2016 começa sob as rédeas das manifestações contra o aumento da tarifa dos transportes públicos chamadas pelo MPL. Quem acha que é tudo mais do mesmo, talvez seja porque vocês não tem a possibilidade ou vontade de acompanhar tudo bem de pertinho. Nós, Jornalistas Livres, estamos ao lado, à frente, atrás, por cima e por baixo, para narrar a história do jeito que ela acontece. E percebemos muitas coisas que não são perceptíveis a quem vê a notícia apenas pelo controle remoto de sua tv.
Uma das coisas que mais nos chamaram a atenção, foi o cordão de bikers que vêm protegendo o final das passeatas não só na manifestação de ontem, como nas duas anteriores. Mais ou menos de 10 a 15 bikers se colocam atrás da última fileira que fecha a passeata, entre os manifestantes e a tropa de choque.
Fotos: Jornalistas Livres
Permitem que as pessoas não fiquem acuadas com a pressão das batidas nos escudos e nos impropérios ditos aos pés de seus ouvidos, pelos policiais da Choque. Com muita calma, não dão ouvidos às provocações e conseguem dar espaço para eventuais recuos e tranquilidade para os manifestantes se sentirem um pouco mais seguros.
Por acaso ou não, é uma ajuda de quem está conseguindo se desvencilhar dos preços das tarifas do transporte público, ao mesmo tempo que isso lhes foi permitido graças ao projeto de ciclovias promovido pela Prefeitura, que junto ao Governo do Estado, são responsáveis pelo aumento das tarifas. Dicotomia é pouco.
“Há exatamente um mês adotei a bicicleta como meio de transporte para ir e voltar do trabalho (32km no total), três vezes por semana. E, coincidentemente, ou não, hoje consegui subir as três ruas mais íngremes da rota sem parar \o/ São elas: Rua Bela Cintra, Rua Dionísio Costa e rua dos Patriotas.
A quem possa interessar, abaixo está o saldo e aprendizados desse meu primeiro mês:
• É possível, inclusive para leigos como eu era 🙂
• Mais de 300km percorridos;
• Eu me considerava uma pessoa atenta, até andar de bike e descobrir que preciso dobrar meu nível de atenção;
• Precaução nunca é demais em cima de duas rodas;
• Insegurança e bike não combinam de jeito nenhum. Na dúvida, empurre a magrela.
• Acidentes: 1/2 (não dá para considerar pq fui pata e caí sozinha na valeta);
• Motorista sem noção e sem educação, independente do veículo, existe em todo lugar: ciclista, motociclista, motorista de carro, de caminhão, de ônibus… O ser humano não é perfeito e, infelizmente, temos que conviver com isso e com o triste fato de que, em muitos casos, os corretos tbm pagam pelos incorretos. As vezes, por experiências traumáticas com um ou outro ciclista, passa-se a detestar a “classe de ciclistas”, sendo que muitos, se não a maioria, é correta e não age com intransigência no trânsito;
• Taxistas gostam menos de ciclistas do que os motoristas de ônibus;
• Ainda temos um longo caminho pela frente para que motoristas e pedestres aceitem as bikes, mas acredito mais do que nunca nessa possibilidade;
• Ir de bike para o trabalho é uma mistura de liberdade, prazer, dificuldade, atenção, orgulho, economia, cidadania, capacidade e saúde;
• Segurança e bike ainda não caminham 100% juntas, mas acho que um dia caminharão;
• Há, sim, ciclofaixas mal planejadas em lugares bizarros. E ainda sinto a falta delas em outras ruas e avenidas;
• Fazer um trajeto de 1h30, sendo que 1h10 é feito em ciclofaixas e ciclovias, é muito bom
• 3kg a menos (estou acima do peso, então era esperado tongue emoticon
• Espero continuar vivendo essa experiência por muitos anos e, se possível, para sempre…
Sexta-feira, 27 de março de 2015. Lá vai a procissão, se arrastando que nem cobra pelo chão da avenida Paulista, espinha dorsal da maior cidade da América do Sul. Não se trata de reza, ladainha ou ofertório de xingos para Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva. Sob contrariedade da mídia multinacional tradicional capitaneada pelas Organizações Globo, milhares e milhares de professores estaduais marcham em greve contra a política (?) educacional (?) do governador Geraldo Alckmim.
A multidão de professoras e professores abandona a Paulista em caminhada em direção ao centro de São Paulo, mas a avenida-cartão-postal não se esvazia. Pelo contrário. São 18h30, início de ~happy hour~ na árida praça do Ciclista, miolo semi-arborizado entre Paulista, viaduto e Consolação, onde ciclistas começam a se concentrar às dezenas, centenas, milhares.
Foto: Márcia Zoet
A mídia tradicional continua contrariada. Não é nem questão de gravar as passeatas do alto do helicóptero-robocop-globocop: nem entre professores nem entre ciclistas, as palavras de ordem aqui concentradas em nada servem aos propósitos da #GloboInimigaDoBrasil e suas focas amestradas. Muito pelo contrário.
(Você já ouviu falar nos #JornalistasLivres? Não? Então #ProcureSaber da gasolina, da margarina, na Carolina, menina…)
Na passeata de professores até há oportunidades de xingo, mas de xingos que se dirigem muito mais a um governo do PSDB que a governos do PT. A mídia tradicional braZileira tenta se concentrar em faixas de “fora Dilma” trazidas pelo esquerdireitista PSTU, se é que vai colar junto à cada vez mais decadente audiência global. Será que colou? E ciclistas contentes pedalando pela liberdade de pedalar, a quais Globos interessarão?
No passeio cicloativista, os xingos são menores e em menor número. “Ministério público — interesses privados”, protesta, sem insultar ninguém, uma grande faixa pendurada na cabeceira do viaduto, indicando a maior razão de ser da bicicleata.
Querem apagar as ~manchas~ vermelhas de ciclofaixa da cidade mais engarrafada da América do Sul. Ninguém grita “viva Fernando Haddad“, mas o brado é contra a cruzada anticiclística que mira a têmpora do prefeito petista.
Foto: Pedro Alexandre Sanchez
Querem apagar as ciclovias nas ruas em que cultuadores do ódio já atiraram tachinhas furadoras de pneus de pedalantes. Um cartaz modesto circunda num coração a foto do reacionário cuspidor de raiva Reinaldo Azevedo, ~jornalista~ da Veja e da Folha e ferrenho detrator das ciclofaixas e ciclovias. No contrapé do ódio fomentado contra determinados políticos (e apenas contra alguns deles), @s ciclistas dedicam um coração e a mensagem “agora só falta você!” ao cão vociferador do Partido da Imprensa Golpista (PIG-USA).
Diferente da grotesca manifestação patrocinada pela #GloboGolpista em 15 de março, a dos ciclistas é realmente apartidária, ou melhor, pluripartidária. Ciclistas são petistas, ciclistas são tucanos, ciclistas são marineiros, ciclistas são peemedebistas, ciclistas são kassabistas, ciclistas votam branco ou votam nulo, ciclistas são tudo isso individualmente e são nada disso coletivamente.
Estou a pé na passeata sobre duas rodas. Encontro Roberson Miguel, meu amigo de Twitter @biosbug (onde estava o @pedalante?). Biosbug é cicloativista, mas também está a pé, transmitindo a passeata ao vivo de seu celular, em TwitCasting, mídia ninja de si próprio.
Nos documentamos um ao outro, cada um à sua maneira. Não sei se Roberson está plenamente ciente disto, mas ele é #JornalistasLivres também. Não sei se estou plenamente ciente disso, mas hoje, mesmo a pé, sou cicloativista também.
Diferente da branquíssima passeata-cusparada de 15 de março, a de ciclistas é multicolorida, multirracial, multissexual (ó, quantos trajes ciclísticos inspiradores!), multitudo. Ciclistas são brancos, pretos, amarelos, mestiços. Todos carregam(os) xingamentos presos no peito, mas hoje é dia de guardá-los: é dia de dizer mais SIM do que não. Em vez de cuspir fogo contra tudo e contra todos, a passeata de bicicletas vamos pedalar, caminhar, salvar a Paulista por alguns minutos do trânsito poluente dos automóveis, conversar, festejar, exigir mansamente das autoridades a preservação da nossa mera existência.
A passeata vermelha do dia 13 e a passeata branca do dia 15 assustam — e frutificam. As sextas-feiras da Paulista vão, semana após semana, se transformando em dias quase-oficiais de manifestação pelo que a gente quiser. A Polícia Militar trabalha loucamente, mas, em contraste com o que aconteceu em junho de 2013, vai se tornando menos e menos violenta diante do nosso direito coletivo de nos manifestar. Mesmo quando o ódio é o mote, é civilizatório o processo que vivemos.
Sexta-feira, na Paulista, há petistas, há tucanos, há fundamentalistas militarizantes, há libertários, há professores, há policiais militares, há ciclistas. Diferentemente dos tempos de aurora tropicalista, quando braSileiras e brasileiros passeavam escondid@s, hoje há uma cordilheira sobre (e não sob) o asfalto.