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  • O GRITO DESESPERADO DA LAVA-JATO

    O GRITO DESESPERADO DA LAVA-JATO

    ARTIGO

    Alexandre Santos de Moraes, professor do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense

    Não aconteceu nada de excepcional. Nenhum escândalo, nenhuma notícia. Aliás, o encarceramento de Lula estava sendo pouco comentado nos últimos dias por conta de outras tantas polêmicas fabricadas ou produzidas pelo governo. Na quarta-feira, 7, porém, o Brasil foi tomado de surpresa pela decisão da juíza Carolina Lebbos, da 14ª Vara de Curitiba, que decidiu pela transferência do ex-presidente para São Paulo. A magistrada teria respondido a um pedido da Superintendência da Polícia Federal do Paraná, que julgou adequado reduzir os gastos e os recursos humanos que a custódia de Lula exigem, além de reestabelecer a tranquilidade na região. Não custa lembrar – e voltarei a isso – que a Polícia Federal é chefiada pelo ministro Sérgio Moro, o mesmo que decidiu pelo encarceramento de Lula no mais escandaloso processo político do Brasil contemporâneo.

    Carolina Lebbos ganhou visibilidade não apenas por substituir Sérgio Moro, mas por impôr uma série de restrições exageradas, devidamente disfarçadas de tecnicalidades, em relação ao ex-presidente. Em abril de 2018, negou a visita da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, alegando que não havia motivos para inspecionar as condições do cárcere. Negou também visitas de Dilma Rousseff, Gleisi Hoffman, Ciro Gomes, Eduardo Suplicy e vários outros, restringindo o acesso ao presidente apenas a familiares e advogados. O mesmo dispositivo foi usado para negar a visita a Adolfo Pérez Esquivel, vencedor do Prêmio Nobel da Paz. Lebbos também negou a Lula, em diversas ocasiões, a possibilidade de ser entrevistado pela imprensa, além de ter vetado a ida do ex-presidente ao velório do irmão.

    A decisão da última quarta-feira, portanto, não é um fato isolado, mas marca de um endurecimento que afaga a sanha punitivista e a cultura de ódio dos setores conservadores, mantendo o público-alvo da Lava-Jato fiel ao seus ídolos de barro.

    Mais do que isso, a decisão de Lebbos foi um aceno, um recado, ou talvez o grito desesperado de um náufrago que luta pela sobrevivência. Vale lembrar que a força-tarefa começou em 2014, no rescaldo das manifestações alucinadas e desconexas do ano anterior, que atiçaram o discurso moralista contra corrupção e foram significadas como o desejo por mudanças no país. A grande mídia acolheu Sérgio Moro e os procuradores como heróis, pois supostamente enfrentavam o poder constituído com a força das leis.

    Muitos perceberam desde cedo que o projeto logrou sucesso pelo acordo íntimo com a imprensa hegemônica e que tinha nítidos contornos políticos, fato confirmado não apenas com a indicação de seu principal líder para ministro da Justiça, mas pela função de cabo eleitoral desempenhado pelo mesmo durante a campanha, especialmente com a divulgação da delação de Antônio Palocci, após ter sido convidado e aceitado participar do governo, caso Jair Bolsonaro fosse eleito.

    Confirmou-se a tragédia e a Lava-Jato deixou de ser uma operação jurídico-midiático-policial, mas uma facção – no sentido maquiaveliano do termo – que começava a ampliar suas redes de ação. Tinham uma agenda própria. O fato se tornou ainda mais escandaloso com a proposta de criação da “Fundação da Lava Jato”, que teria aporte financeiro de R$ 1,2 bi pagos pela Petrobras, além da promessa de emplacar um ministro no Supremo Tribunal Federal, ainda durante a gestão de Bolsonaro. O projeto de poder estava cuspido e escarrado, mas a vida se tornou um pouquinho mais difícil a partir de 2019.

    É fácil entender as razões. O compromisso com o caos foi o que garantiu o sucesso da força-tarefa. O Partido dos Trabalhadores era seu principal adversário, tanto que a influência decisiva no impeachment de Dilma Rousseff e a prisão de Luiz Inácio foram seus feitos mais celebrados. Era, portanto, uma facção que atuava a partir do antagonismo ao governo federal e que dele dependia para assegurar sua popularidade.

    A decisão de abrir novas trincheiras a partir do super-ministério criado por Jair Bolsonaro inverteu a lógica que sempre presidiu sua existência: Sérgio Moro, o déspota desse pequeno império judicialista, deixou de antagonizar em relação ao governo e passou a assumir o ônus de representar o establishment. Seu silêncio vergonhoso diante do caso Queiroz, as tentativas de abafar os escândalos de Flávio Bolsonaro, sua mansidão com a confissão de Caixa 2 de Ônix Lorenzoni e todos os demais esforços para abafar escândalos que atrapalhassem o patrão, tornaram a Lava Jato muito mais frágil do que os membros gostariam.

    Não bastasse o enfraquecimento provocado por essa mudança de posição política, os documentos recebidos pelo The Intercept e partilhados com diversos órgãos de imprensa escancararam as práticas corruptas de seus operadores. A assessoria de imprensa do ministro da Justiça tentou reagir, criando a narrativa burlesca de que o ataque à Lava Jato era uma tática para destruir o combate à corrupção, mas esse discurso barato só cativou os convertidos.

    O problema das facções é que elas podem ser toleradas quando úteis, mas se tornam intoleráveis quando passam a ameaçar. Durante esses anos, o Supremo Tribunal Federal foi lacônico diante de seus exageros. Até mesmo os políticos foram seduzidos pelo canto da sereia, inclusive parte oportunista da esquerda, que flertou com os procuradores na vã ilusão de que o alvo era apenas o PT. No entanto, o jogo virou e a burra unanimidade deixou de existir.

    Os custos da Lava Jato foram altíssimos para a economia, para a política, para os políticos e, sobretudo, para o povo brasileiro, que hoje convive com um governo que declaradamente veio para destruir e que nada tem a oferecer. Os apelos pela renúncia de Moro se avolumam ao longo do tempo e o impeachment de Bolsonaro já entrou no radar dos parlamentares. Os juízes e procuradores da facção reinavam sobre um castelo de areia no meio do oceano, e com a mudança da maré se vêem desesperadamente náufragos.

    A ação de Carolina Lebbos foi, definitivamente, o grito de um afogado. Ela sabia de antemão que Lula não iria para um presídio comum, mas resolveu manter a fórmula celebrada pela força-tarefa e investiu no caos. Logo os robôs do Twitter começaram a agir e subiram hashtgs para estimular o conflito. É o mesmo método prosaico (mas eficaz) que elegeu o patrão de Sérgio Moro. A surpresa talvez tenha sido a intensa mobilização de deputados e senadores de diversos partidos, que identificaram a brutalidade da decisão e foram até o Supremo Tribunal, que decidiu abandonar a passividade de outrora e derrubou a decisão da juíza de primeira instância com uma votação mais do que expressiva.

    No mesmo dia, Gilmar Mendes deu cautelar que impede investigação contra Glenn Greenwald, assegurando a permanência da produção noticiosa que vem enfraquecendo o status ilibado dos protagonistas da força-tarefa semana após semana.

    Como não podem mais antagonizar com o governo federal, o STF se tornou o alvo privilegiado para manter a lógica de antagonismo, mas o inimigo agora é outro: tal como os procuradores e juízes de Curitiba, os ministros do Supremo não foram alçados ao cargo pelo voto popular, de modo que não estão submetidos à instabilidade própria do regime democrático que eles ajudaram a destruir. Sem uma reviravolta autoritária, a Lava Jato vai se tornar comida de peixe, e não deixa de ser curioso que os principais algozes desse imenso projeto político foram seus próprios protagonistas.

  • URGENTE – Lula transferido para São Paulo

    URGENTE – Lula transferido para São Paulo

    No despacho a juíza afirma que “o preso deve cumprir pena em seu meio social, ou seja, em sua cidade ou Estado”. Ela também justifica a transferência ao mencionar o acampamento Marisa Letícia, montado ao lado da Polícia Federal de Curitiba, que foi criado logo após a prisão do ex-presidente. O acampamento estaria a “demandar atuação permanente dos órgãos de segurança”.

    A transferência de Lula foi um pedido do superintendente da Polícia Federal, Luciano Flores, que argumenta que a prisão do petista altera a rotina do prédio da PF. A Defesa também se manifestou favorável ao longo processo e sustentou a ilegitimidade do Município de Curitiba para requerer a transferência de estabelecimento de custódia.

    De acordo com a juíza Carolina Lebbos, “constata-se a plena pertinência de transferência do executado ao Estado de São Paulo, onde em princípio poderá o executado ser custodiado com a segurança necessária ao caso, em condições adequadas e em atendimento ao interesse público”.

    Sobre a transferência, o advogado de Lula Cristiano Zanin diz que “é fundamental que o Supremo Tribunal Federal dê continuidade ao julgamento do habeas corpus para reverter essa prisão injusta e o constrangimento ilegal que está sendo imposto ao ex-presidente Lula”.

    O local onde o ex-presidente ficará ainda não foi definido e será definido pela vara da ca

    pital paulista. Consta na decisão que “Tratando-se de matéria que foge à competência deste Juízo, por não possuir ingerência sobre os estabelecimentos localizados naquele Estado da Federação, solicite-se ao Juízo de execução penal competente do local de destino a indicação do estabelecimento onde o apenado deverá permanecer recolhido”.

    Confira o despacho:1_5068871624795619447

    Nota da defesa do ex-presidente Lula

    Em manifestação protocolada em 08/07/2019 nos autos do Incidente de Transferência nº 5016515-95.2018.4.04.7000, em trâmite perante a 12ª. Vara Federal de Curitiba, pedimos a suspensão da análise do pedido da Superintendência da Polícia Federal até o julgamento final do habeas corpus nº 164.493/PR, em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal.

    Conforme definido no último dia 25/06, a 2ª. Turma do Supremo Tribunal Federal deverá retomar em breve o julgamento do mérito do habeas corpus que apresentamos com o objetivo de reconhecer a suspeição do ex-juiz Sergio Moro e a consequente nulidade de todo o processo e o restabelecimento da liberdade plena de Lula.

    Em caráter subsidiário, requeremos naquela mesma petição de 08/07/2019 que na hipótese de ser acolhido o pedido formulado pela Superintendência da Policia Federal de Curitiba, fossem requisitadas informações de estabelecimentos compatíveis com Sala de Estado Maior, com a oportunidade de prévia manifestação da Defesa.

    No entanto, a decisão proferida hoje (07/08) pela 12.a Vara Federal de Curitiba negou os pedidos formulados pela Defesa e, contrariando precedentes já observados em relação a outro ex-presidente da República (ex.: TRF2, Agravo Interno no Habeas Corpus nº 0001249-27.2019.04.02.0000) negou ao ex-presidente Lula o direito a Sala de Estado Maior e determinou sua transferência para estabelecimento a ser definido em São Paulo.

    Lula é vítima de intenso constrangimento ilegal imposto por parte do Sistema de Justiça. A Defesa tomará todas as medidas necessárias com o objetivo de restabelecer a liberdade plena do ex-Presidente Lula e para assegurar os direitos que lhe são assegurados pela lei e pela Constituição Federal.

    Cristiano Zanin Martins

     

  • Até quando vai o lawfare com Lula?

    Até quando vai o lawfare com Lula?

    No mesmo dia em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é capa no jornal francês L’Humanité como um possível candidato ao Nobel da Paz, na terça-feira 29, ele é terminantemente proibido pela Justiça Federal de ir ao velório de seu irmão mais velho Genival Inácio da Silva, 79 anos, carinhosamente chamado de Vavá, que morreu devido a um câncer. No dia seguinte, quarta 30, quando o ministro do STF Dias Toffoli liberou a ida de Lula à São Bernardo, já era tarde demais: Vavá já estava sendo sepultado e enterrado. 

    Nem quando Lula foi preso por 24 dias durante a Ditadura Militar, em 1980, por liderar uma greve no ABC Paulista, ele deixou de ter este mesmo direito garantido, e foi liberado a comparecer ao velório de sua mãe, Eurídice Ferreira, conhecida também carinhosamente como “Dona Lindu”, pelo diretor-geral do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), Romeu Tuma. 

    Vítima de perseguição política desde suas primeiras atuações como metalúrgico sindicalista, o lawfare com Lula se intensifica após o período de seu mandato presidencial, culminando em sua prisão e, mais uma vez, em um direito gravemente cerceado que acomete não só ao ex-presidente, mas ao Estado de Direito, aos Direitos Humanos e à Democracia brasileira. Sobre isso, o advogado de defesa de Lula, Cristiano Zanin, concedeu entrevista exclusiva aos Jornalistas Livres, nesta matéria.

    Pela Lei de Execução Penal 7210/84, Lula deveria ter seu direito assegurado desde o primeiro pedido de sua assessoria de defesa jurídica para o superintendente da Polícia Federal do Paraná em Curitiba, conforme parágrafo único, imediatamente após a morte de Vavá. O artigo 120 da Lei, que consta na petição, é claro:

    “Os condenados que cumprem pena em regime fechado ou semi-aberto e os presos provisórios poderão obter permissão para sair do estabelecimento, mediante escolta, quando ocorrer um dos seguintes fatos:

    – falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão;

    Parágrafo único. A permissão de saída será concedida pelo diretor do estabelecimento onde se encontra o preso.”

    Ainda de acordo com a petição dos advogados de Lula, “a Lei de Execução Penal é ancorada na proteção constitucional dada à família (CF/88, art. 2262) e em aspectos humanitários, tornando imperioso, e com o devido respeito, o acolhimento do pedido ora formulado”.

    Ou seja, não haveria a necessidade de uma ação judicial para além da PF, submetida ao Ministério da Justiça, na qual Sérgio Moro, o mesmo ex-juiz que prendeu o ex-presidente e que dizia publicamente que nunca seria político, é o ministro. Para a presidenta do PT e deputada federal Gleisi Hoffman, Moro deve explicações à sociedade brasileira sobre a declaração de incompetência da PF para levar Lula ao velório e enterro de seu irmão Vavá. E complementa: “Eu fico pensando qual é a estrutura da Polícia Federal para combater o crime organizado nesse país, se a mesma polícia não tem condições de prover a segurança pra que uma pessoa vá ao velório e enterro de seu irmão”.

    Visto que o tempo era curto e a Polícia Federal não se manifestava, a defesa de Lula entrou imediatamente com pedido de liberação também na 12ª Vara Criminal em Curitiba, mas a juíza Carolina Lebbos expediu intimação para o Ministério Público Federal se manifestar, antes da apreciação judicial. O MPF, por sua vez, pediu para a PF se manifestar com prazo de um dia. A defesa peticionou nos autos chamando a atenção para a ausência de necessidade de manifestação do MPF, no caso, e para o quanto a demora significa perigo de perecimento do direito.

    Na madrugada de quarta, Carolina Lebbos negou o requerimento de Lula. No despacho, ela afirma que a decisão final cabe à Polícia Federal, que alegou dificuldades logísticas para fazer a viagem. Além de “indisponibilidade de transporte aéreo em tempo hábil”, pois os helicópteros estariam todos em Brumadinho (MG), atuando na tragédia anunciada da Vale, o delegado Luciano Flores de Lima alegou “ausência de policiais disponíveis para assegurar a ordem pública” e “perturbações à tranquilidade da cerimônia fúnebre pelo aparato necessário para levar Lula”.

    A defesa recorreu, mas, com o mesmo argumento, o desembargador de plantão do TRF-4, Leandro Paulsen, manteve a proibição, pois considerou haver possibilidade de confronto entre apoiadores e opositores do ex-presidente. O pedido chegou até o Supremo Tribunal Federal, nas mãos de Tóffoli, que liberou a ida de Lula a São Bernardo para encontrar exclusivamente com os seus familiares, em uma Unidade Militar, somente quando Vavá já estava sendo sepultado e enterrado, o que parece um tanto sádico.

    E, assim como em tantas outras situações que o ex-presidente vem sendo extorquido de seus direitos, como por exemplo estar preso sem trânsito em julgado por causa da ação do “Tríplex no Guarujá”, ter tido sua candidatura à presidência, legal, impugnada pelo TSE mesmo após intervenção da ONU, conceder entrevistas à imprensa, ter visitas religiosas e de Fernando Haddad na condição de advogado, Lula não pôde se despedir de seu ente querido na qual mantinha laços afetivos paternais por ser seu irmão mais velho e muito presente em sua vida.

    “O Lula hoje é mais que um preso político. Lula hoje é um refém de uma lógica perversa que impõe ao tratamento que é dado a ele uma forma de sinalização pra tentar intimidar todos e todas deste país que tem coragem de insurgir. Se Lula quisesse ter fugido, ele teria fugido antes de se entregar, em abril do ano passado. Mas Lula não fugiu e nunca teve essa intenção porque acredita que poderá provar sua inocência”, disse o líder do PT na Câmara dos Deputados, Paulo Pimenta, em ato de protesto pela proibição da ida do ex-presidente ao velório do irmão.

    EXCLUSIVA com ZANIN

    Sobre as decisões que claramente ferem princípio de dignidade humana do ex-presidente e o lawfare que ele vem sofrendo, o advogado de Lula, Cristiano Zanin, concede ENTREVISTA EXCLUSIVA para o Jornalistas Livres.

    1. Qual a gravidade desse cerceamento do direito do ex-presidente Lula de ir ao velório do irmão? 

    Cristiano Zanin: Impedir Lula de participar do funeral do irmão é uma conduta muito grave por parte do Estado porque negou ao ex-presidente um direito expressamente previsto na lei e que está lastreado em razões humanitárias. Lula está sendo tratado como uma pessoa sem qualquer direito. Para um conjunto de autoridades no país, ele pode ser processado sem justa causa; pode ser condenado sem ter praticado um crime; pode ser encarcerado mesmo não havendo decisão definitiva transitada em julgado, como prevê a Constituição Federal; pode ser impedido de ter qualquer contato com o mundo exterior. Estão deturpando as leis e os procedimentos jurídicos para promover uma verdadeira cruzada contra o ex-Presidente Lula, para persegui-lo enquanto inimigo político. Isso configura um fenômeno denominado “lawfare” que eu e a Valeska Martins (também advogada de defesa de Lula) apresentamos aqui no Brasil em 2016 para designar o que estava ocorrendo com Lula já naquele momento.

    2. Por qual motivo vocês acham que a PF negou duas vezes?
    CZ: Respeito os policiais federais, mas não é possível concordar com esse posicionamento. Primeiro, porque quando o Estado decidiu realizar atos de persecução penal contra Lula foi possível constatar que tinham todo o aparado necessário, como ocorreu na condução coercitiva realizada em março de 2016. Segundo, porque não foi apontada qualquer situação concreta que pudesse efetivamente mostrar que a ida de Lula ao enterro do irmão poderia causar riscos à sua segurança ou à segurança das outras pessoas presentes. Terceiro e mais importante, porque o Estado não pode alegar suas eventuais deficiências para retirar direito dos cidadãos. É sempre importante lembrar, ainda, que apresentamos às autoridades, em última análise, se necessário, a possibilidade de terceiros relacionados ao ex-presidente suportarem os custos relativos ao frete ou do combustível da aeronave necessária para transportá-lo até São Bernardo do Campo. Isso foi recusado. Diante desse cenário, não temos dúvida de que o veto imposto à ida de Lula ao enterro do irmão é uma prática de lawfare.

    3. No primeiro pedido conforme a lei de execução penal não precisaria ter sido encaminhado para a Carolina Lebbos, e nem ela ao MPF, correto?
    CZ: A Lei de Execução Penal diz no seu artigo 120, parágrafo único, que cabe ao diretor do estabelecimento onde a pessoa está presa autorizar a sua saída para ir ao enterro do familiar. Fizemos esse pedido perante a Superintendência da Polícia Federal do Paraná por volta das 15 horas dia 29, assim que tomamos conhecimento do falecimento do irmão do ex-Presidente Lula. Como havia urgência na medida e não foi tomada nenhuma decisão administrativa de imediato, levamos o caso também à Vara de Execuções Penais, na expectativa de que o pedido fosse prontamente acolhido diante da clareza do direito alegado. Mas o que ocorreu foi que a partir daí o pedido ficou “girando em falso”: foi aberta vista do processo ao MPF, que, por seu turno, disse que somente iria se manifestar depois de ouvir a Polícia. Apenas por volta de uma hora da manhã, quando o velório do irmão do ex-Presidente já estava bastante avançado, é que tivemos uma decisão da primeira instância e foi negativa. Durante a madrugada fomos ao plantão do TRF4 e às 5 horas tivemos outra decisão, também negativa. Também fizemos requerimentos ao STJ e ao STF ao longo da madrugada. Do falecimento de Vavá até a decisão do Ministro Dias Toffoli, por volta das 13 horas do dia 30, protocolamos 19 petições nas mais diversas instâncias administrativas e judiciais para que Lula pudesse exercer um direito expressamente previsto em lei. Além de mostrar um trabalho hercúleo, esse número também mostra que algo que deveria ser simples, quando é para Lula, ganha uma complexidade singular.

    4. Existe alguma medida internacional de Direitos Humanos a qual possa ser apelada com relação às decisões e ao lawfare? Alguma denúncia a algum órgão que possa intervir internacionalmente juridicamente?

    CZ: Em 2016, eu, Valeska Martins e o Geoffrey Robertson, uma referência mundial na advocacia de direitos humanos, levamos ao Comitê de Direitos Humanos da ONU um comunicado mostrando àquele órgão internacional que Lula está sendo vítima de grosseiras violações às suas garantias fundamentais. Foi o primeiro comunicado feito àquele órgão internacional por um cidadão brasileiro. Desde então fizemos diversas atualizações naquele comunicado. Fomos instados pelo Comitê a apresentar uma nova manifestação no início de fevereiro e nessa oportunidade levaremos ao conhecimento do Comitê esses últimos fatos, pois eles reforçam todas as violações que são tratadas no comunicado. A partir dessa nova manifestação que iremos apresentar, em tese, o Comitê poderá julgar o mérito do comunicado a qualquer momento. E se o julgamento for favorável a Lula, como acreditamos, poderá ajudar o Brasil a restabelecer os direitos do ex-presidente e até mesmo a fazer mudanças legislativas necessárias para se adequar aos padrões internacionais de direitos humanos.

    Valeska Martins e Cristiano Zanin Martins, na sede da ONU em Genebra, na Suiça. Foto: Filipe Araújo
  • Get this speech ban away from me!

    Get this speech ban away from me!

    Do you want to prevent the Brazilian people from choosing who to vote for?

    I have been in jail for over 100 days. Out there, unemployment increases, more parents have no means to support their families, and an absurd fuel pricing policy led to a truck strike that has depleted Brazilian cities. As a consequence, the number of people injured when cooking with alcohol has increased because low income families can’t afford cooking gas. Poverty is growing, and the country’s economic prospects are getting worse every day.

    Brazilian children are separated from their families in the United States, while our government humiliates itself in front of the American vice president. Embraer, a high-tech company built over decades, is being sold for such a low price capable of amazing the market.

    An illegitimate government has been in a hurry in the last months to liquidate as much patrimony and national sovereignty it can – reserves of the pre-salt, gas pipelines, energy suppliers, petrochemicals – besides opening the Amazon for foreign troops. As hunger comes back, the vaccination of children falls, part of the judiciary fights to keep its housing assistance privileges and, who knows, to gain a salary raise.

    Last week, Judge Carolina Lebbos ruled that I can not give interviews or record videos as the Worker’s Party (the largest political party in Brazil) pre-candidate for the upcoming presidential elections. It appears that incarcerating me was not enough; they want to silence me.

    You who do not want me to speak, what do you fear I will say? What is happening to the people today? Don’t you want me to discuss solutions for our country? After years of slandering me, do you want me not to have the right to speak up for myself?

    Is that the reason why you, the powerful without votes and without ideas, overthrew an elected president, humiliated the country internationally and imprisoned me without proof, based on a sentence of  “indeterminate acts” after four years of investigation against me and my family? Did you do all this because you are afraid that I’ll speak up?

    I remember when the president of the Federal Supreme Court said “shut up is already dead” [a Brazilian popular saying meaning “I am not going to shut up just because your are telling me to”]. I remember Globo media conglomerate not worrying about such an obstacle to freedom of the press – on the contrary, they celebrate it.

    Jurists, former heads of state from many countries and even political opponents recognize the absurdity of the process that condemned me. I may be physically in a prison cell, but it is those who have condemned me that are bound to the lie they have set. Powerful interests want to turn this ludicrous situation into a political fait accompli, preventing me from running for president, which conflicts with recommendations of the United Nations Human Rights Committee.

    I have lost three presidential races – in 1989, 1994 and 1998 – and I have always respected the results by getting ready for the next elections.

    I am a candidate because I did not commit any crime. I challenge those who accused me to show evidence of what I did to be in a cell. Why their allegations have “undetermined acts” instead of pointing out what I did wrong? Why do they say “assigned property” instead of presenting a proof of ownership of the Guarujá apartment, which belonged to a company that had given it as a form of guarantee to a bank? Will they disrupt the trajectory of democracy in Brazil with such absurdities?

    I say this with the same seriousness with which I told Michel Temer that he should not embark on an adventure to overthrow President Dilma Rousseff, that he would regret it. Those who do not want me to be president should be the most eager that I run for office.

    Do they want to defeat me? Do this cleanly at the polls. Discuss proposals for the country and take responsibility, even more at this time, when the Brazilian elites come up with authoritarian proposals endorsed by people who openly defend the murder of human beings.

    Everyone knows that, as president, I exercised the dialogue. I did not seek a third term when I had a rejection rate as small as Temer’s current approval rate. I worked to guarantee that social inclusion was the engine of the economy and that all Brazilians, not only on paper, really had their rights to eat, to study and to have housing guaranteed.

    Do they want people to forget that Brazil has had better days? Do they want to prevent the Brazilians – from whom all power emanates, according to the Constitution – from choosing whom they want to vote in the October 7th elections?

    What are they afraid of? The return of the dialogue, the development, the time in which there was less social conflict in this country? When the inclusion of the poor made Brazilian companies grow?

    Brazil must restore its democracy and free itself from the hatred that was created to take PT out of government, to implement an agenda of withdrawal of the rights of workers and retirees, and bring back the unbridled exploitation of the poorest. Brazil needs to find itself again and be happy again.

    You can imprison me. You can try to shut me up. But I will not change my faith in the Brazilian people, in the hope of millions and in a better future. I am also sure that this faith in ourselves against the inferiority complex is the solution to the crisis we are experiencing.

    Luiz Inácio Lula da Silva

    Former President of the Republic (2003-2010)

    *Translated from Portuguese by César Locatelli, revised by Amanda Lisboa.