Por José Roberto Torero* Diário, sonhei que o Brasil tinha sido invadido pelo exército de outro país!
Aí, nos primeiros dias, quando o exército inimigo estava começando a tomar as nossas ruas, eu fui pra tevê e disse: “Calma, pessoal. Isso é só uma briguinha. Vamos continuar trabalhando senão todo mundo vai morrer é de fome.”
Quando francos atiradores já começavam a matar centenas de brasileiros por dia, um pessoal esquerdalhento disse que o povo precisava de máscaras, capacetes e coletes à prova de balas. Mas eu falei que esse treco de proteção era mimimi.
Pro povo pensar que estava seguro, mandei distribuir aqueles revolvinhos que disparam água. E chamei eles de hidroxipistolina. Não adiantou muita coisa, mas a fábrica de hidroxipistolina se deu bem.
Os estados protestaram no STF e conseguiram o direito de fazer barricadas. Eu tentei impedir, dizendo que as barricadas feriam a liberdade de ir e vir das pessoas. Mas perdi essa.
Para me vingar, não fiz um planejamento centralizado e coloquei o meu pior general para organizar a defesa.
Ofereceram armas tremendas para nós: tanques Pfizer, metralhadorasCovax e bombas chinesas. Mas eu disse que quem mandava era eu e não deixei comprarem porcaria nenhuma.
Chamei o pessoal que se escondia em bunkers de mariquinhas e disse que tinha que enfrentar o inimigo de peito aberto.
Pra dar o exemplo, aglomerei, joguei bola, fui na praia e passeei de jetski. O engraçado é que, logo depois que eu saía de um lugar, o inimigo bombardeava a cidade.
Nessa altura, a gente já estava perdendo mais de dois mil soldados por dia.
Eu dizia que quem estava matando o pessoal não era o inimigo. Era pneu que estourava no peito do cara, era diabetes, era velhice. Qualquer coisa, menos o inimigo.
Só quando já tínhamos perdido centenas de milhares de soldados é que eu liberei a compra de armas. Mas a distribuição foi bem lenta. Morreram mais sei lá quantos.
Até aí, tudo bem. Então começou o pesadelo de verdade. É que, quando finalmente o inimigo foi vencido, os sobreviventes foram pra rua e pediram a minha cabeça.
Pode tamanha ingratidão, Diário?
José Roberto Torero é autor de livros, como “O Chalaça”, vencedor do Prêmio Jabuti de 1995. Além disso, escreveu roteiros para cinema e tevê, como em Retrato Falado para Rede Globo do Brasil. Também foi colunista de Esportes da Folha de S. Paulo entre 1998 e 2012.
PS: A ideia para o texto de hoje foi do leitor Luiz Fernando Zanandréa.
Uma resposta
Bem isso! Vai ser assim.