O Brasil, em 2018, manteve a liderança no perverso ranking dos países que mais matam a população trans no mundo. Foram 163 casos de assassinatos no ano passado. Não se tratam de número oficiais – aliás, praticamente não há números oficiais no país quando se fala em população trans. Os dados vêm de um seríssimo trabalho desenvolvido pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (ANTRA). Segundo a Transgender Europe, instituição que monitora dados como esses em diversos países, 41% dos assassinatos de pessoas trans em todo o planeta ocorrem no Brasil.
O novo Dossiê de Assassinatos e Violência contra Travestis e Transexuais foi apresentado nesta semana que marcou, mais precisamente em 29 de janeiro, o Dia Nacional pela Visibilidade Transexual.
Maioria é com arma de fogo
Os dados são de arrepiar. E de dar muito medo. A cada 48 horas uma pessoa trans é brutalmente assassinada no país. Em 53% dos casos, o algoz utiliza a arma de fogo para matar sua vítima. O dado é ainda mais aterrorizante se observarmos o contexto: no primeiro mês de seu governo, o presidente Jair Bolsonaro ampliou radicalmente a possibilidade de possuir armas no país. A ministra dos Direitos Humanos defende que meninos usem azul e meninas, rosa.
Os tiros assustam, mas há ainda casos de mortes com facas, pedras, paus, linchamentos e mutilação dos corpos mortos. Em janeiro deste ano, em Campinas, um assassino arrancou o coração de uma travesti após matá-la.
Racismo Trans nas ruas
O levantamento chama a atenção para o racismo brasileiro. O escandaloso percentual de 82% das pessoas mortas eram pretas ou pardas. Vemos ainda que 65% dos assassinatos foram direcionados àquelas que são profissionais do sexo. 60% deles aconteceu nas ruas.
Rio é o estado que mais mata. Nordeste é a região
Em números absolutos, o Rio de Janeiro foi o que mais matou a população trans em 2018, com 16 assassinatos. Bahia (15), São Paulo (14) vem em seguida. O Ceará, estado de Dandara dos Santos, que liderou o ranking em 2017, agora foi o quarto estado que mais matou, 13 pessoas. No ranking proporcional à população de cada estado, os estados do Mato Grosso, Sergipe e Roraima lideram a lista. Não há lugar seguro para a população trans no Brasil – apenas o Acre e o Amapá não tiveram nenhum caso registrado.
O nordeste segue sendo a região do país mais perigosa para a população trans, foram ao todo 59 casos de assassinatos.
Os mortos são jovens
A dramática expectativa de vida da população trans no Brasil é de 35 anos. A alta incidência de assassinatos antes dessa idade puxa a marca para baixo. Em 2018, a média de idade das pessoas trans assassinadas era de 26,4 anos – queda de 1,3 ano em relação a 2017. 60,5% das vítimas tinham entre 17 e 29 anos. A vítima mais jovem tinha apenas 17.
Semana da Visibilidade
Nesta semana de memória e reafirmação da identidade, diversos eventos foram realizados pelo Brasil. No Rio de Janeiro, houve um dia de acolhimento e troca de ideias na Biblioteca Parque do Centro na segunda-feira. Falou-se sobre prevenção ao suicídio, empregabilidade, empreendedorismo, processo transexualizador e ainda das pessoas trans na política. Em 2018, pela primeira vez o Brasil elegeu uma deputada transexual. Erica Malunguinho da Silva (PSOL) será deputada estadual em São Paulo. Na terça-feira, a FioCruz também recebeu um evento para debater a questão transexual. À noite, um ato na Cinelândia encerrou as celebrações.
Transexuais falam
A luta pela visibilidade transexual ganha força, apesar de tantas ameaças. Uma dessas pessoas que se somam à militância trans é o filho do governador do Rio de Janeiro, Erick Witzel. Ele, que é chef de cozinha, falou como é importante perceber que existe uma comunidade trans que acolhe e abraça.