Jornalistas Livres

Categoria: Voz das Periferias

  • Ocupação Mauá celebra a vida, a cultura e o amor, apesar da ameaça de despejo

    Ocupação Mauá celebra a vida, a cultura e o amor, apesar da ameaça de despejo

    Fotos dos Jornalistas Livres

     

    O edifício da rua Mauá, bem ao lado da Estação da Luz, no centro de São Paulo, é o lar e a moradia há 10 anos de cerca de 300 famílias sem teto. Crianças, mulheres grávidas, idosos convivem ali em harmonia, celebram alegrias e dividem as tristezas. Agora, este oásis de cultura, amor e resistência, bem no meio da cidade tão degradada, está ameaçado de desaparecer, por conta da ordem de despejo do juiz Carlos Eduardo Borges Fantacini, da 26ª Vara Cível.

    O prédio onde fica a Ocupação Mauá passou mais de 20 anos completamente abandonado, apodrecendo por falta de uso.

     Em 2007, um grupo de famílias trabalhadoras, engajada no movimento por moradia digna, ocupou o edifício e deu novo sentido ao velho prédio. Em comum entre elas, estava a baixa renda e a incapacidade para arcar com os custos do aluguel, cada vez maiores, mesmo em imóveis de remotas periferias.

    De lá para cá, foram inúmeros mutirões para a limpeza, reforma e conservação da habitação.

    Neste sábado, 24/6, a ocupação abriu seu grande pátio comunitário para eventos e atividades culturais, num encontro que misturou muita música, poesia, grafite e teatro.

    O festival foi uma celebração de amor, de luta e de união, mas também um apelo para que não se cumpra o decreto de reintegração de posse, que representa o fim do sonho de uma vida coletiva, sob um teto comum, das famílias que serão colocadas na rua.

    Veja as fotos e o astral lindo da ocupação, porque…

    QUEM NÃO LUTA TÁ MORTO!

     

    #NenhumaOcupaçãoAMenos

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  • Marcha da Maconha percorre as ruas do centro de Campinas (SP)

    Marcha da Maconha percorre as ruas do centro de Campinas (SP)

    No sábado, 27 de maio, aconteceu em Campinas (SP) Marcha da Maconha de 2017  com o tema: “Prender pra quê? Fumar Sem Temer!”.  O ato levou dezenas de pessoas às ruas do centro da cidade no interior paulista, os manifestantes  pediam a legalização do uso da maconha e discutiam  a questão carcerária do Brasil relacionada  à criminalização da erva.

    Encarcerar não garante mais segurança e não muda a realidade das ruas. Quanto mais se prende, mais violência se cria e  a mercê de um estado paralelo criado pelo crime organizado. O maior problema da proibição do uso de drogas não é o uso de drogas, mas a própria proibição, em si que gera o tráfico, é o que gera a violência.

    Na atual legislação, cabe ao policial definir quem é usuário ou traficante,  existe o tráfico que  transporta drogas em aviões, helicópteros e passam impunes contrapondo com o traficante que  geralmente  é jovem negro, pobres e periférico  que são encarcerados com penas desproporcionais e revelam a face do racismo institucional.

    A  legalização das drogas ou a adoção de penas alternativas para o pequeno traficante poderia liberar até 25% das vagas em presídios para combater a superpopulação carcerária no país.

    Estudos  do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) publicados Atlas da Violência 2016 revela que há um aumento de quase 20% nos homicídios de negros na última década. No mesmo período, a taxa de assassinatos para não negros diminuiu em 15%.

    Os manifestantes também defenderam o cultivo caseiro da maconha.

    Por Fabiana Ribeiro – Jornalistas Livres

     

  • Ato em solidariedade a Rafael Braga

    Ato em solidariedade a Rafael Braga

    “Povo negro lindo é povo negro forte! Que não teme a Luta; que não teme a Morte!” Por Rafael Braga!

    Nesta segunda, 24 de abril, foi realizado na Avenida Paulista, um Ato-Vigília em solidariedade a Rafael Braga, condenado no último dia 20 de abril a 11 anos de prisão  por suposto trafico de drogas e associação para o tráfico. O Ato político é um entre tantos outros que acontecem no Brasil, em universidades e espaços públicos.

    A concentração começou a partir das 18h00 no MASP. Os organizadores entre eles Mães de Maio, Frente Alternativa Negra, Agenda Preta, Contra o Genocídio negro e UNEafro Brasil,  contaram com um carro de som que era aberto a todo negro que quisesse falar em nome de algum coletivo ou por si mesmo. Mas o ato não se deu apenas no âmbito do discurso, contando com performances de um coletivo de jovens negros que denunciavam o encarceramento e o genocídio da juventude negra.
    Além de representantes e militantes de diversos coletivos do movimento  negro, inúmeras pessoas não vinculadas a nenhuma organização estiveram presentes com velas e cartazes. Nota-se que o ato foi inteiramente protagonizado por homens e mulheres negras de diversas gerações. A denúncia à violência estatal foi uníssona, mas houve espaço para a diversidade de ideias durante as falas. As principais falas pontuaram como o caso de Rafael representa o estado da justiça no Brasil: seletiva, racista e classista, justificado por meio da guerra às drogas. Muitos deram testemunhos de ações violentas que passaram na mão da polícia militar.
    A marcha seguiu de forma organizada e combativa até a frente do Escritório da Presidência da República em São Paulo, que fica em frente ao metrô Consolação, na Avenida Paulista. O objetivo seria exigir providências  do Governo Federal em relação aos abusos cometidos pela PM. O fim da Polícia Militar era exigida em gritos de ordens entoados ao longo do ato.
    Essa mesma Polícia Militar que  acompanhou a vigília, inicialmente observando e filmando as movimentações do ato, acompanhando de longe o caminho e, finalmente, esperando os manifestantes no final do ato. Não causou espanto que estivessem prontos para iniciar mais um daqueles massacres tão comuns a um estado que reprime qualquer forma de democracia que supere os limites burgueses.

    O ato teve fim na frente do escritório com a simbólica ação de deixar os cartazes e velas em frente a porta de entrada, esperando que assim a voz de muitos, dessa vez, não fosse silenciada pelas autoridades.

  • PELO DIREITO À MORADIA, MANDELA RENASCE

    PELO DIREITO À MORADIA, MANDELA RENASCE

    “E o Mandela, daqui a aproximadamente uma hora, renascerá de novo”. Essa foi a constatação de Eunice, uma das coordenadoras da Ocupação Nelson Mandela, em Campinas, a 1h58 da madrugada de sexta-feira (21). Naquele momento, ela passava as instruções que precederam a saída das famílias rumo ao terreno a ser ocupado.

    O local escolhido pela comunidade fica numa região industrial de Campinas, no distrito de Ouro Verde, periferia da cidade. Nas proximidades do bairro Jardim Nossa Senhora Aparecida, que está em processo de regularização fundiária, a propriedade de 300 mil m² – equivalente a cerca de 30 campos de futebol – é uma área agrícola localizada no perímetro urbano do município, há décadas inutilizada e sem cumprir nenhuma função social.

    HISTÓRICO

    Anteriormente, os moradores e moradoras da Ocupação Mandela foram despejados de suas residências no dia 28 de março deste ano, após reintegração de posse da área localizada no Jardim Capivari, em Campinas. Cerca de 600 famílias ocupavam a área inutilizada há 44 anos, desde julho do ano passado. Não é a primeira reintegração de posse enfrentada pela Comunidade. Em agosto de 2016, a Polícia Militar já havia realizado uma ação que retirou 30 famílias do local, que retornaram à área logo em seguida.

     

     

    Ocupação Nelson Mandela

    NOITE ADENTRO

    A maratona até a consolidação da ocupação foi longa. Começou na manhã de quinta-feira (20), quando a coordenação do movimento, junto à rede de apoio, articulou procedimentos durante o todo dia para serem adotados durante a ocupação do novo terreno.

    No início da noite as famílias já se encontravam em um ponto base, para mais tarde seguirem rumo ao novo espaço de ocupação.

    Atentos às instruções, que eram reforçadas periodicamente por pessoas da coordenação, os moradores e moradoras se organizaram em equipes. Alguns ficaram responsáveis pela segurança, outros pela construção dos barracos e um terceiro grupo pela alimentação.

    Por volta das 2h30, as famílias começaram a organizar os pertences nos ônibus para seguir em direção ao terreno. Após um percurso por vias asfaltadas, o acesso a uma estrada de terra indicava que o destino estava próximo.

    Já passava das 3h30 da manhã quando os primeiros pontaletes de madeira começaram a ser fincados no chão. Pouco a pouco, sem muita demora, surgiram as primeiras cabanas de lona no terreno, até então inutilizado. A chuva que caiu no início da manhã na região não foi empecilho para o trabalho, que seguiu durante todo o dia.

     

    Ocupação Nelson Mandela

    MANDELA RENASCE COM FORÇA

    A comunidade trabalha incansavelmente na reconstrução da Ocupação Nelson Mandela. As 200 famílias começam a ocupar a área, cerca de 60 famílias já estão instaladas no terreno e trabalham em mutirão auxiliando as outras que estão chegando.

    As famílias recebem o apoio da população por meio de doações,  voluntários de diversas áreas auxiliam e dão assistência às famílias. Mutirões solidários constroem os barracos e começam a construir os banheiros comunitários.

    A Ocupação Nelson Mandela mostrou que está mais viva do que nunca, com a certeza de que enquanto houver famílias sem moradia e áreas que não cumprem função social, existirá, também, ocupação, resistência e luta.

     

    “Nenhum poder na Terra é capaz de deter um povo oprimido, determinado a conquistar sua liberdade” (Nelson Mandela, 1961).

    Mandela resiste!

     

    Por Ana Haddad, Fabiana Ribeiro e Geisa Marques

  • RAFAEL BRAGA: QUANDO A JUSTIÇA MATA A JUSTIÇA!

    RAFAEL BRAGA: QUANDO A JUSTIÇA MATA A JUSTIÇA!

      O Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, na pessoa do magistrado Ricardo Coronha Pinheiro, condenou Rafael Braga a 11 anos e três meses de reclusão e ao pagamento de R$ 1.687 (mil seiscentos e oitenta e sete reais) por tráfico de drogas e associação para o tráfico. A sentença foi publicada no dia 20 de Abril de 2017, mas ainda não transitou em julgado (ainda está no prazo para apresentação de recurso contra a sentença condenatória), ou seja, não vamos tratar Rafael como culpado, conforme nos garante a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LVII (cinquenta e sete), que afirma que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória“. As circunstâncias e algum senso de “justiça” nos permitirão manter esta postura, ainda que a condenação seja confirmada, conforme se pretende afirmar neste texto.

      A leitura da sentença penal fornece os elementos de sua própria contradição. Por isso, citaremos aqui alguns trechos da decisão do juiz. A análise será feita em três partes (a Terra, o Homem e a Luta), em franca alusão ao livro “Os Sertões” de Euclides da Cunha. Mais uma vez leremos sobre o conflito entre forças de repressão e gente que só deseja viver a vida sem fazer ou sofrer mal.

    A TERRA

      Brasil. Estado do Rio de Janeiro. Cidade do Rio de Janeiro. Bairro da Penha. Comunidade da Vila Cruzeiro. Rua 29. Local conhecido como “Sem Terra”. Vai ficando menos turístico conforme se aprofunda na geografia do local: o país é menos “tropical” e a “cidade é menos maravilhosa” naquele canto em que Rafael Braga foi torturado e preso por policiais militares.

      “Sem Terra” é uma denominação que não conhecemos a origem, mas representa dois fatos de máxima importância para compreender a relevância da condenação de Braga.

                – O direito interno é inerente ao território. A isto chamamos jurisdição. Não se pode falar em Estado e aplicação de leis estatais sem a delimitação de um território. Não se pode aplicar (via de regra) leis brasileiras fora do Brasil. Um hipotético lugar “sem terra” é um lugar “sem lei” que possa ser aplicada.

                – Ser “sem terra” é ser desprovido de propriedade privada. A opressão de classe se dá sobre aqueles que são despossuídos. O capitalismo impôs a confusão entre propriedade e riqueza.

      Em suma, não é de se estranhar que este lugar – SEM TERRA – seja cenário de [I] aplicação de medidas de exceção como as que ocorreram com Braga (tortura; acusação falsa; racismo institucionalizado) que, assim como os moradores da região [II], é um pobre sem propriedade que lhe garanta alguma riqueza. Ali, no “Sem Terra”, o direito se revela tão somente como instrumento de opressão de classe [e raça].

      Na sentença, a questão do local foi levantada mais de uma vez como “fundamento” para que o juiz pudesse condenar Rafael Braga, conforme se pode ler:

     

    Registre-se que a localidade em que se deu a apreensão do material entorpecente de fls. 12 e 13 (vide laudo de exame de entorpecente às fls. 99/100), mais precisamente na região conhecida como “sem terra”, no interior da Comunidade Vila Cruzeiro, no Bairro da Penha, nesta cidade, é dominada pela facção criminosa “Comando Vermelho”, conhecida organização criminosa voltada a narcotraficância.

    (…) segundo relato dos policiais que efetuaram a prisão do réu e a apreensão do material entorpecente, o local é conhecido como ponto de venda de drogas. (grifo nosso).

               

     

       

     

      Em outras palavras, o que o juiz diz é: se não estivesse na região “sem terra”, não teria sofrido a condenação por tráfico de drogas. Rafael Braga não foi acusado por ter sido flagrado comercializando maconha ou cocaína, mas por estar no local – vizinhança de sua casa – que se atribui à traficância, e não à existência de homens e mulheres que por ali transitam no caminho de casa, trabalho, estudo ou lazer.

      Não se aceita que o acusado estivesse lá para comprar pães na padaria (conforme versão de Rafael) e não para vender drogas (conforme versão dos PMs e do MP). Nenhuma outra forma de comércio poderia ser reconhecida pelo juíz. Todo mundo “sabe” da suposta existência do Comando Vermelho na região, mas ninguém fez nada contra a organização em si. Melhor ir para cima de pequenos traficantes do que tentar desmantelar um esquema que corrompe desde policiais a políticos.

    O HOMEM

      Um juiz: Ricardo Coronha Pinheiro. Quatro testemunhas de acusação: Policiais Militares Pablo Vinicius Cabral, Victor Hugo Lago, Farley Alves de Figueiredo e Fernando de Souza Pimentel. Um morador sem nome ou existência comprovada. Um réu: Rafael Braga.

      Dentre tantos casos de injustiças cometidas pelo aparato penal brasileiro, vale lembrar o porquê do nome de Braga se destacar: ele foi o único condenado por supostos crimes cometidos por manifestantes durante os atos de 2013. À época foi acusado de portar explosivos, que na verdade eram produtos de limpeza. Uma acusação tão absurda quanto a afirmação que você pode explodir sua casa enquanto limpa a privada do seu banheiro.

      O homem em questão (velho conhecido da repressão política e social do Rio de Janeiro) é negro e também pobre, e sofre como negro e pobre. É muito mais que experimentar a opressão cotidiana do racismo e a desigualdade de classe. Ele sofre algo que eu e a maior parte daqueles que nunca foram acusados de crimes que não cometeram jamais sofremos. O sentimento de injustiça é acompanhado de consequências objetivas: perda da liberdade e condenação a pagamento de multa.

      Outro homem, o Juiz, fundamenta quase toda a sua decisão apenas em testemunho de policiais militares. Desconsidera o que foi dito pela testemunha da defesa, como se fosse mentira:

     

    Embora a testemunha Evelyn Barbara (fl. 194) tenha afirmado em seu depoimento que o réu RAFAEL BRAGA foi vítima de agressão por parte dos policiais militares que o abordaram, fato este também sustentado pelo acusado quando interrogado neste Juízo (fl. 250), o exame de integridade física a que se submeteu o réu RAFAEL BRAGA VIEIRA não constatou “vestígios de lesões filiáveis ao evento alegado”, consoante laudo de fl. 136.

       

     

     

     

      Talvez, o senhor Coronha, que hoje é juiz, quando universitário deva ter faltado às aulas de criminalística para saber que a tortura nem sempre deixa vestígios. Evelyn, por ser quem é (moradora do “Sem terra”), talvez não tenha a abstrata investidura de “verdade” conferida ficcionalmente a agentes estatais, como se estes não tivessem ideologias, preconceitos e interesses materiais.

      Devemos nos perguntar sobre mais um homem, que talvez não seja um homem, mas tão somente o deus ex machina de um teatro de mentiras montado para incriminar um sujeito: o “morador“. Sem nome, é aquele que supostamente indicou os policiais até o ponto de traficância que, por sua vez, era conhecido pelos policiais.

     

    Narrou a testemunha policial militar Pablo Vinicius Cabral (fl. 195) que estavam em patrulhamento de rotina, com intuito de garantir a segurança de trabalhadores que implantavam blindagem no posto policial, na Comunidade da Vila Cruzeiro, quando um “morador” foi até a guarnição policial informar que havia um grupo de pessoas comercializando drogas nas proximidades.

               

     

      E já que falamos da imputação de crime de associação para o tráfico, onde estão os associados? Quais indícios de autoria para a associação com este fim? Segundo o juiz, o conteúdo da embalagem supostamente encontrada com o acusado e as pessoas que teriam corrido quando os policiais chegaram dão conta desta acusação… Nada mais vago!

     

    No caso presente a posse do material entorpecente (maconha e cocaína) embalado em saco plástico (vide laudo de exame de entorpecente de fls. 99/100), fracionado, inclusive, contendo inscrições “CV”, que sabidamente destinava-se à venda, evidencia a estabilidade do vínculo associativo com a facção criminosa “COMANDO VERMELHO” que controla a venda de drogas no local dos fatos.

        Ademais, com o réu houve a apreensão de um rojão (fl. 17), sendo certo que no momento da prisão em flagrante do réu RAFAEL BRAGA, conforme relato dos próprios policiais neste Juízo, havia inúmeros elementos que se evadiram.

        Dessa forma, restou inequívoca a estabilidade do vínculo associativo para a prática do nefasto comércio de drogas, sendo certo que a facção criminosa “Comando Vermelho” é quem domina a prática do tráfico na localidade conhecida como “sem terra”, em que o réu foi preso, situada no interior da Vila Cruzeiro.

        Por outro lado, a regra de experiência comum permite concluir que a ninguém é oportunizado traficar em comunidade sem integrar a facção criminosa que ali pratica o nefasto comércio de drogas, sob pena de pagar com a própria vida.

        Portanto, não poderia o réu atuar como traficante no interior da Comunidade Vila Cruzeiro, sem que estivesse vinculado à facção criminosa “Comando Vermelho” daquela localidade.

                           

     

     

     

      Pelo visto, o juiz tem perícia nas “leis anti-estatais de regulação de comércio de drogas”.

    A LUTA

      “O problema é antigo”.

      Assim começa a terceira parte d’Os Sertões, de Euclides da Cunha. A guerra às drogas e o encarceramento em massa de negros é um problema antigo no Brasil!

      Aqui não pretendo fazer mais nenhuma análise dos vícios de um processo que visa “coibir” o venda de entorpecentes para viciados. A “guerra às drogas”, que é a paz de grandes empresários do ramo de drogas e “segurança”, e uma afronta a direitos fundamentais neste país é absurda por si mesma. Enquanto se atribuir à questão das drogas à questão da segurança e não da saúde pública, milhões continuarão sendo acusados e mortos. Mas quem tem poder para mudar, simplesmente não se importa.

      Mais injusto que o processo é a legislação que lhe dá base no direito material: vender drogas enquanto conduta criminosa. Ainda que o juiz fosse exímio cumpridor da lei, uma injustiça teria sido cometida. Ainda que Rafael fosse o traficante que disseram que ele é, uma injustiça ainda assim teria sido feita.  Em 1842, o governo da Renânia, aprovou a “Lei da Repressão ao Roubo de Lenha” que impedia trabalhadores pobres, sujeitos ao frio extremo, de recolherem lenhas e gravetos caídos no chão, uma tradição nunca antes contestada. Supomos que Rafael Braga tivesse vivido naquela época e local, e tivesse sido acusado de apanhar lenha. Não importa se acusação era verdadeira ou não, ou se o juiz aplicou direito o Direito: a injustiça existia pela própria criminalização da conduta. Ou seja, o crime muda, mas o criminoso tem sempre a mesma cara: a de quem a justiça tem — interesse  —  em prender.

      Por hoje defendemos Rafael Braga, mas mantenhamos nossa posição pelo fim da, genocida e repressiva, Guerra às Drogas.

  • “Brasileiro, estrangeiro… somos todos refugiados”

    “Brasileiro, estrangeiro… somos todos refugiados”

    Parafraseando um trecho da clássica música do Titãs, mais do que moradia e alimento, ser parte do país é estar incluído e ter acesso ao que, atualmente, só uma parcela da população tem.

    Mais do que uma ida ao cinema, a quarta-feira, 05 de abril, foi um incentivo à luta e à esperança para os moradores das ocupações da Izidora, Paulo Freire e Eliana Silva, localizadas na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O filme, assinado por Eliane Caffé, revela a realidade de uma ocupação de brasileiros e refugiados, ocorrida no coração da selva de pedra paulista, em 2012. Da ficção à realidade, o filme e seus espectadores retratam claramente a narrativa dos sem-teto.

    Sob a mesma lógica conflitiva da especulação imobiliária, seguida do abandono do poder público – que nega o direito à moradia de muitas famílias de baixa renda, o caso do glamouroso Hotel Cambridge, construído nos anos 50 em São Paulo para receber artistas de renome, e abandonado em meados de 2004, se assemelha e muito ao cotidiano dos moradores das ocupações urbanas, que viram no cinema um pouco da batalha diária do MLB, Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas, atuante em BH.

    Emocionada com a história exibida no Cine Belas Artes, Maria da Penha Barreto, conhecida por Dona Marta, que vive na Ocupação Esperança, região da Izidora, conta que saiu da experiência ainda mais confiante para as batalhas que ainda virão. “A gente aprende cada vez mais, sabe como é a vida lá fora, não é só a gente que passa por isso, eles também e eles venceram e eu achei ver esse filme uma coisa muito bonita e muito importante”.

    Invadimos ou fomos invadidos?

     

    No Hotel Cambridge, os chamados “invasores de propriedade privada”, entraram no local inabitado, limparam-o e deram utilidade aos escombros da ruína capitalista, que serviu de abrigo para mais de 140 famílias, sendo 240 crianças. Como em São Paulo, na Região Metropolitana de BH, milhares de crianças convivem há anos com a insegurança da violência policial e do despejo.

    Junto com a Dona Marta, mais 8 mil famílias compartilham o território que, segundo a Prefeitura de Belo Horizonte, não corre mais risco de despejo iminente e irá passar por um processo de urbanização, após quase 4 anos de luta. Recentemente foi recusada a proposta feita pela Construtora Direcional, de fazer prédios populares na região. As ocupações Rosa Leão, Esperança e Vitória, que estão na região da Izidora, entre BH e Santa Luzia, seguem na luta pela regularização das terras, promessa ainda pendente.

    Na ocupação Eliana Silva, região do Barreiro, o processo caminha a passos mais largos. A região foi ocupada há 5 anos e já conta com energia elétrica, creche, biblioteca e, em breve, a água encanada, bem natural necessário à vida, irá chegar ao local. Com dois anos de resistência e ocupação, a Ocupação  Paulo Freire, também localizada na região do Barreiro, está em um processo rápido de regularização, após as tentativas de despejo em maio de 2015 e a batalha judicial travada pelos moradores.

    Nos anos 50, enquanto o Hotel Cambridge ainda funcionava a pleno vapor em São Paulo, na capital mineira o Seu João participava da ocupação de onde hoje é o bairro Paulo VI, na região nordeste de Belo Horizonte. Da conquista, vários frutos surgiram, e hoje ele mora no bairro São Benedito, em Santa Luzia, perto da Ocupação Izidora, da qual é colaborador.

    Ao sair do cinema, Seu João recitou uma canção.

    Sobre o filme, ele diz: “Para mim foi muito bom ver esse filme porque ele revigora o meu espírito de luta e então a gente pode avançar. Precisamos estar sempre presentes na luta que com muita fé e esperança, a gente também vai vencer!”

    Você tem sede de quê?

     

    Juliano Vitral, membro do MLB, explica a importância da ação para o fortalecimento do movimento. “A gente não luta só pela casa, só pela moradia, mas por melhores condições de vida, e isso inclui lazer, cultura e o direito à cidade. Muitas vezes os espaços de cultura ficam nas regiões centrais e pessoas que moram nas regiões periféricas não têm acesso e são impedidas de estarem nesses lugares.”

    Assim como no filme Era O Hotel Cambridge, muitas famílias vivem todos os dias com medo do amanhã. O direito à moradia é previsto na Constituição Federal em seu artigo artigo junto com outras necessidades básicas – “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)”.  

    O medo não se resume apenas à falta de moradia, mas a perda das conquistas. Tanto no filme como nas Ocupações Izidora, Paulo Freire e Eliana Silva, as famílias estabelecem com o local ocupado as demais relações necessárias, como relações estudantis, de trabalho, de saúde, entre outras.

    Os refugiados que fizeram história em 2012 e ficaram marcados no imaginário da São Paulo e do Brasil, ficam em cartaz em BH durante toda a semana e mantém o grito de que “todos nós somos refugiados da falta dos nossos direitos”.