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Tag: AtyGuasu

  • ‘Fazendeiros ‘não aceitam o envolvimento da Igreja na defesa dos excluídos’ afirma Bispo do MS’

    ‘Fazendeiros ‘não aceitam o envolvimento da Igreja na defesa dos excluídos’ afirma Bispo do MS’

     

    Em pronunciamento difundido no dia 22 de agosto, logo após a ocupação de uma fazenda no município de Antônio João por indígenas da região, a fazendeira Luana Ruis Silva acusou o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) de estar incentivando as “invasões”, e desafogou seu ressentimento contra a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil afirmando:

    “Abomino esse braço demoníaco da Igreja Católica que é a CNBB”.

    A crítica acerba — uma das muitas levantadas contra a CNBB e o CIMI por quem se sente prejudicado em seus interesses — foi assim explanada pela denunciante: «Ontem, dia 20 de agosto, o Conselho Indigenista Missionário, pregando essa ideologia da subtração, da qual todos os resultados são negativos, atuou junto à comunidade indígena, destituiu os caciques que primavam pelo diálogo e prometeram invadir tudo e nos expulsar de nossas casas. E, realmente, a promessa se consumou nessa madrugada. Invadiram a Fazenda Primavera, amarraram o capataz, o espancaram e, até o momento, não temos notícias de resgate. O Conselho Indigenista Missionário prometeu que está trazendo índios do Paraguai e que vai invadir o Estado».

    Antes de tudo, gostaria de esclarecer que, na quinta-feira, dia 20 de agosto, membros do CIMI participavam de uma reunião comigo em Dourados, numa tentativa de diálogo com alguns produtores rurais de Amambai. Se se achavam em Dourados, não poderiam estar em Antônio João, destituindo caciques e incentivando ocupações… Aliás, quem deu tamanha autoridade ao CIMI para exonerar caciques? Ademais, afirmar que os índios se deixam manipular pelo CIMI em suas iniciativas e decisões é menosprezar a inteligência de suas lideranças, que são as únicas responsáveis pelas “invasões” (assim vistas pelos produtores rurais) ou “retomadas” (como são consideradas pelos indígenas).

    Nos 17 municípios que formam a Diocese de Dourados vivem em torno de 35.000 índios e 70.000 agricultores. Muitos destes últimos são sulistas e gaúchos, como eu. Ou seja, pessoas habituadas a cultivar a terra. Migrantes que aqui chegaram a partir de 1970 e que adquiriram legalmente suas propriedades. E que delas precisam para sobreviver e para construir a riqueza do país.

    Não quero generalizar, mas, a meu ver, quem semeia o ódio de classes entre a população sul-mato-grossense não é o CIMI, mas pessoas que, tendo em mãos o poder político e econômico, envenenam os produtores rurais. Justamente insatisfeitos ante uma situação de conflito que se prolonga indefinidamente e que a todos prejudica: índios e agricultores, já que o Governo Central teima em não tomar providências, parece mais fácil e mais cômodo a essas pessoas transformar o CIMI no “bode expiatório” do momento.

    Ao longo desses quinze anos em que tenho a alegria de residir no Mato Grosso do Sul, foram inúmeras as vezes em que os Bispos do Estado nos manifestamos a respeito. Fizemos nossa uma proposta levantada por agricultores e indígenas, que nos parecia a única viável: a indenização justa das terras identificadas como indígenas pelo Governo Central, a fim de que também os índios — do jeito que seus costumes e sua cultura pedem — tirem seu sustento, assim como fazem os demais agricultores do Estado.

    Calúnias tão pesadas e insustentáveis como as levantadas pela fazendeira de Antônio João devem estar sujeitas a medidas judiciais, que já estão sendo pensadas. Tais calúnias refletem a insatisfação de quantos não aceitam o envolvimento da Igreja na defesa e na promoção dos excluídos e marginalizados, para não perderem seus privilégios.

    É o que, com outras palavras, afirmava Dom Hélder Câmara:

    “Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, me acusam de comunista!”.


    Dom Redovino Rizzardo
    Bispo diocesano de Dourados

     

  • Guarani Kayowaa: a dolorosa retomada

    Guarani Kayowaa: a dolorosa retomada

    Depois de quase duas décadas de espera, a comunidade Guarani Kayowaa está retomando áreas da Terra Indígena Ñanderu Marangatu, na fronteira do Brasil com o Paraguai. Lideranças relatam que tiveram sua aldeia invadida esta semana por agentes do Departamento de Operações da Fronteira (DOF) e que foram ameaçados com disparos de armas de fogo.

    Os Guarani Kayowaa cansaram de esperar. Querem avisar a toda a sociedade que dezoito anos já foi tempo bastante aguardando uma solução oficial para a demarcação de seu tekoa (território sagrado) no município de Antônio João, na fronteira do Brasil com o Paraguai. A Terra Indígena ÑanderuMarangatu, com cerca de 9 mil hectares, teve sua demarcação homologada em março de 2005 pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva. Poucos meses depois, porém, o Supremo Tribunal Federal, anulou a conquista. Com essa decisão, o presidente do STF na época, Nelson Jobim, atendeu aos apelos dos que alegam ser donos das terras. Teve início, então, uma sucessão de sofrimentos para a comunidade que hoje conta com cerca de mil indígenas. Mortes por assassinato, fome, atropelamento. Despejos. Invasões.

    Na semana passada, os Guarani Kayowaa decidiram retomar o território. Homens, mulheres e crianças seguiram para a chamada Fazenda Primavera, cujas terras são reivindicadas pelo ex-prefeito da cidade, Dacio Queiroz Silva (PMDB). “Pouco tempo depois de ocupar a fazenda o Departamento de Operações da Fronteira (DOF) apareceu e fez ameaças aos indígenas. Os guaranikayowaa recuaram então um pouco, por prudência. Mas na terça-feira, dia 25, por volta das 14h, os policiais do DOF invadiram e atacaram a área da aldeia. Não foi nem na área de retomada esse ataque, foi na aldeia mesmo”, denuncia um dos membros da organização indígena AtyGuasu, que não quis se identificar.

    Segundo ele, durante a invasão teriam sido feitos disparos com armas de fogo. Em comunicado, a comissão AtyGuasu relata que os invasores procuravam pelas lideranças da comunidade, entre eles o líder conhecido como Loretito. “Felizmente não houve vítimas nesse ataque. A comunidade está muito assustada, mas decidiu resistir e ampliar a retomada para as áreas de outras fazendas que estão dentro da Terra Indígena”, afirma o representante da organização.

    A reportagem tentou entrar em contato com a regional da Funai em Ponta Porã, sem sucesso. Em comunicado divulgado esta semana, o DOF não responde às denúncias feitas pelos Guarani Kayowaa, mas alega que no sábado teria participado de uma ação para “socorrer e liberar reféns de índios, após invasão de propriedade”. Exibindo fotos divulgadas anteriormente pelos indígenas em redes sociais como se fossem imagens de divulgação do próprio órgão, o DOF acusa dos Guarani Kaiowaa de ter feito reféns um adulto e dois adolescentes durante a retomada da Fazenda Primavera e de tê-los ameaçado com flechas e armas de fogo. A Comissão AtyGuasu diz que todas as acusações são falsas.