Rudá Ricci, cientista político e presidente do Instituto Cultiva
Proponho uma tese sobre o momento político que vivemos a partir das mobilizações de rua que cravam o “Fora Bolsonaro”: as mobilizações estão sendo canalizadas para um movimento circular que favorece Lula e Arthur Lira, mas que queima Bolsonaro e o bolsonarismo. Em outras palavras: a ação “circular” da política atual se organiza a partir da pressão das ruas que canaliza um ataque direto ao governo federal a partir da consigna “Fora Bolsonaro”. Portanto, aponta para o impeachment. Então, o “Fora Bolsonaro” aponta para o campo institucional. A não ser que dê um giro político e assuma uma pressão política que engula o Congresso, a tal consigna se dirige à abertura da apreciação, pelos deputados federais, de um dos mais de 100 pedidos de impeachment.
Porém, como as forças oposicionistas operam com esta demanda que sai das ruas, cada vez mais nítida a cada mobilização? Minha leitura é que jogam para a plateia. O bloco que constitui o lulismo não deseja efetivamente o impeachment que cairia no colo de Mourão. Mourão como presidente pode recompor o campo militar-empresarial que se instalou entre os governos Temer e Bolsonaro. Tal recomposição tiraria parte da musculatura que Lula está construindo para 2022. O risco é alto. Daí fingir que estão fazendo força.
Se minha tese está correta, a pressão vai toda para a conta de Arthur Lira. Não seria por outro motivo que ele aparece mais nos últimos dias: acelera a pauta “empresarial” e tenta desqualificar o impeachment. O que ele estaria fazendo, de fato? Minha segunda tese é que Arthur Lira mata no peito e aumenta o valor do passe junto ao governo federal. Vende caro o apoio e o engavetamento da apreciação dos pedidos de impeachment de Bolsonaro.
Assim, Lira canaliza mais poder e recursos para os famintos deputados federais que almejam se eleger no próximo ano. Com mais recursos, o presidente da Câmara de Deputados se torna o “Príncipe do Centrão e do Baixo Clero”. Não é lá muito distinto do expediente usado por Eduardo Cunha.
Então, temos um movimento circular na política institucional que se baseia em: A) Mobilizações maiores pedindo o impeachment; B) O campo lulista se apresentando como o mensageiro da exigência no campo institucional; C) Arthur Lira se aproveitando da pressão e vendendo caro o apoio ao governo federal.
Se a tese geral está correta, quem ganha com essa circularidade é o lulismo ….. e Arthur Lira. Subsidiariamente, o Centrão. Mas, a tal circularidade tira musculatura e iniciativa do governo federal e diminui o protagonismo do bolsonarismo.
Tal circularidade só será alterada se as mobilizações de rua (a próxima será dia 24 de julho) mudarem o tom ou se Bolsonaro partir para o tudo ou nada. Até lá, vamos viver esse tipo de “emoção controlada”.
Do mesmo autor: