O assassinato sob tortura de Genivaldo Jesus dos Santos, de 38 anos, cometido por agentes da Polícia Rodoviária Federal lotados em Sergipe, repugnou o mundo. A cena, filmada por familiares e divulgada pelas redes sociais, viralizou diante do espanto generalizado. Como não se impressionar com aquela viatura soltando a fumaça tóxica das bombas de gás lacrimogêneo, enquanto os policiais empurravam o capô traseiro sobre as pernas desesperadas de Genivaldo Jesus, que tentava escapar dos acessos de tosse, da asfixia, do sangramento dos olhos, da ruptura das córneas, das queimaduras graves na garganta e nos pulmões, das lesões neurológicas?
Todo mundo sabe que essas armas chamadas de “menos letais”, como as bombas de gás lacrimogêneo, usadas largamente contra manifestações em lugares abertos para dispersar multidões, não podem ser empregadas em locais confinados. Que dirá dentro do exíguo espaço do “chiqueirinho” de uma viatura policial.
Foi tortura, sim! Foi assassinato, sim! Foi covardia, sim! Porque cometida contra um homem negro, doente e desarmado, cujo único crime foi pilotar uma motocicleta sem usar o capacete obrigatório (coisa que o genocida Jair Bolsonaro já vez inúmeras vezes durante suas infames motociatas).
A cena repugnante está hoje nas capas dos jornais Folha e O Globo, foi amplamente veiculada nos principais telejornais, indignou o Brasil e ensejou comparações justificadas com as dantescas câmaras de gás usadas pelos nazistas nos campos de extermínio de Auschwitz e Birkenau, entre outros.
Mas Lula, o candidato à Presidência do povo pobre, preferiu hoje publicar em seu twitter uma cena ridícula. Uma toalha estampando o rosto dele, jogada no chão da chiquérrima praia de Cannes, na França, onde acontece o Festival de Cinema homônimo.

Lula também nada falou sobre a chacina na Vila Cruzeiro, decorrente de operação policial deflagrada na terça-feira (24) numa comunidade da zona norte do Rio de Janeiro, que resultou em 26 vítimas. E que já é considerada a segunda mais letal da história do estado, ficando atrás apenas da ação na favela do Jacarezinho do ano passado, com 28 óbitos.
Esse silêncio ensurdecedor de Lula destina-se a não incomodar os ouvidos sensíveis de Geraldo Alckmin, candidato a vice na chapa do petista? Nós não esquecemos que Alckmin leva sobre os ombros a culpa pelo terrível massacre nas periferias de São Paulo, durante a retaliação aos ataques do PCC, em 2006, quando mais de 500 jovens moradores das periferias foram assassinados a sangue frio pelas forças policiais. O mesmo Alckmin que desfechou uma brutal repressão contra os protestos de 2013, ferindo e cegando covardemente muitos manifestantes.
Lula precisa entender definitivamente que a sua base de apoio não é a mesma de Geraldo Alckmin, que aliás nem tem base nenhuma, como demonstram os episódios que o levaram a ser ejetado do PSDB sob humilhação.
O último Datafolha, divulgado nesta quinta (26 de maio) mostra que a base de Lula é composta por negros, pobres, nordestinos e mulheres, as mesmas coortes que pranteiam Genivaldo Jesus e os mortos da Vila Cruzeiro. Virar as costas para esse povo (tão sofrido quando esperançoso em um novo mandato de Lula) pode ter consequências funestas para a candidatura que até agora se mostra tão vigorosa.

Ainda faltam 18 semanas para a eleição presidencial. Se até Bolsonaro, sempre desrespeitoso com a morte e a dor dos mais vulneráveis, teve de se conter no apoio aos assassinos de Genivaldo Jesus, Lula não pode silenciar. Não tem o direito de silenciar. Porque ninguém quer de Lula que se equivalha aos seus adversários políticos na covardia ao enfrentar os assassinos infiltrados na máquina do Estado. Aliás, muito pelo contrário.
Bolsonaro criou-se como mito ao usar o nome do meio, “Messias”. Genivaldo pode se tornar um símbolo contra a violência policial. Seu nome do meio é “Jesus”. Só pra lembrar, Lula!