Butantã (SP), luta para manter assistencia social de criança e jovens

Comunidades do Butantã, na luta contra o fechamento de serviços de assistência à criança e ao adolescente

Crianças, adolescentes, famílias atendidas pelos Centros de Convivência  da Criança e do Adolescente – CCAs Gracinha e Clarisse,  profissionais das unidades e representantes das comunidades, realizam Ato de apelo para o não fechamento anunciado de suas atividades.Estes CCAs, mantidos pela Associação Pela Família – ASPF há 35 anos, em convênio com a Prefeitura de São Paulo, desenvolvem atividades sócio-educativas e culturais, orientação e fornecem alimentação a crianças e adolescentes de 6 a 14 anos de extrema vulnerabilidade social, no período em que não estão na escola. Com sua atuação propiciam o fortalecimento de vínculos, atividades que reforçam a identidade e o direito de cidadania para os matriculados, famílias e comunidades do entorno.

De maneira unilateral, a ASPF em plena pandemia comunicou à Prefeitura, e à direção das unidades, o rompimento do convênio com encerramento das atividades. Decidiu em Assembléia abandonar os investimentos em áreas de bolsões de pobreza cuja renda per capita chega a ser de 1/4 de salário-mínimo, sem consulta e participação das partes envolvidas: alunos, famílias, funcionários dos CCAs e comunidades. Com esta decisão, sob a alegação de não ter condições de arcar com os custos de reforma exigidos pela Prefeitura para garantir a acessibilidade de eventuais pessoas com deficiência, deixam de atender 300 crianças e adolescentes, 3.144 famílias, impactando  12.576 pessoas,  além de provocar o desemprego de profissionais moradores da própria região compromissados com o trabalho.

Várias tentativas de negociação foram realizadas pelos CCAs, tanto com a mantenedora quanto com a Prefeitura. Os CCAs propõem que o atendimento seja mantido até pelo menos o final do ano, tempo para que a Prefeitura faça as articulações necessárias, para conseguir local físico nas mesmas comunidades e que uma outra  Organização Social assuma o trabalho,  garantindo a continuidade do atendimento e a permanência dos profissionais envolvidos.

De outro lado, a ASPF propõe bolsas de estudo para algumas crianças da periferia que seriam atendidas em sua unidade central, Escola Nossa Senhora das Graças no Itaim Bibi, bairro nobre de São Paulo, com freqüência de filhos da elite. A prestação deste serviço assistencial no Itaim Bibi para as crianças do Jardim Kemel e do Jardim Jaqueline é totalmente inviável, não atende às comunidades e nada tem a ver com suas realidades. Por sua vez, isso garantiria à ASPF a continuidade do benefício de isenção fiscal por serviços assistenciais prestados.

Qual a responsabilidade da Prefeitura?

Em plena pandemia, no momento em que os parcos investimentos em Assistência Social (cerca de apenas 1,7% do orçamento do município) deveriam ser multiplicados, os recursos diminuem e vários serviços e programas são fechados. Só na região do Butantã, no último ano fecharam mais 3 CCAs.

Cabe à Prefeitura priorizar a garantia de uma vida digna para todos. Um atendimento de tanta importância não pode deixar de existir. A Prefeitura deveria flexibilizar as exigências de adequações da estrutura física. Quais negociações a Prefeitura poderia fazer com a ASPF?

O poder público não pode se eximir de responsabilidades num momento em que a fome, a extrema pobreza e a falta de atendimento têm afetado amplos segmentos da população da cidade, especialmente nas regiões periféricas. As crianças e adolescentes tem direito a ser gente!

Fotos de Guilherme Piazzaroli

A voz das crianças e adolescentes do butantã precisa ser ouvida

Segundo uma das professoras, ”os jovens são incentivados nos CCAs a reconhecer sua capacidade de manifestar seus sonhos, angústias, revolta, carinho e sua opinião através da palavra. A palavra como principal arma para posicionamento social, político, cultural e emocional, pois é através da palavra que damos forma aos nossos sonhos e pensamentos”.

Através dos SLAMs produzidos pelos alunos, é possível perceber os impactos que a falta dos CCAs terá em suas vidas.

VALORIZE: Estendeu a mão quando eu caí, Me passou confiança até aqui… (12 anos). CRIANÇA NÃO TEM QUE TRABALHAR: Quanto mais o tempo passa, Crianças sem futuro continuam a trabalhar.  Já está na hora disso tudo mudar.  Criança foi feita para estudar, brincar, para sua família um dia ajudar… (10 anos). FOME, MONSTRO INTERNO: …sentir o cheiro do alimento e não sentir o sabor/ Assim é a cara da fome, que nos traz aperto e dor… é o monstro interno que devora o estômago! (10, 11 e 12 anos). MEU BRASIL: Que mundo é esse? Onde a fome aperta, a dor sufoca e a criança chora, Que mundo é esse onde uns nada têm e outros com tantas notas de cem.. (13 anos).

Quem não faz acontecer, vê acontecer…
(autor 14 anos)

As comunidades do Jardim Kemel e Jardim Jaqueline se mobilizaram e fizeram a sua parte.  Cerca de 300 pessoas organizadas foram até a sede da Mantenedora no Itaim Bibi, onde funciona também a escola Nossa Senhora das Graças, para explicar a importância da manutenção dos CCAs para as comunidades e sugerir continuidade dos trabalhos.  Os responsáveis  cientes de que haveria a mobilização não foram trabalhar neste dia. Uma representante da Frente de Luta pela defesa dos CCAs e uma mãe da comunidade foram recebidas pela direção da Escola que se sensibilizou pela causa, assim como professores que se juntaram aos manifestantes. As representantes protocolaram uma carta com 5 pontos a serem considerados e aguardam um posicionamento dentro de 10 dias. Na saída dos alunos, muitos pais ficaram surpresos e inconformados com a decisão unilateral da mantenedora também do colégio.

O movimento está forte e a disposição de luta é grande.  Com apoio dos adultos, muitas crianças e jovens são conscientes e aguerridos. Segundo a palavra deles, NÃO NOS CALARÃO: Nenhum ser humano tem o poder de matar a alma. Podem matar o corpo, mas não o pensamento… eles podem me matar, mas não podem me calar! (aluno de 13 anos). VOU GRITAR PRO MUNDO: O Brasil que eu quero para o futuro, É um Brasil onde temos direitos!… Minha melhor arma é minha voz! Com meu protesto vou gritar e lutar contra o sistema…( 14 anos). O CLARISSE NÃO PODE FECHAR: “Em plena pandemia, não podem fechar nosso espaço.  Olhem só que ironia, querem nos dar cestas básicas… aqui é um lugar muito importante para a periferia, aqui a gente aprende  a ser gente, aprende a convivência, o que nem a escola nos ensina… como cantam os Titãs, a gente não quer só comida,a gente quer diversão e arte… a gente quer saída pra qualquer parte… queremos esse espaço aberto ajudando a criança e o adolescente, dentro da nossa comunidade… (14 anos).

A ASPF e o governo não podem ficar de costas para o povo

FOME PRA QUEM? Fome dói! Não sei o que faço. O alimento é escasso …, futuro de incertezas… A coisa está séria, O povo crescendo na miséria, E para o governo isso nem é matéria. (11 anos). Organizados na Frente de Luta em defesa dos CCAs,  comunidades , alunos, pais e profissionais, reafirmam sua garra e disponibilidade: a LUTA CONTINUA!

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