Jornalistas Livres

Categoria: São Carlos (SP)

  • Irmão de Sara Winter torce para que ela seja presa por fabricar fake news

    Irmão de Sara Winter torce para que ela seja presa por fabricar fake news

    Diego Giromini, irmão de Sara Winter, torce para que a irmã seja presa logo por causa das ofensas aos ministros do STF
    Diego Giromini, irmão de Sara Winter, torce para que a irmã seja presa logo por ofensas ao STF

    Heroína da extrema direita brasileira e uma das apoiadoras mais famosas de Jair Bolsonaro, Sara Winter, de 27 anos, foi alvo de um mandado de busca e apreensão da Polícia Federal na operação que investiga as fábricas de fake news e ameaças contra membros do Supremo Tribunal Federal (STF).

    Na quarta-feira (27/5) Sara Winter teve seu celular e computador apreendidos, o que a levou a gravar um vídeo com novas ameaças e mais xingamentos contra o ministro Alexandre de Morais, que havia autorizado a operação. Ela chegou a dizer que pretendia “trocar socos” com Morais, a quem chamou de “covarde”, “filho da puta” e “arrombado”.

    Sara Winter foi uma militante nazifascista na Inglaterra durante a II Guerra Mundial. A atual Sara Winter, na verdade, não tem esse nome. Trata-se apenas do pseudônimo escolhido por Sara Fernanda Giromini —este o seu verdadeiro nome.

     

    Briga em Família

     

    A família Giromini vive em São Carlos, no interior de São Paulo. Mas não é tranquila a convivência de Sara Winter com seus parentes de sangue.

    Diego comenta o post da irmã Sara Winter: "presa logo"
    Diego sobre o post de Sara Winter: “Logo vc vai”

    Irmão dela, Diego Giromini postou no facebook que a PF não deveria ter levado apenas o celular e o computador de Sara. Deveriam levar vc também irmã querida. Mas logo vc vai”.

    No seu perfil no facebook, Diego Giromini se apresenta de uma forma inusitada: “Infelizmente irmão da Sara Winter”. Seguem-se emojis de fezes e de carinhas vomitando.

    Diego Giromini não suporta a irmã Sara. No youtube, ele conta que Sara foi prostituta, diz que ela não vê o filho desde o nascimento, já que o abandonou para que a mãe dela o criasse, denuncia que Sara é usuária de drogas.

    Sara Winter, que foi candidata a deputada federal pelo Democratas do Rio, nas eleições de 2018, afirma ser ex-feminista. Diz que agora está consagrada ao cristianismo, embora seja uma defensora fanática das armas. Ela afirma que pretende criar o filho “com base nos Dez Mandamentos”. Com esse currículo, trabalhou durante sete meses como coordenadora nacional de políticas para a maternidade no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, da ministra Damares Alves.

    Atualmente, Sara Winter organiza o grupo paramilitar chamado “Os 300 do Brasil”, que pretende defender à força de armas o governo de Bolsonaro. O grupo fica acampado na Praça dos Três Poderes.

     

    Diego Giromini: "Infelizmente irmão da Sara Winter"
    Diego Giromini: Infelizmente
  • Por que a Caminhada das Mulheres Lésbicas e Bissexuais é importante?

    Por que a Caminhada das Mulheres Lésbicas e Bissexuais é importante?

    “[…] com certeza não é isso que vai me fazer parar, porque eu não brigo por espaços, eu brigo por fé na emancipação.” –  Aline Anaya

     

    Centenas de mulheres participaram, no Centro de São Paulo, da 15ª Caminhada das Mulheres Lésbicas e Bissexuais. Com o tema “Luanas e Katianes, quantas mais? Resistiremos!”, elas protestavam contra a lesbofobia, responsável pela morte de mais de 120 mulheres em São Paulo, em 2016. Em entrevista à repórter Michelle Gomes, da Rede TVT, uma pergunta foi feita:

    A importância de vir toda hora aqui, pra rua, é pra que a gente mostre que nós existimos! Pra não se fazer apagamento, porque a mídia e todo o movimento LGBT não falam do L…” – Virgínia Figueiredo – Liga Brasileira de Lésbicas

    “As lésbicas não são visíveis dentro do movimento LGBT, o L praticamente não existe. Até mesmo dentro de um cenário – além do político, comercial, somos invisíveis. Os gays homens tem até um nicho comercial, entendeu? E a gente está sempre à margem.” – Rafaela Erre – Compositora

    Quando você toma um enquadro, você é tratada como um homem mesmo que você não queira ser um homem. São coisas que a gente precisa debater entre nós, mulheres lésbicas, porque quando a gente fala isso, percebemos que a mana da outra quebrada, lá da Zona Leste, passa pela mesma coisa.” – Gabi Nyarai – Ativista / Batalha Dominação

    “Uns dias atrás eu levei um enquadro da PM, eu, um companheiro e uma companheira minha – essa companheira não performa a feminilidade, no caso é uma companheira que costumamos chamar de butch, de lésbica caminhão – e esse policial tentou enquadrar a gente como se tivesse enquadrando um homem. Ele leu aquela mulher, mesmo ela falando que ela era mulher, como um homem.” – Fernanda Gomes – Organização da Caminhada Lésbica e Bissexual

    “No Rio de Janeiro a gente tem o vagão feminino no metrô e me tiram do vagão feminino direto… São várias questões de violência que a gente vem sofrendo e que a gente vai arrumando estratégias de sobrevivência.” – JLo Borges – Grafiteira / Coletiva Visibilidade Lésbica

    Queremos a demanda na saúde, porque nós não temos profissionais adequados e capacitados para trabalhar as nossas especificidades como lésbicas. Eles tratam a gente como se a gente como se fossemos héteros. A gente fala que não transa com homem, a gente fala que não usa camisinha, e eles continuam passando remédio como se ignorasse o que a gente fala – isso quando não encaminham a gente pra algum psicólogo ou igreja, porque somos todas doentes segundo eles.” – Virgínia Figueiredo – Liga Brasileira de Lésbicas

    “A importância da caminhada é trazer isso pra rua, as mulheres virem pra rua e entenderem que lesbofobia mata. A lesbofobia existe e mata todos os dias mulheres. O ano de 2016 foi um ano que teve mais de 120 casos de morte por lesbofobia aqui no estado de São Paulo.” Fernanda Gomes – Organização da Caminhada Lésbica e Bissexual

  • Era uma vez um ponto iluminado nas madrugadas do Centro de São Paulo…

    Era uma vez um ponto iluminado nas madrugadas do Centro de São Paulo…

    Segunda-feira, dia 24 de abril de 2017, quase dez horas da noite. Um segurança interrompe a conversa da galera no jardim. A estudante coloca os cadernos na mochila. Dois amigos fecham seus laptops – quase sem bateria pois as tomadas elétricas estão lacradas na sala de convivência. Um senhor sexagenário mergulhado na revista de arte leva alguns instantes para entender por que a funcionária tocou seu ombro e atrapalhou a leitura. Era hora de ir embora da Biblioteca Mário de Andrade. O prefeito João Dória Júnior que mandou.

    O fim do horário estendido da maior biblioteca de São Paulo, que por um ano e meio funcionou por 24 horas, sete dias por semana, com todas as portas abertas, foi melancólico. Funcionários estavam visivelmente chateados –  pela interrupção dos serviços e pela perda de seus empregos. Uma tranca e um cadeado grandão foram passados no portão por guardas da GCM, a Guarda Civil Metropolitana. Tinha até um carro da Polícia Militar na rua para conter os tristes notívagos que se reuniram na portaria da Mário de Andrade para protestar. Uma garota tentou devolver um livro às 21h30 mas os guardas não a deixaram entrar.

    A partir de agora, aliás, ninguém mais poderá estender uma noite tendo ao alcance da mão um acervo de mais 50 mil livros circulantes entre os mais de 7 milhões de itens, entre livros, fotos, periódicos e documentos. Dória não gosta disso, não. Diz que custa caro.

    O corte do horário da Biblioteca Mário de Andrade vai economizar cerca de R$ 2.200 por dia. Ou R$ 800 mil por ano. Menos do que os R$ 804.959,44 que o prefeito Júnior gastou APENAS com propaganda nos principais programas de televisão para divulgar o programa Corujão da Saúde, sua principal plataforma de campanha. Dória também diz que pouca gente está frequentando o horário noturno na biblioteca.

    Quando o horário extendido foi implantado – depois de três anos de estudo – o aumento de custo foi de cerca de 30%, com abertura ao público também nos finais de semana. Quem conta é o ex-supervisor de planejamento da Mario de Andrade, o historiador Fabrício Reiner, que participou de todo o processo e estava na portaria da biblioteca. Inconformado. “O número de livros emprestados dobrou quando a biblioteca passou a ficar aberta 24 horas. Antes, o fluxo era de 1500 pessoas por dia. Em 2016, a média foi de 3 mil visitantes por dia. Está tudo em relatório!”.

    Doria diz que não é bem assim. Fala que o público não só diminuiu como deixou de pegar livros emprestados. O prefeito Júnior só não lembrou que os eventos e atividades noturnas foram cancelados. Também esqueceu de medir o impacto na permanência no local quando tampou as tomadas de energia para carregamento de celulares e notebooks. Nem mencionou, ainda, a retirada de jornais e periódicos da sala de convivência, entre outras pequenas perversidades econômicas. Ah, a mudança no tipo de programação também não foi levada em consideração, claro.

    Hoje, em vez de roda de samba, há espetáculo de flamenco na Mário de Andrade. Nada contra. Mas quem quis assim foi o atual diretor da biblioteca, o milionário e ex-diretor da editora Cosac Naify, Charles Cosac. Ele também acabou com as baladas que aconteciam um sábado por mês. Inimaginável ele permitir, por exemplo, mais um Sarau Erótico, que em 2015 contou com apresentação do grupo de teatro Sensus, estendida até 4 da manhã com festa que amanheceu na rua. Inesquecível para quem estava lá.

    “Infelizmente vejo um trabalho de quatro anos arruinando. Tanto a programação quanto o horário expandido foram criados a partir das necessidades dos frequentadores. Muitos trabalham o dia todo no Centro, que é um local de aglomeração. Tudo foi feito para atender a todo e qualquer cidadão em qualquer horário do dia e noite”, conta Reiner, o ex-funcionário, que cuidava do planejamento da biblioteca. O diretor do local na época, o filósofo e professor da USP, Luiz Armando Bagolin, entendia a Mário de Andrade não como um depósito de livros, mas como um centro de encontros.

    Não espanta, portanto, notar que nem todos os que estavam ali na portaria para serem expulsos às 22 horas eram exímios apreciadores da leitura. As portas abertas e a fachada iluminada a noite toda abrigava os usuários de wi-fi grátis, gente que fugia do frio ou que perdeu o último metrô ou ônibus e moradores de rua que travavam uma luta inglória contra os olhos dos seguranças e o sono nas mesas de madeira. A presença desse público, por sinal, é um dos incômodos do prefeito.

    Intérprete de Mário de Andrade no teatro e na TV, o ator Pascoal da Conceição, devidamente caracterizado como o poeta e escritor, perguntou: “E então é assim? Fecha a porta porque essa gente feia toda está incomodando a biblioteca? Eu dormi tantas vezes em cima de livro… Acho que é uma das coisas mais deliciosas de se fazer. É de uma mesquinharia inescrupulosa o que estão fazendo com a Cultura”, diz o ator-ativista.

    Pascoal, quel também é conhecido em todo país também por ter vivido o personagem Doutor Abobrinha, do premiado infantil Castelo Rá-Tim-Bum, na TV Cultura, segue em sua bravata: “temos uma luta muito forte no campo do simbólico nesses tempos difíceis. A Cultura é um ganho que entra dentro de você, que faz transformar o mundo. É na Cultura que a gente gera direitos humanos, igualdade entre as pessoas, avanços em relação ao convívio. Quando atacam a Democracia e a Liberdade e isso chega na Cultura, o que se ataca, no fundo, é o lugar onde se geram os desejos, as vontades. É contra isso que temos a felicidade guerreira, emotiva e humana da luta. A luta é essa”. A fala é emocionada, com uma lágrima escorregadia que depois emenda numa outra enquanto o ator lembra que Mário de Andrade foi artista engajadíssmo na gestão pública da cidade.

    De fato, em 1935, o escritor, musicólogo, folclorista, autor de “Paulicéia Desvairada”, festeiro, principal articulador do movimento modernista, criou uma biblioteca circulante com uma caminhonete que levava livros nas casas dos leitores. Tudo para que o prazer da leitura chegasse à população. Então primeiro diretor do Departamento de Cultura de São Paulo, Mário de Andrade falou para o prefeito na época: “Em vez de esperar em casa pelo seu público, vai em busca de seu público onde ele estiver.”

    A biblioteca Mario de Andrade passa a funcionar das 8h às 22h, de segunda a sexta-feira, e aos sábados e domingos, das 8h às 20h.

    Leia o comunicado oficial anunciado pela direção: http://bit.ly/2piGsZW

     

  • Entidades negras repudiam racismo em ônibus de São Paulo

    Entidades negras repudiam racismo em ônibus de São Paulo

    racismo é crime
    Pedofilia é crime. Racismo também é!

    Entidades, ativistas e parceiros do movimento negro repudiam a veiculação de propaganda contra a pedofilia, nos ônibus que circulam na cidade de São Paulo. Sob a responsabilidade da CET, SPTrans e Prefeitura Municipal, a peça publicitária mostra um homem negro agarrando uma garotinha branca, ajudando a cristalizar a criminalização da população negra.

    Jornalistas Livres entraram em contato com a SPTrans e receberam a seguinte resposta: “Esclarecemos que a escolha das tonalidades das ilustrações tem como única finalidade contrastar a figura infantil com a figura adulta. Não houve nenhum outro direcionamento. Independentemente desse aspecto técnico, informamos que esta edição do Jornal do ônibus foi retirada.”

    Infelizmente, a explicação dada pela SPTrans foi muito ruim. O racismo, sabidamente, expressa-se exatamente na escolha da tonalidade clara para identificar atributos de bondade, pureza e caráter. A tonalidade escura, em oposição, é escolhida pelos racistas como atributo do mal. É aí mesmo que se manifesta o racismo.

    A Prefeitura deveria pedir desculpas. Seria mais digno de seu histórico de defesa dos Direitos Humanos. A própria SPTrans já deu exemplos de atuação contra o racismo e pela inclusão cidadã de todos. Fez isso, por exemplo, com a confecção do Bilhete Único com estampa alusiva à Consciência Negra, lançado em 2014. Ou com o Bilhete único de combate à Violência Contra a Mulher, 2015. Também quando foi pioneira no reconhecimento do uso de nome social no Bilhete Único.

     

    Abaixo, a íntegra da nota de repúdio assinada pelas entidades negras

     

    Entidades, ativistas e parceiros do movimento negro, vimos a público repudiar a veiculação de propaganda institucional do transporte público na cidade de São Paulo, de responsabilidade da CET, SPTrans e Prefeitura Municipal.
    Trata-se do periódico “Jornal do Ônibus”, precisamente a peça publicitária de número 1.016 de 6 a 19 de dezembro de 2016. Aparentemente é uma campanha inofensiva e legítima, de combate à pedofilia. Não há qualquer dúvida de que esta é uma campanha muito importante e necessária, o problema não é esse. O problema, aí sim, é a forma como a questão é apresentada: um homem negro agarrando uma garotinha branca.
    No Brasil, a criminalização da população negra não é algo recente. Primeiramente, é importante lembrar que o povo negro jamais foi inserido no projeto de país chamado Brasil. Idéias como as de Lombroso, que diziam que nós negras e negros, pelo nosso fenótipo, somos “naturalmente inclinados ao crime”, reafirmando todo um processo de exclusão, perseguição, intolerância, na estrutura de super-exploração que sempre foi a tônica das relações sociais de raças no território tupiniquim, inclusive existiu mesmo uma tentativa de embranquecimento da população, um processo de eugenia para “limpar o Brasil”. As leis que criminalizavam nossas tradições, que proibiam nossa circulação nos espaços públicos, como a “lei da vadiagem”, tudo isso é para dizer que já naquela época, antes da famosa e duvidosa “abolição”, dizer “negro” e dizer “bandido” era basicamente a mesma coisa.
    O tempo passou, mas ainda somos estes “suspeitos naturais”, potencialmente “perigosos”, o Estado brasileiro ainda não nos inseriu plenamente no conceito de cidadania, ainda hoje a perseguição de nossas tradições, principalmente religiosas, é um fato concreto. Nós que fomos empurradas(os) pela história a ocupar as periferias, territórios militarizados, dependemos do serviço público, somos sub-representados politicamente, não dirigimos as grandes empresas, somos minoria no Judiciário, quase não estamos nas universidades públicas, somos a maioria da população brasileira e pagamos mais impostos que os ricos.

    Já basta de criminalização!

    Ainda hoje estamos morrendo e sendo encarceradas(os), é essa a solução de um Estado que é palco de um genocídio em curso.

    Essa publicidade racista da prefeitura de São Paulo, está em todos os ônibus e terminais da capital e alcançará milhões de pessoas, reforçando uma ideia de criminalização, que em nosso país tem uma história própria, a violência sexual, iniciada enquanto projeto de Estado pelos primeiros colonizadores europeus, e principalmente a violência contra crianças deve ser combatida com rigor, é fato hoje nas sociedades modernas, que o lugar mais perigoso para crianças, mulheres, idosos, é dentro do próprio lar, violência doméstica que dificulta o combate, existente em todas as camadas sociais, independente de cor, credo ou conta bancária.

    Portanto, não justifica a escolha deliberada de usar imagem de um homem negro agarrando uma garotinha branca.

    Exigimos que a propaganda seja retirada, e além da retratação, consideramos fundamental uma ação compensatória de combate ao racismo e à discriminação dentro dos ônibus e terminais, afinal de contas, da mesma forma que os efeitos da escravidão negra no Brasil são irreparáveis, o efeito de uma propaganda como essa pode ser mortal, basta lembrarmos do jovem negro que foi linchado na rua amarrado num poste, “confundido com um bandido”.

    Não aceitamos um Estado cúmplice!

     

    Assinam esta nota:
    Círculo Palmarino, corrente nacional do movimento negro.
    Rede Antirracista Quilombação.
    UNEGRO.
    Coletivo Sócio-cultural Simbiose Urbana.
    Espaço Cultural Carlos Marighella.
    Brigadas Populares.
    Coletivo Kilombagem.
    Núcleo de Consciência Negra da USP.
    Coletivo de Entidades Negras – CEN.
    Agentes de Pastoral Negros do Brasil.
    Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e favelas (MLB).
    Coletivo Opá Negra.
    Insurgência.
    Lsr.
    Coletivo Rosa Zumbi.
    Sônia Regina Nozabielli.
    Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida – departamento de Política Puc-SP.
    Givanildo M. da Silva-Giva.
    Luiz Henrique Pereira da Silva.
    José Henrique – Militante Anti-Racista.

  • O racismo não bateu à porta, mas entregou uma carta

    O racismo não bateu à porta, mas entregou uma carta

    Não é novidade que o Brasil é um país racista. A falsa impressão de superação desta realidade por meio de avanços legítimos do direito dos negros e das discussões em torno da igualdade étnica no país é sempre demonstrada nos casos cotidianos de racismo e intolerância religiosa. Agora, o alvo foi o Ilê Asè Osalá, casa de energias dedicada ao orixá Oxalá localizada em São Carlos (SP).
    Exatamente na madrugada após o Dia da Consciência Negra, na segunda feira (21 de novembro), uma carta anônima foi deixada na caixa do correio do Ilê contendo forte teor racista, agressões às práticas religiosas da casa e também ameaças de morte. O material, que já foi entregue à polícia, deixou a Yalorixá Luciana e o Babalorixá Junior de Odé (zeladores de santo da casa) e todos os seus filhos-de-santo indignados. A casa é frequentada por muitas crianças e famílias inteiras que até hoje estão perplexas com tamanho ódio dedicado.

    Cartas enviadas para o terreiro de candomblé Ilê Asè Osalá em São Carlos (SP).
    Cartas enviadas para o terreiro de candomblé Ilê Asè Osalá em São Carlos (SP).

    Na carta, que não tem assinatura, as famílias são chamadas de “família de macacos” e os autores ameaçam matar nas esquinas os frequentadores da casa, adeptas do Candomblé da Nação Ketu, uma das diversas culturas religiosas dos Povos Tradicionais de Matriz Africana no Brasil.
    O caso, apesar de assustador, revela a faceta do racismo ainda muito presente no país. Descendente de escravos que trabalharam nas fazendas de café que deram origem à cidade de São Carlos, a Yalorixá Luciana tem uma trajetória de lutas por igualdade e pela liberdade religiosa. Participou de movimentos negros na cidade e foi a partir daí que descobriu que “o negro é lindo”. “O candomblé é uma religião que prega a liberdade. Nossos membros são livres. Mas as pessoas não querem que os outros sejam livres. Vivem da culpa e do sofrimento. Aqui somos felizes e é isso que mantém nossa casa aberta”, destaca ela. E arremata “queremos fazer uma realidade melhor. Devolver para as pessoas todo o bem que recebemos dos nossos santos. Queremos respeito, que os meu filhos tem prazer de usar o branco e o direito de louvar os meus ancestrais”.


    Por compreenderem que têm amparo legal, a Yalorixá Luciana e o Babalorixá Junior de Odé decidiram registrar um Boletim de Ocorrência (B.O.) por crime de racismo religioso, racismo, crime contra a integridade física e ameaça de morte, exigindo assim do poder público uma postura efetiva para o combate ao racismo e ao racismo religioso na região. A ausência de um autor na carta impediu que o B.O. fosse feito no dia do ocorrido. O documento foi expedido três dias depois no 2º Distrito Policial de São Carlos após apoio e presença de agentes de diversos movimentos sociais da cidade.
    Embora as religiões afrobrasileiras (como a Umbanda e o Candomblé, entre outras) sejam marcadas pela luta e resistência histórica do povo negro, enfrentando desde sempre a discriminação, a intolerância e o racismo no Brasil, casos de ataques como esse ocorrido em São Carlos, infelizmente, têm sido cada vez mais noticiados no país: terreiros criminosamente incendiados, atos de vandalismo e depredação ao patrimônio cultural e religioso das Casas, agressão física e também assassinatos de adeptos dessas religiões.
    Há pouco mais de um mês, o Templo Religioso Hermínio Marques, terreiro de Umbanda localizado no distrito de Bueno de Andrada, na região de Araraquara-SP, no interior do Estado de São Paulo, teve seu prédio incendiado e seu patrimônio religioso depredado, ficando completamente destruído. No ano passado, em cerca de três meses, cinco terreiros de religiões de matriz africanas foram atacados em Brasília-DF e cidades vizinhas.
    Dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) mostram que, de 2011 a 2014, foram registrados no Brasil 462 casos de intolerância religiosa contra pessoas ligadas às religiões, por meio do Disque 100, central de atendimento para denunciar violações de direitos humanos.


    Em cenários assim tão temerosos, é sempre válido (e extremamente importante) lembrar que a Constituição de 1988 garante o tratamento igualitário de todos e todas, independente de crenças religiosas. Garante também um Estado laico, que não possua uma religião oficial e tenha como obrigação a garantia de que os seus cidadãos possam preservar suas culturas e suas práticas tradicionais. Há ainda outros amparos legais, como a Lei nº 9.459, de 1997, que considera crime a prática de discriminação ou preconceito contra religiões. Os cultos das religiões de matriz africana no Brasil fazem parte daquilo que se afirma: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” ( Art. 5 da Constituição da República Federativa do Brasil).
    Assim, cabe às autoridades legais e representativas das diferentes partes da sociedade civil uma resposta para alguns questionamentos: O povo-de-santo (não só do Ilê Asè Osalá, mas de todo o Brasil) está sozinho nessa luta pela própria vida e pela liberdade de exercer a sua cultura? Os negros nesse têm direitos e são também eles os cidadãos de quem a Constituição Federal brasileira fala em assegurar a liberdade religiosa.
    Quantos incêndios mais terão que ocorrer? Quanto mais de destruição do patrimônio cultural e religioso afrobrasileiro? Quantas agressões físicas? Quantos assassinatos a mais serão o suficiente para que esse estranho paladar institucional, que parece tomar com gosto o sangue do povo de descendência africana, combata o racismo nesse país em que mais da metade da população é negra?
    O racismo religioso coloca carta anônima na caixa do correio, às vezes, mas depreda e atea fogo em muitas outras. O racismo religioso ainda agride e mata. RACISMO MATA. RACISMO É CRIME.