Faltando um dia para a votação do segundo turno das eleições, grupos bolsonaristas se multiplicam. No último fôlego da corrida, esses eleitores não abrem mão do jogo sujo, como sempre: é o antigo vale tudo. Difusão de fake news, preconceitos de todos os tipos, incentivo à violência, ataques ao TSE e STF, denúncias de supostas fraudes eleitorais e pedidos de intervenção militar são alguns dos destaques das mensagens enviadas entre quinta (27) e sexta (28). Os Jornalistas Livres se infiltraram em seis grupos bolsonaristas criados nas últimas semanas, além dos sete onde já estávamos presentes. O objetivo era acompanhar o que os eleitores do presidente, candidato do PL à reeleição, estão pensando e compartilhando na reta final da campanha.
Fake news e Alexandre de Moraes
Na última semana, Bolsonaro voltou a instaurar um clima de desconfiança do eleitor quanto à lisura do processo eleitoral. Segundo o presidente, as rádios nordestinas estariam boicotando as suas propagandas eleitorais e priorizando as de Lula. Alexandre de Moraes, presidente do TSE, deu 24 horas para que Bolsonaro apresentasse provas sobre as acusações, entretanto a base documental do presidente foi considerada inconsistente e a ação acabou sendo rejeitada.
Nesta quarta (26), Alexandre Machado, servidor do TSE exonerado, foi até a Polícia Federal (PF) falar que sua demissão havia sido por perseguição. Segundo declarou, ele teria informado aos seus superiores sobre irregularidades na fiscalização das inserções da propaganda de Jair Bolsonaro. Além disso, acusou Moraes de abuso de poder. O servidor, entretanto, foi exonerado por assédio moral e eleitoral no ambiente de trabalho, além de postar em seu perfil de Facebook publicações contra Lula e favor de Bolsonaro, o que desrespeita o regimento interno do TSE.
O assunto foi muito difundido, sobretudo nas bolhas bolsonaristas, que não perderam a oportunidade de usar o evento para dizer que as eleições “não são limpas” e, por isso, um golpe seria justificável. Sobre a demissão de Machado, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) chegou a falar em “conluio entre as forças do PT”. Tentam difundir que há um boicote a Bolsonaro e que este boicote é arquitetado pelo “TSE de Alexandre de Moraes”, aliado aos “comunistas”.
Um baixo-assinado pelo impeachment de Alexandre de Moraes circula nos grupos de apoiadores do presidente da República:
As mensagens sobre o suposto boicote que Bolsonaro alega estar sofrendo das rádios nordestinas também têm inflamado os grupos. Alexandre de Moraes disse que, com essa narrativa das inserções nas rádios, Bolsonaro poderia estar agindo para tumultuar as eleições. Parece que o presidente, de fato, conseguiu o efeito desejado. Seus eleitores praticamente não falaram de outra coisa nesses últimos dois dias:
No grupo “Mito” enviaram um vídeo em que hipoteticamente ocorria o impeachment de Alexandre de Moraes:
Outras mensagens circulam em grupos sobre o TSE estar obrigando a Jovem Pan a “mentir” que Lula foi inocentado. Não trata-se, entretanto, de uma mentira, como os apoiadores do presidente insistem em alegar. Os processos contra Lula, de fato, foram anulados, uma vez que a Corte compreendeu que o juiz Sérgio Moro comprometeu o direito da defesa a um julgamento justo.
Alexandre de Moraes foi alvo de ataques de todos os tipos:
Meme mostra Lula no corpo de um bebê e Alexandre de Moraes no de um pai:
Ódio aos pobres, nordestinos e opositores
Nos grupos, a associação do Complexo do Alemão com o crime organizado não para de crescer. Um vídeo inicia com a pergunta: “O Comando Vermelho apoia Lula? Seria uma fake news?”. Então segue o texto: “Alemão é o lugar mais perigoso do Rio de Janeiro”. Segundo a torpe visão bolsonarista, o vídeo insinua que o jornalista, ativista e empresário, Rene Silva, que mora no Complexo e é fundador do jornal Voz das Comunidades, teria ligação com o Comando Vermelho. Rene abrir as portas da comunidade para Lula, como de fato fez, significaria que o petista estaria ao lado do crime organizado. Essa é a lógica deles.
Esta mensagem foi encaminhada com o vídeo, que não será publicado aqui para não incentivar a propagação desse tipo de conteúdo. O vídeo reproduz preconceitos contra pessoas negras e pobres.
No primeiro debate presidencial, Bolsonaro fez a relação entre a comunidade e a criminalidade, como se todo pobre morador de favela fosse, por natureza, bandido. Sua fala foi criticada, principalmente por moradores de periferias. Nas pesquisas eleitorais, as intenções de voto no presidente caíram justamente nesse segmento da população. No último debate, ocorrido na sexta (28), Bolsonaro insistiu em associar o Complexo do Alemão e Lula ao crime organizado.
Também foi difundido pelo presidente e no zap dos seus apoiadores a ideia de que o boné usado por Lula, com a sigla “CPX”, que na verdade significa “Complexo”, fizesse referência ao crime organizado. A deputada bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP) deu munição para os seguidores. Em suas redes chegou ao absurdo de afirmar que CPX significava “cupinxa”. Na verdade ela escreveu errado a palavra CUPINCHA, que quer dizer amigo ou companheiro. De qualquer modo, o preconceito de classe é a base do discurso dessa extrema-direita.
O ódio ao Nordeste e aos pobres é uma constante, o que não foge do que foi o governo Bolsonaro. O descaso com os mais pobres, com os direitos trabalhistas e com programas de distribuição de renda marcaram o mandato do atual presidente, que bateu recordes de extrema pobreza. Com Bolsonaro, 10 milhões de pessoas entraram na miséria, atingindo a marca de 49 milhões de brasileiros que não têm renda suficiente para sobreviver. Em 2022, o Brasil atingiu o número de 33 milhões de pessoas que sofrem com a fome. Enquanto isso, o presidente mantém o aumento do mínimo abaixo da inflação pelo quarto ano consecutivo e, em 2022, corta 87% do Programa Alimenta Brasil, que distribuía leite para famílias nordestinas.
Em grupo “Bolsonaro 22”, integrante “dá tiro” em professor comunista
Pesquisas eleitorais
Por ignorância ou desespero, Bolsonaro e e seus eleitores demonstram descrença generalizada nos institutos de pesquisas. A polêmica ganhou corpo na votação do primeiro turno, que apontou resultados diferentes daqueles apresentados pelos institutos nas vésperas, embora número de indecisos e pessoas inclinadas a mudar o voto fosse já alto. De qualquer forma, desde o começo da campanha, os ataques aos estudos de intenção de voto eram persistentes. Em discursos, Bolsonaro e seus filhos atacaram inúmeras vezes o Datafolha e Ipec, que mostravam Lula na frente do presidente. “Aqui não tem Datafolha, aqui tem DataPovo”, foi a frase gritada por Eduardo Bolsonaro durante fala no bicentenário da independência na Avenida Paulista.
Arthur Lira, presidente da Câmara, e Bolsonaro chegaram a defender projeto de lei que abordava a criminalização de institutos de pesquisa eleitoral. No começo de outubro, o ministro das Comunicações do governo Bolsonaro, Fábio Faria, publicou em suas redes, um vídeo em que pedia para que os apoiadores do presidente não respondessem institutos como Datafolha ou Ipec no segundo turno.
Nos grupos, a dúvida acerca da veracidade desses institutos é difundida em massa. Em contrapartida, pesquisas desconhecidas que apresentam Bolsonaro na frente de Lula são consideradas verdadeiras.
Um dos argumentos dos bolsonaristas é que pesquisas eleitorais induzem o eleitor ao erro, uma vez que “manipulam seu voto”. Um vídeo associa pesquisas à fraude eleitoral: “Vazou!!! O plano da esquerda é diabólico. Pesquisas eleitorais conduziram grande parte da população a votar em Lula ladrão”.
Pesquisas compartilhadas mostram Bolsonaro na frente de Lula:
“Globolixo”
São raros os dias em que Bolsonaro e seus filhos não fazem ataques a Globo ou a outros veículos jornalísticos. A hashtag “Globolixo” se popularizou e nas manifestações dos camisas-verde-e-amarela cartazes acusando a emissora global são a regra. Nos grupos, ela se mantém entre os assuntos mais falados, especialmente nesses últimos dois dias. Acontece que o jornal “O Globo” divulgou o que seria o resultado das eleições do segundo turno. Neles, Lula aparecia como vitorioso com 51,2% dos votos.
Na quinta (27), O Globo reconheceu ter errado na exibição, explicando que os dados foram gerados apenas para testar o sistema. A explicação, entretanto, não acalmou os ânimos dos eleitores do presidente, que difundiram nas últimas horas uma série de mensagens atacando o jornal e dizendo que a fraude era certa, já que a Globo “até sabia dos resultados”.
Antes do último debate presidencial da Globo, ocorrido nesta sexta, os 11 grupos analisados por Jornalistas Livres ferviam. Em todos eles foram enviadas correntes pedindo aos eleitores do presidente para não darem audiência à emissora. E convidavam para assistir ao debate por meio de links da internet.
Quando um integrante do grupo “Intervenção Militar Já” enviou uma pesquisa eleitoral Ipec, da Globo, os demais participantes responderam assim:
Lula, macumba e satanismo
O ataque às religiões de matriz africana não é algo novo entre os seguidores de Bolsonaro ou seu clã. Em agosto, Michelle Bolsonaro, ao lado do presidente, declarou, durante um culto religioso, que antes do casal ocupar o Palácio do Planalto, o espaço era ocupado por “demônios”. Com o mandato de Bolsonaro, o palácio, segundo ela, seria “consagrado ao senhor”. Após a fala intolerante, Michelle ainda compartilhou em suas redes um vídeo em que o ex-presidente Lula participava de uma cerimônia da umbanda. Na legenda da republicação, Michelle dizia que Lula vendia sua alma para vencer as eleições.
De acordo com o Art. 208 do Código Penal é crime: “escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa…”. A pena é a reclusão, de um a três anos, e multa. Mesmo assim, nada aconteceu no sentido de punir a fala intolerante da primeira-dama. A impunidade é bálsamo para governo de seu marido.
É essa sensação de impunidade que dá fôlego aos apoiadores do presidente, esses usam as redes para espalhar racismo religioso e fake news associando Lula ao satanismo. Mensagens trocadas nos grupos falam que Lula estaria fazendo “macumba” para ganhar as eleições. Macumba é um termo usado para se referir a cultos afro-brasileiros.
O mesmo vídeo também foi usado para associar Lula ao satanismo:
“Satanistas são flagrados em ritual prometendo sacrificar 10.000 crianças pela vitória de Lula”.
Uma resposta
nunca me diverti tanto com o circo de palhacos que estao nas ruas, ontem tinha um cara falando que, as mulheres tinham que beijar todo mundo das ruas para mostrar que bolsonaro é forte, até as tiazinhas estavam beijando os tiozao bebados, nao entendi absolutamente nada.