“Estou até hoje abismada e atônita”, diz Laerte sobre o Brasil de 2022. A cartunista, ilustradora e artista de quadrinhos começou a conversa com a revista Focus Brasil expressando sua dificuldade de entender seu “estupor diante da realidade”, que segundo ela, ainda está parado em 2018.
Por Bia Abramo e Pedro Camarão – Revista Focus
Mesmo se perguntando continuamente se tem o que dizer, Laerte não para de produzir, disseminando seu humor irônico (às vezes no limite do nonsense), o traço elegante e os “achados” de narrativa, que tornam a artista uma das mais importantes dos quadrinhos brasileiros.
Com trajetória iniciada ainda no final dos anos 1970, ou seja, no final da ditadura militar e com atuação quase febril nas décadas 1980 e 1990, tanto nas tiras diárias para a Folha de S. Paulo quanto com os álbuns dos Piratas do Tietê, Laerte também é reconhecida como uma referência das artes gráficas, pela diversidade impressionante do seu trabalho, e, por que não, pela capacidade de traduzir a cada dia as perplexidades e contradições da vida brasileira.
Laerte Coutinho — Essa pergunta meio que já mata a entrevista toda, ela já meio define tudo. Bolsonaro alega que o governo dele teve o azar de pegar a pandemia e que… Mas ele está tentando desesperadamente parecer menos tóxico. Francamente, o meu grande estupor em relação à realidade e aos acontecimentos está parado ainda lá em 2018. Eu não entendo até hoje. Todo mundo tem várias linhas de explicações, “não, porque é o uso do WhatsApp”, “é o uso das redes sociais que foi simplesmente genial”. Quer dizer, a gente reconhecer que alguém como o Carlos Bolsonaro é genial, é triste. Mas sim, foi usado com maestria, com muita eficiência. Mesmo assim, é o Bolsonaro, gente. Sabe? Não é o Alckmin, não é o Serra, não é nem o Sarney, [ri] não é o Maluf. Não é o Maluf. Chegar a esse ponto de dizer uma coisa dessas, pensar um negócio desses… O Bolsonaro é muito além do Maluf.
A gente achava que o Maluf era um suprassumo assim do gangsterismo, da máfia, do protofascismo… Não. O Bolsonaro vai muito além. Eu fico pensando como é que esse sujeito não só foi eleito em 2018, como tem cerca de 30% de intenções de voto em quase todas as pesquisas hoje… 680 mil mortos depois. Fico abismada com o nosso país, com a gente, sabe, porque eu me vejo fazendo parte deste país. Não importa se eu votei em quem eu votei, importa que eu faço parte desse contexto social que elegeu este monstro, que foi capaz disso e seria capaz, teoricamente, de fazer isso de novo. Eu estou até hoje abismada e atônita. Eu fico boba tentando entender…. Isso altera todas as minhas perspectivas, sobre o meu trabalho, sobre as minhas relações no mundo, sobre tudo, sobre o modo de entender, enfim. É isso. Eu ainda estou tentando entender o que aconteceu.
— Você acha que esse retrocesso tem volta? A gente consegue retomar um ritmo, um presente em que a gente consiga pensar em um futuro?
— Pois é… A primeira coisa que eu fico pensando é quem sou eu para dizer isso… [finaliza a frase com uma gargalhada curta] No plano singelo da conversa de bar, eu posso responder: eu acho que não. Eu acho que a gente nunca mais vai ser o que foi. Eu acho que o governo Lula não vai ser o que foi. Eu acho que a gente vai ter que… É como ter que conviver com uma pessoa que matou outra. Você tem que levar aquilo numa boa, sabe? É isso… A gente vai ter que lidar com realidades que são chocantes. Uma parcela muito grande da população brasileira, e não estamos falando só de gente relacionada com o crime ou de idiotas funcionais, não, estou falando de uma parcela grande da população, mesmo, gente que a gente conhece e que votou e votaria de novo nesse cara. [Gente que] faz parte de grupos de WhatsApp que continuam, hoje, divulgando fake news. E não adianta a gente chegar e dizer que… Sabe, invocar as leis ou a moralidade ou a ética ou não sei o quê e dizer: “Não, nós estamos com a razão. Eles estão sem a razão”. Nós todos estamos aqui nessa realidade e vamos ter que fazer tudo isso juntos. Eu acho que nunca mais a gente vai ser o mesmo país que já foi. Se a gente por acaso tiver um momento mais luminoso de desempenho na economia, na sociedade, e se a gente conseguir ganhos aqui e ali, eu acho que independentemente disso, a gente não vai mais voltar a pontos onde já estivemos. A gente vai ter que achar novos pontos. Essa é a minha opinião de boteco.
— A gente faz essa pergunta por que você é uma artista que atuou profissionalmente muitos anos conectada à realidade brasileira, ao jornalismo e aos movimentos sociais, e isso em momentos mais esperançosos.
— Eu muitas vezes me pergunto por que estão me entrevistando. Eu não estou assim num momento muito bom da minha autoestima, por causa de um conjunto de coisas que tem a ver com a idade ou talvez com sequelas da Covid… [Fala rindo] Não sei, não tenho certeza, mas eu estou vivendo um momento de autoavaliação muito desfavorável. Eu fico pensando por que estão me entrevistando. Eu não entendo nada. Eu não conheço nada. Eu não terminei curso nenhum. Eu leio pouca literatura científica ou informativa, desses temas eu leio pouco. Eu leio bastante, mas eu leio literatura, ficção e tudo. O meu trabalho não é uma referência analítica. Eu não sei. Eu fico com esse tipo de avaliação. Estou fazendo análise [fala rindo]. Mas essas coisas demoram… Eu não me sinto segura em relação ao que eu penso e às coisas que eu digo. Eu acho que na época em que eu comecei, por exemplo, você mencionou o João Ferrador, isso foi o final dos anos 1970. Naquela época, eu acho, pelo que eu me lembro, eu estava mais seguro de mim. Eu tinha, assim, uma certa certeza de que eu estava do lado certo, na companhia das pessoas certas. E eu estava na companhia de pessoas muito legais. Assim o Sérgio Gomes, que criou a Oboré, e o Henfil, que veio de Natal para trabalhar com os sindicalistas. O Lula, sabe. Conheci o Lula. Então, eu transitava numa área realmente de pessoas do caralho. Agora, eu mesma… Eu acho que isso me fez com que eu me contaminasse também dessas certezas todas. E boa parte dessas certezas me abandonou. Eu não tenho mais certeza de muita coisa. Eu tenho certeza de coisas que me comovem ou que me movem, mas são coisas meio basilares. Quando as amigas trans que eu tenho, e conheço, e respeito, estão se candidatando e vão sendo alvo de ataques super truculentos e ameaçadores… Sabe, eu me movimento nesse momento, nessa hora. Mas eu fico pensando quanto de estratégia política tem nisso [fala rindo]. Não sei. Acho que nada.
— Acho que a gente passou um período muito traumático desde a eleição do Bolsonaro e a pandemia e acho natural estar insegura. Mas ainda assim tem horas que o seu quadrinho diz tudo, sua charge é praticamente uma análise de conjuntura. Então, talvez algo aí daquele outro momento não tenha te abandonado.
— Trabalhar com essa realidade não é nem uma questão de nojo. É uma questão de… Quando se trata de fazer uma charge política, de fazer um trabalho que tem necessariamente que carregar alguma ideia política e lidar com a linguagem do humor, que é tecer esses fios todos do ridículo… Você está lidando com um sujeito que não tem o menor sentido de decência, ridículo, compostura. Você está lidando com um sujeito que limparia a bunda em público sem o menor problema. Ele fará isso em algum momento. Esse sujeito… Fazer uma charge sobre esse sujeito, você percebe que já tem que partir de um ponto muito além da linguagem do humor. Então, não adianta você dizer que o cara é genocida. Ele está pouco se fodendo com isso, realmente pouco se fodendo. Chamá-lo de genocida é uma espécie de ponto de partida de onde você tem que começar. Agora, ele não liga. Ninguém liga para isso. Ninguém conecta os 680 mil mortos à pessoa, entendeu? Então, você tem que trabalhar em alguma direção que seja capaz de avançar e produzir um efeito. Eu sei que charges não derrubam o governo, mas a charge tem algum nível de eficácia. Ela tem uma possibilidade de ser contundente. Para conseguir essa contundência, em se tratando do Bolsonaro e do bolsonarismo, a gente tem que pensar de um modo que nunca pensou, porque o ridículo, o chocante, o absurdo já está sendo produzido e performado por essa gente toda. Nunca se viu um governo como este. Nunca se viu. Nunca se pensou em alguém como Damares [Alves, ex-ministra da Família], sabe? Nunca se pensou em alguém como Ricardo Salles [ex-ministro do Meio Ambiente] chefiando… E chefiando as áreas que eles chefiam, o que é uma espécie de grande piada. Você pega a Damares e põe ela para chefiar uma coisa de famílias. E aí você pega o Ricardo Salles e põe no meio ambiente. Isso seria uma piada já. Nos anos 80 a gente contaria um negócio desses “kkk”… Daria risada. Não, não é mais para rir, é o que a gente está vivendo. Então, como é que você faz uma charge num momento e a partir de uma realidade como essa? Eu não sei. Eu acho que é uma luta difícil, muitas vezes é frustrante porque a gente não consegue chegar numa boa saída. Ontem, eu fiz uma charge que foi meio instintiva, assim, mas me agradou. E eu estou pensando até agora porque que me agradou. Eu acho que ela foi bastante eficiente. Eu peguei um meme que tem muito na internet, que é o Tintim, o Capitão Haddock e o Milu. O Capitão Haddock está com uma aparência cansada e fala assim “Que semaninha, hein?” E o Tintim vira para ele e fala “Capitão, ainda é quarta-feira” [Ri no final da frase]. Esse meme vem circulando há muito tempo, mas ele circula na população que consome memes. Essa é uma das limitações do trabalho que eu fiz, porque eu fiz uma versão desse meme desenhada com Tintim e tudo, mas o capitão sendo o Bolsonaro. [Conta rindo] E o Bolsonaro falando “que ano, hein”, e o Tintim fala “Capitão, ainda é agosto”.
— Boa…
— Pois é, por que que é boa? Eu fiquei pensando… Antes de publicar eu pensei, será que eu publico isso? Eu publiquei, mas eu fico pensando: por que ela é boa? Ela é só um meme de um meme, ela é uma citação de um meme. Todo mundo entendeu? Parece que sim. A quantidade de bolsonaristas que entraram na caixa de comentários para me ofender, para tentar chamar Lula ladrão e tal, me diz que eu acertei no nervo [falou rindo]. Mas por que ela é boa? Não sei, eu fico pensando. Todo mundo sabe que o Bolsonaro está com medo de perder a eleição. Isso…
— Posso arriscar uma hipótese?
— Pode, claro.
— Eu acho que o Bolsonaro começou aí uma campanha eleitoral com esse medo de perder e muito sem direção, né… As pesquisas estão mostrando que ele não está crescendo, apesar do auxílio emergencial…
— O pacote de “bondades”, né?
— Exatamente, do pacote de bondades. Então, se os bolsonaristas acusaram o golpe, eu acho que você atingiu um nervo. Recentemente a gente falou da aposentadoria do Angeli e foi um negócio muito comovente… Como você vê essa experiência da geração de vocês?
— Acho que isso o futuro que vai ter que dizer. Eu penso com mais clareza no que o pessoal que fez o Pasquim deixou. Para mim, esse é um legado mais nítido. O que nós deixamos? Eu acho que isso é o que está contido nas publicações que a gente fez Chiclete com Banana, do Angeli; Geraldão, do Glauco. E o Piratas do Tietê, que eu fiz. Essa experiência de quadrinhos e humor que a gente viveu e produziu, eu acho que se distingue da experiência do Pasquim por conta dos períodos históricos. O Pasquim foi fundado em 1969. É fruto desse período de ditadura. Nossa produção, embora a gente tenha trabalhado durante a ditadura também, mas essa produção marcante que acabou ficando, é fruto do estertor da ditadura, do final da ditadura e desse período imediato, que sucede imediatamente a ditadura. Então, ela tem marcas que são características desse período, que é essa linguagem muito fervilhante, de desabafos, o uso de equipamentos de expressão, assim, que estavam proibidos, que estavam racionados e reprimidos durante a ditadura. Então, a gente tem essa marca de uma “perestroika brasileira”, da nossa “glasnost”. Tanto é que eu acho que eu não sei se o Glauco estivesse vivo hoje se ele continuaria… Provavelmente continuaria, porque o Glauco era muito especial. Mas eu não continuaria a fazer Los Três Amigos nem Piratas do Tietê, porque não corresponde mais ao modo como eu vejo a sociedade, como entendo a realidade, como percebo o meu trabalho, também.
Então, eu acho que esse legado que você mencionou tem um lugar no tempo mais evidente que é o final da ditadura. E eu acho que ele tem legados que representam as pessoas individualmente. Por exemplo, o Angeli, além do Chiclete com Banana, deixou a construção de uma linguagem de charge política que é preciosíssima. E daí já não é mais o Chiclete com Banana, é o trabalho dele na Folha de S.Paulo, na página 2. Assim, uma revolução, um trabalho incrível. Até hoje as charges que o Angeli fez nos anos 90 e no início dos anos 2000, você pode publicar até hoje, tranquilamente. Elas têm o mesmo impacto e a mesma expressão… [A mesma] expressividade. Recentemente, eu acho que a [revista] Piauí usou uma coleção de charges do Angeli e é impressionante porque parece que ele fez essa semana. Eu mesma não sei [começa a rir], quer dizer, a parte que me toca… Eu não sei. Eu gosto do modo como eu passei a construir tiras e HQs a partir do início dos anos 2000. Eu acho que isso, para mim, foi muito importante. Se isso funciona como influência ou como uma referência importante, aí já não é comigo.
— Eu queria fazer um preâmbulo antes sobre a tira do meme do Tintim e do Capitão Haddock. Eu lembrei aqui que a gente fez uma entrevista há um tempo atrás com o Silvio Almeida. E ele foi muito feliz quando falou que o Bolsonaro sequestrou o presente. A essa tira mostra um pouco que ele perdeu o controle e isso talvez o assuste.
— Talvez seja isso. Eu acho que ela tem um tom de otimismo assim que, para mim, foi meio inesperado. Ele já não controla isso, né.… O Silvio [Almeida] tem razão. Isso o que você está comentando agora, o Silvio tem toda a razão. Bolsonaro transformou o país num pântano e a gente só consegue pensar em função de quando a gente tirar esse desgraçado daí a gente vai tentar entender o que fazer. O que dá para fazer hoje é ficar negociando como derrubar esse desgraçado, essa peste, essa praga que está no governo. Então, é tudo em função de como vamos derrubar esse desgraçado. Todas as alianças possíveis, todas as construções possíveis. Mas e daí, para governar depois? Ah, isso depois a gente vê por que… De certa forma é isso, claro que o Lula tem programa e perspectivas do que fazer em cada área. Ele já deixou isso muito claro. Eu acho que ele está certo, é encarar a miséria absoluta em que as pessoas estão, ou que uma grande quantidade de gente no Brasil está vivendo em uma condição de miséria assustadora e inédita também. Então, acho que esse é o primeiro problema, é começar por aí.
— Como disse o Xico Sá numa outra entrevista que a gente fez: “Eu sou a favor da frente ampla, amplíssima, até onde doer, aí depois que ganhar, aí todo mundo se estapeia por espaço. O importante é derrotar o cara”.
— [Ri] É interessante e eu em princípio, concordo, mas a gente vai derrotar alguém que está num posto-chave, que é a Presidência da República, e a gente vai ter que encarar um Congresso que está completamente contaminado. É claro que já não era nenhuma belezinha, né? Mas o Congresso foi contaminado com essas práticas que o Bolsonaro institucionalizou no governo dele, elas vão continuar por quanto tempo? Quando a gente vai conseguir vencer isso e com que armas e com que forças e com que argumentos? E a quantidade de instituições destruídas, equipamentos de fiscalização completamente detonados, órgãos que foram desmontados em todas as áreas, de vigilância ambiental, de cultura. O cara foi uma bomba atômica sobre o Brasil. A quantidade de destruição que esse desgraçado promoveu e com o apoio de muita gente também, é assustador. Então, derrotar o Bolsonaro é o primeiro passo de muitos outros. Derrotar o bolsonarismo não vai ser muito fácil, não.
— Sobre essa questão de “sequestrar o presente”, isso tem muito a ver com as redes sociais. E eu queria saber se você pensa um pouco sobre a questão das redes sociais, se você relaciona com isso? Porque de alguma maneira, para determinados públicos elas viraram uma concorrência muito forte ao jornalismo, aos jornais, aos veículos de informação. E é uma coisa que também a gente não sabe se tem volta.
— É, não é exatamente uma concorrência. Elas viraram uma realidade que não pode ser ignorada pelo jornalismo. Quando você vê a Folha fazendo manchete de uma notícia que já foi fartamente comentada no dia anterior… Quer dizer, você tem uma notícia que é manchete naquele dia, mas ao mesmo tempo, no Painel do Leitor, já tem gente comentando aquilo. Por quê? Porque se informou na internet. Então, as redes sociais, a internet, o jornalismo representado por uma quantidade grande de blogs, de sites e de portais que surgiram nesse movimento, é um jornalismo também. Quer dizer, é o jornalismo que tem que se transformar e tem que se reconduzir. E eu acho que se apresentaram novas circunstâncias para o jornalismo. É possível, por exemplo, se produzir um jornal com muito mais opinião do que noticiários. Mas é possível também você dar uma outra dimensão para a reportagem. Eu estou falando de coisas que são possíveis, não exatamente de coisas que são praticadas com muita frequência.
— Nesse sentido, Laerte, do ponto de vista técnico, a tecnologia facilita o trabalho do ilustrador ou do cartunista, do chargista? O fato de não depender mais do papel para publicar todo dia, você gosta disso?
— Gosto. Eu acho que facilita sob todos os pontos de vista, desde o ponto de vista meramente técnico. Fazer um desenho com os recursos que os programas gráficos oferecem tem muito mais eficiência, as possibilidades são muito maiores. E a possibilidade de você terminar o trabalho, enviar para a mídia que vai reproduzir também é muito, muito rápido, então, tudo isso favoreceu. Eu acho que isso favoreceu muito o cartum, essa linguagem do humor, da charge, do cartum e da tira. Além do ponto de vista técnico e operacional, dessa coisa logística, do ponto de vista de elaboração também. Eu acho que as redes e os canais da mídia da internet são valiosos para os artistas e as artistas. Para mim, é importantíssimo. Aliás, uma das constatações que eu tive nesse episódio da charge em que eu usei o meme do Tintim e do capitão, foi isso. O meu trabalho é uma elaboração em cima da realidade política do país, mas usa elementos para sua compreensão que estão todos dentro da rede social. Quer dizer, eu fiz um meme a partir de um meme. Eu fiz uma charge a partir de um meme e eu estou supondo que todo mundo sabe do que se trata. Por incrível que pareça, tem gente que não sabe e que acha que eu plagiei.
— Você acha que tem um boom agora de quadrinhos brasileiros?
— Eu também não estou dando conta, não. É muito mais do que eu consigo acompanhar. Eu nem faço um esforço tão grande para acompanhar, porque eu sei que mais cedo ou mais tarde eu vou acabar vendo tudo. Mas tem muita gente que começou na pandemia, começou a publicar nas redes sociais ou um pouco antes da pandemia. Teve agora há pouco tempo, um festival de quadrinhos que é muito famoso e que ficou suspenso durante a pandemia e voltou é o Festival Internacional de Quadrinhos de Belo Horizonte e era uma coisa impressionante ver, acompanhar pelo Twitter e pelas pelas redes sociais o pessoal jovem, autores e autoras, comentando e dizendo que foram, que foi demais, que venderam bastante ou que não venderam muito. Mas, enfim, a quantidade toda de publicações que está aparecendo é muito entusiasmante. Eu fico bem impressionada.
— O que você continua lendo de ficção, de literatura, que te importa ou a que você recorre?
— Estou lendo o romence do Sérgio Rodrigues, “A Vida Futura”. Eu estava querendo ver já, mas não pude ir ao lançamento, então eu comprei. É incrível, não dá para largar. Peguei ele ontem e já estou terminando. Eu botei para fazer “tabelinha” com outros livros que eu estou lendo. Eu tinha me programado para ler coisas volumosas que eu nunca li, por exemplo, “A Montanha Mágica”, do Thomas Mann, e eu li. Daí eu falei: “agora, quero ler ‘Grande Sertão’” [ri]. Eu nunca li. Então, estou tentando me pôr em dia com os livrões. Li “Grandes Sertão: Veredas”, é incrível, incrível. Eu gostei do Thomas Mann” e estou lendo o “Doutor Fausto, também. Nesse meio tempo eu comprei o do Sérgio Rodrigues e tive que interromper tudo porque eu não consigo largar o livro. Quadrinhos… Eu tenho uns clássicos que eu leio sempre: como Calvin, do Bill Waterson; o Quino, qualquer coisa dele; e algumas autoras como a Ruth Modan, que é uma autora israelense. E a Alison Bechdel, que é uma autora americana que eu amo também. E os trabalhos do meu filho, o Rafa Coutinho… Por exemplo, “O Beijo Adolescente”, eu acho um trabalho incrível, tem três volumes que são… É uma saga. Luiz Eduardo Soares fez com o Rafael uma ficção científica que o Rafael ilustrou e está sendo lançado esses dias. É uma ficção científica que o Luiz Eduardo escreveu. É muito legal. •
Publicado originalmente na FOCUS #73 – 29 DE AGOSTO A 04 DE SETEMBRO