Voto em feministas negras, indígenas e trans pode revolucionar Câmara e Assembleias

Negras e indígenas
Candidatas à Câmara dos Deputados e às Assembleias Legislativas: Vilma Reis (PT-BA), Célia Xakriabá (PSOL-MG), Rosa Amorim (PT-PE), Adélia (PT-SP), Ediane Maria (PSOL-SP), Erika Hilton (PSOL-SP), Sônia Guajajara (PSOL-SP), Lucinha do MST (PT-BA) e Carmen Silva (PSB-SP)

Deu! Não é mais tolerável viver um Brasil sem mulheres. Carregamos o país nas costas, acordamos de madrugada e dormimos por último, mas ainda valemos pouco ou quase nada. Miseravelmente, nossa opinião é da porta pra dentro de casa; o resto é silêncio. Mulheres não estão nos lugares onde são tomadas as decisões que afetam a sociedade inteira. E tudo continuará igual se o parlamento seguir com cheiro de macho. Não faremos leis nem dividiremos o bolo orçamentário dos Estados e da federação, deixando cada vez mais distantes as pautas e conquistas que interessam. Digamos assim: sem as feministas não haverá futuro algum.

Hoje, na Câmara dos Deputados, 77 cadeiras são de mulheres, enquanto 436 permanecem nas mãos dos homens. No Brasil de limites continentais, apenas 161 deputadas transitam nas 26 Assembleias Legislativas e na Câmara Legislativa do Distrito Federal – isto é de uma pobreza fenomenal, algo que não se vê nem em países de regimes mais fechados. De que adiantaria sermos 51,8% da população e quase 53% dos eleitores se, fechadas as urnas no próximo domingo, o cenário político no parlamento permanecer como nos tempos da instalação da República?  

Como entendem todos que defendem a paz, Lula deve ser eleito para pôr fim à política da morte e do atraso. Os mesmo brasileiros precisam igualmente entender que se não houver profunda mudança no Legislativo, Lula não avançará, os governadores não darão passos decisivos no caminho da igualdade e da justiça. E nós, mulheres, nada seremos. Lacramos já, com uma grande revolução, elegendo um ensurdecedor número de feministas, ou nossa sina se confirmará, com o feminicídio banqueteando no sangue das brasileiras. Pela milionésima vez, vão reiterar que a mulher pertence ao macho por mais que ela levante o nariz, banque a casa, eduque os filhos e ao mesmo tempo arraste nos dentes a indústria nacional, o comércio, os serviços, a sala de aula, a enfermaria dos hospitais, a lavoura, a pesca artesanal, a ciência ou a operação de máquinas pesadas na construção civil.

Um poder branco é misógino. Não conhece o sabor do pagode assim como ignora a solução para a queimada na Amazônia e no Cerrado. Poder branco-macho não tem fé, abusa da fé dos outros, rouba o próximo, assalta, furta, mata, estupra, assedia, chantageia, corrompe, polui rios, cobra propina para comprar vacina. Poder branco é bruto, não admite que mulher decida quantos filhos quer ter – e odeia que ela se recuse à maternidade. No mando, branco dita a última palavra sobre a sexualidade das pessoas. Sem graça, meio feio, branco não tem a cara do povo brasileiro. Dá prioridade à Faria Lima, mistura agro com senhor de engenho, fecha com o labby do comerciante de armas, com os mercadores da vida, com milicianos de todas as falanges. Ou elegemos mulheres do campo progressista neste domingo ou as políticas públicas continuarão sob a régua deles. Aquele bando de deputados e senadores que pintam o cabelo da cor do caju discutirá a vida da gente por mais quatro anos. Coronéis, calhordas, vendilhões, gatunos… são sempre os mesmos em mandatos longevos. Chegaram ao orgasmo quando golpearam Dilma, lembra? Não devem pisar nem mesmo no aeroporto de Brasília. Nunca mais!

Quem dá o norte às lutas são as feministas pretas e pardas

É tudo ou nada, não tem negociação nem depois. Sejamos espertas, a chance é de ouro, o processo eleitoral de 2022 tem tudo para fazer história, se o avesso triunfar. O que temos a fazer é levar, no colo, até o poder as mulheres negras, que têm pautado o feminismo brasileiro. Sim, quem dá o norte às principais lutas são elas, as pretas e pardas. E também as indígenas, as mulheres trans e as lésbicas. Elas estão conseguindo se impor, subverter a ordem estabelecida. Sabem, melhor que qualquer autoridade, de que é feito o Brasil. Conhecem os tremendos furos na segurança pública; ninguém precisa dizer a elas que a polícia faz mira na testa dos pretos e a mando de quem. Chegam no problema muito antes das estatísticas e têm solução para eles. Entendem a razão da fome dos últimos tempos porque sabem como encher a panela. Sabem de saúde, sabem de economia, sabem de isonomia, sabem de direito, sabem de água suja e água limpa.

Todo cuidado é pouco, porém, quando falamos em eleger nomes femininos. Não cabem aqui as mulheres que comem com os lobos. Ficam fora aquelas que repetem amém para o Centrão, integrantes da extrema direita, além das que dão palanque para crias do bolsonarismo e do fascismo — que, certamente, não querem largar o osso. Chega, nem elas nem os lobos terão vitória sobre nossos corpos e cabeças. Uma vigorosíssima bancada de rebeldes de esquerda derrotará os ogros e os retrógados para tomar deles o parlamento. E nós vamos respirar fundo, sorrir novamente para começar a reconstrução do país.  

Vasculhe as listas de candidatas do seu estado. Você vai se surpreender com o elenco de trabalhadoras rurais assentadas que disputam as eleições, com propostas agroecológicas e de uma reforma agrária mais produtiva. Há centenas de lideranças antirracistas com sugestões práticas para resgatar o povo preto da subalternidade que a escravidão os submeteu e submete, ainda. Pretas e pardas fazem dinheiro desde a invenção do tabuleiro de acarajé, como diz a feminista Sueli Carneiro, fundadora do Geledés. E podem muito bem ocupar a Comissão de Finanças da Câmara, a Comissão de Constituição e Justiça, a presidência do Senado ou das Assembleias Legislativas. Há valorosas trans organizando outras como ela, exigindo respeito, trabalho, cidadania. Olhe para os movimentos sociais. Eles formaram, na dificuldade e na teimosia, mulheres que reivindicam moradia apontando o caminho para encontrar teto decente para as mais de 7 milhões de família. Elas darão parlamentares excelentes, com muita consciência social. Vão agir também por nós – suas companheiras brancas que se somam na causa –, já que trarão dias muito melhores para todas, todos e todxs. Ponha o Brasil na mão destas candidatas e você verá o que vai acontecer. Ai de Lula se não ouvir as guerreiras e não cumprir o que pactuou com elas.  

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