Eles venceram, mas o sinal não está fechado pra nós

Foto de Lula Marques

Alexandre Santos de Moraes, professor do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense

A Reforma da Previdência foi aprovada na Câmara dos Deputados. Em 10 de julho de 2019, 379 deputados votaram “sim” para o texto-base que altera as regras de aposentadoria. A esquerda, praticamente em uníssono, votou “não”, mas foram apenas 131 votos.

Foi uma vitória de Rodrigo Maia (DEM), que assumiu as rédeas do jogo e definiu um “Parlamentarismo de ocasião” quando percebeu que Bolsonaro é incapaz de negociar qualquer coisa. No entanto, não vamos tirar essa vitória do colo do presidente: ele jogou com as cartas que tinha e que não tinha, liberando verbas indecentes para comprar a convicção daqueles que se recusavam a empunhar seus nomes nessa medida impopular. Maia e Bolsonaro venceram, e não vamos privá-los desse gostinho de vitória. Negar esse fato é jogar fora a verdade cruel que eles lutam para esconder: quando a direita vence, o povo perde.

Mas não basta lembrar a vitória, é preciso recordar seu custo. Não me refiro apenas aos milhões de reais liberados estrategicamente para financiar essa jogatina. É preciso colocar na conta o volume indecente de verba publicitária que o governo reservou para convencer as pessoas de que o veneno funcionava como remédio. Também não há como esquecer os custos do discurso apocalíptico de que o “país iria quebrar” caso a PEC não fosse aprovada.

O governo e os deputados governistas também cobraram um preço alto da democracia: fecharam as portas do Parlamento para se livrar das pressões populares, brincaram de fazer “bolão” e foram comemorar algo que prejudica seriamente a vida de milhões de trabalhadores e trabalhadoras, sem falar que não houve consulta popular e a discussão sempre foi terrivelmente frágil, pois no afã de garantir a vitória ocultaram dados, números e informações. Venceram de modo vil, pode-se dizer, mas venceram. Política tem dessas coisas, e não adianta lamentar a imoralidade do processo.

Eles venceram, mas o sinal não está fechado pra nós. Para que não se perca a memória, essa reforma é um sonho de longa data acalentado pelos donos do dinheiro. É preciso lembrar que o Estado tem uma dívida que consome mais da metade de tudo que se arrecada, e o desespero dos ricos é perder um pouquinho de tudo aquilo que os pobres sequer sonham desfrutar. Trata-se de uma reivindicação antiga dos milionários e bilionários, brasileiros e estrangeiros, empresários e especuladores financeiros que se escondem atrás do chamado “mercado”, uma metonímia maldita que despersonaliza a pequena parcela de abastados que se esconde nos cofres e se esforça para parecer uma entidade sobrenatural.

A Reforma da Previdência não é apenas um forte incentivo ao pagamento das dívidas, mas a abertura de uma janela de oportunidades para ampliar ainda mais as possibilidades desse lucrativo endividamento. Rodrigo Maia e Jair Bolsonaro foram títeres de ocasião, manobrados com as cordas na contramão das necessidades e exigências populares. Isso não os exime de culpa, é verdade, mas é preciso compartilhar os méritos da vitória: quando vencem os ricos, perdem os pobres. Quando vence a direita, perde o povo.

O problema é que os fatos da política não são como os da natureza, e se a derrota pode ser amarga, as vitórias também não são lá muito cândidas. Ainda não foi possível, para a maioria de nós, assimilar os custos dessa vitória. Aqueles que trabalham muito e ganham pouco, especialmente os que votaram no presidente que ora os obriga a uma vida de labuta ininterrupta, precisarão fazer as contas em algum momento. Se ainda não estão cansados, um dia ficarão exauridos e perceberão o direito que lhes foi negado. Essa compreensão, certamente, não cairá do céu e os defensores do fim da aposentadoria continuarão alegando que foi “o melhor para o país”.

Nossa função será lembrar que o país não pode ter dono, e que se for ruim para o povo, não pode ser bom para Brasil. As condições da vida material gritam, e é nesse momento que se abre a chance de gozar com a vitória alheia. Não se trata de revanchismo ou otimismo baratos, mas, sim, do reconhecimento de que a realidade se impõe de modo visceral, razão pela qual é importante não deixar esse assunto se esvair na rotina de escândalos medíocres que adorna os noticiários. Em política, todas as vitórias são passageiras. Mesmo eles, que governaram o país por tanto tempo, se viram derrotados por um projeto popular que deixou na lembrança um sabor doce que será difícil apagar. Conseguiram que o sinal verde se abrisse, mas a gente sabe que logo em seguida vem o sinal vermelho.

Nesse momento, não podemos confundir indignação com desânimo. Na verdade, é a indignação que move nosso ânimo, e a vitória deles deve nos atiçar ainda mais. Seguiremos conversando com as pessoas, discutindo a maldade que foi imposta, revendo a romantização estratégica do trabalho e demonstrando o custo da despolitização da política. Sempre é tempo de combater o bom combate, nas ruas, na internet e em todas as trincheiras possíveis. O sinal, insisto, não está fechado para nós. Eles venceram, e poucas vitórias mostraram de forma tão transparente as diferenças fundamentais que nos opõem.

A conta já está chegando, e pelo mapa da votação sabemos que partidos votaram contra ou a favor dos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras. O sinal não está fechado e a luta nunca termina, até porque, como diz a canção de Belchior, “Viver é melhor que sonhar”. Política dá trabalho, mas dessa aposentadoria não fazemos a menor questão.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

COMENTÁRIOS

15 respostas

  1. JL aceitem que dói menos. Quando os de esquerdas liberavam dinheiro a rodo (propinas) comprando os políticos devassos do congresso, onde vocês estavam que nada viam…

  2. Dinovo o feitiço esmagador tomou conta de parte do povo parte de seus representantes lá em Brasília um resto de sonho foi destruido a esperança de um povo se perdeo em meio a tantos votos proferidos contra o povo contra uma nação,,a conta chegará e o povo embora sangrando saberá mesmo em meio às revolta exigirá que a conta seja paga…

  3. Interessante. De acordo com a matéria, quem era incapaz de negociar conseguiu que aprovassem o texto-base da Reforma. Outros que antes dele tentaram não conseguiram. Não entendi bem. Ou será que entendi a intenção da matéria?

  4. Eu, espero que numa próxima oportunidade que à esquerda estiver, invista com muito potencial na educação plena. e por favor, redemocratização da mídia tradicional pra já,!!

  5. As 5 perguntas que o covarde jornalista americano não se atreveu a responder 

    Na Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, os deputados da esquerda, principalmente do PT, PCdoB e PSOL, quase todos envolvidos nos esquemas de corrupção da era PT, prepararam uma encenação para paparicar o criminoso Glenn Greenwald.
    Um bando de parlamentares implicados com denúncias de corrupção, afagando um gângster travestido de jornalista.

    Um lamentável e deprimente espetáculo.
    Até surgir :
    Filipe Barros, do PSL.
    Antes de iniciar a formular suas perguntas, o brilhante deputado ressaltou a importância da Lava Jato no combate a criminalidade e a corrupção e fez questão de ressaltar que ali, naquele plenário, estavam sentados alguns réus da operação, que justamente por isso, essas pessoas ignoravam os casos gravíssimos investigados.
    Glenn não foi capaz de responder a nenhuma das perguntas de Filipe.
    O gringo mostrou a sua fraqueza moral e a inconsistência do material hackeado.

  6. Infelizmente o tempo vai mostrar a amargura dessa Vitória e devemos estar prontos para seguir lutand de cabeça erguida.

  7. Bolsonaro nao entende nada de politica lamentavel fazer o pobre trabalhar p encher o bolso dos ricos ele pode enganar a justiça dos homens mais a de deus jamais ainda tem coragem d falar q é homem d deus passou longe paresce mais é homem d capeta!

  8. Sem sentido essa avaliação. Qual o político que faz política pensando no povo. Sem comentário!

  9. KkkkKkkkk. A gritaria da esquerda é coisa de passado.

  10. O que muito me dói é ver pobres que perderam seu direito a Aposentadoria comemorando a própria derrota. Não conseguem enchergar a realidade cruel simplesmente por questões ideológicas , para não pagar recibo pq votaram errado!

  11. Neste momento de enorme preocupação com nosso futuro, futuro de quem trabalha nas agruras da vida comum, o texto nos conforta ao nos dizer “não estamos sozinhos”. Obrigado.

  12. eu fiquei muito feliz em ver um presidente que dizem ser ignorante tornar publico que o pais esta no caminho certo estou vendo declaracoes de barganha mais foi aprovado no senado e camara verbas obrigatoria depois da votacao esses pessoal que nao tem compromisso com o mais pobre dizer tanta coisa mediocre o fim de tanta canalhice esta terminando o brasil precisa de progresso

  13. OS que amam o passado, não vê que o novo sempre vem e pode vir assombradamente de forma muito mais cruel qdo o vil metal não é distribuído de forma um pouco mais igualitária. Sofreremos todos, até mesmo os se impuseram pra que essa reforma saísse pois, O preço da miséria em pleno século XXI, será alto e amargo.

  14. Infelizmente, a grande maioria do povo brasileiro é ignorante, não tem noção da realidade política e ficam à mercê de seus patrões, líderes evangélicos, mídia reacionária, que expressam seus interesses individuais disfarçados de interesses do todo.

  15. 13 de junho de 1990 o então presidente da República Fernando collo de Mello nomeou seu primo .hoje o então ministro do supremo tribunal Federal Marco Aurélio Mello .
    PODE ISSO????
    EU só quero entender como funciona a lei desse país.

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