação. Porém se avança muito em 1999, quando os estados são representados por fatores políticos, diferentes atores e setores do pais.

    Além disso, ter o município como unidade de base para escolher a representação territorial diz muito do que vai realmente ser exposto na Assembleia Constituinte. Falamos sobre a unidade de vizinhança, das condições imediatas que servem ao cidadão, no bairro e na política cotidiana.

    Este equilíbrio setorial e territorial visa construir um debate constitucional desde a base para resolver temáticas e realidades políticas com visões transversais, alimentadas pelo setor específico. Ou seja, é um projeto constitucional que visa nos termos da Constituição de uma democracia participativa e protagonista, aprofundar os níveis de participação, cada vez mais perto dos cidadãos. É um debate que reconhece uma política para além dos partidos políticos, o que exige neste momento de dificuldade, poder e reconhecimento originário do povo soberano.

     

     

     

  • VENEZUELA: É A VELHA LUTA DE CLASSES QUE ESTÁ NAS RUAS!

    VENEZUELA: É A VELHA LUTA DE CLASSES QUE ESTÁ NAS RUAS!

     

    De Caracas, para os Jornalistas Livres

    Quem há de dizer que a Venezuela é uma Ditadura? Se alguém sentia falta de uma consulta popular, o país realizou duas no mesmo dia! Uma foi convocada pelo governo do presidente Nicolás Maduro, na forma de uma simulação da eleição para os deputados da Assembléia Nacional Constituinte, que deverá ocorrer de verdade no próximo dia 30 de julho. A outra foi convocada pela Mesa de Unidade Democrática (MUD), a frente de partidos de oposição ao chavismo.

    Foi um domingo alegre e iluminado em Caracas. Quente, como sempre. As ruas estavam cheias de famílias, já que 16 de julho é o Dia das Crianças venezuelano. Meninas e meninos com os rostos pintados como bichinhos, em roupas elegantes, viam-se por toda a cidade. As lojas estavam abertas. Nada havia que denunciasse a guerra civil ou os enfrentamentos dramáticos, cheios de sangue, ódio e ira, vistos todos os dias nas televisões e grandes jornais do Brasil. Mas a disputa renhida estava presente.

    1º CAPÍTULO
    A ATIVIDADE DO POVO POBRE

    Há semelhanças e dessemelhanças cruciais entre o golpe que ocorreu no Brasil há um ano e o que pretende se implantar agora na Venezuela. Em ambos os países, o poder econômico quer assumir o comando e impor uma cartilha neoliberal em que apenas os ricos rentistas podem se dar bem. A diferença está no povo pobre que, no país de Chávez, está organizado em comunas de bairros, em movimentos sociais e no PSUV (o Partido Socialista Unido de Venezuela).

    É impossível conversar com os defensores da República Bolivariana inaugurada por Chávez há 19 anos, sem que apareçam nas falas os “interesses nacionais”, a “Pátria Grande”, o petróleo (um orgulho, já que nacionalizado), os “direitos dos trabalhadores” e o “imperialismo predador” a ser combatido.

    Todos falam em luta de classes. Dizem que o núcleo político da oposição reside na defesa de interesses espúrios por parte da burguesia e de uma classe média que tem os olhos e o desejos postos em Miami. Bem informados, falam do golpe ocorrido no Brasil, da condenação de Lula pelo juiz Sergio Moro. Defendem Lula com emoção e gratidão.

    A Constituinte proposta por Nicolás Maduro, o sucessor de Chávez, tem tudo a ver com esse povo politizado e dotado de profunda consciência de classe. Pretende “aperfeiçoar o sistema econômico, social e político” e realizar uma extensa reforma política no país. Na prática, deverá radicalizar na via de transformação do Estado Venezuelano, reformando a Constituição de 1999, criada por iniciativa de Hugo Chávez.  O propósito é adequar o Estado, de modo a torná-lo mais e mais um espelho da maioria da população do país, que é pobre e mestiça.

    Jornalistas Livres percorreram a fila formada diante do Liceu Andrés Bello, no centro de Caracas. Trata-se de colégio icônico, um dos primeiros do país, e representa o sonho republicano de uma educação pública, gratuita e de qualidade para todos. Lá, diante de um gigantesco e lindo mural retratando a luta popular desde os tempos da colônia, uma fila animadíssima de cidadãos pobres e orgulhosos explicava porque participavam da simulação eleitoral convocada por Maduro.

    A simulação foi organizada pelo Conselho Nacional Eleitoral, o CNE, que tem na Venezuela autoridade equivalente à do nosso Tribunal Superior Eleitoral. Tudo computadorizado, como acontece no Brasil, mas no final o eleitor retira seu voto e o deposita numa urna física, de modo a ser possível fazer recontagens de votos, em caso de suspeita de fraude.

    Para Maduro, a Constituinte é a única possibilidade de levar paz ao país, porque criaria uma instância de poder para decidir os rumos do Estado venezuelano. Hoje, vive-se lá uma grave crise econômica, social e política decorrente da corrupção, da sabotagem econômica e do uso de táticas terroristas pelos que pretendem reimplantar um modelo neoliberal e privatista. As vitrines da loja de Departamentos Traki, no centro da cidade, por exemplo, exibem latas de conservas e embalagens de artigos de higiene e limpeza em arranjos caprichosos, como se jóias fossem. Nas farmácias faltam medicamentos e não se sabe quando eles estarão à disposição.
    Para o chavismo, a Constituinte é a forma de resolver esses problemas da vida cotidiana, além de resgatar para o espaço da discussão política setores hoje descontentes com a adoção de táticas violentas por parte da oposição. Pacificar o país, que já conta mais de 112 mortos em conflitos e atentados de matriz terrorista, é um dos objetivos. É nisso que acreditam os partidários do governo que foram às urnas neste domingo para treinar o voto. Dia 30 de julho, o voto será para valer.

    Para quem achava que o jogo estava em vias de terminar na Venezuela, a professora universitária Nilze Almendraz, 62 anos, vestida com camiseta negra em que se vê o rosto imenso de Simon Bolívar, garante: “Estamos apenas começando! E estamos dispostos dar nossas vidas para defender o sonho de nosso comandante máximo, Hugo Chávez. Porque é o nosso sonho também. ”

    Oposicionistas ateiam fogo nas cédulas e nas atas eleitorais, ao fim de seu “plebiscito informal”

    A ATIVIDADE DA OPOSIÇÃO

    Jornalistas Livres acompanharam a atividade oposicionista em dois pontos de Caracas: em Sabana Grande e na praça Carabobo, na região central. Concentrações da classe média branca, cem pessoas em cada uma delas, organizavam o seu “plebiscito” como se fosse a eleição do representante de classe na escola. Em vez de listas de votantes, folhas de papel sulfite A4, que cada “eleitor” preenchia mediante a apresentação de sua cédula de identidade –válida ou vencida, diga-se.

    A pessoa podia votar fora de seu domicilio eleitoral, como constatamos ao entrevistar a jovem estudante de letras da Universidade Central de Venezuela, Susan Ovalle, 26 anos. Moradora de Catia, periferia pobre de Caracas, perto do aeroporto de Maiquetía, ela votou em Sabana Grande. Como evitar que pessoas votem várias vezes?, perguntamos. “Confiamos na honestidade dos nossos”, respondeu ela. Sei.

    O plebiscito organizado pelos oposicionistas tinha três perguntas, todas em aparente defesa da Constituição de 1999, que esses mesmos setores combateram antes, quando Chávez a promulgou. Na prática, o objetivo era inviabilizar politicamente a convocação da nova Assembléia Nacional Constituinte, iniciativa de Nicolás Maduro, conforme garante a própria Constituição de 1999:

    1. Você rechaça e desconhece a realização de uma constituinte proposta por Nicolás Maduro sem a aprovação prévia do povo da Venezuela?
    2. Você pede à Força Armada Nacional e a todo funcionário público que obedeça e defenda a Constituição de 1999 e respalde as decisões da Assembléia Nacional?
    3. Você aprova que se proceda à renovação dos Poderes Públicos de acordo com o estabelecido na Constituição e à realização de eleições livres e transparentes, assim como a conformação de um governo de União Nacional para restituir a ordem constitucional?

     

     

    A idéia dos oposicionistas era recolher um número significativo de respostas “Sim” às três questões, de modo a deslegitimar a presidência de Nicolás Maduro e derrubar o que eles chamam de “Ditadura Chavista”. Nenhuma negociação, nenhum plano a não ser a explosão do atual governo.

    Interessante o conceito de “Ditadura”, já que é ampla a liberdade de manifestação e expressão dos opositores, inclusive na televisão e nos meios impressos, em que fizeram abertamente campanha para chamar à participação no “plebiscito informal” deste domingo. Também é curioso que chamem de “ditador” a um presidente que, como Maduro, foi eleito pela maioria do povo venezuelano em eleições das quais a oposição participou e às quais convalidou. Ressalte-se que Maduro está ainda a um ano de ter seu mandato encerrado.

    Incongruências à parte, o problema principal da oposição foi a total desorganização da consulta que realizou sem o apoio logístico do Conselho Nacional Eleitoral, o CNE, que tem na Venezuela autoridade equivalente à do nosso Tribunal Superior Eleitoral.

    Piorando o que já estava precário, em vez de urnas, os votos foram recolhidos em caixas de sabão e de enlatados. Não havia lacre.
    A deputada Tamara Adrian, deputada da Assembleia Nacional pelo partido Vontade Popular, de oposição a Maduro, explicou pela manhã que todos os votos recolhidos pelos oposicionistas seriam incinerados “por questões de segurança”. Foi o que de fato aconteceu, e logo deu para entender o porquê.

    Tratava-se de evitar que alguém tivesse a inconveniente idéia de contar os votos ou checar a lista de votação para evitar fraudes. E foi assim: nacionalmente, a oposição combinou que, tão logo se apurasse o resultado de cada urna, todo o registro da votação –as cédulas inclusive—seriam queimadas. Isso aconteceu já na noite de domingo. Sem condições de checagem, a oposição disse que obteve mais de 7 milhões de votos, dos quais 98,4% rejeitando a Assembleia Nacional Constituinte proposta pelo presidente Nicolás Maduro. Na realidade, mesmo com todas as fraudes que possam ter ocorrido e que jamais poderão ser investigadas, o número de votantes ficou bem aquém dos 11 milhões que eram a meta da oposição. Mas isso não impediu o presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Julio Borges, antichavista ferrenho, de proclamar ao final da votação neste “plebiscito” de fancaria: “O mandato de Nicolás Maduro está praticamente revogado”.

     

    Na praça Carabobo em que a oposição realizava sua “consulta”, cerca de 10 homens portando paus sentaram-se sobre a sinalização do Metrô de Caracas. Batiam fortemente no metal, avisando que não estavam para brincadeiras. Enquanto isso, mulheres agitavam bandeiras para os veículos que passavam na rua. Carrões SUV e caminhonetes saudavam o protesto oposicionista, enquanto a turma que passava de ônibus nem se dignava a olhar para o que ocorria no espaço dominado pela direita.

    Definitivamente, na Venezuela, a cisão é de classes. E todos têm consciência disso.