Jornalistas Livres

Categoria: Ação Humanitária

  • Bolsonaro abandona estudantes de universidades federais na Colômbia

    Bolsonaro abandona estudantes de universidades federais na Colômbia

    Por Safira Campos, da Redação do PNBOnline

    Em meio à pandemia do novo coronavírus (Covid-19), oito estudantes da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), que estão na Colômbia, enfrentam dificuldades para saber quando poderão retornar a suas casas. Eles fazem parte de um grupo de 51 brasileiros que está em mobilidade acadêmica desde o começo do ano (até ontem, 31 estudantes haviam sido identificados, com a divulgação do caso hoje, mais 20 se juntaram ao grupo – nota dos Jornalistas Livres). Com fronteiras fechadas e cancelamentos de vôos comerciais em razão da pandemia, os jovens aguardam um posicionamento da embaixada do Brasil em Bogotá para um possível voo de repatriação. 

    Na semana passada, os brasileiros enviaram uma carta à Embaixada do Brasil em Bogotá solicitando ajuda. O que mais preocupa é que a maior parte dos estudantes é composta por bolsistas, que recebem alimentação e estadia, e que não têm como manter as despesas sem os auxílios, que já estão próximos de expirar.

    “Os brasileiros que atualmente se encontram na Colômbia e que se manifestam por meio desta carta, exortam aos órgãos consulares brasileiros a coordenação, juntamente com os órgãos competentes, a organização de um voo de repatriação humanitário e/ou apoio diante das necessidades que se desenham nesse cenário, como por exemplo a de estudantes com bolsas prestes a expirar”, inicia a carta.

    Em entrevista ao PNBonline, a estudante do curso de Comunicação Social Isabelle Fanaia, que atualmente estuda na Universidad de Boyacá, comentou sobre a preocupação do grupo de brasileiros. “O problema gira em torno do fato de que estamos aqui porque nos mantemos com a bolsa, que garante estadia e alimentação. Mas ela tem um prazo e o prazo tá se aproximando. Minha universidade aqui já pronunciou falando que não tem como prorrogar a bolsa caso a gente fique por mais tempo. O problema é que voos estão sendo cancelados e o aeroporto está fechado. O risco é sermos obrigados a ficar e nem ter um auxílio para isso”, relata Fanaia.

    Cerimônia de boa viagem da Secretaria de Relações Internacionais da UFMT antes da ida dos estudantes ao exterior.
    Cerimônia de boa viagem da Secretaria de Relações Internacionais da UFMT antes da ida dos estudantes ao exterior

    O sentimento é compartilhado pela colega de curso Pollyana Rodrigues, que está na Universidad Simón Bolívar, localizada na cidade de Cucuta. “A nossa situação é bem delicada. Eu por exemplo recebo a última bolsa na primeira semana de junho, ou seja, daqui a poucos dias. Se não tivermos auxílio e alojamento, não sabemos o que fazer para nos manter. Ainda pesa o fato de que os seguros de saúde que nós contratamos só vão até essa data. Se eventualmente acontecer algo depois desse limite, nós não temos nem isso”, lamenta.

    Em resposta à carta, a embaixada informou que já repatriou 577 brasileiros desde o fechamento das fronteiras em março e que está acompanhando a situação das cidadãos interessados em repatriação. Não há, entretanto, qualquer estimativa de quando isto pode acontecer.

    Sem informar algum tipo de previsão, o secretário de Relações Internacionais da UFMT,  Prof. Lucas Oliveira de Sousa, afirmou em resposta à redação que a instituição está buscando alternativas de trazer os estudantes de volta a Mato Grosso. “Desde o início da pandemia, a Secretaria de Relações Internacionais da UFMT faz um trabalho constante de acompanhamento individual dos estudantes em mobilidade internacional (…). Dentro deste diálogo, busca alternativas para viabilizar o retorno ao Brasil dos manifestaram interesse. Em todos os casos cuja mobilidade ainda está em vigor, a UFMT já se articula para que, após a conclusão e durante a pandemia, os estudantes tenham o amparo das embaixadas brasileiras nos respectivos países e garantido o retorno ao estado de Mato Grosso”, disse.

    Além dos estudantes da UFMT, estão na mesma situação alunos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade Federal do Piauí (UFPI), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas (IFSULDEMINAS), Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Universidade Estadual de Goiás (UEG), Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Tiradentes (Unit) e Universidade Vale do Rio Verde (UninCor).

     

    Confira a nota enviada pela UFMT na íntegra: 

    Desde o início da pandemia, a Secretaria de Relações Internacionais (SECRI) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) faz um trabalho constante de acompanhamento individual dos estudantes em mobilidade internacional, mantendo contato direto e frequente com os mais 50 alunos em 6 países e 15 instituições parceiras anfitriãs. Dentro deste diálogo, busca alternativas para viabilizar o retorno ao Brasil dos que, após consultados, manifestaram interesse, concretizando, até o momento, oito casos.

    Vale ressaltar que, infelizmente, esta situação não é exclusiva da UFMT. Estudantes de outras universidades passam pela mesma situação e no contexto do fechamento de fronteiras e cancelamento de voos comerciais, a repatriação é de competência exclusiva do Ministério de Relações Exteriores e do corpo diplomático brasileiro em cada país.

    Em todos os casos cuja mobilidade ainda está em vigor, a UFMT já se articula para que, após a conclusão e durante a pandemia, os estudantes tenham o amparo das embaixadas brasileiras nos respectivos países e garantido o retorno ao estado de Mato Grosso

    Matéria original em: https://www.pnbonline.com.br/geral/em-carta-a-embaixada-estudantes-da-ufmt-na-cola-mbia-pedem-ajuda-para-retornar-ao-brasil/66291

  • “O presidente perdeu a condição de governar”, dizem ex-ministros

    “O presidente perdeu a condição de governar”, dizem ex-ministros

    O claro flerte com o fascismo, a exultação da ditadura e as honrarias a assassinos e torturadores, uma constante na vida política de Jair Bolsonaro, finalmente está levando a centro-direita a voltar, ainda que devagar, à luta pela preservação dos Direitos Humanos no Brasil. Enquanto o PSDB tinha interesse na queda, por quaisquer métodos e motivos que fossem, dos governos petistas, a escalada fascista, o negacionismo da ciência e mesmo os crimes da familícia foram sempre minimizados ou mesmo ignorados. Agora que uma pandemia global ceifa, oficialmente, mais de 16 mil vidas de brasileiros, cinco ex-ministros sociais-democratas e um ex-ministro de Lula, todos fundadores e representantes da Comissão Arns de Defesa dos Direitos Humanos, publicaram artigo na Folha de S. Paulo para dizer o óbvio: Bolsonaro não possui as mínimas condições de seguir governando e enquanto ele não for impedido não será possível criar saídas para o genocídio diário e com viés de crescimento até onde a vista alcança. Antes tarde do que mais tarde ainda.

    Veja abaixo a íntegra do documento:

    Hora de falar ao povo, detentor e destinatário dos rumos do país

    Assistimos em 2019 ao desmanche de instituições e estruturas de Estado, em nome de alinhamentos ideológicos e guerras culturais.

    A partir de fevereiro último, com a chegada da pandemia em nosso território, ao grande desmanche somaram-se ataques à ordem constitucional, à democracia, ao Estado de Direito. Não podem ser banalizados, muito menos naturalizados.

    Como alertaram os cientistas, a Covid-19 encontraria no Brasil campo fértil para o seu alastramento: um país-continente com enorme desigualdade social e concentração de renda, sistema de saúde fragilizado por cortes e tetos orçamentários, saneamento básico precário, milhões de brasileiros vivendo em bairros, comunidades e distritos sem infraestrutura, sucateamento da educação pública, desemprego na casa das 13 milhões de pessoas e uma economia estagnada.

    Acrescente-se a esse quadro as características próprias da atual pandemia — um vírus com alta velocidade de transmissão e sintomatologia grave, para o qual ainda não há remédio ou vacina eficazes.

    Talvez não imune ao vírus, mas com toda certeza imune ao sofrimento humano, o presidente da República, Jair Bolsonaro, tem manifestado notória falta de preocupação com os brasileiros, com o risco das aglomerações que estimula, com a volta prematura ao trabalho, com um sistema de saúde que colapsa aos olhos de todos e até com o número de óbitos pela Covid-19, que totalizam, hoje, muitos milhares de casos — sobre os quais, aliás, já se permitiu fazer ironias grosseiras e cruéis.

    Mas a sanha do presidente não para por aí.

    Enquanto o país vive um calvário, Jair Bolsonaro insufla crises entre os Poderes. Baixa atos administrativos para inibir investigações envolvendo a sua família.

    Participa de manifestações pelo fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Manipula a opinião pública, e até as Forças Armadas, propagando a ideia de um apoio incondicional dos militares como blindagem para os seus desatinos.

    Enfim, o presidente deixa de governar para se dedicar à exibição diária de sua triste figura, em pantomimas familiares e ensaios golpistas.

    Preocupado com o amanhã e sob o peso do luto, o Brasil precisa contar com um governo que coordene esforços para a superação da crise, começando por ouvir a voz que vem das casas, das pessoas que sofrem, em todas as partes.

    Não há como aceitar um governante que ouve apenas radicais fanáticos, ressentidos e manipuladores, obcecado que está em exercer o poder de forma ilimitada, em regime miliciano-militar que viola as regras democráticas e até mesmo o sentido básico da decência.

    Só resta sublinhar o que já ficou evidente: Jair Bolsonaro perdeu todas as condições para o exercício legítimo da Presidência da República, por sua incapacidade, vocação autoritária e pela ameaça que representa à democracia. Ao semear a intranquilidade, a insegurança, a desinformação e, sobretudo, ao colocar em risco a vida dos brasileiros, seu afastamento do cargo se impõe.

    A Comissão Arns de Defesa dos Direitos Humanos entende que as forças democráticas devem buscar, com urgência, caminhos para que isso se faça dentro do Estado de Direito e em obediência à Constituição.

    José Carlos Dias
    Presidente da Comissão Arns de Defesa dos Direitos Humanos e ex-ministro da Justiça (governo FHC)

    Claudia Costin
    Ex-ministra de Administração e Reforma (governo FHC)

    José Gregori
    Ex-ministro da Justiça (governo FHC)

    Luiz Carlos Bresser-Pereira
    Ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), ministro da Administração e Reforma do Estado e ministro da Ciência e
    Tecnologia (governos FHC)

    Paulo Sérgio Pinheiro
    Ex-ministro da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos (governo FHC)

    Paulo Vannuchi
    Ex-ministro de Direitos Humanos (governo Lula).

    Texto original em : https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2020/05/o-presidente-perdeu-a-condicao-de-governar.shtml

  • 13 de maio, mentira, cinismo e resistência

    13 de maio, mentira, cinismo e resistência

    Por Douglas Belchior, defensor de direitos humanos e professor no movimento negro Uneafro Brasil

    As projeções são de que entre 80 e 100 mil brasileiras e brasileiros podem perder suas vidas para o Covid-19 em 2020. É o que demonstram estudos como a da Imperial College, de Londres, e da consultoria americana Kearney. Dois terços dessas mortes serão de pessoas negras, segundo projeções a partir dos poucos dados estatais de identificação racial de doentes e mortos pela Covid-19, revelados graças à insistência do Movimento Negro. As desigualdades estruturais geram uma pobreza mais acentuada entre negros, afetando sua condição alimentar e, portanto, suas defesas imunológicas. Isso, por consequência, gera doenças pré-existentes à pandemia, condenando toda essa população ao grupo de risco.

    Mas não só isso. A este quadro somam-se outros como: a impossibilidade do isolamento social, diante da fome e das panelas vazias; o serviço público de saúde que, por servir pobres e negros, foi em sua grande maioria desmontado, mercantilizado e é alvo frequente dos assalto de seus recursos previstos pela constituição; as condições precárias de infraestrutura, saneamento básico e a distribuição irregular de água potável em bairros de maioria negra e favelas, nas cidades, assim como a pobreza que assola o campo, as comunidades quilombolas e os povos negros da floresta. Mesmo o apoio governamental de renda emergencial chega menos à esta população. Todos esses fatores desaguam num resultado comum que, no contexto de pandemia, chamamos, por triste que seja, pelo nome que tem: Genocídio Negro pelo Covid-19.

    Fossemos um país decente, causaria revolta a insistente coincidência que faz com que a população de rua e o contingente de pessoas encarceradas – e ameaçadas pelo isolamento em containers, sejam em sua quase totalidade, ao mesmo tempo, alvo inevitável da Covid-19 e negros. As reivindicações tantas vezes repetidas (e ignoradas), pelo movimento negro gritam no contexto de pandemia que vivemos. Na distopia brasileira, onde um vírus que deveria ser letal a qualquer ser humano, mata desproporcionalmente seres humanos negros, nada mais atual que explorar os sentidos da maior de todas as permanências da história do Brasil: a característica escravocrata da sociedade, das relações sociais e das formas em que o poder e as condições de viver ou morrer se estabelecem.

    O Brasil do 13 de maio de 2020, que lembrado será para sempre como o ano da pandemia do corona vírus, nunca esteve tão perto do Brasil do 13 de maio 1888, ano lembrado como o do fim da escravidão mercantil. Não vou enumerar os horrores do agora. Mas, por responsabilidade, preciso reafirmar o quão criminosa tem sido a postura de Bolsonaro e seu governo como um todo, sobretudo no sentido de potencializar a condição de sofrimento imposta pela dinâmica racista e genocida da sociedade brasileira. Como quem convoca uma guerra, o presidente tem, reiteradas vezes, cometido crime de responsabilidade ao estimular que milhares de trabalhadores – prestadores de serviços, informais e assalariados mal remunerados, negras e negros em sua maior parte, como bem ilustra o vídeo oficial do governo em sua campanha “O Brasil não pode parar”, voltem à sua rotina normal em meio à pandemia de um vírus mortal.

    Não pode parar! A linha de produção não pode parar! O engenho não pode parar! E presenteados pela liberdade de empreender e viver a livre iniciativa, negras e negros devem ignorar as mais de 12.400 mortes pelo Covid-19 (até ontem, descontadas subnotificações inumeráveis) e festejar, agradecer e homenagear Princesa Isabel, a redentora, como propõe o presidente da Fundação Palmares, ao fazer uso indevido de sua posição institucional e praticar atos contraditórios à existência da própria instituição que preside.

    Não há o que comemorar em 13 de maio. Não houve abolição. A escravidão ainda é marca fundamental em nós, enquanto sociedade. Esta data, resignificada, é de luta e denúncia do racismo no Brasil. É dia de celebrar a resistência histórica, diante da falsa abolição. Resistir e reinventar a vida é marca da existência do povo negro brasileiro. Colonizadores brancos europeus forjaram um país com base num genocídio atemporal, permanente, continuado – mas nós sobrevivemos. Desejaram um país de brancos, mas empretecemos o Brasil. Na primeira oportunidade que nossas lutas proporcionaram, ocupamos universidades e cargos públicos, formulamos teses, desafiamos o poder com nossa presença, nossa voz, nossa religiosidade, nossos costumes, nossos cheiros e nossos sorrisos. Em momentos de crise e conflitos, é preciso considerar que a violência com que nos atacam é proporcional ao medo que sentem de nós.

    E tem razão em temer, porque lutamos muito! Somos maioria e organizamos nossa Coalizão Negra por Direitos. Denunciamos o genocídio e queremos que reconheçam isso! Diante da fome, exigimos do governo uma Renda Básica Emergencial. Mas não dá pra esperar! Milhares dos nossos não serão atendidos, então, nos organizamos para matar a fome dos nossos irmãos. E você pode ajudar! Muitos de nós, doentes, não serão atendidos nos hospitais já lotados, então, cuidamos de nossa própria saúde. E enquanto sobrevivemos, lutamos pelos direitos de nossos filhos de se prepararem para o ENEM. Falamos sobre nossas vidas. E lutamos por ela em nossos territórios, todos os dias!

    A partir de nossas crenças e da confiança ancestral, mesmo com poucas certezas sobre o amanhã, levantamos a cabeça, cobramos e agimos:

    Sabe esse lugar que você ocupa? O lugar de proprietário, de chefe, de bonito, de competente, de doutor, de escolhido, de aprovado, de eleito, este seu lugar de privilégio disfarçado de mérito e esforço honesto, tem cheiro de sangue, tem carma de muito sofrimento e morte.

    Você devia ter vergonha! Não foi com teus bisavós, nem com teus avós e pais. Talvez não seja com você. Mas com teus filhos e netos, amanhã ou depois, pode ter certeza.
    Temos contas a acertar.

    Porque hoje é 13 de Maio, e eu preciso te lembrar isso.

    Douglas Belchior, defensor de direitos humanos e professor no movimento negro Uneafro Brasil
    @negrobelchior

  • Em Cuiabá, cruzes denunciam morte de enfermeir@s

    Em Cuiabá, cruzes denunciam morte de enfermeir@s

    A morte de cada profissional da enfermagem que atuava na linha de frente do combate ao coronavírus importa. Em menos de dois meses, o país já perdeu 98 profissionais, mais do que Espanha e Itália juntos. Não foi por acaso. Os governos neoliberais que promoveram sucessivos cortes de recursos, entre outras políticas voltadas à privatização da saúde pública são os grandes responsáveis por essas perdas. E essa é a denúncia de trabalhadores de Cuiabá organizados na Frente Popular em Defesa dos Serviços Públicos e de Solidariedade ao Enfrentamento da Covid-19 nessa terça-feira, 12/05, Dia Internacional da Enfermagem.

    Em abril, Mato Grosso também registrou a morte de um enfermeiro. Athaíde Celestino da Silva, de 63 anos, faleceu em decorrência da Covid-19 após 37 dias de internação. O 37 também marca os anos de dedicação do servidor à Saúde Pública. Segundo o Conselho Federal de Enfermagem (http://observatoriodaenfermagem.cofen.gov.br/ ), outros 106 profissionais da Enfermagem estão infectados no estado; no Brasil, já são cerca de 13 mil (acompanhe aqui a atualização do Confen).

    Como não poderia deixar de ser, o ato dessa terça-feira – em defesa da vida, do Sistema Único de Saúde (SUS) e em homenagem aos profissionais da Enfermagem – foi realizado sem aglomeração. Desde as 8h, na Prainha, próximo ao Morro da Luz, região central de Cuiabá, os transeuntes podem ver uma cruz e uma vela para cada um dos profissionais que morreram nessa guerra. Nos arredores também há faixas com reivindicações e sons reproduzidos mecanicamente.

    A ideia é chamar a atenção da população para o número de mortos no Brasil como efeito do descaso dos governantes de todas as esferas – federal, estadual e municipal –, representada pela falta de investimentos e, consequentemente, equipamentos de proteção.

    Por mais que os representantes brasileiros se preocupem em demonstrar esforços para conter a pandemia agora, o mundo percebe a diferença entre os países que investem na saúde pública e os que não investem. Nos extremos, a Alemanha aparece como exemplo pelo baixo número de mortalidade, e seu histórico de investimento na saúde pública; na outra ponta, os Estados Unidos da América (EUA), cujo sistema de saúde é limitado pelos interesses do mercado, é o triste líder do ranking de mortalidade.

    Nessa terça-feira, foi possível acompanhar o ato realizado em Cuiabá por meio de uma live, transmitida pela página oficial da Adufmat-Ssind e SINASEFE no facebook. Alguns poucos organizadores estiveram presentes no ato distribuindo 500 máscaras, o que já está sendo feito pelas entidades que compõem a Frente desde o início de abril.

    Foto: Sandra Duarte, Sinasefe e AAMOBEP

    Em entrevista ao repórter Khayo Riberiro, do HNT/HiperNotícias, a professora aposentada da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso, Rosa Lúcia, apontou que o movimento cobra urgência em ações que assistam aos profissionais expostos ao coronavírus no exercício de suas atividades.

    “Hoje é o Dia Internacional da Enfermagem e essa movimentação que está acontecendo é uma manifestação silenciosa, de luto pelo número de profissionais de saúde e mais especificamente de enfermagem que já tombaram no Brasil por conta da infecção da Covid-19. Até ontem tínhamos o número de 98 profissionais de enfermagem que tinham morrido”, apontou a professora, que faz parte da comissão organizadora do movimento.

    Na reportagem, o jornalista cita ainda uma fala do

    presidente do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), Manoel Neri, dizendo que o Brasil enfrenta hoje uma situação grave no que diz respeito à evolução da pandemia entre os profissionais da saúde.

    “A situação no Brasil é crítica. O Observatório da Enfermagem, criado pelo COFEN para monitorar a evolução da pandemia entre profissionais de Enfermagem, já registra mais de 13 mil casos e 100 óbitos associados à Covid-19. A maior parte desses profissionais integrava pelo menos um grupo de risco. É inadmissível que estivessem expostos na linha de frente, contrariando as diretrizes sanitárias indicadas pelo Ministério da Saúde”, apontou Neri.

    Foto: Sandra Duarte, Sinasefe e AAMOBEP
  • Manifesto Leito para Todos

    Manifesto Leito para Todos

    Somos todos e todas cidadãos/ãs. Somos todos e todas brasileir@s. Por quê então alguns terão direito a leitos de UTI no caso de necessidade e outros encontrarão hospitais lotados, sem respiradores, sem pessoal médico e sem leitos disponíveis? O poder econômico não pode separar quem tem e quem não tem direito à vida. Em tempos de pandemia e de calamidade pública atestada até por um governo fascista e negacionista da ciência, todas as vidas devem ser tratadas de forma igualitária. Por isso, dezenas de entidades se uniram em um manifesto para acesso de todos e todas a TODOS os leitos disponíveis no Brasil, sejam do SUS ou das redes privadas. Na próxima quarta-feira, dia 13 de maio, às 14:00, o manifesto será oficialmente lançado em uma live transmitida pela Rede TV Unida (https://www.youtube.com/channel/UC2IuNUB3MrfUmE4-A5E-zkA). Mas os leitores dos Jornalistas Livres já podem ler e divulgar o material. Vamos fazer pressão no governo para que tenhamos garantido nosso direito à VIDA!

     

    Em poucas semanas a pandemia da COVID-19 vai levar o sistema de saúde brasileiro ao colapso, isto é, ao ponto a partir do qual não será possível atender a demanda de casos graves de internação e terapia intensiva. Como o próprio Ministério da Saúde admite, esse cenário se torna cada vez mais provável na medida em que: a curva de evolução da epidemia segue em crescimento; persistem dificuldades para a implantação das medidas de isolamento em áreas urbanas periféricas com condições precárias de moradia, saneamento, renda e trabalho; a mais alta autoridade do país desdenha dos impactos do vírus e da necessidade de medidas de contenção.

    O Sistema Único de Saúde (SUS), público, gratuito e universal, é o principal instrumento para enfrentar essa situação. Diversos estados têm mobilizado esforços crescentes para a ampliar a oferta de leitos por meio da adaptação de espaços assistenciais públicos existentes e da criação de hospitais de campanha. Medidas importantes, mas insuficientes frente aos enormes desafios que se apresentam a curto prazo. As secretarias estaduais e municipais não serão capazes de responder sozinhas a essa situação.

    Estudos sobre a demanda por cuidados intensivos indicam que em 53% das regiões de saúde será necessário dobrar a capacidade instalada de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTI) que para isso seriam necessários 18,6 bilhões de reais [1]. Outras projeções estimam que, a depender do cenário, o déficit pode chegar a 24.500 leitos de UTI e o esgotamento destes pode ser dar por volta do início do mês de maio. [2]. Quando se consideram as disparidades regionais, a situação pode ser ainda pior.

    Para além da insuficiência de leitos, corremos o risco de que o atendimento aos pacientes portadores do coronavírus reproduza uma incômoda marca estrutural do sistema de saúde brasileiro: a desigualdade. Em 2019, o Brasil contava com cerca de 15,6 leitos de UTI para cada 100.000 habitantes[1]. Todavia, para cada leito per capita disponível para o SUS, existem aproximadamente 4 disponíveis para os planos de saúde [3]. O sistema público utiliza cerca 45% do total de leitos de UTI [4], enquanto mais da metade se destina a 25% da população que é cliente de planos de saúde. A ciência tem mostrado que a organização fragmentada da rede hospitalar, decorrente da segmentação do acesso, pode limitar concretamente a capacidade de atendimento aos casos graves de COVID-19[5][6].

    Para enfrentar esta dramática e urgente situação, o poder público precisa tomar atitudes muito mais enfáticas para garantir atenção a todos os casos, independente da capacidade de pagamento. Faz-se necessário que o SUS assuma imediatamente a coordenação integrada da capacidade hospitalar pública e privada para que se organize uma resposta mais abrangente e efetiva. Países como Espanha, Irlanda e Itália já adotaram medidas nessa direção. O momento exige que o setor privado, incluindo planos de saúde e hospitais privados, colaborem de forma muito mais decisiva do que vem fazendo, dada a quantidade de recursos assistenciais que mobilizam: leitos, profissionais, respiradores, equipamentos, máscaras, entre outros. Exige também que, governos estaduais, Ministério da Saúde e governo federal
    assumam suas responsabilidades nesta questão. Evitar ou postergar essa decisão terá um impacto direto em vidas perdidas.

    É preciso fazer valer o que está previsto em preceitos fundamentais da Constituição Federal: a universalidade do direito social à saúde (art. 6º; art. 23, inciso II; art. 24, inciso XII; art. 194; art. 196; art. 197; art. 198; art. 199 e art. 200), o direito fundamental à vida (art. 5º, caput; art. 227 e art. 230), o direito fundamental à igualdade (art. 5º, caput, e art. 196), o fundamento da República Federativa do Brasil de dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III) e, por fim, o objetivo fundamental de construir uma sociedade justa e solidária (art. 3º, inciso I). A Constituição também prevê que (artigo 5º, inciso XXV), em caso de perigo público iminente, a propriedade particular pode ser usada por autoridade competente, mediante indenização posterior ao proprietário em caso de dano. O mesmo é afirmado pela Lei n° 13.979/2020, que estabelece o estado de calamidade pública, e na lei orgânica da saúde (Lei nº 8080/1990).

    Diante da necessidade de estabelecermos mecanismos práticos que viabilizem o acesso universal e igualitário aos serviços de saúde como prevê a Constituição de 1988; e da necessidade urgente de construção de uma resposta eficaz e solidária à epidemia, que salve a maior quantidade de vidas possível, propomos:

    1. A requisição administrativa pelo poder público, de forma emergencial e mediante indenização, de toda a capacidade hospitalar privada existente no país para o tratamento universal e igualitário dos casos graves da COVID-19 através do SUS. Isso deve acontecer de forma articulada ao setor privado, que por sua vez deve cooperar com recursos técnicos e assistenciais para o enfrentamento coletivo da pandemia.

    2. O controle e coordenação da utilização de todos os leitos públicos e privados pelo SUS, mediante a instauração de um sistema de regulação unificado de leitos gerenciado pelas secretarias estaduais. O acesso deve ter por base critérios clínicos e epidemiológicos, sem discriminação pela capacidade de pagamento individual.

    3. Que o Governo Federal, em articulação e cooperação com os estados e municípios apresente imediatamente projeções de demanda de leitos de internação, UTI e respiradores para todas as unidades da federação e regiões de saúde. Que sejam disponibilizados imediatamente os recursos financeiros e assistenciais necessários para a construção de capacidade hospitalar para todos que precisam, considerando critérios epidemiológicos e disparidades regionais. Isso pode ser feito utilizando a capacidade privada, adaptando serviços já existentes para que se tornem leitos de internação e UTI, e construindo quando necessário hospitais de campanha.

    4. O monitoramento, gestão e distribuição unificada dos estoques de equipamentos de proteção individual (EPIs) que garantam isolamento respiratório e segurança para todos os profissionais de saúde na rede pública e na rede privada. O mesmo vale para os testes da COVID-19, que precisam ser disponibilizados e distribuídos em uma escala muito superior ao que vem acontecendo.

    5. Estímulo às empresas com capacidade de produção de respiradores artificiais, monitores, leitos especiais de UTI e demais dispositivos necessários à ampliação do parque hospitalar, bem como articulação imediata com empresas industriais que possam ampliar essa produção em nível nacional. Importação imediata de quantos respiradores artificiais se dispuser. O mesmo vale para EPIs e testes de diagnóstico da COVID-19.

    Referências e Bibliografia Complementar

    [1] RACHE, B et al. Necessidades de Infraestrutura do SUS em Preparo ao COVID19: Leitos de UTI, Respiradores e Ocupação Hospitalar. Nota Técnica nº 3. IEPS.
    [2] ALMEIDA, JFF et al. Previsão de disponibilidade de leitos nos estados brasileiros e Distrito Federal em função da pandemia de Sars-CoV-2. Nota Técnica LABDEC/NESCON/UFMG n°2
    [3] COSTA, NR e LAGO, MJ. A Disponibilidade de Leitos em Unidade de Tratamento Intensivo no SUS e nos Planos de Saúde Diante da Epidemia da COVID-19 no Brasil. Nota Técnica. 19 de março de 2020
    [4] Dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES)
    [5] NORONHA, K et al. Análise de demanda e oferta de leitos hospitalares gerais, UTI e equipamentos de ventilação assistida no Brasil em função da pandemia do COVID-19. Nota Técnica n.1. CEDEPLAR/UFMG: Belo Horizonte, 2020.
    [6] CASTRO, MC et al. Demand for hospitalization services for COVID-19 patients in Brazil Harvard. medRxiv 2020.03.30.20047662.
    [7] KAY, G et al. Cenários para a demanda vs oferta de leitos de UTIs e respiradores na epidemia COVID-19 no Brasil.
    [8] WANG, D e Lucca-Silveira, M. Escolhas Dramáticas em Contextos Trágicos: Alocação de Vagas em UTI Durante a Crise da COVID-19. Nota Técnica nº 5. IEPS
    [9] As empresas de planos de saúde no contexto da pandemia do coronavírus: entre a omissão e o oportunismo. Nota Técnica GEPS/USP e GPDES/UFRJ.
    ________________________________________________________________

     

    APOIAM ESTA CAMPANHA

    Entidades e Movimentos (Atualizado em 03/05)

    Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB)
    Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS)
    Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco)
    Associação Brasileira dos Terapeutas Ocupacionais
    Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (Abia)
    Associação Brasileira REDE UNIDA
    Associação de Medicina de Família e Comunidade do Rio de Janeiro
    Associação de Musicoterapia do Estado do Rio de Janeiro
    Associação de Pós-Graduandos da Fundação Oswaldo Cruz (APG – Fiocruz)
    Associação dos Servidores da Saúde de Niterói
    Associação dos Servidores do Ministério Público do Trabalho e Militar (Asempt)
    Associação Nacional de Pós Graduandos (ANPG)
    Associação Paulista de Saúde Pública (Apsp)
    Central Única dos Trabalhadores (CUT)
    Central Única dos Trabalhadores PE
    Central Única dos Trabalhadores RJ
    Centro Acadêmico de Enfermagem da Escola Superior de Ciências da Saúde (CAEnf ESCS)
    Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes)
    Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec)
    Centro de Promoção da Saúde (Cedaps)
    Coletivo Adelaides
    Coletivo Afrodivas
    Coletivo Feminista Rosa Lilás
    Coletivo Gaúcho de Residente em Saúde
    Comissão de Direitos Humanos e Cidadania – OAB Niterói
    Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo
    Confederação Nacional de Associações de Moradores
    Conselho Nacional de Saúde (CNS)
    Conselho Regional de Assistentes Sociais do Rio de Janeiro (Cress-RJ)
    Conselho Regional de Psicologia do Ceará (CRP-CE)
    Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP-PR)
    Conselho Regional de Psicologia de Pernambuco (CRP-PE)
    Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro (Crp-RJ)
    Conselho Regional de Psicologia do Pará e Amapá (Crp-PA/AP)
    Conselho Regional de Serviço Social do Espírito Santo (Cress-ES)
    Cooperativa Habitacional Central do Brasil – COOHABRAS
    Diretório Acadêmico Florestan Fernandes
    Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEnf)
    Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social (Enesso)
    Federação Nacional dos Estudantes de Direito (Fened)
    Fórum de Educação Inclusiva de Niterói
    Fórum Nacional de Residentes em Saúde
    Forum Popular de Cultura de Ilhabela
    Frente Evangélicos pelo Estado de Direito
    Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde
    Grupo de Apoio a Prevenção da Aids de Florianópolis
    Grupo Pela Vida

    Jornalistas Livres
    Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas
    Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
    Movimento Nacional Quilombo Raca e Classe
    Movimento Pela Saúde dos Povos – Brasil
    Movimento Popular de Saúde (Mops) – Campinas
    Mulheres Negras Decidem
    Nenhum Serviço de Saúde a Menos
    Projeto Ruas
    Rede Brasileira de Cooperação em Emergências (RBCE)
    Rede Nacional de Médicos e Médicas Populares
    Rede Solidária em Defesa da Vida de Pernambuco
    Sindicato Nacional dos Servidores do Ministério Público da União – Seção São Paulo (SindMPU)
    Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo (SASP)
    Sindicato dos Agentes Comunitários de Saúde do Município do Rio de Janeiro
    Sindicato dos Assistentes Sociais do Distrito Federal
    Sindicato dos Assistentes Sociais do Estado do Rio de Janeiro
    Sindicato dos Bibliotecários do Estado do Rio de Janeiro
    Sindicato dos Farmacêuticos do Estado do Rio de Janeiro
    Sindicato dos Farmacêuticos do Rio Grande do Sul
    Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro
    Sindicato dos Nutricionistas do Estado do Rio de Janeiro
    Sindicato dos Petroleiros do Pará, Amazonas, Maranhão e Amapá
    Sindicato dos Psicólogos do Estado do Rio de Janeiro
    Sindicato dos Trabalhadores da Fundação Oswaldo Cruz (Asfoc-SN)
    Sindicato dos Trabalhadores em Saúde Trabalho e Previdência Social do Estado do Rio de janeiro
    Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente (Sobrasp)
    Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)
    Trabalhadores pelo SUS
    União Nacional dos Estudantes (UNE)
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  • Precisamos falar sobre a morte: guia do luto em tempos de coronavírus

    Precisamos falar sobre a morte: guia do luto em tempos de coronavírus

    Com reportagem de Flávia Martinelli e Ariane Silva, do blog MULHERIAS 

    O número de mortos pelo novo coronavírus no Brasil é um soco no estômago todos os dias. As notícias nos atualizam: uma, dez, 100 vítimas, 300 e agora mais de 600 pessoas morreram apenas nas últimas 24 horas. No momento em que esse texto é escrito somam-se 8.685 vidas levadas pela pandemia. Nessa semana, chegamos ao trágico patamar de terceiro país com maior índice de óbitos do mundo. Não dá tempo de sequer processar tanta informação.

    Mas, ainda que seja óbvio, é preciso lembrar o que dados revelam: além da irresponsabilidade e incompetência dos nossos governantes, cada número deve mostrar que TODA vida importa. Nesse momento de dor e sofrimento, o blog Mulherias, sempre atento às belas iniciativas das mulheres periféricas, tem a obrigação de fugir de sua pauta para falar sobre luto. Publicamos aqui o “Guia para pessoas que perdem um ente querido em tempos de coronavírus“, elaborado por uma rede espanhola de psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros e terapeutas especializados no assunto.

    O livro foi traduzido para o português por voluntários do Memorial das Vítimas do Coronavírus no Brasil e pela Rede de Apoio às Famílias que, por sua vez, reúne mais de 60 organizações solidárias à dor dos que sofrem o luto. “São orientações para ajudar a lidar com esses momentos difíceis de isolamento e incerteza, oferecendo outras maneiras que atendem à necessidade de compartilhar e expressar a dor com os outros e, ao mesmo tempo, permitir honrar a memória de nossos entes queridos falecidos”, diz o coordenador da iniciativa, o historiador Danilo Cesar.

    Danilo é taxativo sobre a situação que estamos vivendo: “os esforços para garantir a vida da população não estão sendo suficientes e a doença hoje castiga mais a população negra, pobre e periférica, cujas mortes sempre foram banalizadas.” Em uma live que foi ao ar no último sábado, do coletivo Jornalistas Livres, parceira da Rede, ele também lembrou da situação das populações indígena e carcerária, que estão sendo gravemente afetadas.

    Velórios rápidos sem ver o rosto do familiar

    Como se não bastasse a dor das perdas em si, as despedidas, em muitas cidades do país, estão com medidas de restrição por questões sanitárias. Em São Paulo, por exemplo, a prefeitura está restringindo a duração dos velórios a no máximo uma hora. Somente dez pessoas podem estar na sala ao mesmo tempo. O caixão é recoberto de papelão e fechado para a cerimônia. “É muito difícil. E ainda temos um presidente que insulta a população com o seu ‘e daí?’; o que agrava ainda mais essa sensação de isolamento no luto”, completa Danilo.

    De acordo com o Guia, os rituais de despedida são atos simbólicos que nos ajudam a expressar nossos sentimentos ante uma perda, colocar um pouco de ordem em nosso estado emocional caótico, estabelecer uma diretriz simbólica para os eventos da vida e nos permitir a construção social de significados compartilhados. “Eles abrem a porta para que tomemos consciência do processo de luto.”

    Covid-19 e as novas formas de lidar com o sofrimento

    A internet, por conta do isolamento social, é uma ferramenta útil para lidar com a perda de alguém nesse momento. Vale uma reunião virtual com família, amigos ou com a participação de um guia religioso. “Vale escrever um texto expressando as lembranças e sentimentos direcionados à pessoa falecida, acender uma vela enquanto diz algumas palavras para a pessoa ausente. Deixe um minuto de silêncio para expressar amor, perdão e gratidão”, recomenda o manual.

    Publicar homenagem em redes sociais sobre o legado de vida que aquela pessoa deixou é saudável. “E assim, compartilhando-o, dará aos seus contatos a oportunidade de expressar suas condolências e apoio, acompanhando-o através de palavras, músicas e imagens.”

    O recurso foi usado pela família da pastora Sandra Cristina da Silva, de Barueri (SP), que tinha apenas 41 anos. Seus parentes não puderam prestar homenagens como gostariam no dia do sepultamento. Sem poder se reunir, compartilhar histórias e abraços, as condolências estão registradas página do Facebook do Memorial, um espaço virtual criado para reunir e compartilhar manifestações de afeto a quem quem partiu. “Continua aí de cima cuidando de nós”, escreveu a mãe de Sandra, Margarida, em mensagem na rede social. O marido, Silvio, agradeceu pelos anos que dividiu com a mulher e relembrou da alegria e companheirismo dela.

    “A impossibilidade de velar e acompanhar o enterro é uma violência para os familiares e amigos”, afirma a jornalista Malu Oliveira, 63, ativista e pesquisadora que faz parte do coletivo Segura a Onda, plataforma colaborativa surgida na Espanha que conecta os grupos de apoio às vítimas da Covid-19. No Brasil, a entidade também faz parte da Rede que elaborou o guia e organizou em seu site uma galeria online para registro de memória das vítimas. “Estas famílias ainda sofreram muito por falta de acesso a hospitais ou durante a internação de seus parentes sem receber visitas. Nada vai substituir o abraço confortador, o ombro amigo na hora da dor. Mas o ritual virtual pode ajudar a diminuir a solidão do luto nesta situação de emergência.”

    Outra voluntária do projeto, a historiadora Elisiana Castro, de 44 anos, destaca a importância de buscar novas formas de viver o luto durante o isolamento social. “O luto não vai parar, a dor da perda não é banida, a pessoa não deixa de sentir, ou de precisar de amparo por que nós estamos num momento de pandemia”, explica ela, presidente da Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais (ABEC), que reúne estudiosos, pesquisadores e especialistas sobre o morrer. “Toda a sociedade deve apoiar as famílias no sentido de reconhecemos sua dor. Apesar de não ter recebido um funeral adequado e respeitoso, a pessoa querida não é apenas um número nesta soma macabra. Toda morte importa, cada número tem nome, idade, profissão e família.”

    Segundo os organizadores do Memorial e da Rede de Apoio, parentes e amigos não tratam apenas de comunicar a morte nas redes sociais e espaços virtuais, mas compartilham amor, afeto, abraços. “É esse abraço distanciado, mas real. Até me emociono quando falo porque é muito difícil reconhecer o quanto as pessoas estão desamparadas diante de uma dor tão grande como a da perda”, diz Elisiana, ciente de que a compaixão nos conecta como seres humanos. Mesmo que isso não dê conta, mesmo que não seja suficiente, enfim, estamos juntos.

    PARA SABER MAIS:

    • A Rede de Apoio às Famílias de Vítimas Fatais do Covid-19 no Brasil oferece apoio jurídico, psicológico e orientações sobre velórios, sepultamentos e rituais de despedida. A iniciativa faz também o monitoramento das mortes com jornalistas e cientistas sociais levantando informações sobre os casos. A rede pode ser contactada por Whatsapp ou Telegram no número (11) 93011-3281 e por e-mail em memorialcoronabrasil@gmail.com, e também pelo chat da página do Memorial no Facebook.
    • Outro projeto que registra por textos a memória sobre quem se foi, com mensagens de amigos e familiares, é o projeto Inumeráveis, que possui sitepágina no Facebook e Instagram. Por meio de um formulário é possível cadastrar novas histórias ou pedir ajuda de jornalistas voluntários para escrever um relato.
    • O Memorial das Vítimas do Coronavírus no Brasil monitora e compartilha relatos no Facebook e registra de forma mais permanente as histórias de vida na galeria do coletivo Segura a Onda. Todos os domingos, sempre às 20hs, o grupo convida a todos a acender uma vela, levar o celular ou bater palmas nas janelas em memória às vítimas. Abaixo, segue o vídeo-convite comovente que traz fotos de quem partiu.

     

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