“É ditatorial, mas às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência.” (Jarbas Passarinho, ministro da Educação do ditador golpista Emílio Garrastazu Médici – Golpe de 1964, na instauração do AI-5, em 68)
“O MEC irá encaminhar solicitação para a apuração de improbidade administrativa por parte dos responsáveis pela criação da disciplina na Universidade de Brasília (UnB) por fazer proselitismo político e ideológico de uma corrente política usando uma instituição pública de ensino”. (Ministro Mendonça Filho – Ditadura de Temer – Golpe de 2016)
Jarbas Passarinho, o ministro da Educação do golpe de 64, teve mais tempo à frente da pasta do que Mendonça Filho, seu sucessor no golpe de 2016, para violar a liberdade de ensino e a vida dos que lutavam contra a ditadura militar. Ambos já guardam, todavia, diversas semelhanças sombrias no pensamento ideológico. Passarinho também ficou celebrizado por perseguir estudantes e professores universitários, sobretudo da Universidade de Brasília, que liderava uma greve corajosa contra a ditadura, em 71. O então ministro recebia as lideranças em seu gabinete para dar um puxão de orelha severo de pai, despedia-se aconselhando-os a se afastar de movimentos subversivos e baderneiros e dias depois eram todos identificados, presos e encaminhados às masmorras da tortura.
Nessa época, o mais entusiasta defensor do regime ditatorial seguiu à risca a implantação da reforma universitária, como parte do acordo MEC-USAID, que destruía na base dos currículos a possibilidade de pensamento crítico, num modelo de educação fast food muito semelhante às recomendações do Banco Mundial seguidas por Temer. E também empurrou goela abaixo o currículo técnico e profissional obrigatório no chamado segundo grau, que exigia “abandonar o ensino verbalístico e academizante para partir, vigorosamente, para um sistema educativo de 1º e 2º grau voltado às necessidades do desenvolvimento”. Era, na base, a mesma reforma do Ensino Médio encabeçada por Mendoncinha, que resultou em retumbante fracasso, com a explosão dos índices de evasão escolar, os vergonhosos índices de desempenho e os problemas estruturantes na formação dos alunos em todas as matérias.
Talvez o ministro Jarbas Passarinho supere seu sucessor num único quesito: o da autenticidade, ou cara de pau. Enquanto nenhum integrante do Regime Militar admitia chamar a dita “Revolução de 64” de golpe, ele preferiu escancarar que “é golpe mesmo!”. Nomeado a diretor de Direitos Humanos por FHC, em 1996, atacou os Movimentos dos Trabalhadores Sem-Terra até o fim de sua vida e se posicionou contra o direito de indenização das pessoas perseguidas pela Ditadura. Morreu com quase cem anos, no emblemático ano do de 2016, depois de uma vida de luxo e impunidade, massacrando os movimentos sociais e trabalhistas. É dele a célebre frase, proferida ao defender a instauração do AI 5 na Tribuna do Senado, em 1968, o ato que aboliu de vez todos os direitos constitucionais: “É ditatorial, mas às favas, senhor presidente, neste momento, com todos os escrúpulos de consciência”. Menos dado a assumir a realidade, Mendonça, por sua vez, exasperou-se ao lhe entregarem uma ementa que dá ao que ele chama de “movimento pró-impeachment”, o nome justo e verdadeiro: é golpe. Numa demonstração clara de sectarismo e de ignorância política, qualificou como proselitismo político e doutrina ideológica um curso dedicado a discutir o país após o golpe de 2016 e seus efeitos para a democracia.
O que o cientista político Luís Felipe Miguel sacramentou no nome da sua disciplina “Golpe de 2017: o futuro da democracia” não é novidade para nenhum brasileiro. Nem para a solução Michel do “grande acordão pra estancar a sangria”, nem para Jucá, Sérgio Machado, Renan Calheiros, Eduardo Cunha. Nem mesmo os integrantes do ministério golpista se esforçam mais para desmentir o fato. A ministra do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, bem que tentou enquadrar a presidenta Dilma ainda antes de ser derrubada por contar ao mundo o que acontecia no Brasil, mas não houve como calar o que a voz das ruas repetia.
Dos cientistas políticos aos líderes partidários; dos movimentos trabalhistas e sociais aos professores em sala de aula; da mídia independente brasileira à grande imprensa internacional. Do Le Monde e Libération (França), Der Spiegel (Alemanha), The Economist (Inglaterra), El País (Espanha), Público (Portugal), The Guardian (Inglaterra), Página 12 (Argentina), até o New York Times (EUA), a Rede Al Jazeera (Catar) e a BBC (Londres) todos repetiram: impeachment sem crime é golpe. O que a disciplina nomeia está nas camisetas, tatuado na pele dos manifestantes, nas faixas dos protestos de rua. Se arrasta pelos túneis e metrôs e sobe as paredes dos prédios, muros, pontes, viadutos. Está nas conversas de botequim, nas marchinhas do Carnaval, na poesia, nos livros, em coletâneas de artigos científicos, por tudo. Foi Golpe! É Golpe!
Poucos, além dos fantoches do Jornal Nacional ainda fingem não conhecer o que diz a voz corrente que com frequência irrompe furtivamente diante das câmeras de TV. São os papagaios de pirata, que constrangem o já escasso jornalismo global de rua, com seus constrangedores cartazetes profanando o aparato de poder: Globo golpista! É golpe! O incômodo do título da disciplina do Curso de Ciências Politicas da UnB é que o seu nome traduz uma verdade histórica, ou cristaliza no mundo científico a evidência do golpe como acontecimento político que abala o curso da história e traumatiza o curso da democracia brasileira.
Só a necessidade de negar essa evidência do golpe explica o destempero do ministro, que estreou na pasta de Educação já provocando um ruidoso escárnio ao receber, em sua primeira bateria de audiências, os líderes dos Revoltados Online, o ator pornográfico Alexandre Frota e o ex-pastor Marcello Reis, que entregaram ao ministro as bases do Escola Sem Partido, um projeto que se dedica a eliminar a doutrinação ideológica nas escolas, como os dois explicaram.“Não discrimino ninguém, porque respeito a liberdade de cada pessoa fazer suas escolhas de vida. Conheci Frota no movimento pró-impeachment, assim como, o pessoal do Revoltados On Line. Não vejo problema em recebê-los para uma visita”, justificou-se na época, alegando que se tratava de uma mera visita de cortesia, um ministro bem mais cortês do que este que ataca a UnB e um professor de ciências políticas por pensar diferente dele com uma espécie de processo que tende a ser grave como uma Lei de Segurança Nacional.
Mas a violência de sua investida pesada contra a cátedra Tópicos Especiais de Leitura 4 do Curso de Ciências Políticas da UnB deixa claro sua afinidade com os métodos de intimidação, constrangimento e criminalização de professores e alunos adotados pelo MBL e pelos leões de chácara da Ditadura. Num tom ameaçador, Mendonça Filho afirmou em nota que pretende processar os responsáveis pela oferta da disciplina por “improbidade administrativa”. Anunciou que vai acionar a Advocacia-Geral da União, o Tribunal de Contas da União, a Controladoria-Geral da União e o Ministério Público Federal para apurar os responsáveis, bem nos moldes dos seus antecessores na pasta dos anos de chumbo.
A ofensiva contra um curso de caráter facultativo fez cair de vez a aura de “tolerância e ausência de preconceito” que ele tentou forjar no encontro com a dupla Marcello Reis e Alexandre Frota. Ficou escancarada a diferença no tratamento dedicado a um dos cientistas políticos mais atuantes, produtivos e prestigiados do país, em relação aos dois Revoltados On-Line que depois se fundiram ao MBL e vieram a se processar mutuamente por estelionato, lavagem de divisas e formação de quadrilha.
REAÇÃO: ATAQUE FUNCIONOU COMO PROPAGANDA
A truculência do ministro não deixou nada a desejar aos seus antecessores do Golpe de 64. “A iniciativa traz indicativos claros de uso de toda uma estrutura acadêmica, custeada por todos os brasileiros com recursos públicos, para benefício político e ideológico de determinado segmento partidário”, disparou ainda o ministro, que parece ter se inspirado no MBL para criar esse protótipo de “Universidade sem Partido”. Diante da ameaça de processar o professor por “improbidade administrativa”, recorrendo a todo o aparato de repressão e sustentação do golpe (AGU, MPF, CGU, TCU), as manifestações de interesse e procura pela disciplina anunciada no Facebook do professor se multiplicaram. Logo que abriu para matrículas no sistema as 50 vagas se esgotaram e já se formou uma longa fila de espera.
A ofensiva golpista contra o professor e a universidade gerou uma reação proporcional aos excessos de Mendonça. Em ato contínuo explodiram manifestações nas redes sociais, seguidas de notas de repúdio, cartas de solidariedade em apoio a Felipe Miguel e à UnB emitidas por comunidades científicas, universidades de todo o país, organizações estudantis, partidos políticos, entidades democráticas, etc. A atual gestão da universidade informou que respeita a autonomia pedagógica de cada Centro e ainda argumentou que as acusações são incabíveis, uma vez que a disciplina tem oferta como matéria optativa. Mas a reação não ficou nisso: uma contundente representação no Conselho de Ética da Presidência da República e na Procuradoria-Geral da República foi protocolada no dia 22/2 contra o ministro da Educação, Mendonça Filho por violação da autonomia universitária e à liberdade de cátedra. Assinam a queixa o ex-reitor da UnB, José Geraldo de Sousa Júnior, o ex-procurador de Estado de São Paulo, Marcio Sotelo Felippe, os deputados federais Paulo Pimenta (PT) e Wadih Damous (PT), e Patrick Mariano Gomes, advogado.
QUEM É FELIPE MIGUEL – VIDA E OBRA
Nascido no Rio de Janeiro, Luís Felipe Miguel passou a adolescência e boa parte da juventude em Florianópolis, onde fez Escola Técnica Federal e se formou em Jornalismo pela UFSC, ao lado da esposa Regina Dalcastagné, professora de Literatura. É um dos cinco filhos de Salim Miguel e Eglê Malheiros, velhos comunistas do PCB, que deram uma contribuição inestimável à cultura catarinense, com a introdução do modernismo no Estado pelo cinema, pela literatura e pelas artes plásticas, sobretudo. O pai, imigrante libanês, falecido há dois anos, é um dos escritores mais premiados e conhecidos do Brasil, fundador da Editora da UFSC, que dirigiu por várias décadas. A mãe, professora aposentada do Instituto Estadual de Educação, também assina uma vasta contribuição para a pedagogia, a literatura e a dramaturgia, com livros de ensaios, traduções, contos, roteiro para teatro e cinema.
Intelectual com larga capacidade de relacionar o conhecimento teórico à cena política do cotidiano, o jornalista e cientista político Luís Felipe Miguel assina as obras Democracia e representação; territórios em disputa, Consenso e conflito na democracia contemporânea e Política e mídia no Brasil; episódios na história recente, além de dezenas de artigos e ensaios em revistas científicas e coletâneas de livros. Ao contrário do que diz o ministro, que na nota o acusa de reduzir o ensino ao partidarismo, petismo e lulismo, o professor já manifestou publicamente, em escritos e conferências, sua postura crítica aos governos Lula e Dilma, o que não o impediu de reconhecer os avanços na promoção das classes menos favorecidas e de posicionar-se desde o início do golpe em defesa do mandato legítimo da presidenta eleita Dilma Roussef.
Seus escritos versam sobre a destruição da democracia pela instauração de um estado policialesco e punitivista que rasgou a Constituição e o Estado Democrático e de Direito. Mesmo nunca tendo sido filiado ao PT, ao contrário do que afirma ainda o ministro, seus textos analisam a perseguição seletiva do ex-presidente Lula, vítima de um dos casos mais exemplares de Lawfare na história mundial, assim como o reitor da UFSC, Luís Carlos Cancellier, amigo de juventude, que foi induzido ao suicídio por um processo de abuso de poder que Luís Felipe Miguel ajudou a denunciar.
Para quem de fato o lê, seus artigos não deixam transparecer nenhuma filiação partidária, mas um teórico de esquerda engajado nas questões dramáticas do seu tempo e do seu país, cuja escritura evidencia um pensamento de complexidade científica muito distante das acusações grosseiras do ministro.
(Raquel Wandelli / Jornalistas Livres)
LEIA A NOTA DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO NA ÍNTEGRA
O ministro da Educação, Mendonça Filho, lamenta que uma instituição respeitada e importante como a Universidade de Brasília adote uma prática de apropriação do bem público para promoção de pensamentos político-partidário ao criar a disciplina “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”, que será ministrado no curso de Ciências Políticas da universidade.
O MEC irá encaminhar solicitação para a Advocacia-Geral da União (AGU), ao Tribunal de Contas da União (TCU), à Controladoria-Geral da União (CGU) e ao Ministério Público Federal (MPF) para a apuração de improbidade administrativa por parte dos responsáveis pela criação da disciplina na Universidade de Brasília (UnB) por fazer proselitismo político e ideológico de uma corrente política usando uma instituição pública de ensino.
A ementa da disciplina traz indicativos claros de uso de toda uma estrutura acadêmica, custeada por todos os brasileiros com recursos públicos, para benefício político e ideológico de determinado segmento partidário, citando, inclusive, nominalmente o PT. Dividida em 5 módulos, a disciplina tem indicativos de ter sido criada exclusivamente para militância partidária, algo que pode ser percebido no caso da temática de algumas unidades como “o lulismo e a promoção da paz social”, “o governo Dilma e a tentativa de repactuação lulista” e “a resistência popular e as eleições de 2018”.
Além disso, há, também, módulos tratando sobre “O PT e o Pacto Lulista”, “Democratização e Desdemocratização” e “O Governo ilegítimo e a resistência”, em um ataque claro às instituições brasileiras, incluindo o próprio Supremo Tribunal Federal (STF).
Em homenagem e solidariedade ao professor, os Jornalistas Livres reuniram aqui num único documento o acervo in progress dessas manifestações. A maioria das notas relaciona o caso aos recentes ataques às universidades patrocinados pelos agentes de exceção do governo intervencionista de Temer, como as invasões às universidades federais do Paraná, Santa Catarina e Minas Gerais como uma tentativa de desmoralizar as instituições de ensino superior e minar a autonomia universitária para promover o ensino pago. Emblemático que um dia após o ataque de Mendonça, a Universidade Federal de Juiz de Fora também sofreu uma intervenção da Polícia Federal, com condução coercitiva e prisão preventiva do reitor, dentro do mesmo modus operandi que vem aterrorizando a comunidade universitária do país. Segue também o link para as matérias com o conteúdo da disciplina indicado pela ementa estão em PDF neste link, organizado pelo leitor e compartilhado nas redes sociais: https://m.box.com/shared_item/https%3A%2F%2Fapp.box.com%2Fs%2Fbm0d52sjav3e975hmz0sifjktrsz4too.
NOTA PUBLICADA PELO PROFESSOR LUÍS FELIPE MIGUEL
(22/2)
Agradeço as centenas de mensagens de solidariedade que recebi nas últimas horas. Diante da ameaça de censura à disciplina que estou oferecendo e das tentativas de intimidação, é essencial saber que conto com o apoio de tantas pessoas, que não necessariamente concordam com minhas escolhas políticas ou acadêmicas, mas que coincidem no entendimento de que a universidade é lugar de liberdade e de debate.
Agradeço, em especial, à Universidade de Brasília, que não hesitou em reafirmar seu compromisso “com a liberdade de expressão e opinião – valores fundamentais para as universidades, que são espaços, por excelência, para o debate de ideias”.
(E aproveito para agradecer também todos os que sugeriram temas e textos para aprimorar o curso. Será difícil acomodar mais do que uma pequena parte das sugestões no programa, cuja elaboração já foi um exercício de cortar e cortar conteúdo, mas certamente as dicas contribuirão para alimentar as discussões nas aulas.)
Muitos têm também sugerido formas de ampliar o alcance da disciplina, como transmissão online ou aulas em espaços abertos. Entendo o objetivo, mas penso que, no momento, o principal é reafirmar que se trata de uma disciplina normal, a ser ministrada normalmente na universidade. Ela não é um acontecimento político – exceto, claro, no sentido de que o processo de ensino e aprendizagem é sempre um ato político.
O que não impede que eu contribua para a difusão do debate, dentro e fora da UnB, para além das aulas que ministrarei ao longo do semestre. Caso seja possível, divulgarei depois parte do conteúdo do curso, para circulação mais ampla. Sandra Helena sugeriu uma versão “pocket”, para ser ministrada como minicurso em outras universidades, o que seria bacana se fosse viabilizado. Letícia Sallorenzo tomou a iniciativa de reunir os textos do curso numa pasta virtual (obrigado!) e, assim que estiver completo, divulgo o link.
A divulgação do programa foi feita, como sempre faço a cada início do semestre, a fim de dar clareza do conteúdo a eventuais interessados. O alvoroço surgiu com a publicação de uma reportagem alarmista, por um pequeno site de notícias aqui de Brasília. Talvez seja só coincidência, mas há poucos dias recusei um convite para escrever – de graça – para este mesmo site.
O conteúdo da disciplina não é diferente daquilo que tem sido discutido por muitos colegas interessados em compreender o Brasil atual. O que causou reboliço foi o uso da palavra “golpe” já no título da matéria. Tenho razões, que creio muito sólidas, para sustentar que a ruptura ocorrida no Brasil em 2016 se classifica como golpe. Tenho discutido e continuarei discutindo essas razões com estudantes e com colegas, nos espaços do debate universitário, e com a sociedade civil, em minhas intervenções públicas. Não vou, no entanto, justificar escolhas acadêmicas diante de Mendonça Filho ou de seus assessores, que não têm qualificação para fazer tal exigência.
NOTA DO PROFESSOR LUÍS FELIPE MIGUEL NO DIA 21/2
Um site aqui de Brasília publicou a ementa da minha disciplina sobre o golpe e vários jornais correram à UnB para pedir posição sobre este “absurdo” – começando pelo pasquim fascistoide do Paraná, especializado no ataque à universidade pública.
Não vejo nenhum sentido em alimentar a falsa polêmica que querem abrir. Pedi à assessoria de comunicação da universidade que encaminhasse, de minha parte, apenas a seguinte observação:
Trata-se de uma disciplina corriqueira, de interpelação da realidade à luz do conhecimento produzido nas ciências sociais, que não merece o estardalhaço artificialmente criado sobre ela. A única coisa que não é corriqueira é a situação atual do Brasil, sobre a qual a disciplina se debruçará. De resto, na academia é como no jornalismo: o discurso da “imparcialidade” é muitas vezes brandido para inibir qualquer interpelação crítica do mundo e para transmitir uma aceitação conservadora da realidade existente. A disciplina que estou oferecendo se alinha com valores claros, em favor da liberdade, da democracia e da justiça social, sem por isso abrir mão do rigor científico ou aderir a qualquer tipo de dogmatismo. É assim que se faz a melhor ciência e que a universidade pode realizar seu compromisso de contribuir para a construção de uma sociedade melhor.
NOTA EM DEFESA DA UNIVERSIDADE, DA LIBERDADE DE CÁTEDRA, DE PENSAMENTO E CONTRA A CENSURA
Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFRGS
Desde o movimento político que resultou no golpe de Estado que destitui a Presidenta Dilma Rousseff, a população brasileira assiste a uma espiral de violações do Estado Democrático de Direito e das garantias constitucionais asseguradas aos brasileiros em 1988. Nas últimas horas, fomos surpreendidos com as declarações do senhor que ocupa de forma ilegítima o mais alto cargo no Ministério da Educação, Mendonça Filho, visando censurar o curso “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”, previsto a ser ministrado pelo Professor Doutor Luis Felipe Miguel na Universidade de Brasília (UnB) no primeiro semestre de 2018. Diante da gravidade da situação, estudantes de Mestrado e Doutorado em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e apoiadores externos vêm a público asseverar que:
1. As declarações e medidas autoritárias do senhor Mendonça Filho são um ataque frontal à Universidade Brasileira e a autonomia didático-científica destas Instituições, garantida pelo artigo 207 da Constituição Federal de 1988;
2. A tentativa de censura promovida pelo senhor Mendonça Filho ao curso “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil” viola a Liberdade de Cátedra dos docentes brasileiros, liberdade essa assegurada pelo artigo 206 da Constituição Federal de 1988;
3. O Professor Doutor Luis Felipe Miguel é um reconhecido pesquisador da área de Ciência Política e seu trabalho é pautado pelo mais absoluto rigor científico e metodológico. Qualquer tentativa de calá-lo se configura como uma tentativa de calar toda a ciência política nacional;
4. A Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP) – instituição reconhecida mundialmente como a representante da comunidade politóloga brasileira – se manifestou em 2016 sobre o golpe de Estado que sofreu a Presidenta Dilma Rousseff. A análise de Luis Felipe Miguel encontra eco, portanto, na área da Ciência Política;
5. A livre manifestação de pensamento e ensino é um direito humano garantido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.
Recordamos que o autoritarismo é muito danoso ao ambiente universitário e convocamos toda a comunidade acadêmica a se posicionar em favor da Universidade Brasileira, da Liberdade de Cátedra, da Ciência Política e do Professor Luis Felipe Miguel.
Se houver qualquer impedimento ao curso “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”, a ser ministrado pelo Professor Doutor Luis Felipe Miguel na UnB, o Estado Brasileiro mais uma vez dará mostras que está sob o comando de um governo ilegítimo, ditatorial, violador dos direitos humanos e da Constituição de 1988 e que, portanto, esse deve ser derrotado imediatamente.
Assinam discentes do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFRGS e apoiadores externos:
Vinicius de Lara Ribas – Mestre e Doutorando em Ciência Política
Marina Grandi Giongo – Doutoranda em Ciência Política
Adriana Lameirão – Mestre e Doutoranda em Ciência Política
Maria do Rosário – Deputada Federal, Mestre em Educação e Doutoranda em Ciência Política
Juliana Botelho Foernges – Mestre e Doutoranda em Ciência Política
Carolina Assis – Mestranda em Ciência Política
Cristiana Maglia – Mestre e Doutoranda em Ciência Política
Rafael Lameira – Mestre em História e Doutorando em Ciência Política
Vinicius Valentin Raduan Miguel – Doutorando em Ciência Política
Ana Julia Bonzanini Bernardi – Doutoranda em ciência política ufrgs
Flávio Marcelo Busnello – Doutorando em Ciência Política
Tiago Alexandre Leme Barbosa – Doutorando em Ciência Política
Rafael Cesar Ilha Pinto – Professor UFPel e doutorando em Ciência Política UFRGS
Arthur Augusto Rotta, doutorando ciência política UFRGS
Moisés Lazzaretti Vieira – Mestrando em Ciência Política
Jorge Branco, mestre em Ciência Política e doutorando no PPGCP UFRGS
Felipe Bortoncello Zorzi – Doutorando em Ciência Política
Rodolfo Silva Marques – Mestre em Ciência Política/UFPA e Doutorando em Ciência Política/UFRGS
Priscila Alves Rodrigues – Mestre e Doutoranda em Ciência Política
Bruno Marques Schaefer, mestrando em Ciência Política/ UFRGS
Maxmiler Campos da Costa – mestrando em Ciência Política/ UFRGS
Paulo Pinto, doutorando em CP
Maíra Costa – mestranda em Ciência Política/UFRGS
Laura Lammerhirt – mestranda em ciência política UFRGS
Bruno Mariotto Jubran – Analista Pesquisador – FEE/RS e Doutor em Ciência Política pela UFRGS
Camila Andrade – Mestre em Relações Internacionais e Doutoranda em Ciência Política
Jorge Alfredo Gimenez Peralta – Mestrando em Ciência Política
Victor Merola – Mestrando em Ciência Política UFRGS
Amanda Cegatti – Mestranda PPGCP/UFRGS
APOIO EXTERNO
Inês Patrício – Doutora em Ciência Política (IUPERJ), Professora do PPG em Ciência Política da UFF
Wagner Pralon Mancuso – Doutor em Ciência Política e Professor da USP
Mauricio Assumpção Moya – Professor de Ciência Política – UFRGS
João Feres Júnior – IESP-UERJ
Renato Perissinotto – UFPR
Fernando de Castro Fontainha – IESP-UERJ
Angela Alonso – USP
Volnei Picolotto – Doutor em Economia do Desenvolvimento/UFRGS e Comitê em Defesa da Democracia/RS
Thomas Bustamante, Professor de Filosofia do Direito da UFMG
Laura Bannach Jardim – Professora da UFRGS
Beatriz Vargas Ramos – Professora de Direito Penal e Criminologia da UnB
Marlise Matos – Professora Associada do Departamento de Ciência Política da UFMG
Francisco Marshall, professor Titular do Departamento de História, IFCH-UFRGS
Luciano Elia, professor titular de Psicanálise e Coordenador do Programa de Mestrado Profissional em Psicanálise e Políticas Públicas do Instituto de Psicologia da UERJ
Patricia Reuillard Professora do Programa de Pós-Graduação em Letras – UFRGS
Carmen Regina Abreu Gonçalves – Professora doutora da Universidade Federal do Pampa
Marcus Vinicius Xavier de Oliveira – Professor de Direito da Universidade Federal de Rondônia
Eoin O’Neill , mestrado e doctorade em sociologia (IUPERJ), Pos-Doctorado em Historia (UFF)
Tassia Rabelo – Doutora e Professora de Ciência Política da Universidade Federal Vale do São Francisco (Unifasf)
João Paulo Viana – Professor de Ciência Política da Universidade Federal de Rondônia, Secretário Executivo da ABCP Regional Centro-Norte
Hermógenes Saviani Filho – professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais (DERI) da UFRGS
Esther Solano – UNIFESP
Fabio Kerche – Fundação Casa Rui Barbosa
Luiz Augusto Campos – IESP-UERJ
Carlos Milani – IESP-UERJ
Adalberto Cardoso – IESP-UERJ
Benito Schimidt – Professor dep. História UFRGS
Marcia Lima – USP
Cleyton Feitosa Pereira – Doutorando em Ciência Política (IPOL/UnB) e Mestre em Direitos Humanos (UFPE)
Flavio Ilha – Jornalista
Diego Ellwanger Pereira – Publicitário
Tatiana Brocardo de Castro – Professora
Jucemara Beltrame – Advogada
Ezequiel Hanke, Mestre e Doutorando em Teologia – Faculdades EST, São Leopoldo, RS.
Adalberto Moreira Cardoso IESP / UERJ sociólogo
Francisco Carlos Teixeira Da Silva, Professor Titular de História Moderna e Contemporanea/UFRJ.
Ramiro Goulart – Advogado
Angela Maria Santos Tavares – Aposentada
Maria Aparecida Azevedo Abreu – cientista política – IPPUR/UFRJ
Suelen Aires Gonçalves – Doutoranda em Sociologia UFRGS
Alexandre Arns – Doutorando em Ciência Política (UnB)
Matheus Alexandre de Araújo – Graduando em Ciências Sociais (UFC)
Cláudio Guedes – físico e empresário
Renata Lins – mestre em economia pelo IE/UFRJ
Gisele Cittadino – coordenadora e professora do PPGD da PUC-Rio
Paulo Canavezi – Músico e Servidor TRT 4
Anthony Massayoshi Tao – Graduando em Ciências Sociais na UFRGS
Rodrigo Francisco dos Santos – físico , doutorando (UFF) e perseguido politico
Hilário Rodrigues, Dr em Física pelo CBPF. Prof. CEFET/RJ
André de Freitas Liziardi – Jornalista
Célio Golin – Coordenador do grupo nuances (Porto Alegre)
Roney Marques – mestrando em Sociologia/UFRGS
Bernardo Muratt – Mestre em Ciência Política UFF
Roberto Bueno – Professor universitário
Cleide Martins Silva – Pedagoga, aposentada
Ivan Daniel Müller – Doutorando em sociologia – UFRGS
Tiago Mendes Rodrigues dos Santos – Sociologia UFRGS
Jacqueline Sinhoretto – prof ufscar
Bruno de Mattos Almeida – sociologia UFRGS
Samuel Passos – UFRGS
Luciana Almeida Da Silva Teixeira – advogada
Claudia Penalvo – Grupo Somos (Porto Alegre)
Paulo de Tarso Carneiro – Advogado
Diogo Ives – Doutorando em Ciência Política IESPE
Marco Alexandre Fronckowiak – Professor Aposentado UFRGS
Cesar Alessandro Sagrillo Figueiredo – Doutor em Ciência Política e professor da Universidade Federal do Tocantins
Andréa Senra Coutinho – Doutora em Estudos da criança/Colégio de aplicação João XXIII – UFJF
Russel Teresinha Dutra da Rosa – professora da Faculdade de Educação Ufrgs e coordenadora da Frente Gaúcha Escola sem Mordaça
Lucia Carpena – professora do departamento de música da UFRGS e diretora do Instituto de Artes da UFRGS
Argemiro Martins – Prof. Direito da UnB
Valéria Wilke – Professora Associada do Departamento de Filosofia da UNIRIO
Alexandre de A. Mourão – Psicólogo e Doutorando em psicologia na UnB
Eduardo Oliveira – Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Federal Fluminense
Danilo Braganca – Ciencia Politica UFF
Kaio Pimentel doutorando em economia Ufrj
Luis Rojo antropologia UFF
Julio Villasboas – UFF
Thais Rodrigues doutoranda ciencia politica da UFF
Amanda Micaela Souza – Psicóloga Clínica
Frederico de Almeida – Professor do Departamento e do Programa de Pós-graduação em Ciência Política da Unicamp
Clayton Mendonça Cunha Filho – Professor do Departamento de Ciências Sociais da UFC
WILSON RAMOS FILHO (XIXO), doutor e pós-doutor, presidente do Instituto Defesa da Classe Trabalhadora
Angela Medeiros Santi – prof. Associada da Faculdade de Educação, UFRJ
Benedito Tadeu César – cientista político, ex-coordenador do PPG de Ciência Política da UFRGS, aposentado
Adriano Nascimento, professor adjunto UFAL
Profa. Dra. Rubia-Mar Nunes Pinto – FEFD/UFG PPGE/UFG
Carmen Irene Correia de Oliveira
Luciano Lima, mestrando em Ciência Política, UFPel.
Paula Marcelino – Sociologia Usp
Adriana Delbó (Profª Filosofia Universidade Federal de Goiás)
Maria Auxiliadora Delgado Machado
Fabio A G Oliveira – Professor de Filosofia (UFF)
Clovis Ricardo Montenegro de Lima
Pesquisador do ministerio da Ciência e tecnologia
Roberto A. R. de Aguiar, professor emérito da UnB
Othon Leonards, professor emérito da UnB
Luiz Carlos Soares – Doutor em História pela Universidade de Londres e Professor Titular Aposentado do Departamento de História da UFF
Marjorie Marina – Ufmg
Ricardo Leães- Doutor em Ciência Política
Sandra Bitencourt – doutora em Comunicação pela UFRGS e Professora da UNIMETODISTA
Maria Helena Weber – Prof. UFRGS
Da Associação Brasileira de Ciência Política
Nota de repúdio à violência contra a liberdade de cátedra
A Diretoria da ABCP entende que a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 206, II, garante aos docentes e discentes o pleno exercício da liberdade de ensinar e aprender, assim como faculta às Universidades brasileiras autonomia pedagógica. Ressalte-se ainda que a disciplina questionada pelo MEC é uma cadeira optativa de ementário livre, sendo facultado aos docentes montar o programa com o intuito de apresentar pesquisas recentes e debater temas da atualidade. A rigor, nenhum aluno ou aluna do curso de graduação em Ciência Política da UNB é obrigado a cursá-la. Por outro lado, proibir a realização da disciplina impediria os discentes que assim o desejassem de cursá-la, o que fere, por suposto, o princípio da liberdade de aprender.
Diante disto, consideramos que, se a intenção manifesta do Ministro de fato se concretizar, a autonomia pedagógica das universidades brasileiras estará ameaçada, assim como os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal. O ato não poderá ser avaliado de outra forma, se não como censura, característico de regimes de exceção.
Nota da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação (Compós)
A Compós manifesta sua solidariedade professor Professor Luis Felipe Miguel e reforça a nota da Compolítica, ressaltando a importância de mantermos a liberdade de cátedra e nossa autonomia no exercício da docência. Esses valores foram violentamente atacados pela ameaça do Ministério da Educação em intervir na disciplina “Tópicos Especiais em Ciência Política 4”, com o tema “O Golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”.
Também manifestamos nosso repúdio ao sucateamento de uma instituição como o CPDOC acentuado com as recentes demissões das docentes Luciana Heyman, Dulce Pandolfi, Verena Alberti e Mônica Kornis. Por último, manifestamos nossa solidariedade à professora Jaqueline Muniz, do departamento de Segurança da UFF, atacada de forma misógina e preconceituosa nas redes sociais após entrevista na GloboNews questionando a intervenção militar no Rio de Janeiro.
A Compós foi fundada em 16 junho de 1991, em Belo Horizonte, com o apoio da Capes e do CNPq, a partir da iniciativa de alguns pesquisadores e representantes dos seguintes cursos de Pós-Graduação: PUC-SP, UFBA, UFRJ, UnB, UNICAMP, UMESP.
Nota do Departamento de Ciência Política da Unicamp em defesa da liberdade de cátedra e da autonomia universitária
O Departamento de Ciência Política da Unicamp vem a público manifestar irrestrita solidariedade ao professor e pesquisador Luis Felipe Miguel, da Universidade de Brasília, que ministrará neste semestre a disciplina “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”.
Repudiamos as declarações e ameaças do ministro da Educação do governo golpista contra nosso colega da UnB. Elas são a demonstração cabal de que vivemos em um contexto político autoritário, no qual a máxima autoridade federal no campo educacional infringe a liberdade de cátedra e a autonomia universitária contra um docente e cientista político que apenas cumpre seu dever de ofício: pesquisar, elaborar cursos sobre a realidade e ensinar.
Manifestamos nossa mais profunda indignação contra os ataques à Universidade Pública e aos seus membros que temos assistido nos últimos meses no Brasil. Não é esse o caminho pelo qual transformaremos o Brasil em um país soberano, justo e livre. Estamos e estaremos juntos na luta para mudar a atual situação política do país.
Docentes do Departamento de Ciência Política da Unicamp e demais apoiadores
ABCP Centro-Norte – Pela consolidação da expansão da C.Política no Brasil
NOTA DE REPÚDIO
A Diretoria Centro-Norte da Associação Brasileira de Ciência Política – ABCP Centro-Norte repudia o processo de perseguição ao pensamento crítico contra o professor Luis Felipe Miguel, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, que representa as ameaças à liberdade de cátedra de todos/as os/as cientistas políticos/as que atuam em instituições de ensino brasileiras.
Nesta quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018, um site de notícias publicou uma matéria sobre a disciplina optativa de graduação que o professor Luis Felipe Miguel ofertará no primeiro período letivo de 2018 na Universidade de Brasília: “Tópicos especiais em Ciência Política: O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”. A matéria repercutiu em outros veículos de mídia, causando uma falsa polêmica sobre a possibilidade de abordar academicamente o processo de instabilidade democrática sob a denominação de golpe, que teria unicamente, segundo o Ministro da Educação, Sr. Mendonça Filho, o objetivo de aparelhar a universidade e partidarizar o ensino público brasileiro.
Esse evento mostra um evidente desconhecimento das profícuas discussões acadêmicas em curso na nossa disciplina há pelo menos dois anos, ignorando uma parte significativa e muito séria da Ciência Política brasileira que desde 2016 analisa a situação pela qual passa o país atualmente como um golpe de Estado, não sem marcados interlocutores discordantes.
Faz parte da vocação da Ciência Política a preocupação com os fenômenos políticos de forma ampla, diversa, inclusiva e livre. A liberdade de cátedra é uma prerrogativa do trabalho docente porque permite a diversidade de ideias, a contraposição de argumentos e a construção de um campo crítico de conhecimento. Construir uma discussão acadêmica desde a aberta perspectiva do/a pesquisador/a, como os próprios debates das ciências sociais sobre epistemologia e metodologia nos indicam, é um ponto de partida imprescindível para a construção do diálogo na área, dado que todo conhecimento (científico ou não) carrega seu viés.
O curso ofertado pelo professor Luis Felipe Miguel, reconhecido pesquisador da Ciência Política brasileira e um dos professores mais produtivos em termos de publicações da nossa regional, está ancorado em muitas discussões centrais da área, como se vê na sua sugestão preliminar do programa de curso: http://www.demode.unb.br/images/ementas/Tpicos%20Golpe.pdf.
A resposta autoritária do Ministro da Educação, Sr. Mendonça Filho, criticando a proposta de curso do professor Luis Felipe Miguel na imprensa (https://www.poder360.com.br/…/ministerio-da-educacao-prepa…/), desrespeita os fundamentos da liberdade de cátedra e da autonomia universitária no Brasil e ameaça o desenvolvimento científico da nossa área de atuação. Ao afirmar que “[e]stá claro que não houve base científica na criação desse curso. Contraria as boas práticas da educação. Alguém não pode ter uma ideia ou uma opinião e simplesmente oferecer dentro de uma universidade 1 [sic] curso”, o Ministro mostra desconhecimento do estado da arte da Ciência Política brasileira, falta de cuidado com as boas práticas de educação, confusão entre opinião infundada e argumento científico e também ameaça a construção de um debate de ideias crítico e diverso no país. O Ministério da Educação, em vez de fomentar as boas condições de trabalho nas instituições federais de ensino superior, nos últimos anos vem impondo um contexto de cortes orçamentários e limitações que está nos levando ao sufocamento da universidade pública, gratuita e de qualidade no Brasil, assim como da ciência brasileira.
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais
NPOCS encontra-se estarrecida diante da atitude do ministro da educação em acionar os órgãos de controle para analisar a legalidade de uma disciplina a ser lecionada no Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (IPOL-UNB), o que comprova a tese básica do curso, e aguarda uma resposta firme do Ministério Público de defesa da legalidade e da democracia.
Nota de Dilma Rousseff
Manifesto minha solidariedade ao professor Luis Felipe Miguel, da UNB, diante da arbitrária e retrógrada censura feita pelo ministro da educação à sua cátedra “O golpe de 2016 e o futuro da democracia”.
Impedir que se chame os fatos e acontecimentos pelo nome é reação típica dos regimes de exceção. No passado, durante a ditadura, era proibido dizer que havia presos políticos no Brasil, embora eles enchessem os presídios país afora.
Durante o impeachment, sem crime de responsabilidade, tentaram de todas as formas bloquear a denúncia do novo tipo de golpe que estava ferindo a democracia brasileira.
Censurar, agora, uma disciplina na UNB que caracteriza como golpe o processo inaugurado pelo impeachment, em 2016, deixa evidente o aprofundamento do arbítrio e da censura.
Os atos do pseudo-ministro são uma terrível agressão à autonomia universitária, à cultura acadêmica, à livre circulação de ideias e à própria democracia. É abuso típico dos estados de exceção. os maiores inimigos da cultura e da educação.
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Do Diretório Central dos Estudantes da UnB
MANIFESTO EM DEFESA DA AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
O ministro da educação do governo golpista, Mendonça Filho, anunciou que vai operar uma ação judicial contra a Universidade de Brasília pelo anúncio de oferta de uma disciplina intitulada “Tópicos especiais em Ciência Política: o golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil” que procura analisar as fragilidades do sistema político pós ruptura democrática, a ampliação da desigualdade social causada pela política de retirada de direitos e as possibilidades de retomada da democracia colocadas pela resistência popular.
A reitoria da UnB distribuiu nota dizendo que “reitera seu compromisso com a liberdade de expressão e opinião – valores fundamentais para as universidades, que são espaços, por excelência, para o debate de ideias em um Estado democrático” além de afirmar que a formulação de disciplinas é responsabilidade das unidades acadêmicas que possuem autonomia sobre suas ementas e produção científica.
Nós repudiamos esse anúncio do MEC, mais uma medida do estado de exceção em que estamos vivendo, e que ocorre no mesmo momento em que avança a militarização da sociedade, com a intervenção no Rio de Janeiro.
Exigimos que o MEC retire essa ameaça que fortalece o obscurantismo na educação, pisoteia a liberdade das instituições produzirem conhecimento científico.
Defendemos a autonomia didática e administrativa da UNB, pela recomposição orçamentária contra os violentos e injustificáveis cortes orçamentários.
Lutamos por uma universidade com orçamento compatível com suas necessidades estruturantes. Para que reitores possam conduzir os trabalhos sem o receio da arbitrariedade jurídico policial como conduções coercitivas que levaram ao sacrifício do reitor da UFSC e ao atendado à liberdade na UFMG.
Lutamos para que estudantes e professores possam trabalhar pela construção de um conhecimento útil à nação, que contribua para a reflexão dos problemas e desafios de nossa nação e como superá-los, cumprindo assim a função social da universidade.
A consciência democrática da UNB não permitirá a violência anunciada pelo MEC!
DCE UnB Honestino Guimarães – – GESTÃO TODAS AS VOZES
SOLIDARIEDADE AO PROFESSOR LUIS FELIPE E EM DEFESA DA AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
Nós, docentes da Universidade de Brasília, manifestamos nossa total e irrestrita solidariedade ao Professor Luís Felipe Miguel, docente do Instituto de Ciência Política de nossa instituição, que está sendo atacado pela mídia e pelo Ministério da Educação pelo simples motivo de exercer com zelo e responsabilidade o seu dever de educador e oferecer a disciplina Tópicos Especiais de Ciência Política: o golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil.
O ataque não é, na verdade, ao professor Luís Felipe. É um ataque a um dos pilares que sustentam as universidades no mundo e em nosso pais. É um ataque a liberdade de ensinar. Nossa UnB, que foi vilmente atacada durante o período da ditadura militar, esteve na frente do processo de redemocratização e faz parte da conquista prevista nos artigos 205, 206 e principalmente no artigo 207 da Constituição Federal de 1988. A autonomia universitária, em todos os seus aspectos, mas especialmente a didático-cientifica, são conquistas fundamentais para a existência plena de nossas universidades. A liberdade de cátedra é uma das essências de uma universidade e está sendo duramente atacada.
Presenciar um Ministro da Educação, mesmo que seja de um governo ilegítimo e fruto de um golpe, insinuando intervir na UnB por discordar e achar imprópria a oferta de uma disciplina que versa sobre um acontecimento fundamental para a história política recente do país, é um fato gravíssimo e, caso nossa reação não seja proporcional a sua gravidade, abrirá as portas para mais ataques a autonomia universitária.
Este ataque deve ter o repúdio de toda a comunidade. Cabe a nossa seção sindical defender o docente em questão e se manifestar claramente e urgentemente. A Universidade, por meio de seu conselho máximo, deve de maneira contundente, repudiar a tentativa de ingerência do gestor do MEC na sua autonomia.
E mais, a atitude ministerial, os constantes ataques a autonomia didático-pedagógica de docentes da educação básica, somada a intervenção militar no Rio de Janeiro, com revistas em mochilas de alunos do ensino fundamental, e outras medidas autoritárias, denota que nossa democracia está fragilizada e sendo vilipendiada a cada dia. Não são somente nossos direitos trabalhistas e previdenciários que estão sendo ameaçados e retirados, mas há uma tentativa de cercear a liberdade de expressão.
Assim como no passado, nós resistiremos. Faremos jus a história gloriosa de luta democrática que a Universidade de Brasília carrega. Não passarão.
Assinam:
Raquel de Almeida Moraes – Representante dos Coordenadores de Cursos da Faculdade de Educação no CEPE.
Do Fórum Renova ANDES
Foi golpe sim! Nota de solidariedade ao professor Luís Felipe Miguel
O Fórum Renova Andes vem a público declarar seu incondicional apoio e solidariedade ao professor Luís Felipe Miguel, da UnB, diante das ameaças advindas diretamente do ministro da educação no sentido de perseguir funcional e juridicamente uma atividade docente cotidiana.
É esperado que alguém beneficiado diretamente pelo impeachment, pois obteve o cargo após votar pela farsa armada no Congresso Nacional em 2016 contra o voto dos brasileiros, não se sinta à vontade em ver a palavra golpe, a qual descreve precisamente o que foi aquele triste episódio de nossa história. Mas o ministro deveria estar acostumado com tal conceito, pois se trata de alguém cujo partido só existe por ter sido relevante protagonista e vanguarda da ditadura anterior.
Um ministro membro de um governo que coloca o Exército Brasileiro para revistar mochilas de crianças negras e pobres no estado do Rio de Janeiro, que censura diretamente o desfile de uma escola de samba carioca e agora quer determinar o que pode ou não ser discutido nas salas de aula do País.
A universidade tem sido objeto de ataques constantes pela justiça de exceção e pelo governo golpista instalado em 2016. Desde então diversos docentes de todo o País buscam desvelar com metodologia e rigor científicos a dinâmica e as implicações desse triste episódio de nossa história política. O que vem ocorrendo com o professor Luis Felipe Miguel é apenas o prenúncio do que virá contra os todo e qualquer docente que ousar produzir conhecimento autônomo e crítico no Brasil.
Somente os que apoiaram, se beneficiam e/ou se omitiram diante do golpe querem negar sua existência ou ocultar a sua natureza. Por isso combatem a investigação científica, sua divulgação e o debate em ambiente democrático.
É nossa tarefa como movimento docente oferecer solidariedade e defender o professor Luís Felipe Miguel contra todo tipo de perseguição, seja jurídica, institucional ou midiática, uma defesa que é de todos nós, da Universidade, do ensino, da extensão e da pesquisa científica no Brasil.
Nota em Defesa da Universidade, da Liberdade de Cátedra e do Professor Luis Felipe Miguel
1. As declarações e medidas autoritárias do senhor Mendonça Filho são um ataque frontal à Universidade Brasileira e a autonomia didático-científica destas Instituições, garantida pelo artigo 207 da Constituição Federal de 1988;
2. A tentativa de censura promovida pelo senhor Mendonça Filho ao curso “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil” viola a Liberdade de Cátedra dos docentes brasileiros, liberdade essa assegurada pelo artigo 206 da Constituição Federal de 1988;
3. O Professor Doutor Luis Felipe Miguel é um reconhecido pesquisador da área de Ciência Política e seu trabalho é pautado pelo mais absoluto rigor científico e metodológico. Qualquer tentativa de calá-lo se configura como uma tentativa de calar toda a ciência política nacional;
4. A Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP) – instituição reconhecida mundialmente como a representante da comunidade politóloga brasileira – se manifestou em 2016 sobre o golpe de Estado que sofreu a Presidenta Dilma Rousseff. A análise de Luis Felipe Miguel encontra eco, portanto, em na área da Ciência Política;
5. A livre manifestação de pensamento e ensino é um direito humano garantido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.
Recordamos que o autoritarismo é muito danoso ao ambiente universitário e convocamos toda a comunidade acadêmica a se posicionar em favor da Universidade Brasileira, da Liberdade de Cátedra, da Ciência Política e do Professor Luis Felipe Miguel.
Se houver qualquer impedimento ao curso “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”, a ser ministrado pelo Professor Doutor Luis Felipe Miguel na UnB, o Estado Brasileiro mais uma vez dará mostras que está sob o comando de um governo ilegítimo, ditatorial, violador dos direitos humanos e da Constituição de 1988 e que, portanto, deve ser derrotado imediatamente.
Assinam discentes do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFRGS e apoiadores externos:
Vinicius de Lara Ribas – Mestre e Doutorando em Ciência Política
Marina Grandi Giongo – Doutoranda em Ciência Política
Adriana Lameirão – Mestre e Doutoranda em Ciência Política
Maria do Rosário – Deputada Federal, Mestre em Educação e Doutoranda em Ciência Política
Juliana Botelho Foernges – Mestre e Doutoranda em Ciência Política
Carolina Assis – Mestranda em Ciência Política
Cristiana Maglia – Mestre e Doutoranda em Ciência Política
Rafael Lameira – Mestre em História e Doutorando em Ciência Política
Vinicius Valentin Raduan Miguel – Doutorando em Ciência Política
Ana Julia Bonzanini Bernardi – Doutoranda em ciência política ufrgs
Flávio Marcelo Busnello – Doutorando em Ciência Política
Tiago Alexandre Leme Barbosa – Doutorando em Ciência Política
Rafael Cesar Ilha Pinto – Professor UFPel e doutorando em Ciência Política UFRGS
Arthur Augusto Rotta, doutorando ciência política UFRGS
Moisés Lazzaretti Vieira – Mestrando em Ciência Política
Jorge Branco, mestre em Ciência Política e doutorando no PPGCP UFRGS
Apoio Externo
Inês Patrício – Doutora em Ciência Política (IUPERJ), Professora do PPG em Ciência Política da UFF
Wagner Pralon Mancuso – Doutor em Ciência Política e Professor da USP
Mauricio Assumpção Moya – Professor de Ciência Política – UFRGS
Volnei Picolotto – Doutor em Economia do Desenvolvimento/UFRGS e Comitê em Defesa da Democracia/RS
Cleyton Feitosa Pereira – Doutorando em Ciência Política (IPOL/UnB) e Mestre em Direitos Humanos (UFPE)
Carmen Regina Abreu Gonçalves – Professora doutora da Universidade Federal do Pampa
Flavio Ilha – Jornalista
Diego Ellwanger Pereira – Publicitário
Tatiana Brocardo de Castro – Professora
Jucemara Beltrame – Advogada
Tassia Rabelo – Doutora e Professora de Ciência Política da Universidade Federal Vale do São Francisco (Unifasf)
Ezequiel Hanke, Mestre e Doutorando em Teologia – Faculdades EST, São Leopoldo, RS.
Eoin O’Neill , mestrado e doctorade em sociologia (IUPERJ), Pos-Doctorado em Historia (UFF)
Adalberto Moreira Cardoso IESP / UERJ sociólogo
Francisco Carlos Teixeira Da Silva, Professor Titular de História Moderna e Contemporanea/UFRJ.
João Paulo Viana – Professor de Ciência Política da Universidade Federal de Rondônia, Secretário Executivo da ABCP Regional Centro-Norte
Ramiro Goulart – Advogado
Angela Maria Santos Tavares – Aposentada
Maria Aparecida Azevedo Abreu – cientista política – IPPUR/UFRJ
Suelen Aires Gonçalves – Doutoranda em Sociologia UFRGS
Alexandre Arns – Doutorando em Ciência Política (UnB)
De Renato Janine Ribeiro – ex-ministro da Educação
A decisão do ministro da Educação de mandar processar o prof. Luis Felipe Miguel, da UnB, porque este ministrará um curso sobre o golpe de 2016, é absurda.
A pesquisa e o ensino são protegidos, mais que isso, são promovidos pela Constituição.
O ministro deve saber disso.
Mas sua ação é uma tentativa de inibir a vida universitária.
Somada ao silêncio clamoroso do MEC ante a condução coercitiva de Reitores, e mesmo perante o suicídio do Reitor da UFSC, nota-se a dificuldade extrema da atual gestão em lidar com o mundo da pesquisa e do ensino mais qualificados, ou até pior que isso, o medo que ela sente deles.
Nota de apoio ao professor Luis Felipe Miguel da UNB
A diretoria da Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná (APUFPR-SSind), Seção Sindical do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN), manifesta mais uma vez seu repúdio ao ataque à liberdade e a autonomia universitária. A liberdade de discussão LIVRE é o pressuposto da universidade. Não podemos permitir qualquer ataque a essa liberdade.
Assim, entendemos que a ação do Ministério da Educação que busca apurar por meio do que chama “improbidade administrativa” a oferta de uma disciplina de pós-graduação, é um ataque que busca REPRIMIR a liberdade de ensino e a liberdade do docente da referida disciplina, Luis Felipe Miguel. Trata-se de um ataque à liberdade e autonomia universitária.
O docente citado é de reconhecida competência acadêmica, e esse ataque ao trabalho acadêmico é um ataque à liberdade de opinião, de discussão, de pesquisa, de ensino e de trabalho. Trata-se de uma perseguição política escancarada que se soma ao conjunto de perseguições que vários docentes tem passado no Brasil e no mundo. A ação do MEC é abusiva e desnecessária.
Essas medidas impostas, têm como objetivo perseguir, reprimir, criminalizar, amedrontar e impedir o livre debate e o ensino independente! Não podemos aceitar essas práticas! Todo apoio ao docente Luis Felipe Miguel!
Fonte: APUFPR-SSind
http://apufpr.org.br/nota-de-apoio-ao-professor-luis-felipe-miguel-da-unb/
Frente Ampla de Trabalhadoras e Trabalhadores do Serviço Público pela Democracia
Manifesto de apoio à Universidade de Brasília e a Luís Felipe Miguel
Não nos curvaremos. Não baixaremos a cabeça. Ombreamos com o Professor Luís Felipe Miguel, que conta com nosso apoio e solidariedade neste momento em que a autonomia universitária encontra-se ameaçada. Que estejam atentos aqueles se julgam alheios e imunes aos ataques golpistas dentro das universidades. Como se sentiriam ao submeter as ementas de suas disciplinas a pessoas que, fora o poder de polícia, nada tem a contribuir com as questões a serem discutidas?
O golpe avança em passos rápidos rumo ao obscurantismo. Depois de cassar o voto de 54 milhões de brasileiros e brasileiras utilizando-se de subterfúgios, deixa evidente sua face agressora ao colocar o povo do Rio de Janeiro sob a opressão militar. Como se fosse insuficiente demonstrar sua violência sobre a vida das pessoas que somente desejam construir um país justo para viver, acrescenta medidas atentatórias contra a produção do conhecimento, do pensamento e da inteligência humana, ao ameaçar com censura e intimidação a Universidade de Brasília.
O golpe teve início com a judicialização da política, com a decisão autoritária, ilegal e arbitrária de servidores que nunca foram eleitos sobre os destinos de representantes legítimos do povo brasileiro.
Aprofunda-se agora por esta via, em que o ministro ilegítimo busca interferir na liberdade de pensamento da universidade pela força jurídica.
Sem uma reação popular contundente, amanhã as portas das universidades serão novamente arrombadas pelos coturnos militares: como em 29 de agosto de 1968, às vésperas da promulgação do AI-5; como hoje nas comunidades do Rio de Janeiro.
Por reconhecer esse estado de opressão e desmando, este coletivo de trabalhadores manifesta seu mais veemente repúdio à tentativa de proibir o professor Luís Felipe Miguel de ministrar curso que discute o Golpe de 2016. O pesquisador enfrenta a questão, como excelente cientista que é, com argumentos e sem dogmas. Alinha o que há de mais sofisticado no pensamento crítico nacional e internacional. Aliás, há, em outros países, reconhecidos autores e pesquisadores que tratam de estados de exceção, como este em que vivemos na atualidade, sem ter que enfrentar mais que frutíferos debates acadêmicos.
A hora é de solidariedade com a liberdade de pensamento.
Que sejam livres as universidades.
Que nunca mais os coturnos marchem sobre as cabeças de nossos professores e estudantes.
Que seja livre a Universidade de Brasília, patrimônio do povo brasileiro, concebida pelo inesquecível Darcy Ribeiro.
Liberdade de pensamento para o Professor Luís Felipe Miguel!
No Nocaute
Ex-reitor da UnB, deputados e advogados entram com ação contra ministro da Educação
Documento acusa Mendonça Filho de violar a liberdade de cátedra e autonomia universitária ao se manifestar contra curso ministrado na UnB sobre golpe contra Dilma
José Geraldo de Sousa Júnior, ex-reitor da Universidade de Brasília, Marcio Sotelo Felippe, ex-Procurador Geral do Estado de São Paulo, Wadih Damous, deputado federal (PT), Paulo Pimenta, deputado federal (PT), e Patrick Mariano Gomes, advogado, protocolaram nesta quinta-feira (22) uma representação no Conselho de Ética da Presidência da República e na Procuradoria-Geral da República contra o ministro da Educação, Mendonça Filho.
O documento acusa o ministro de violar a liberdade de cátedra e a autonomia universitária ao se manifestar contra o curso dado pelo professor Luis Felipe Miguel, da Universidade de Brasília, “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”.
Mendonça Filho disse que acionaria a Advocacia-Geral da União, Controladoria-Geral da União, Tribunal de Contas da União e o Ministério Público Federal para “apurar se há algum ato de improbidade administrativa ou prejuízo ao erário a partir da disciplina”.
Em texto postado no Facebook, o ministro diz que “não se pode ensinar qualquer coisa”: “Se cada um construir uma tese e criar uma disciplina, as universidades vão virar uma bagunça geral. A respeitabilidade no ambiente acadêmico fica na berlinda”.
Clique aqui para acessar a íntegra da representação.
O enterro da “democracia utópica”
No Brasil, a disseminação do enquadramento liberal fez com que nossa própria transição política fosse avaliada tendo como único metro as instituições formais que dela emergiram.
Publicado em 22/02/2018 // pelo Blog da Boitempo 6 comentários
Por Luis Felipe Miguel.
Quando o bloco soviético entrou em colapso, a ciência política estadunidense entrou em festa. Era o triunfo simultâneo do capitalismo e da democracia, enfim unidos como par indissociável. Uma democracia, é claro, plenamente equiparada à sua efetivação nas sociedades ocidentais. Samuel Huntington, o veterano cold warrior de Harvard, escreveu que a “terceira onda” de democratização, no último quarto do século XX, punha fim à polêmica sobre o sentido da democracia, em favor de sua versão concorrencial, limitada. Ainda mais ousado, Francis Fukuyama, então estrela em ascensão no neoconservadorismo, decretou a chegada do fim da história, com uma eternidade de economia de mercado e instituições políticas liberais nos aguardando pela frente.
Huntington e Fukuyama nunca foram santos de devoção da esquerda, mas ela também não ficou imune ao novo clima. Um debate que começara no meio dos anos 1970, no eurocomunismo italiano, e que chegou ao Brasil no final daquela década, por meio de um famoso artigo de Carlos Nelson Coutinho, foi resolvido meio de supetão: a democracia estava alçada à condição de valor universal. Aliás, sem nenhuma das ponderações que o próprio Coutinho apresentava, sobre a necessidade de avançar para uma “democracia pluralista de massas”, superando os obstáculos que a ordem capitalista impõe à ampla participação popular. A parafernália institucional do liberalismo foi aceita como alfa e ômega do ordenamento político e, mais, foi aceita em seus próprios termos, como fórmula para resolver as disputas em paz e em igualdade de condições.
Não por acaso, naquele momento a teoria política crítica aderia a modelos também convergentes com o enquadramento liberal e cada vez mais despreocupados com o impacto político das desigualdades sociais. O ideal da “democracia deliberativa”, que colonizou o espaço das visões democráticas radicais, assumia que, estabelecidas as condições para um diálogo abrangente, franco e igualitário, seria alcançado um autêntico consenso racional sobre todas as questões polêmicas. As relações sociais de dominação eram transcendidas por um ato de vontade teórica e nossa meta passava a ser uma versão sofisticada do velho “conversando a gente se entende”. Os instrumentos para o tal diálogo franco, como os teóricos da corrente não tardaram em indicar, já estavam nas instituições da própria democracia liberal.
No Brasil, a disseminação do enquadramento liberal fez com que nossa própria transição política fosse avaliada tendo como único metro as instituições formais que dela emergiram. O resgate da imensa dívida social podia ser considerado importante, até mesmo crucial, mas formava um capítulo à parte. A convivência entre democracia e desigualdade aparecia como natural e pouco problemática. A crença num céu político completamente desvinculado de sua base material, que Marx já denunciava, tornou-se artigo de fé geral.
Quando as nuvens do golpe de 2016 já sombreavam o horizonte, a maior parte da ciência política brasileira ainda via nossa democracia como “consolidada”. E mesmo hoje, quando o som dos coturnos em marcha alcança nossos ouvidos, muitos ainda se perguntam como pôde ter acontecido o que aconteceu e não vislumbram nenhum projeto além da restauração da ordem que foi derrubada junto com a presidente Dilma Rousseff.
Mas tal restauração, caso alcançada, padecerá da mesma fragilidade que foi congênita à institucionalidade instaurada com a Constituição de 1988. A coexistência entre democracia e desigualdade só é tranquila caso a democracia contenha a cada momento seu impulso igualitário. Num país como o Brasil, cujas classes dominantes são tão arredias a qualquer diminuição da distância que as separa do resto da população, isto significa uma democracia que, na tentativa sempre frustrada de se afirmar consolidada, nega permanentemente a si mesma. Como o golpe demonstrou de forma cabal, mesmo o programa reformista mais tímido possível, aquele que o PT no poder adotou, foi demasiado.
Não é errado ver na democracia um método para a resolução pacífica dos conflitos sociais. Mas só ver isso é deixar de lado sua outra face, ao menos igualmente importante. A democracia traz, em seu próprio nome, um paradoxo: é o governo do povo, isto é, é o governo daqueles que são governados. Seu princípio é conferir poder a quem não o tem. É um regime que, para ser digno de si mesmo, deve entrar em combate contra todas as formas de opressão e dominação vigentes na sociedade. Talvez o que nos permita alcançar uma democracia mais consolidada não seja a minimização de sua ambições, a fim de não ameaçar os dominantes, mas, ao contrário, a construção de uma sociedade mais igualitária.
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A Boitempo prepara-se para lançar em breve o novo livro de Luis Felipe Miguel: Dominação e resistência: desafios para uma política emancipatória.
A obra apresenta uma discussão sobre o sentido da democracia e sua relação com os padrões de dominação presentes na sociedade. A ordem democrática liberal não pode ser entendida como a efetiva realização dos valores que promete, pois a igualdade entre os cidadãos, a possibilidade de influenciar as decisões coletivas e a capacidade de desfrutar de direitos são sensíveis às múltiplas assimetrias que vigoram na sociedade. Porém, tampouco pode ser lida segundo a crítica convencional às “liberdades formais” e à “democracia burguesa”, que a apresenta como mera fachada desprovida de qualquer sentido real. Assim, a democracia não é um ponto de chegada, e sim um momento de um conflito que se manifesta como sendo entre aqueles que desejam domá-la, tornando-a compatível com uma reprodução incontestada das assimetrias sociais, e quem, ao contrário, pretende usá-la para aprofundar contradições e avançar no combate às desigualdades. Portanto, o conflito na democracia é um conflito também sobre o sentido da democracia, isto é, sobre quanto ela pode se realizar no mundo real como projeto emancipatório e quanto as instituições vigentes contribuem para promovê-la ou para refreá-la.
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Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, onde coordena o Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades – Demodê, que mantém o Blog do Demodê, onde escreve regularmente. Autor, entre outros, de Democracia e representação: territórias em disputa (Editora Unesp, 2014), e, junto com Flávia Biroli, de Feminismo e política: uma introdução (Boitempo, 2014). É um dos autores do livro de intervenção Por que gritamos golpe? Para entender o impeachment e a crise política no Brasil. Seu livro mais recente é Dominação e resistência: desafios para uma política emancipatória (Boitempo, 2018). Colabora com o Blog da Boitempo mensalmente às sextas. https://blogdaboitempo.com.br/2018/02/22/o-enterro-da-democracia-utopica/
A democracia domesticada: bases antidemocráticas do pensamento democrático contemporâneo
A concepção corrente de “democracia”, tanto no senso comum como no ambiente acadêmico, está cindida em dois. De um lado, a idéia de “governo do povo”, que corresponde a seu significado etimológico; é a herança dos gregos, que nos deram a palavra e parte do imaginário associado à democracia. De outro, a democracia está ligada ao processo eleitoral como forma de escolha dos governantes. O principal traço comum aos regimes que são considerados democráticos é a realização de eleições periódicas e livres para o governo – “livres” significando, em geral, a ausência de violência física e de restrições legais à apresentação de candidaturas. Outras interferências sobre o pleito, como o uso do poder econômico e o partidarismo da mídia, podem ser vistas como prejudiciais, mas não a ponto de deslegitimar o processo.
O problema é que as duas faces do conceito de democracia se mostram, em alguma medida, incompatíveis entre si. Em primeiro lugar, a própria instituição da eleição era vista, da Antiguidade ao século XVIII, como oposta ao ordenamento democrático, que pressupunha a igualdade entre os cidadãos e, portanto, devia utilizar o sorteio como forma de escolha dos governantes (Manin, 1997; Miguel, 2000). Mais importante, porém, é o fato de que, em nenhum dos regimes hoje considerados democráticos, o povo realmente governa. As decisões políticas são tomadas por uma minoria, via de regra mais rica e mais instruída do que os cidadãos comuns, e com forte tendência à hereditariedade.
Tudo isso está longe da concepção normativa que a palavra “democracia” continua a carregar: uma forma de organização política baseada na igualdade potencial de influência de todos os cidadãos, que concede às pessoas comuns a capacidade de decidir coletivamente seu destino. Está longe, também, da experiência clássica. Sobre a Atenas dos séculos V e IV a.C., é possível dizer que, em alguma medida, o povo governava – se entendemos por “povo” o conjunto dos cidadãos, isto é, com a exclusão da maior parte da população (mulheres, escravos e metecos). As principais decisões políticas eram tomadas pela assembléia popular, que era soberana. Não se está querendo dizer que o modelo grego seja aplicável nas condições contemporâneas, ou que as limitações no acesso à cidadania não tivessem importância política. Pelo contrário, a exigência de inclusão, com a ampliação do conflito latente de interesses no seio do demos, talvez coloque obstáculos ainda maiores à replicação da experiência ateniense do que os decorrentes da expansão do território e da população.
Também não se quer afirmar que na Ática não houvesse uma liderança com influência desproporcional na condução dos negócios públicos. Apenas que, naquele contexto, a palavra “democracia” designava um conjunto específico de instituições voltadas, muitas delas, para permitir a participação efetiva dos cidadãos na tomada das decisões políticas. Instituições como a assembléia popular e o preenchimento de cargos por sorteio permitiam uma presença muito maior do homem comum no processo decisório e obrigavam os próprios candidatos à liderança a uma supervisão muito mais estrita dos populares. Em especial, ninguém estava condenado a ser liderado, já que o instituto da isegoria garantia a todos direito igual à fala no espaço decisório, isto é, na ágora. Mais do que uma forma de liberdade de expressão, tal como a entendemos hoje, a isegoria representava o direito de ser escutado durante o processo de tomada de decisão1.
Já na democracia contemporânea, o povo é condenado à quase passividade. Exerce sua “soberania” de tempos em tempos, no momento da eleição. Ainda assim, limita-se a escolher entre as opções que lhe são apresentadas por grupos organizados, já que o próprio sentido da representação política foi alterado, destinando ao eleitor um papel reativo (ver Bourdieu, 1990:188). Parte dessa distância entre as duas faces da democracia, a clássica (ou etimológica) e a atual, pode ser creditada ao fato de os regimes democráticos contemporâneos serem entendidos e vividos a partir de pressupostos – sobre a natureza humana e sobre a organização das sociedades – emprestados de uma corrente teórica que nasceu para afirmar a impossibilidade das democracias: a chamada “teoria das elites”.
Os fundadores dessa corrente, Mosca, Pareto e Michels, não escondiam sua oposição aos movimentos democráticos e socialistas presentes na virada do século XIX para o XX. Suas obras revelam a apreensão com a atuação desses movimentos e buscam demonstrar que seus objetivos igualitários eram ilusórios. Segundo eles, sempre vai haver desigualdade na sociedade, em especial a desigualdade política. Isto é, sempre existirá uma minoria dirigente e uma maioria condenada a ser dirigida, o que significa dizer que a democracia, enquanto “governo do povo”, é uma fantasia inatingível. Pois é exatamente esta visão que, sobretudo a partir da teoria de Schumpeter, publicada nos anos 1940, se torna a base da tendência dominante da teoria democrática – e penetra profundamente na concepção corrente sobre a democracia.
A ASCENSÃO DAS “MASSAS”
Ao longo dos séculos XVIII e XIX, constituíram-se poderosas correntes de pensamento político que afirmavam a possibilidade e a necessidade de maior igualdade entre os homens – pensadores como Rousseau, Fourier, Proudhon ou Marx, que, de diferentes maneiras, propugnavam uma sociedade eqüitativa. Mas o fantasma da igualdade não estava encarnado apenas em teorias. Na Europa, começava a haver, de fato, uma democratização da vida social, sobretudo a partir do momento em que a classe operária irrompeu com face própria na cena política, com a Revolução de Fevereiro de 1848, na França. Antigos privilégios foram questionados e perderam sustentação legal. O direito ao voto foi paulatinamente estendido, até alcançar o sufrágio masculino. No campo das mentalidades, os plebeus passavam a se considerar iguais aos nobres, a deferência do povo em relação às classes altas diminuía. Em suma, as estruturas aristocráticas foram sendo corroídas.
Uma das análises mais perspicazes do processo foi feita por Alexis de Tocqueville, no clássico A Democracia na América, cujos dois volumes foram publicados originalmente em 1835 e 1840. Tocqueville não era um simpatizante da igualdade. Pelo contrário, como integrante da nobreza francesa e discípulo de Montesquieu, valorizava o papel “equilibrador” que a aristocracia desempenharia na sociedade. Mas ele via como inevitável o progresso da igualdade, que parecia, segundo sua expressão famosa, comandado pela própria Providência Divina. O avanço da igualdade era um fato durável, universal, imune à interferência humana. Mesmo medidas voltadas para contê-lo terminavam por auxiliá-lo (Tocqueville, 1992:6). Percorrer os Estados Unidos (a América do título), o país onde a igualdade estava mais desenvolvida, era conhecer o futuro da Europa.
Para Tocqueville, “igualdade” e “democracia” eram quase sinônimos. Não é possível haver democracia sem igualdade; e a igualdade leva necessariamente à democracia. Sem ser democrata, Tocqueville julgava ser necessário aprender a conviver com a democracia, que seria o regime político do futuro. Não interessa, aqui, discutir a acurácia da descrição que o nobre francês faz dos Estados Unidos do século XIX – um país bem menos igualitário do que ele afirma, a começar pela presença da escravidão, instituição sobre a qual discorre, mas que parece julgar que está “à parte” na sociedade estadunidense. O importante é que A Democracia na América apreendeu o movimento de democratização existente no seu tempo e projetou sua irresistível vitória final, em um quadro apavorante para aristocratas mais inquietos do que seu autor.
É nesse momento, quando a desigualdade é questionada, que se reerguem as vozes dos que afiançam que ela é “natural” e “eterna” – o que talvez seja a definição mais simples do elitismo. No seu sentido corrente, o elitismo pode ser descrito como a crença de que a igualdade social é impossível, de que sempre haverá um grupo naturalmente mais capacitado que deterá os cargos de poder. Não se trata de idéia nova: o sonho de Platão na República, com a divisão de castas (de acordo com a capacidade de cada um), reflete essa visão, bem como a crença de Aristóteles na existência de “escravos por natureza”. A palavra “natureza” é crucial: para o elitismo, a desigualdade é um fato natural. Isto está na raiz da atração que o pensamento elitista tem sobre aqueles que ocupam posições de elite. Em vez de estarem nessas posições como fruto do acaso, de contingências ligadas à estrutura da sociedade, seriam recompensados por seus méritos intrínsecos.
Se uma pessoa pensa que tem acesso a determinados bens materiais ou culturais, inatingíveis para boa parte da população, como uma recompensa por suas qualidades intrínsecas, isto lhe dá um reconfortante sentimento de superioridade, acompanhado do desprezo pelos que não são tão bons. Ela poderia pensar diferente; que estar na universidade, por exemplo, em um país de analfabetos, significa que foi privilegiada por uma série de circunstâncias – e então, em vez da sensação de superioridade, poderia vir um sentimento de responsabilidade social. Mas é muito mais gratificante, para o indivíduo que pertence à elite, olhar para o balconista da loja, para o operário, para o engraxate, e pensar “puxa, como eu sou superior” do que refletir que um pequeno acidente de percurso poderia inverter as posições.
A fruição estética é extremamente importante para gerar esse sentimento de superioridade: o intelectual que lê Proust e ouve Bach menospreza a massa que consome programas de auditório e livros de auto-ajuda. Isso seria fruto de uma sensibilidade mais apurada, inata. Daí provém o fascínio que muitos artistas e escritores sentiram pelo elitismo, inclusive em sua versão mais extrema, fascista. Pound, Eliot, Yeats, Dalí, Céline, Knut Hamsun são apenas alguns nomes de uma longa lista. Há um poema de D. H. Lawrence que reflete bem essa postura; um dos versos afirma: “A vida é mais vívida em mim do que no mexicano que conduz minha carroça”. Não é (como poderia ser) uma discussão sobre a desigualdade social, sobre os bens materiais e culturais a que Lawrence tinha acesso, e que enriqueciam sua vida, e o carroceiro não. É uma exaltação da própria superioridade intrínseca, como o início do poema deixa claro, comparando a “vividez” da vida em diversas espécies animais e vegetais. A diferença entre o poeta e o trabalhador mexicano, portanto, seria tão natural quanto a que separa o dente-de-leão da samambaia ou a serpente da borboleta2. No entanto, a sensibilidade estética também não é um dom “natural”, mas algo fabricado; mais ainda, a diferença de sensibilidade estética é socialmente usada como forma de construir as distinções sociais (Bourdieu, 1979).
Lawrence escrevia no começo do século XX. O final do século XIX e o início do seguinte foram momentos em que o elitismo de boa parte dos intelectuais se mostrou mais evidente. Não por acaso, é o período em que a ameaça de uma vitória política das classes trabalhadoras é maior (entre, digamos, a Comuna de Paris, em 1871, e a acomodação social-democrata com o capitalismo, nas décadas que se seguiram à Primeira Guerra Mundial). Mais do que a simples afirmação da desigualdade, os escritos da época revelam ódio contra a “plebe ignara” e um marcado sentimento de distância, como se pertencessem a outra espécie.
À parte os teóricos políticos das elites, que serão analisados na próxima seção, dois pensadores canalizaram e expressaram com especial nitidez essa apreensão das classes altas: o alemão Friedrich Nietzsche e o espanhol José Ortega y Gasset. Um autor simpático a Nietzsche definiu seu pensamento político como sendo uma “justificação complexa e incomum” da exploração, da dominação e da escravidão (Ansell-Pearson, 1997:19); para John Rawls (1997:359), ele é um exemplo da vinculação ao “princípio da perfeição”, isto é, a idéia de que a sociedade deve se organizar de forma a permitir que os “grandes homens” realizem obras excepcionais. Já Ortega y Gasset (1987) vê a civilização ocidental ameaçada pelo nivelamento social, a “rebelião das massas”, como diz o título de seu livro mais famoso.
O primeiro ponto relevante da filosofia de Nietzsche é seu irracionalismo. Por que valorizamos a verdade?, ele pergunta. Por que a inverdade ou a incerteza não são melhores? (Nietzsche, 1992:9) É a reação contra o Iluminismo; os homens do final do século XIX começavam a perceber que o império da razão não era libertador, como acreditavam os filósofos iluministas; que muitas injustiças podiam ser desculpadas com argumentos racionais. O estilo de Nietzsche é coerente com sua recusa da razão. Ele é obscuro, metafórico, ambíguo porque busca atingir não (ou não prioritariamente) a razão dos leitores, mas seus instintos e intuições. No lugar da razão, Nietzsche vai colocar, como fundamento que deve guiar as ações humanas, a vontade: a vontade de poder (ou vontade de potência, de acordo com a tradução). É o princípio afirmativo da vida, o desejo que todos têm de se impor diante do meio (necessariamente hostil). Para o filósofo alemão, o objetivo que guia a ação dos organismos vivos – ou das sociedades – não é a mera autoconservação, como muitos pensaram, mas a busca da própria superação, o “tornar-se mais” (Nietzsche, 1918, vol. 2:121-136). Em seu sistema moral, esta vontade não é apenas o princípio da vida, mas a qualidade que concede o direito à própria vida. Contentar-se com a permanência é trair esse impulso vital básico.
Ocorre que alguns homens teriam mais vontade de poder e, portanto, deveriam governar. A maioria, menos dotada dessa qualidade, seria medrosa e não conseguiria impor sua vontade. Só lhe restaria obedecer. Assim, para Nietzsche (1992:103), a sociedade é naturalmente dividida em vencedores e perdedores, e a democracia é uma aberração, uma “decadência ou diminuição” do homem. Ela significa que a maioria fraca e covarde vai impor sua vontadezinha medíocre sobre os grandes homens, cuja poderosa vontade deveria triunfar. É “imoral”, ele diz, julgar que todos são iguais, que as mesmas regras valem para todos: a hierarquia precisa ser respeitada. Além de uma aberração, a democracia é um contra-senso, pois os fortes de vontade de poder jamais se submeteriam à maioria medrosa. Apavorado com a ameaça de nivelamento social, Nietzsche parece não perceber que, de acordo com seu raciocínio, ela é impossível, sob qualquer aspecto.
Uma solução parcial para essa impossibilidade está no fato de que, junto com o avanço da democracia, vem a disseminação da moralidade – que ele define como sendo “o instinto de rebanho no indivíduo” (Nietzsche, 2001:142). Os fortes não podem se guiar por regras morais de bondade ou altruísmo, já que devem estar comprometidos apenas com a própria vontade do poder. Sua característica distintiva é a capacidade de “deixar sofrer” (Nietzsche, 1992:102). Nesse sentido, estão “além do bem e do mal”3. A imposição da moral convencional, necessária apenas “para o rebanho”, sobre o puro egoísmo dos superiores mina sua vontade de poder, portanto destrói as bases de sua superioridade e da hierarquia social.
No entanto, a exigência da universalização da moral convencional mostra que os fracos não estão mais tão submissos quanto deveriam, e desejam impor condições a seus superiores. É aquilo que Nietzsche chamou de “revolta dos escravos”, e que ele indicava como o grande problema da época. Os fortes precisavam mostrar que sua vontade de poder não havia fraquejado e esmagar essa revolta.
É evidente que Nietzsche não era nazista, até porque seria um anacronismo. Mas não é possível negar que seu pensamento foi apropriado pelos nazistas por ser, em grande medida, compatível com o hitlerismo. A idéia da “vontade de poder” inspirou a geopolítica de Ratzel e Kjellen, que viam o Estado como um organismo vivo e, portanto, querendo “tornar-se mais”. Isto, por sua vez, inspirou a doutrina nazista do Lebensraum, o “espaço vital”, sustentação ideológica do expansionismo alemão. A divisão entre a minoria poderosa com vontade de poder e a maioria fraca e covarde ganhou uma roupagem racista mais explícita, mas continuou essencialmente a mesma. O próprio Nietzsche (1998:28), aliás, relacionava a “revolta dos escravos” a uma “revolta judia”, que procurava impor aos senhores a moralidade judaico-cristã. A busca do Übermensch (o “Além-do-Homem” ou “Super-Homem”, segundo as traduções), o ser humano superior que abandonou toda a moral (Nietzsche, 1977), ganhou contornos pseudocientíficos com a introdução da eugenia4. Sobretudo, Nietzsche e o fascismo, como os pensadores elitistas em geral, compartilham uma visão profundamente antidemocrática; exaltavam e naturalizavam as desigualdades e viam como perniciosa a participação popular na política. Por isso, Nietzsche pôde ser apropriado pelo nazismo; por isso, Mosca, Pareto e Michels, os teóricos elitistas políticos clássicos, simpatizavam com o fascismo (e foram usados para legitimá-lo).
José Ortega y Gasset parece um Nietzsche moderado. A Rebelião das Massas reúne artigos escritos entre 1920 e a metade dos anos 1930; na época, chegou a ser considerado equivalente (em importância) ao Contrato Social ou O Capital, mas hoje é bem menos respeitado. Trata-se de uma obra importante historicamente, por exprimir uma certa posição política e uma certa sensibilidade intelectual, mas sem brilho teórico significativo.
Ortega y Gasset (1987:37) parte da observação de um fenômeno cotidiano: a presença física do povo em locais antes reservados às elites. Trens, concertos, museus, tudo parecia estar lotado, como conseqüência do rompimento de certas barreiras que separavam a massa dos “superiores”. Na verdade, por trás da teorização do pensador espanhol está um agastamento simples, egoísta: o de quem sai para jantar e encontra o restaurante lotado.
Foi visto, acima, como a diferença de sensibilidade estética era importante para que as elites afirmassem sua própria superioridade. Por isso, o fato de a massa buscar acesso à fruição artística era uma das principais causas da irritação de Ortega, que enfatizava que a grande obra de arte deveria ser acessível apenas a poucos (Ortega y Gasset, 1942). A posição oposta, democrática, é expressa na mesma época por Maiakovski (1984:183-184), que manifesta seu maravilhamento quando, na Rússia revolucionária, a poesia chega ao povo e ele vê “dois mujiques grandes como elefantes” discutindo versinhos5.
Para Ortega, a massa define-se por uma característica psicológica. Pertence a ela quem não se incomoda em ser igual aos outros. Percebe-se aí a típica perspectiva aristocrática, que vê na desigualdade um bem em si mesmo. À massa opõem-se os “seletos”, aqueles que exigem mais de si próprios e cujas características seriam individuais e inatas; nada têm a ver com a situação social ou econômica, nem podem ser alteradas pela educação, que serve para fornecer conhecimentos, mas não cria o espírito (Ortega y Gasset, 1987:38-39 e 70). Dessa forma, as hierarquias sociais são naturalizadas e, portanto, legitimadas.
Tudo estava bem enquanto as massas eram “disciplinadas” e “se satisfaziam com seu papel”. A rebelião atual tem a ver com o fato de elas “não conhecerem mais seu lugar”. Segundo Ortega y Gasset (idem:128), o destino da massa é ser comandada, mas hoje ela se revolta contra o destino. Dois são os pontos fundamentais: as massas perderam a noção da existência de superiores e perderam a ciência de que há atividades especiais (como a política) que exigem dons específicos e onde, portanto, ela não deve interferir6. O perigo que surge daí é a “hiperdemocracia”, em que os inferiores desbancam os superiores. Ele vai aproximar esse processo da política totalitária – o homem-massa identifica-se com o Estado e quer dele fazer tudo (idem:131-132). Aqui, ele avança uma tese que será comum às teorias elitistas da democracia, a de que o excesso de presença popular na cena política é um passo certo para o totalitarismo.
Com base na crença da desigualdade natural, o que Ortega y Gasset propõe é uma limitação da democracia. Uma vez que as diferenças são inatas, elas devem ser institucionalizadas. Em seu livro, há uma reveladora defesa dos privilégios, direitos “privados” conquistados pelos superiores e mantidos por seu esforço, em contraposição aos direitos humanos universais, que são concedidos sem que nada seja exigido em troca (idem:81). As massas rebeladas desejam eliminar todos os privilégios. Por isso, precisam ser contidas.
A TRINDADE DO ELITISMO “CLÁSSICO”
Pensadores como Nietzsche e Ortega y Gasset formularam os princípios filosóficos do elitismo, com a afirmação da desigualdade natural e a crença de que sua contestação era o principal sinal da crise do mundo contemporâneo. Mais ou menos na mesma época, surgia a teoria política das elites, que procurava demonstrar, com pretensa base científica, que a dominação das minorias era inevitável e a democracia, impossível. Seus fundadores foram o engenheiro, economista e sociólogo franco-italiano Vilfredo Pareto e o jurista e sociólogo italiano Gaetano Mosca, que disputaram entre si o título de pioneiro da corrente; um pouco mais tarde, viria a contribuição do sociólogo Robert Michels, alemão de nascimento e italiano por adoção.
A principal obra sociológica de Pareto é o Tratado de Sociologia Geral (1935 [1916]). Sua ambição é criar uma ciência perfeitamente neutra e experimental, tendo a química como modelo. Por isso, empreende a tarefa de buscar os “átomos” e “moléculas” da ação em sociedade – e encontra-os na psique humana. A sociologia de Pareto é, na verdade, uma psicologia política. Um dos pressupostos básicos é que as ações humanas têm, quase todas, caráter irracional, sendo guiadas por partículas eternas e imutáveis da personalidade (os “átomos” que procurava), às quais dá o nome de “resíduos”. As razões para a ação, longe de serem sua causa, são apenas justificativas a posteriori, que Pareto chama de “derivações”.
Ele identifica 52 tipos de resíduos, que cada indivíduo possuiria em combinações variáveis (idem, vol. 2:516-519). É importante sublinhar que Pareto não os vê como constructos teóricos, mas como elementos naturais que ele apenas detecta. Em uma manobra típica do pensamento paretiano, a classificação dos resíduos passa do complexo para o esquemático. Primeiro, os 52 tipos são transformados em seis classes, das quais quatro são desprezadas. Restam os resíduos da classe I (“instintos de combinações”) e da classe II (“permanência dos agregados”). Depois, de forma quase imperceptível, eles deixam de ser átomos de comportamento para se tornarem traços definidores de personalidade. Há pessoas classe I e pessoas classe II; as primeiras são conciliadoras e astutas, as segundas, intransigentes e violentas. Assim, o modelo “científico” de Pareto reduz-se ao velho tropo das raposas e dos leões, presente no pensamento clássico e retomado na Renascença, entre outros por Maquiavel.
Aqui, é possível inserir o conceito de elite. Pareto afirma que elite é o nome dado ao grupo de indivíduos que demonstram possuir o grau máximo de capacidade, cada qual em seu ramo de atividade. Cada um desses ramos possui algumas pessoas que são as mais bem-sucedidas e a reunião delas forma a elite (idem, vol. 3:1421-1423). Ele acredita que seu conceito é neutro e não-valorativo. O grande cirurgião e o grande financista fariam parte da elite em seus respectivos setores, da mesma maneira que o ladrão mais habilidoso ou o pistoleiro de melhor pontaria. Pelo conceito paretiano, a elite define-se através das qualidades intrínsecas de seus integrantes – ao contrário do emprego corrente do termo, que incorpora a capacidade de influência. De acordo com este uso, um gênio isolado, que nunca publicou nada, não poderia estar na elite intelectual, já que possui influência reduzida ou nula. Na visão de Pareto, ele pertenceria objetivamente a essa elite, mesmo que não fosse reconhecido como tal. Suas elites, a princípio, não precisam ter qualquer repercussão na sociedade.
A existência das elites revelaria a desigualdade – natural – entre os homens, da qual a desigualdade social seria um mero efeito. Pareto insiste que, mesmo em um sistema de castas fechado, como o indiano, há brechas para que os melhores das classes inferiores subam; ainda mais em uma sociedade como a ocidental, onde ele vê uma mobilidade excessivamente rápida entre as classes. Esta é a questão central da teoria elitista no debate contra os igualitaristas. Já que a desigualdade é natural, fruto dos diferentes talentos, seria impossível eliminá-la, para não dizer injusto. Além disso, Pareto aplaina diferenças fundamentais, presentes na sociedade, ao tratar as muitas elites como se fossem idênticas. Segundo ele, o mendigo que faz ponto na frente da igreja matriz, e portanto é o mais bem-sucedido na sua atividade, é tão “de elite” quanto o bilionário que ganha rios de dinheiro com a especulação financeira.
Entretanto, Pareto introduz uma distinção essencial no seio da elite: a que separa a elite governante, que exerce o poder político, de todo o resto, chamado de elite não-governante. A existência de um grupo minoritário que monopoliza o governo é, para ele, uma constante universal das sociedades humanas. Outra constante é a rotação entre os integrantes desse grupo. É a teoria da “circulação das elites”, provavelmente, a principal contribuição de Pareto à sociologia política.
Para o bom andamento do governo, haveria necessidade tanto da astúcia quanto da disposição para o uso da força, isto é, a elite governante deve possuir tanto indivíduos da classe I quanto da classe II, raposas e leões. Para se perpetuar, esse governo deve cooptar os indivíduos talentosos que existam dentro da sociedade. Ora, os leões, justamente por serem leões, não são dados a compromissos, e não aceitarão a cooptação, que ocorre em geral para postos (a princípio) subalternos. Só as raposas ascenderão ao poder, causando um desequilíbrio. Em primeiro lugar, haverá um governo formado total ou majoritariamente por indivíduos da classe I, que preferem usar apenas a astúcia e vacilam em empregar a força. A segunda conseqüência é um acúmulo de leões privados de poder, mas desejosos de alcançá-lo, formando uma “contra-elite”. Chega um momento em que a pressão é grande demais, os indivíduos da classe II promovem uma revolução e instauram um governo leonino (idem, vol. 3:1431)7. E o processo se reinicia.
Assim, existem duas circulações de elites. A primeira, paulatina, é a cooptação dos “melhores” de baixo (e, imagina-se, a excreção dos “piores” de cima). Mas ela tende a falhar, privilegiando a classe I, e isso faz ocorrer a circulação de segundo tipo, revolucionária. Como resultados dessa visão da história, é importante citar:
i) uma perspectiva essencialista, isto é, há uma essência imutável das relações humanas e do processo histórico. A afirmação da impossibilidade de uma organização social em que não haja uma minoria dominante é o traço definidor das teorias das elites. No momento em que Pareto escrevia, isto era uma tentativa de contradição “científica” às promessas, que também se queriam “científicas”, do movimento democrático e socialista;
ii) a idéia de que todas as mudanças políticas são, por trás das aparências, repetições do mesmo processo, a luta dos leões contra as raposas. Assim, discutir as transformações nas estruturas sociais, a economia ou a ideologia é inútil. Seja a Revolução Francesa, a Revolução Russa, a subida de Mussolini ao poder ou o que for, trata-se apenas de mais um capítulo da luta entre pessoas da classe I e da classe II;
iii) os únicos agentes políticos relevantes são a elite e a contra-elite. A massa é incapaz de intervir no processo histórico. Se parece que o faz, é porque está sendo manobrada por outro grupo;
iv) uma vez que nenhum governo persiste sem sua quota de leões, o uso da força deve ser aceito como inevitável na sociedade (ibidem). Há aqui uma polêmica contra aqueles que se escandalizavam com o uso da repressão, pelo Estado, contra seus adversários (isto é, contra o movimento operário). Fiel à visão essencialista da história, Pareto afirma que, como sempre se usou a violência, ela deve continuar sendo usada da mesma maneira. Da teoria se passa à naturalização, quer dizer, à legitimação da repressão.
O que se deseja, aqui, não é refutar as idéias de Pareto. Caso fosse este o objetivo, seria necessário observar que seu uso das fontes históricas é enviesado, que sua concepção da sociedade e do ser humano é simplificadora ou, ainda, que, ao tratar de temas como o uso da violência, ele aplaina diferenças significativas para daí extrair a “essência transhistórica” que seu argumento requer. Para os objetivos deste artigo, o que interessa é perceber que todo o esforço intelectual de Pareto está voltado à demonstração de que qualquer ordenamento democrático é ilusório. Portanto, é no mínimo bizarro que uma visão de mundo próxima à sua sirva de base para uma tentativa de reconstruir – e não de demolir – a teoria democrática.
A obra de Mosca leva a conclusões semelhantes, embora de forma mais sutil e matizada. Ele também julga inevitável a existência de uma classe dirigente, expressão que usa em lugar de elite. Para ele, o domínio da minoria sobre a maioria é uma constante universal (Mosca, 1939:50). A chave, para entender esse fenômeno, é que a minoria é organizada, enquanto a maioria, justamente por ser tão numerosa, está fadada à desorganização. Se quiser se organizar, precisará constituir uma minoria dirigente dentro de si. O fato de ser organizada torna, segundo Mosca, a minoria mais numerosa do que a maioria (idem:53). Ou seja, o membro da maioria que se insurgir estará sempre isolado contra a classe dirigente, que age em bloco.
Portanto, ao contrário de Pareto, Mosca não está preocupado em determinar quais são os mais habilidosos ou qualificados. Ele despreza as explicações psicológicas, vinculando o domínio da minoria a uma questão organizativa. O passo seguinte, em sua teoria, é a discussão da legitimação: a minoria se faz passar, diante da maioria, como dotada de certa qualidade superior (ibidem). Assim, o exercício do poder é justificado em nome de princípios morais universais. Tais princípios mudam historicamente, de acordo com a transformação material na sociedade. Era a valentia, nas sociedades inseguras do passado, quando o gozo da vida e dos bens dependia de força militar própria e os guerreiros governavam. Em seguida, com o aumento da produtividade da terra e a redução da insegurança, a base do poder passa a ser a propriedade rural, e assim por diante. Trata-se de uma perspectiva materialista, que, em vez da luta entre “resíduos”, apresenta o conflito contínuo entre antigas fontes de poder, que querem se manter, e novas fontes de poder, que desejam emergir.
Como a de seu rival, a teoria de Mosca também investe contra as “ilusões” do movimento operário, que se propunha reunir a maioria da população e levá-la ao poder. Impossível, segundo ele, já que a maioria nunca governa, no máximo pode entronizar outra minoria. Portanto, é uma teoria conservadora, partilhando daquilo que Hirschman (1992:43-72) chamou de “tese da futilidade”: não adianta tentar mudar o mundo, já que, em sua essência, ele permanece sempre o mesmo. E antidemocrática, na medida em que condena como impossível qualquer forma de governo do povo.
Ao contrário dos outros dois, o terceiro teórico clássico das elites, Michels, tinha simpatia pelo socialismo e pelo movimento operário. Por isso, foi estudar a social-democracia alemã (SPD). Aliás, antes de estudá-la, ingressou no partido, militou, participou de vários de seus congressos. Seu livro mais importante, Sociologia dos Partidos Políticos (1982 [1911]), já mostra o desencanto com o socialismo. Mais tarde, Michels aderiu ao fascismo.
Enquanto Pareto e Mosca não se detinham em casos concretos (faziam grandes teorizações e depois pinçavam na história os exemplos que julgavam adequados), Michels adotava o percurso inverso. A partir de um único estudo de caso, o SPD, ele fez uma grande generalização. O núcleo de sua tese é que qualquer tipo de organização caminha para a burocratização. Aqui, ele fica com Mosca: a massa, o grande número, é incapaz de se organizar. Quando resolve fazê-lo, deve fatalmente constituir um pequeno comitê para dirigi-la. Isto é a burocratização: não há mais um movimento espontâneo de massa, e sim algo com uma hierarquia, com regras, com disciplina.
A burocratização assume uma característica especial, que é a oligarquização. Para que a organização aja com eficiência, é necessária a criação de um quadro de funcionários que se dediquem em tempo integral a ela. Ora, essa nova posição funcional gera novos interesses, ligados a ela e diferentes daqueles que a base da organização possui. O operário que se torna um quadro profissional do partido não é mais um operário: é um burocrata ou um líder político. Para os militantes da base, a organização é um meio para alcançar um determinado fim, que, no caso, era a revolução socialista. Para o funcionário, a organização torna-se um fim em si mesma, já que seu ganha-pão está no partido (Michels, 1982:223).
Segundo Michels, isto levaria inexoravelmente ao abandono dos ideais revolucionários. Primeiro, porque seus líderes já alcançaram uma posição privilegiada dentro da sociedade; depois, porque uma tentativa revolucionária poderia causar a dissolução do partido (e a perda do ganha-pão). O poder, diz Michels (idem:219), é sempre conservador. A essa construção teórica, ele deu o nome de “lei de ferro da oligarquia”. Segundo ela, toda organização gera uma minoria dirigente, com interesses divergentes dos de sua base. Embora os caminhos traçados sejam diferentes, a conclusão é idêntica à de Mosca: só a minoria pode governar.
Michels tocou em um ponto crucial para a implementação da democracia, que é a relação entre representantes e representados. Sua teoria é útil para analisar o desgaste atual dos partidos políticos, que pode ser creditado aos vícios que ele descreveu. Experiências organizativas que procuram contornar esses problemas, como a busca da rotatividade e da participação direta pelos Verdes alemães (Poguntke, 1992), parecem comprovar Michels: menor oligarquia gera, também, menor eficiência. Alguns sugerem que os partidos cederiam lugar a novos movimentos sociais, mais ágeis e representativos. Mas, pela lei de ferro, os movimentos sociais, à medida que ganham peso, oligarquizam-se da mesma forma.
A tese de Michels possui pontos de contato com o pensamento de Weber, que, no entanto, é mais complexo. Weber (1993 [1918]:113) afirmava a “inevitabilidade” do político profissional, que é produto da racionalização e da especialização do trabalho político no campo das eleições de massa. Portanto, ele também coloca a impossibilidade de formas de “governo pela base” e de democracia direta, julgando insuperável a divisão entre governantes e governados. Mas, embora tenha influenciado Michels, não aceitava a “lei de ferro da oligarquia”, que julgava demasiado simplista. Na verdade, existem dois mecanismos diferentes em funcionamento: do lado de Michels, o egoísmo dos dirigentes (uma visão um tanto simplista e limitada da natureza humana); do lado de Weber, as exigências impessoais da racionalização e da eficiência.
Weber faz também uma distinção entre o funcionário (mesmo partidário) e o líder político. É a célebre diferença entre o burocrata, dono de saber e técnica, mas que não assume a responsabilidade, e o político, que se caracteriza justamente por ser diretamente responsável por seus atos (Weber, 1985 [1919]:79). Weber observa a “infiltração” de funcionários dos partidos nas chapas de candidatos ao Parlamento (e lamenta o fato), mas em seu esquema a capacidade de liderança política, diferente da burocracia, permanece essencial. Para Michels, ao contrário, não há distinção entre líder político e burocratas, todos sendo igualmente pessoas que se beneficiam da estrutura partidária e, portanto, oligarcas.
A CONTRADIÇÃO EM TERMOS: A DEMOCRACIA ELITISTA
Para os fins que nos interessam, é possível traçar um quadro condensado da discussão sobre a igualdade entre os seres humanos: a ordem estamental medieval afirmava a desigualdade entre os indivíduos. Contra ela, o liberalismo vai propugnar que todos são iguais. Os socialistas, então, denunciam que a igualdade formal, apreciada pelos liberais, é inócua diante da permanência de profunda desigualdade material. Em oposição ao socialismo, a teoria elitista vai dizer que a igualdade é impossível. Há uma concordância quanto ao diagnóstico sobre as sociedades contemporâneas, com a constatação de que a igualdade dos liberais é a mera fachada da desigualdade efetiva; mas a ênfase é dada à polêmica contra a bandeira socialista de uma nova forma de organização, material e politicamente igualitária, que a teoria das elites apresenta como ilusória.
Os elitistas miraram no socialismo, mas acabaram acertando também a democracia, denunciando como fantasista qualquer idéia de governo da maioria. Porém, numa reviravolta notável, uma importante corrente da teoria democrática vai aceitar o argumento elitista como pressuposto. É a tese da “democracia concorrencial”, cujo pai é o economista austríaco Joseph Schumpeter. Não se trata apenas de uma tendência, entre outras, da teoria democrática. É a corrente amplamente dominante, que se enraizou no senso comum; é um divisor de águas, já que, a partir dela, qualquer estudioso da democracia tem que se colocar, em primeiro lugar, contra ou a favor das teses schumpeterianas. Entre aqueles que foram influenciados por elas, de diferentes maneiras, estão nomes do peso de Giovanni Sartori, Robert Dahl e Anthony Downs.
Vários fatores contribuíram para o sucesso de Schumpeter. Em primeiro lugar, uma nova visão da relação entre democracia e participação política popular. Ele publicou o livro em que apresenta sua teoria democrática, Capitalismo, Socialismo e Democracia, em 1942. Nove anos antes, Hitler havia chegado ao poder. Para alguns analistas, o mal da República de Weimar, que havia permitido o avanço do nazismo, foi o “excesso de participação”. Por outro lado, os regimes totalitários da Alemanha e da União Soviética promoviam a mobilização das massas (embora não sua participação efetiva). A presença popular na política passou a ser associada mais com o totalitarismo do que com a democracia.
Em 1945, ocorreu a derrota dos países do Eixo e, logo em seguida, o início da Guerra Fria. Os Aliados haviam lutado em nome da “democracia”, palavra que foi reivindicada tanto pelo bloco soviético quanto pelo bloco estadunidense. Em vez de “ditadura do proletariado”, como afirmava o leninismo ortodoxo, os regimes do Leste Europeu autoclassificavam-se como democracias populares. No Ocidente, o problema era demonstrar que existia uma verdadeira democracia, apesar da evidente ausência do governo do povo. Ao redefinir a democracia de forma a excluir o que antes era seu principal critério, a teoria de Schumpeter se prestava bem a este fim. Assim, embora Schumpeter e os schumpeterianos gostem de se apresentar como neutros e descritivos, em contraste com a visão “ideológica” dos críticos dos regimes políticos ocidentais, sua empreitada intelectual possuiu um significativo caráter justificador do status quo.
Capitalismo, Socialismo e Democracia é a única obra sociológica de Schumpeter. A reformulação da teoria democrática está restrita a três capítulos (do XXI ao XXIII), sem dúvida os mais lidos do livro. Ele começa demolindo o que chama de “doutrina clássica da democracia”, na verdade um mix não muito equilibrado de autores clássicos e senso comum, que une Rousseau ao utilitarismo. Já foi demonstrado que a doutrina clássica é um mito, que Schumpeter reuniu e distorceu autores incompatíveis entre si para gerar um espectro contra o qual lutar (Pateman, 1992:9-34). Seja como for, em linhas gerais, a “doutrina clássica” é a seguinte: a democracia é o método para promover o bem comum através da tomada de decisões pelo próprio povo, com a intermediação de seus representantes (Schumpeter, 1984:313). Um primeiro ponto a ser criticado nesta definição é a própria noção de bem comum. Schumpeter observa que, para cada indivíduo, o bem comum poderá significar uma coisa diferente. Sua perspectiva, portanto, é a da sociedade como um composto de indivíduos atomizados, sem a possibilidade de construção de vontades coletivas.
A rigor, a impugnação da idéia de bem comum não invalida a doutrina clássica, já que em seu lugar é possível colocar a “vontade da maioria”, expressa na votação. Mas há aí uma premissa oculta, própria da filosofia utilitarista: a de que cada um é o melhor juiz de seu próprio bem. Por isso, o processo democrático seria indicado, em vez de, por exemplo, um déspota esclarecido e bondoso. O ponto crucial da crítica schumpeteriana está aqui: as pessoas não sabem determinar o que é melhor para elas, quando estão em jogo questões públicas. Não há uma vontade do cidadão, só impulsos vagos, equivocados, desinformados (idem:317). Segundo o economista austríaco, o indivíduo médio desce para um patamar mais baixo de racionalidade quando entra no campo da política. Em suma, mesmo que possa cuidar bem dos seus negócios pessoais, não sabe tratar de assuntos públicos8.
A aparente comprovação empírica para as afirmações de Schumpeter apareceria, na mesma época, através da obra de outro austríaco imigrado para os Estados Unidos, o sociólogo e estatístico Paul Lazarsfeld. Em um estudo de campo sobre a campanha para as eleições presidenciais de 1940 (nas quais Franklin Roosevelt conquistou seu terceiro mandato), realizado, em conjunto com Bernard Berelson e Hazel Gaudet, em uma pequena cidade do Estado de Ohio, ele mostrou que, mesmo em período eleitoral, as pessoas não são ativas, participantes, interessadas ou informadas. Elas decidem seu voto de forma irracional, seguindo padrões tradicionais ou por motivos afetivos. Um estudo similar, realizado oito anos mais tarde, em outra cidade estadunidense, chegou à mesma conclusão (Lazarsfeld et alii, 1969 [1944]; Berelson et alii, 1954). Ou seja, a democracia representativa não encontra eleitores como seu modelo ideal esperaria. Os cidadãos não sabem decidir, não estão dispostos a se informar e não se preocupam em avaliar as conseqüências de seus atos.
Uma diferença importante entre as duas abordagens é que Lazarsfeld busca demonstrar que a influência dos meios de comunicação de massa sobre o eleitor era praticamente nula, já que o voto refletia predisposições anteriores. Schumpeter, pelo contrário, julga que a massa é sempre manipulada pela propaganda política. Embora não haja referência direta, essa postura refletia o sucesso da máquina publicitária nazista, que muitos intelectuais da época viam como paradigma da nova forma de fazer política. Um exemplo é o livro do psicólogo russo Serge Tchakhotine, publicado poucos anos antes da obra de Schumpeter, cujo enfoque está claro a partir do título: O Estupro das Massas pela Propaganda Política (Tchakhotine, 1952 [1939]).
Para Schumpeter, a propaganda política possui uma diferença crucial em relação à comercial: a impossibilidade de ser testada.
“O retrato da mulher mais bonita do mundo mostrar-se-á, no longo prazo, incapaz de sustentar as vendas de um cigarro ruim. Mas não há qualquer salvaguarda igualmente efetiva no caso das decisões políticas. Muitas decisões de importância fatal são de natureza a tornar impossível para o público experimentá-las à vontade e a custos moderados” (Schumpeter, 1984:329).
Ou seja, o eleitorado estaria incapacitado de aprender com os próprios erros, uma vez que as conjunturas políticas são mutáveis, e estaria condenado a sempre ser presa das campanhas demagógicas.
As conclusões a que Schumpeter chega são baseadas em uma visão de natureza humana. As pessoas são egoístas, incapazes de se preocuparem com os interesses coletivos (mesmo quando estes as afetam). Ou seja, não adianta mudar as instituições, já que a causa da apatia e da desinformação não está nelas, mas nos próprios indivíduos. Mas se o indivíduo é ruim, a massa – aqui Schumpeter se baseia nos trabalhos, hoje desacreditados, de Gustave Le Bon – é pior, cega, age irracionalmente, levada por seus preconceitos. E não é por estar disperso pelos vários locais de votação que o eleitorado deixa de ser uma massa.
Mais tarde, Mancur Olson (1971:11) vai argumentar que a incompetência do cidadão comum para a tomada de decisões políticas decorre não de sua irracionalidade, como julga Schumpeter, mas de sua racionalidade. Para ele, o indivíduo racional é aquele que faz o cálculo de custo-benefício em suas ações. Como o peso do voto individual em uma eleição é ínfimo, simplesmente não vale a pena cobrir os custos (em termos de esforço, tempo e mesmo dinheiro) de obter informações. De uma forma ou de outra, ambos chegam à mesma conclusão: o povo não sabe tomar decisões políticas.
Enterrada, como crê Schumpeter, a “doutrina clássica”, surge a necessidade de uma nova teoria da democracia. Em seu núcleo, não está mais o governo do povo, mas a competição entre elites. Em uma passagem famosa, que sintetiza seu esforço conceitual, ele define que “o método democrático é aquele acordo institucional para se chegar a decisões políticas em que os indivíduos adquirem o poder de decisão através de uma luta competitiva pelos votos da população” (Schumpeter, 1984:336). O que ocorre, portanto, é a aceitação do dogma essencial dos elitistas – a maioria é incapaz de governar – e a produção de um conceito de democracia que se adapte a ele. A democracia fica resumida ao processo eleitoral, que Schumpeter julga compatível com quaisquer formas de restrição do direito de voto (um ponto que os schumpeterianos posteriores modificarão). Ele enfatiza a importância da liberdade para a apresentação de candidaturas, mas, em uma nota de rodapé cínica, explica que usa a expressão “no sentido de que qualquer pessoa é livre para instalar uma fábrica têxtil” (idem:339). Ou seja, trata-se de uma liberdade formal, cuja efetivação só é viável para aqueles que possuem determinados recursos (tanto econômicos quanto culturais).
O modelo desenhado por Schumpeter é um retrato bastante fiel dos regimes políticos ocidentais, que permite que eles se apresentem como verdadeiras democracias. Mas é, de fato, um rebaixamento do ideal democrático. Significa a negação da possibilidade de qualquer forma substantiva de soberania popular. A participação do cidadão comum é reduzida ao mínimo, ao ato de votar. Schumpeter condena qualquer outra manifestação popular, até mesmo o simples envio de cartas aos representantes, como sendo uma intromissão indevida dos governados nas ações dos governantes. Ao mesmo tempo, o momento central da democracia concorrencial, a eleição, é desprovido de qualquer conteúdo, pois não indica a vontade do povo, nem mesmo a da maioria.
Até a salvaguarda dos direitos individuais, função que os “democratas protetores” do século XVIII atribuíam ao direito de voto9, é desprezada. Para Schumpeter, o método eleitoral parece ter, sobretudo, um caráter legitimador, importante a partir do momento em que outros modelos de dominação política, em especial as monarquias hereditárias, perdiam legitimidade. Ao votar, o povo não decide nada, mas pensa que está decidindo – e, por isso, dispõe-se a obedecer aos governantes. É importante assinalar que a legitimidade do modelo depende basicamente de sua vinculação com o significado etimológico da democracia. A ressemantização promovida com a virada schumpeteriana permite colher certos frutos simbólicos da democracia-enquanto-governo-do-povo, sem que se busquem arranjos institucionais voltados para realizá-la.
Um ponto crucial do legado de Schumpeter é a transformação na compreensão do processo eleitoral, que deixa de ser um meio para a realização da democracia (o governo do povo), para ser a democracia em si. O outro ponto é a exaltação da apatia política, tema que será desenvolvido por autores posteriores. Para Seymour Lipset, a baixa participação política demonstra que o regime democrático vai bem, possui alto grau de aprovação. Ele chega a afirmar que, em sistemas de voto facultativo, quanto maior a taxa de abstenção eleitoral, mais firme está a democracia (Lipset, 1963:227)10. Samuel Huntington (1975) é mais sutil: não é a apatia que é um bem, mas a participação que é um mal. O excesso de participação aumenta os conflitos sociais, põe em risco a continuidade do sistema, gera um excesso de demandas que o Estado é incapaz de processar. No famoso relatório à Comissão Trilateral, Huntington (1975a) chegou à conclusão de que, justamente por causa disso, as democracias são “ingovernáveis”: cada vez que o Estado atende a uma demanda popular, incentiva a apresentação de novas e mais extravagantes exigências. “Ingovernável”, mas indispensável como fator de legitimação, a democracia estava em uma encruzilhada. O neoliberalismo foi a solução encontrada, fazendo o Estado, regulador ostensivo e suscetível a reivindicações, recuar diante do mercado, regulador oculto e impermeável ao controle democrático (Gorz, 1996:25)11.
Em suma, para essa corrente, a apatia demonstra a satisfação com o sistema político, impede o acirramento das diferenças dentro da sociedade e diminui as pressões sobre o Estado. O resultado é maior estabilidade (ou “governabilidade”, para usar o jargão da ciência política). De forma quase imperceptível, promove-se um deslocamento de valores, com a estabilidade sendo erigida em meta da organização política, no lugar do ideal democrático de autonomia.
DEMOCRACIA SEM POVO
O livro de Schumpeter é um marco da teoria democrática. Muitos foram seus herdeiros e continuadores, entre eles alguns dos mais influentes cientistas políticos contemporâneos. Anthony Downs “dourou a pílula” de Schumpeter, buscando mostrar que, graças à vontade de permanecer no poder (e à necessidade do voto popular para que isto ocorra), os governantes se tornariam os mais fiéis servidores do povo, promovendo melhorias incessantes em suas condições de vida (Downs, 1957). Apesar de estar baseada em uma visão limitada das motivações dos políticos, dos processos cognitivos dos eleitores e da eleição como um todo (ignorando, por exemplo, o papel da mídia ou dos financiadores de campanha), a tese de Downs tornou-se extremamente influente (Wattenberg, 1991:17-20). A presença de Schumpeter também é clara na teoria mais sofisticada de Robert Dahl (1989; 1971), em que uma multiplicidade de “centros de poder” complementa a existência das minorias concorrentes12, na obra de Lipset (1963), de Giovanni Sartori (1994) e de muitos outros. A chamada “teoria da escolha social” buscou demonstrar, através de modelos matemáticos, a impossibilidade de as eleições revelarem uma vontade popular (Riker, 1982).
Samuel Huntington, que afirma sem rodeios que eleições são “a essência da democracia”, sumariza da seguinte forma as discussões sobre teoria democrática do último meio século:
“Por algum tempo depois da Segunda Guerra Mundial, travou-se um debate entre aqueles que, na linha clássica, definiam democracia segundo fonte [das decisões] ou propósito e o crescente número de teóricos que aderiam ao conceito processual de democracia, à maneira schumpeteriana. Nos anos 70, o debate tinha terminado e Schumpeter vencera” (Huntington, 1994:16).
É possível contestar uma afirmação tão taxativa. Na realidade, as últimas duas décadas, pelo menos, presenciaram esforços notáveis de construção de novos modelos de democracia, republicanos e deliberativos, que põem em xeque a redução schumpeteriana. Mas não é menos verdade que ela ocupa um lugar central nas discussões sobre a questão. Mesmo os que defendem uma democracia mais autêntica e participativa têm que se ver, em primeiro lugar, com o legado de Schumpeter (ver, p. ex., Pateman, 1992). Por vezes, seus esforços são desdenhados como “prescritivos”, enquanto a verdadeira ciência, aí incluída a “ciência política”, deve ser descritiva e isenta de valores (Sartori, 1994; Huntington, 1994:16). Sem discutir a possibilidade de tal isenção no discurso científico em geral (e nas ciências sociais em particular), cabe notar que a distinção é enviesada. A corrente inaugurada por Schumpeter está tão carregada de valores quanto seus adversários. Ao aplicar o rótulo, politicamente prestigioso, de “democracia” aos regimes eleitorais do Ocidente, ao virar do avesso o conceito de democracia para adequá-lo a tais regimes e ao negar a possibilidade de qualquer avanço em direção a um regime mais participativo, ela cumpre um relevante papel legitimador. Isto é, possui um inocultável caráter político conservador.
O significativo é que essa teoria da democracia, hoje predominante, adotou os pressupostos de uma corrente de pensamento destinada precisamente a combater a democracia: o elitismo. O principal ideal da democracia, a autonomia popular, entendida no sentido preciso da palavra, a produção das próprias regras, foi descartado como quimérico. No lugar da idéia de poder do povo, colocou-se o dogma elitista de que o governo é uma atividade de minorias. A descrença na igualdade entre os seres humanos – igualdade que, tradicionalmente, era vista como um quase-sinônimo da democracia – levou, como corolário natural, ao fim do preceito do rodízio entre governantes e governados.
Não se trata de negar os elementos positivos presentes nos regimes eleitorais, em geral herdeiros do liberalismo. Ainda que as condições necessárias para seu pleno usufruto estejam muitas vezes ausentes, as liberdades e os direitos individuais (de consciência, expressão, imprensa, associação, manifestação, movimento etc.) não podem ser desdenhados como apenas “formais”. Eles criam um ambiente político incomparavelmente melhor do que o de regimes em que estão ausentes. E, como Guillermo O’Donnell (1999:582-588) procurou mostrar, mesmo a concepção mínima de democracia, em Schumpeter, acaba por exigir tais liberdades e direitos, como conseqüência lógica de sua postulação. Mas continua faltando muito, quase tudo, para se chegar perto daquilo que, até o século XIX, era entendido por democracia, tanto por seus partidários quanto por seus muitos adversários: um regime em que o poder político está, de alguma maneira, nas mãos do povo comum13.
Ao dar fundamento teórico aos regimes eleitorais que chamam a si mesmos de democracia, Schumpeter e seus seguidores buscam neutralizar aqueles que reivindicam um regime mais participativo e igualitário. Mas a idéia de “governo do povo” – no sentido da igualdade efetiva na tomada das decisões públicas – insiste em permanecer à tona, quando menos como um parâmetro normativo que revela quão pouco os regimes ocidentais realizaram as promessas do rótulo que carregam. Por trás das “democracias realmente existentes” de hoje, domesticadas, que aceitam todas as desigualdades sociais e se contentam com um papel secundário diante do ordenamento capitalista da sociedade, o ideal democrático continua exibindo seu caráter subversivo.
NOTAS
1. Sobre a democracia grega, ver Finley (1988; 1983), Vidal-Naquet (2002), Ober (1989), Castoriadis (1987), entre tantos outros.
2. Os versos de Lawrence são citados em Carey (1993:18). O livro de Carey é uma excelente discussão sobre o elitismo dos intelectuais. Para o caso brasileiro, ver Dalcastagnè (2000; 2002).
3. Uma notável antecipação do argumento de Nietzsche (e, sob outro aspecto, de Ortega y Gasset) está na divisão da humanidade proposta por Raskólnikov, entre “extraordinários” e “ordinários”, os primeiros tendo direito ao crime, os últimos condenados à obediência da lei. O fato de um dos eixos de Crime e Castigo ser precisamente evidenciar o absurdo dessa doutrina mostra como tais idéias já se encontravam disseminadas décadas antes da formulação de Nietzsche (ver Dostoievski, 2001:268-274 e passim).
4. Como observou Gramsci, a idéia do indivíduo sobre-humano que, por isso mesmo, transcendia a moral convencional, era corrente na cultura popular da época e, em especial, na literatura de folhetim; assim, “muito da suposta ‘super-humanidade’ nietzschiana tem como origem e modelo doutrinário não Zaratustra, mas O Conde de Monte Cristo, de A. Dumas” (Gramsci, 2001:56).
5. Uma terceira posição, a da Escola de Frankfurt, julga que a massificação rebaixa a obra de arte, em uma crítica da indústria cultural que não está isenta de elitismo.
6. Uma terceira questão está ligada à inconsciência, por parte das massas, de que são devedoras da minoria seleta, na medida em que seu bem-estar material dependeria do gênio de uns poucos homens superiores. Visão similar, incorporando a perspectiva de uma “espiral das expectativas ascendentes”, é encontrada em Hayek (1990:44).
7. Um excelente resumo crítico da teoria paretiana da circulação das elites está em Bottomore (1974, cap. III).
8. As classes dominantes escapam a este problema, já que os negócios públicos são de seu interesse particular (ver Bourdieu, 1979:518).
9. A expressão “democracia protetora”, para designar a concepção de Bentham e Mill, é de Macpherson (1978).
10. É claro que é muito mais plausível a interpretação oposta: a diminuição da presença nas eleições é um sintoma de alienação em relação ao sistema político, reflexo do sentimento de impotência por parte dos cidadãos comuns.
11. Convém observar que o recuo do Estado diante do mercado, como forma de reduzir a ativação popular, estava previsto nas discussões da Trilateral, nos anos 1970, e pode ser detectado nos escritos dos “papas” do neoliberalismo – basta lembrar, por exemplo, da posição de Milton Friedman quanto aos sindicatos (Friedman, 1984; Friedman e Friedman, 1979). É possível dizer, portanto, que a desmobilização foi um resultado intencionalmente perseguido pelos governos neoliberais. A idéia de que o mercado impõe limites à democracia, por sua vez, já está expressa em Hayek (1990:83). Sobre a questão, remeto novamente a Gorz (1996) e também a Anderson (1995) e Borón (1994).
12. Embora a obra mais recente de Dahl revele uma posição bem mais crítica sobre os regimes democráticos concorrenciais (Dahl, 1990; 1989a).
13. Até a segunda metade do século XIX, o discurso predominante era antidemocrático; por exemplo, Disraeli, quando primeiro-ministro britânico, justificava um projeto de ampliação do direito de voto afirmando que se tratava de um “bastião contra a democracia” (apud Hirschman, 1992:81). Não é difícil perceber que o consenso favorável à democracia cresce conforme seu conteúdo se dilui e – ao contrário do que esperava Marx e temiam os políticos da burguesia – fica evidenciada a compatibilidade entre o sufrágio universal e a dominação de classe.
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VIDAL-NAQUET, Pierre. (2002), Os Gregos, os Historiadores, a Democracia: O Grande Desvio. São Paulo, Companhia das Letras.
WATTENBERG, Martin P. (1991), The Rise of Candidate-Centered Politics: Presidential Elections of the 1980’s. Cambridge, MA, Harvard University Press.
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___. (1985) [1919], Ciência e Política: Duas Vocações (5ª ed.). São Paulo, Cultrix.
(Recebido para publicação em novembro de 2001)
(Versão definitiva em agosto de 2002)
*Ainda quando o autor não seguiu integralmente as sugestões, este texto se beneficiou grandemente da leitura e dos comentários de Regina Dalcastagnè, de Bruno Pinheiro Wanderley Reis e dos pareceristas anônimos de Dados. Quero registrar aqui meu agradecimento a todos.
3 respostas
Muito perigosa essa postura ideológica por um professor. No entanto, persegui-lo ou tentar impedir que fale é um ataque a democracia. O fato de um professor ter uma posição a respeito de um determinado assunto não deve lhe dar direito de desenvolver essa postura na sua disciplina. Isso também é anti democrático. Se estamos falando em democracia, discursos sem argumentação, baseados em fontes que não podem ser comprovadas não devem ser lançados aos alunos. O jovem precisa desenvolver o seu senso crítico sem que seja um “boneco” repetidor de um professor de uma cátedra. Esses alunos estão no curso dos acontecimentos históricos. Por que esse assunto se está em curso? Quem já tem capacidade de analisar com isenção esse momento?
E se fossem promovidos curso particulares sobre …
E se fizesse anuncios na midia para promove-los…
Sei la..
Ta na hora de ocupar a midia com acoes criativas….
Ate carimbo em notas de dinheiro podem ser novamente usados ..
O que nao da e pra ficar parado!