O músico mineiro Djonga foi indicado para concorrer ao troféu de melhor artista internacional no BET Hip Hop Awards, especializado em hap e hip hop. O rapper, compositor e historiador é o primeiro brasileiro a ser reconhecido pelo evento. O BET Hip Hop Awards é uma premiação norte-americana anual realizada pela Black Entertainment Television e voltada para rappers, produtores e diretores de videoclipes de hip hop e Rap.
Ele vai disputar o prêmio com Kaaris (França), Khaligraph Jones (Quênia), Meryl (França), MS Banks (Reino Unido), Nasty C (África Do Sul) e Stormzy (Reino Unido). O BET Hip Hop Awards revelará os vencedores do ano no dia 27 de outubro.
Neste ano, Djonga lançou seu quarto álbum de estúdio, Histórias da Minha Área, onde conta um pouco sobre o bairro Santa Efigênia, onde mora em Belo Horizonte. O trabalho conta com participações de MC Don Juan, Bia Nogueira, Cristal, NGC Borges e FBC.
Depois de surgir como grande astro na cena do hip hop nacional e colocar seu nome entre os principais personagens da cena do rap no país, Gustavo Pereira Marques (seu nome de batismo) acaba de fazer história aos 26 anos tornando-se o primeiro brasileiro a ser indicado ao prestigiado BET Hip Hop Awards, premiação musical focada na cultura negra.
A indicação de Djonga aconteceu nesta terça-feira, 29, e ele concorre na categoria Melhor Artista Internacional. “Cravando o nome na pedra, sem emocionar!”, escreveu Djonga no Twitter ao dar a notícia. Na postagem, ele publicou um vídeo em que fala à MTV sobre a importância do rap no período da pandemia: “O rap tem que continuar fazendo o papel de sempre. O primeiro papel, e mais importante, é o papel de arte, de música, de levar alegria e reflexão para as pessoas. Em segundo lugar, continuar denunciado o que a gente sempre denunciou. Dedo na ferida, dedo na cara de quem tá errado”.
A Justiça Federal deu um chega-pra-lá nos militares do Colégio Militar de Belo Horizonte e proibiu o retorno às aulas presenciais a partir da próxima segunda-feira, 21, a exemplo do que outras instituições do Exército pretendem fazer no país. A instituição tem cerca de 750 alunos, 42% do sexo feminino. Dezenas de pais de alunos são contrários à volta às aulas, mesmo com uma série de protocolos a serem adotados. Durante a ditadura, as instalações da escola abrigaram presos políticos, que foram vítimas de tortura no local.
A retomada das atividades escolares na unidade do Exército provocou discussões tanto na Prefeitura de Belo Horizonte quanto no Ministério Público Federal e, como medida de segurança, o Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal (Sindsep-MG) entrou na Justiça com um pedido em tutela de urgência para continuidade do regime remoto de aulas, o que foi acatado com a fixação de uma multa de R$ 5 mil por dia, caso ocorra descumprimento da determinação.
Colégio do bairro Pampulha foi usado para abrigar presos políticos durante a ditadura
Sem prejuízo
Na quarta-feira, 16, a direção do Colégio Militar encaminhou às famílias um comunicado informando sobre o retorno obrigatório às aulas na unidade, exceto para os alunos que comprovassem pertencer a grupos de risco para o novo coronavírus. Porém, para o sindicato, o retorno não é necessário, uma vez que os alunos não estariam sendo prejudicados pelo sistema de aulas on-line. Pela avaliação dos professores, os estudantes estão respondendo bem às aulas.
“Nós estamos conversando com os professores há mais de um mês, logo que eles perceberam que seriam convocados para um planejamento presencial das atividades e que incluía desde então o retorno às aulas na própria escola. Nós entendemos que não é necessário um retorno presencial quando tudo pode ser feito remotamente. Sabemos que a cidade está em processo de reabertura, mas achamos que não há necessidade de colocar mais pessoas nos ônibus e nas ruas se os alunos estão respondendo bem às aulas remotas. As aulas estão tendo qualidade”, ressaltou a diretora do Sindicato, Jussara Griffo, ao jornal O Tempo.
Segundo Jussara, o Colégio Militar tinha determinado que retornariam apenas aqueles funcionários que não compõem grupos de risco para a pandemia do novo coronavírus, mantendo em regime remoto, portanto, aqueles com idades superiores a 60 anos e portadores de comorbidades. “Se algumas pessoas permaneceriam em casa, entendemos que o trabalho pode ser mantido remotamente, então não há necessidade de retornar também os outros. Para quê colocar alunos em risco, famílias e professores? Se os alunos estão respondendo bem às aulas remotas, podemos mantê-las”, declarou.
O comunicado feito pelo colégio indicava que haveria um revezamento entre turmas e a adoção de medidas sanitárias relacionadas à Covid-19 para garantir a segurança de estudantes, funcionários e familiares. O retorno contradiz as políticas municipal e estadual que ainda mantêm as aulas suspensas nas redes pública e particular de Minas Gerais. Autoridades da Prefeitura de Belo Horizonte declararam nessa sexta-feira, 18, que poderia procurar a Justiça para pedir a proibição da retomada do ano na unidade militar. Em uma mesma direção, o Ministério Público Federal determinou que o diretor do colégio, o coronel Marco José dos Santos, explicasse à Justiça com um prazo máximo de 24 horas quais estudos técnicos e protocolos de segurança justificariam o retorno às aulas presenciais.
Barbacena
Desde o dia 26 de maio mais de 200 alunos da Escola Preparatória de Cadetes do Ar (Epcar) em Barbacena, no Campo das Vertentes, em Minas, testaram positivo para Covid-19. No dia 22 de junho, o Ministério Público Federal emitiu recomendação ao diretor de Ensino da Aeronáutica, major-brigadeiro do Ar Marcos Vinícius Rezende Murad, e ao comandante da Escola Preparatória de Cadetes do Ar, brigadeiro do Ar Paulo Ricardo da Silva Mendes, para suspender imediatamente todas as aulas e demais atividades acadêmicas presenciais. A Epcar é uma escola de ensino militar sediada em Barbacena que admite alunos de idade entre 14 e 18 anos por meio de concurso público. No local, estudantes de várias cidades de todo o Brasil vivem em regime de internato e, por isso, dormem em alojamentos e têm aulas em horário integral.
Os sem-casa de 18 ocupações de Belo Horizonte e Grande-BH participaram hoje de uma grande manifestação no centro da capital mineira para reivindicar uma solução para o direito de moradia. Eles saíram em passeata da Praça da Estação até a Praça 7, de onde seguiram até a sede da prefeitura. Muitos deles temem serem despejados durante a pandemia e cobram do governador Romeu Zema (Novo), e dos prefeitos Alexandre Kalil (PSD), de BH, e Alex de Freitas (PSDB), de Contagem.
Manifestantes percorreram o centro da cidade até a prefeitura – Fotos de Cadu Passos/JL
Participaram da manifestação sem-casa das ocupações Camilo Torres, Zilá, Professor Fábio Alves, Vicentão, Carolina, William Rosa e Marião, estas duas em Contagem, Cidade de Deus, em Sete Lagoas, Eliana Silva, Vila Fazendinha, Nelson Mandela, Forte, Paulo Freire, Manoel Aleixo, Zezéu Ribeiro, Norma Lúcia, Esperança e Helena Greco da Isidora.
O problema da falta de moradia fica cada vez mais acentuado na Grande Belo Horizonte, o que explica a preocupação dos sem-casa, principalmente diante do crescente desemprego. Enquanto isso, cresce na capital de forma assustadora o número de moradores de rua. Conforme levantamento da prefeitura, na capital eles já somam quase 6 mil pessoas.
Moradores em situação de rua de Belo Horizonte e Região Metropolitana realizaram hoje uma manifestação no centro da cidade para denunciar as precárias condições que tem enfrentado em meio à pandemia de covid-19. Entre as suas bandeiras de luta estão a reforma urbana, a não violência contra as mulheres e o atendimento precário dos governos.
Conforme levantamento do serviço social da prefeitura, a capital mineira já conta quase 5 mil moradores de rua, sendo 88% do sexo masculino e 12% de mulheres. Mas o Cadastro Único – CAD do Ministério da Cidadania, que identifica pessoas em extrema pobreza para direcionar políticas públicas de acolhimento e atendimento, indica que são 9.164 pessoas vivendo nas ruas de Belo Horizonte, boa parte delas vindas do interior ou de outros estados. Nada menos que 84% delas são beneficiários do Programa Bolsa-Família.
Recentemente, mais de mil barracas foram distribuídas aos moradores de rua pela Frente Humanitária do Canto da Rua Emergencial, movimento solidário organizado pela Pastoral da Rua da Arquidiocese de Belo Horizonte que reúne várias entidades. Os abrigos fazem parte de um “kit inverno”, composto também por mantas de cobertura, meias, agasalhos e saco de dormir. As barracas foram adquiridas por um instituto privado parceiro, que ofereceu o aporte financeiro para os kits e para outras ações promovidas pelos mais de 200 colaboradores. As equipes de apoio saíram as ruas, realizaram um cadastro, identificaram as necessidades de cada um e depois distribuíram as doações. Outras 120 pessoas, idosas ou com comorbidades, foram encaminhadas a três centros de acolhimento montados pela Frente.
Claudenice Rodrigues Lopes, assistente social e voluntária da Pastoral de Rua da Arquidiocese, disse ao repórter Elian Guimarães, do jornal Estado de Minas, que ultimamente o número de moradores de rua cresceu devido também aos casos de pessoas liberadas do sistema prisional por causa da pandemia. “É significativo o número de pessoas vindas do sistema que nos procuram, algumas em busca de passagens. Grande parte é do interior, não tem recursos para voltar pra casa e não tem para onde ir. Então, ficam por aí”. Segundo Claudenice, a diminuição do fluxo de pessoas circulando pelo Centro da cidade deu visibilidade a elas. “Antes eram invisíveis, que passavam despercebidas pelos cantos, diante do grande movimento”, observou.
Perfil das pessoas em situação de rua
Gênero Masculino 88% Feminino 12%
Idade 0 a 17 0,7% 18 a 24 7,1% 25 a 34 22,2% 35 a 39 16,5% 40 a 44 15,6% 45 a 49 12,1% 50 a 54 10,8% 55 a 59 7,4% +60 7,1%
Renda familiar per capita Até R$ 89 90,84% Entre R$ 89,01 e R$ 178 0,99% Entre R$ 178,1 e meio salário mínimo 1,9% Acima de meio salário mínimo 6,28%
Grau de instrução Sem instrução 7,3% Fundamental incompleto 52,3% Fundamental completo 14,3% Médio incompleto 10% Médio completo 14,3% Superior incompleto ou mais 1,2% Não informado 0,6%
Motivos para estar nas ruas (principais) Problemas familiares 56% Desemprego 41,5% Perda de moradia 30% Alcoolismo 19,3%
Outros 33% dizem usar abrigos para dormitório 84% são beneficiários do Programa Bolsa-Família
Fonte: Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania
Escutar notícias, ouvir uma narração e ser levado por uma trilha sonora… O que antes poderia ser um programa de rádio, hoje talvez seja um episódio de podcast. Esse fenômeno que invadiu a internet há poucos anos, continua em constante crescimento no número de ouvintes e se expande também na variedade de assuntos oferecidos. Atualmente, grande parte dos temas de podcasts estão relacionados à pandemia da COVID-19 ou ao contexto sócio-político decorrente do bom ou mau enfrentamento dos governos a essa crise mundial sanitária. No nosso país, a pandemia escancara as desigualdades ao evidenciar os problemas sociais que separam as classes econômicas da população.
Diante desse contexto, as jornalistas Raquel Baster e Joana Suarez decidiram mergulhar no mundo do podcast para contar histórias de mulheres brasileiras que enfrentam a pandemia, além dos desafios diários vividos cotidianamente. “A gente tem certeza que as mulheres sempre tem as melhores soluções. Ao reunir essas histórias, trazemos muitas ideias e inspirações, formando uma grande ciranda. Daí veio o nome do podcast: Cirandeiras“, conta Joana.
Para conhecer melhor esse espaço de webrádio e feminismo, os Jornalistas Livres fizeram um bate-papo com as jornalistas que contam sobre o processo de produção, a pandemia e a relação desse projeto com a democratização da comunicação.
Como começou
Raquel Baster e Joana Suarez já dividiam afinidades pelas pautas feministas e bastou apenas uma semana de quarentena para que colocassem o projeto do podcast em ação. Joana, que vem do jornalismo de redação, conta que já vinha se aproximando da rede de podcasts, refletindo sobre a acessibilidade do áudio e seu poder de democratizar: “A maioria dos textos que eu faço são textos enormes e tenho a certeza que muita gente não lê, principalmente as mulheres sobre quem eu falo. O áudio me atraía muito porque leva as pessoas a imaginarem, criar cenários e ir para outra dimensão. Agora na pandemia onde as pessoas estão confinadas, o podcast virou uma companhia, uma forma de sair de casa.”
Já Raquel trouxe ao universo do podcast, sua experiência com a comunicação popular: “Eu sempre trabalhei muito com rádio comunitária e me interesso por essa forma de comunicação que está mais próxima das pessoas. Por mais que ainda seja um novo tipo de mídia, o podcast traz as características do rádio, como as histórias contadas através de uma narração.”
Como é produzido
Muitas vezes, quem escuta um podcast não imagina o que pode estar por trás de sua produção. Segundo as jornalistas, a primeira coisa a fazer é pensar no tema e escolher as mulheres para as entrevistas, por elas chamadas de “cirandeiras”.
“Geralmente o episódio tem a ver com uma pauta que já trabalhamos anteriormente e assim, procuramos mulheres que já tivemos contato. Por coincidência, toda vez que decidimos uma pauta, acontece algo nacionalmente que se conecta ao programa.” Joana lembra que o episódio recente Pandemia na internet sobre segurança digital foi ao ar na mesma semana em que o Senado brasileiro discutia o projeto de lei que combate fake news, enquanto outra discussão acontecia nas redes sobre a exposição de dados pessoais dos usuários do aplicativo FaceApp.
Após o primeiro contato, elas fazem uma pesquisa sobre a cirandeira, enviam as perguntas e dão algumas dicas à entrevistada de como fazer uma boa gravação utilizando o próprio WhatsApp. Como essa orientação, muitas vezes, não é suficiente, nem sempre os áudios tem a melhor qualidade, “mas na pandemia tá tudo justificado”, comenta Joana.
Com as respostas da entrevistada, o roteiro chega a ter mais de 10 páginas e leva de 20 a 30 horas para sua elaboração. A cada episódio, uma delas toma à frente a função de escrever o roteiro, incluindo referências pessoais, e em seguida, a parceira acrescenta a sua parte. “A gente percebe que às vezes um tema muito comum para uma, pode ser muito complexo para a outra. A gente vai se complementando para facilitar o entendimento de quem escuta”, conta Raquel.
Depois do roteiro, vem a hora da gravação que exige algumas preparações, como escolher um horário silencioso do dia para gravar, desligar a geladeira e armar um pequeno estúdio caseiro com edredons. “O legal do podcast é que é uma mídia barata. Basta ter um celular, internet e gambiarras”, conta Joana dando risadas.
Retorno dos ouvintes
As jornalistas contam que 75% das pessoas que ouvem o podcast são mulheres e pertencem ao grupo social que elas convivem. Além do desafio de expandir a rede de ouvintes, elas relatam que ainda é uma grande dificuldade fazer com que o podcast retorne às pessoas entrevistadas e a outras mulheres que não estão acostumadas a esse tipo de mídia.
Raquel conta que a cirandeira Lia de Itamaracá, entrevistada no episódio Pandemia na Ilha, só pôde escutar o podcast após seu produtor viajar até a ilha onde mora para mostrá-la pessoalmente em seu celular. Lia é uma das mulheres brasileiras que ainda não fazem parte dessa grande rede de internet em 2020.
Um infográfico produzido pelo site iinterativa utilizando as fontes do IBOPE, Spotify Newsroom e ABPod, mostra que cerca de 45% do público dos podcasts é formado por homens, do sudeste do país, que pertencem às classes A e B e tem entre 16 e 24 anos. Segundo a pesquisa feita em 2019, 32% dos entrevistados nem sabiam o que é um podcast.
Se o podcast ainda é limitado a uma pequena parcela da população, o WhatsApp talvez possa ser um lugar mais democrático para a sua difusão. As jornalistas contam que decidiram fazer os episódios em formatos pequenos de até 30 minutos para conseguir enviar pelo aplicativo de mensagens e garantir que o podcast alcance o maior número de pessoas.
Democratização da comunicação
Para a jornalista Raquel Baster, é inevitável discutir o alcance dos podcasts sem pensar na democratização dos meios de comunicação no Brasil. Apesar do surgimento das novas mídias, grande parte das informações veiculadas é controlada por um conglomerado de grandes empresários que atendem os interesses privados dessa própria elite.
Segundo ela, “não adianta inventar a roda do podcast, sem falar da estrutura da comunicação no Brasil. Para tornar (a comunicação) mais acessível, precisamos discutir a concentração midiática. A internet ainda não é acessível para grande parte da população brasileira. Precisamos que o maior número de pessoas tenham acesso, mas que possam também alcançar os meios de produção.”
No episódio sobre trabalhadoras rurais, a entrevistada Verônica Santana fala sobre a dificuldade das agricultoras em conseguir se comunicar durante a pandemia, visto que o trabalho sempre foi presencial. “A gente tem muita dificuldade, tanto no domínio dessas ferramentas, como no desafio de que a internet não funciona na maioria dos nossos territórios rurais. No campo, a internet ainda não é uma realidade.”, diz Verônica.
Segundo a pesquisa TIC Domicílios, apenas 50% da população rural tem acesso a internet e esses números podem diminuir ainda mais de acordo com o recorte social e econômico.
Por outro lado, Joana revela seu otimismo no poder das novas mídias: “Acho que o podcast vai se democratizar como aconteceu com o Instagram. Quando a gente poderia imaginar ter acesso a sotaques das pessoas do sertão do Cariri?” Joana se refere ao podcast BUDEJO, de Juazeiro do Norte, e cita ainda o Radionovela produzido por alunos da UFPE em Caruaru, no agreste pernambucano, que narra em formato de radionovela O Alto da Compadecida em Tempos de Pandemia, adaptação da obra de Ariano Suassuna.
Para onde vai essa Ciranda
O podcast Cirandeiras teve início durante a pandemia, portanto grande parte dos seus episódios tem esse tema como contexto. No entanto, as jornalistas Raquel Baster e Joana Suarez pretendem continuar os episódios futuramente, indo a diferentes locais do Brasil para entrevistar de perto as mulheres que conduzem “as cirandas”.
Os episódios das Cirandeiras estão disponíveis nas plataformas mais conhecidas de podcast e tem a cada quarta-feira um novo episódio. Também estão presentes no Instagram, onde ocorrem as lives com as outras mulheres dentro das temáticas dos programas.
Edifício JK, um projeto de Oscar Niemeyer, foi usado para apelos à população para ficar em casa
Graças às rápidas medidas adotadas pelas autoridades e pela população, quase cem anos depois Belo Horizonte poderá registrar um baixo índice de mortes pelo covid-19, a exemplo do que ocorreu durante a peste da gripe espanhola, em 1918. É o que já apontaram os primeiros estudos de um grupo de epidemiologistas. A gripe espanhola matou entre 20 a 50 milhões de pessoas em todo o mundo. Em Belo Horizonte a peste provocou 282 mortes, um número bem abaixo do registrados em inúmeras cidades brasileiras e da Europa, segundo estudos da historiadora mineira Heloísa Starling, da UFMG.
Para se ter uma ideia, o isolamento social determinado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e adotado pela prefeitura de Belo Horizonte já evitou 2.128 casos de contaminação pelo novo coronavírus. Esse levantamento foi realizado entre os dias 16 de março e 7 de abril pelo infectologista e epidemiologista Carlos Starling, pelo engenheiro de produção Joaquim José da Cunha Júnior e pelo doutor em bioengenharia Bráulio Couto. “Essa é uma amostra representativa, mas esse número deve ser muito maior. Estamos evitando um percentual de mortes muito significativo”, disse Starling ao portal O Tempo.
O levantamento mostra um comparativo da curva de infecções em BH, na Itália e na Suíça. Nesses países europeus, os casos esperados de Covid-19 são muito superiores se confrontados aos da capital. “Temos conseguido manter em níveis muito mais baixos e uma curva muito menos íngreme do que temos na Itália, na Suíça e nos Estados Unidos também, por exemplo”, observou o epidemiologista.
Isso se deve, segundo Starling, às medidas impostas. “O isolamento social é fundamental e uma arma efetiva, tem lastro científico. Já demonstramos que a estratégia está correta. É isso que se espera de quem dirige um país, um Estado ou um município”, afirmou.
Além do isolamento, Carlos Starling salienta outras precauções que devem ser tratadas como prioritárias, como lavar as mãos regularmente com água e sabão e álcool em gel, evitar tocar o rosto e ter o mínimo de convívio social possível, no caso daqueles que não podem adotar o confinamento. Ele acredita que uma flexibilização da política de distanciamento traria consequências trágicas à população. “Temos acompanhado a realidade com dados estatísticos e epidemiológicos. Você não tira isso da cartola, tal dia é o ‘Dia D’ para liberar tudo. O isolamento não tem um tempo definido para acabar”.
A gripe espanhola
Em 1918, em cerca de 90 dias a febre espanhola infectou um quinto da população mundial e matou entre 20 a 50 milhões de pessoas. A gripe desembarcou no Rio de Janeiro provavelmente no dia 14 de setembro. Veio de Lisboa no barco “Demerara” que atracou no porto com gente doente a bordo. Os tripulantes desceram na Praça Mauá sem que ninguém prestasse muita atenção, mas já estavam contaminados e contaminando. Pouco depois, a gripe chegou a São Paulo vinda do Rio de Janeiro e cinco mil paulistanos morreram até o final de dezembro.
Em Belo Horizonte, a gripe espanhola durou três meses. A população girava em torno de 45 mil habitantes e a doença derrubou cerca de 15 mil pessoas. “Os registros apontam 282 mortes, mas faltam dados. Quantos faleceram fora dos hospitais? Quantos óbitos foram notificados? Não sabemos”, diz Heloísa Starling.
No dia 7 de outubro, um oficial da Vila Militar, no Rio de Janeiro, desembarcou na Praça da Estação da capital mineira junto com a família. Instalaram-se, numa casa do bairro da Floresta e, dois dias depois, os primeiros sintomas da gripe espanhola apareciam. “Quem morava no bairro entrou em pânico assistindo à chegada dos enfermeiros responsáveis pela transferência imediata dos doentes para o Hospital de Isolamento, e dos funcionários da Diretoria de Higiene, o equivalente hoje à Secretaria de Saúde, devidamente paramentados, transportando, em carroças da prefeitura, o equipamento para desinfecção da casa”, contou a historiadora Heloísa Starling em trabalho encomendado pelo portal G1.
As praças da Liberdade e do Papa, esta aos pé da Serra do Curral, foram fechadas para evitar caminhadas e aglomeração
O surto não tinha nada de benigno, a doença avançava com rapidez pela zona urbana, suburbana e rural e atacava qualquer pessoa: ricos e pobres, homens, mulheres, crianças, velhos, jovens, fracos ou atléticos, sem distinção.
O médico Samuel Libânio, responsável pela Diretoria de Higiene, suspendeu o comércio e ordenou o fechamento das lojas; os proprietários obedeceram, mesmo a contragosto. As ruas ficaram vazias, cafés e bares, cinemas, clubes e casas de diversão às moscas, a circulação dos bondes foi reduzida. Os estabelecimentos de ensino suspenderam as aulas, inclusive as faculdades. Tudo ficou deserto, menos as farmácias, onde uma multidão se aglomerava em busca dos medicamentos que começavam a faltar.
“Em Belo Horizonte, a gripe espanhola se alastrou indiferente pelos bairros. Os hospitais não dispunham de capacidade para receberem tantos doentes ao mesmo tempo, e era urgente criar um serviço de hospitalização para mendigos e para a população pobre. Havia dificuldades de abastecimento, risco de desemprego, queda no volume de negócios, perigo de falência, desestruturação dos elementos que constroem o cotidiano das pessoas. Quem não era funcionário público, não recebia salário mensal e vivia exclusivamente do trabalho diário, ficou em situação precária, iam faltar recursos. Não existia remédio disponível para todo mundo e as pessoas não podiam dominar a epidemia, mas descobriram que era possível juntar esforços para tentar combatê-la”, observa Heloísa Starling.
“Reconhecer isso uniu a população. A Congregação da Faculdade de Medicina transformou o prédio da sua Escola em hospital provisório com 112 leitos e nove enfermarias, e orientou professores e estudantes a irem além do atendimento interno, prestando serviços nos inúmeros postos de saúde que estavam sendo abertos na cidade. A Escola de Enfermagem ainda não existia, mas a Congregação da Medicina não titubeou e os médicos convocaram as enfermeiras da Cruz Vermelha para o trabalho nos hospitais e elas responderam imediatamente”, destaca a historiadora.
“Cem anos depois, Belo Horizonte volta a enfrentar uma nova epidemia e imagens de pesadelo estão se espalhando por toda Minas Gerais. Ninguém recria o já vivido, e é certo que a História nunca se repete. Mas, por vezes, podemos arriscar e pedir algo emprestado ao passado. Talvez seja hora de tentarmos esse empréstimo. Para enfrentarmos juntos o tempo sombrio que estamos vivendo”, conclui Heloísa Starling.
E cem anos depois, quem está à frente da luta contra o coronavírus é o prefeito Alexandre Kalil (PSD), que, ao contrário do governador Romeu Zema (Novo), não titubeou em partir imediatamente para o combate à peste. Usando as mesmas estratégias do passado, Kalil, ex-presidente do Clube Atlético Mineiro, e acostumado a lidar com a massa atleticana, passou a utilizar de todos os meios para fazer com que a população ficasse em casa, o que não foi fácil.
Começou a ser atacado por aqueles contrários ao isolamento, como os bolsonaristas. Mas partiu para o enfrentamento. No alto do bairro Mangabeiras, por exemplo, botou a Guarda Municipal para dispersar uma carreata que ameaçava descer a Avenida Afonso Pena rumo ao centro da cidade. Para impedir o retorno daqueles que buscavam as farras e as churrascadas nos condomínios da vizinha Lagoa Santa e da Serra do Cipó, Kalil baixou decreto impedindo que ônibus daquela cidade entrassem na capital, medida que acabou estendida a outros municípios. “As pessoas vão para a farra, não se protegem, se infectam e depois vêm encher nossos hospitais”, esbravejou.
Para impedir que alguns teimosos insistissem em fazer caminhadas pela orla da Lagoa da Pampulha, por praças e parques de Belo Horizonte, o prefeito mandou cercá-los ou suspender o funcionamento. Por fim, assinou decreto determinando que a partir do dia 17 de abril todos os moradores deveriam usar máscaras em locais públicos. O resultado é que as ruas e avenidas passaram a ficar vazias e o comércio fechado, enquanto a população se colocava em isolamento se precavendo contra o covid-19. Até este domingo, 19, Minas contava 39 mortes provocadas pelo coronavírus. Belo Horizonte mostrava-se estabilizada, registrando oito mortos, número idêntico ao de Macapá, Sorocaba (SP) e São João do Meriti (RJ) e 440 pessoas infectadas pela doença. A expectativa é de que ela seja contida em Belo Horizonte, a exemplo do passado, um bom motivo para que todos fiquem em casa.