Presidente da FUNAI oferece proteção a servidor preso por arrendar terras indígenas

Em áudio divulgado pela PF, presidente Marcelo Xavier diz “Pode ficar tranquilo aí que você tem toda a sustentação aqui.”
Marcelo Xavier, presidente da Funai, defende mineração em terras indígenas
Marcelo Xavier, presidente da Funai, defende mineração em terras indígenas

Áudio captado pela Polícia Federal, durante investigação sobre irregularidades no órgão de proteção aos povos indígenas, mostra o Presidente da Funai, Marcelo Augusto Xavier, oferecendo apoio ao coordenador da FUNAI Jussielson Silva, que foi preso por arrendar terras indígenas no Mato Grosso. Houve um repasse de quase R$900 mil reais para a liderança do povo Xavante, nos 15 arrendamentos feitos na terra indígena Marãiwatsédé, além de denúncias de pagamentos de propina a servidores públicos. 

Na conversa divulgada, o presidente da Fundação Nacional do Índio diz que Jussielson pode “ficar tranquilo”, pois “Eu vou dar ciência já do caso ao corregedor lá de Mato Grosso, ao corregedor nacional da Polícia Federal aqui e já vou acionar nossa corregedoria para atuar nisso aqui.” afirmou Xavier. O servidor revela estar na “ponta da lança” nas investigações e que fica feliz pela ajuda oferecida por Xavier. 

“Pode ficar tranquilo aí que você tem toda a sustentação aqui. Pode ficar sossegado”  

Marcelo Xavier, presidente da FUNAI

Marcelo Xavier é delegado da Polícia Federal e foi nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro, em 2019, para o cargo na FUNAI. Apoiado pela bancada ruralista e pela bancada da bala, Xavier é favorável à exploração de minérios em terras indígenas. Seu antecessor, general Franklimberg Ribeiro de Freitas deixou o cargo justamente por pressão dos ruralistas.

O coordenador da FUNAI e mais dois suspeitos do arrendamento, o policial militar Gerrard Maxmiliano Rodrigues e Souza e o ex-policial militar Enoque Bento de Souza, foram presos em março de 2022 na Operação Res Capta. Gerrad e Enoque ainda são acusados de integrar milícia privada, sequestro qualificado, abuso de autoridade, peculato, favorecimento pessoal, usurpação de função pública na forma qualificada, porte ilegal de arma de fogo e estelionato.

A defesa de Jussielson alegou que o áudio é irrelevante para o julgamento dele. A FUNAI, em nota, declarou que o foco da fundação, em virtude da pandemia, foi garantir a segurança alimentar e sanitária dos indígenas e que “desde 2018 busca uma solução para o impasse envolvendo a prática de arrendamento na Terra Indígena Marãiwatsédé, localizada no Mato Grosso, em diálogo constante com o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal sobre o tema.”

A fundação ainda declara que as lideranças indígenas da Terra Indígena Marãiwatsédé tem uma grande quantidade de armas ilegais o que dificulta a fiscalização. “A prática do arrendamento gerava concentração de renda por parte do Cacique Damião, com coação dos demais indígenas, impedindo inclusive que fosse realizada atividade de fiscalização pela Funai”.

Em 9 de agosto a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) pediu, por meio de uma petição, o afastamento imediato do presidente da Funai. “A presidência de Marcelo Xavier tem claro intuito de inviabilizar o funcionamento da Funai. Age em desrespeito aos direitos dos povos indígenas, principalmente em relação aos direitos sobre as terras originárias tradicionalmente ocupadas, e viola o que está previsto no artigo 231, §2º, da Constituição Federal” afirmou a petição.

O outro lado – nota da FUNAI

Recentemente, o presidente da Funai, Marcelo Xavier, enviou ofício à Polícia Federal exigindo a instauração do competente inquérito policial para apuração do seu suposto envolvimento em arrendamento ilegal na Terra Indígena Maraiwatsede (MT), ou justificativa plausível para deixar de fazê-lo, sob pena de prevaricação.

No que se refere à sua atuação no processo de desintrusão da Terra Indígena Maraiwatsede, ressaltamos que nunca houve nenhum indício de que tenha atuado de forma parcial ou praticado alguma irregularidade, sendo mentirosas e ofensivas as narrativas dos veículos de comunicação com vazamento descontextualizados dos áudios. Tanto é verdade que durante o procedimento de desintrusão foi efetuado o indiciamento de mais de 40 pessoas que invadiram a respectiva área indígena. Foram indiciadas pela prática de crimes ambientais, conforme consta nos Inquéritos Policiais nº 10/2013, 11/13, 12/13, 12/12, 13/09, 13/12, 14/13, 14/12, 15/13, 15/12, 16/13, 16/12, 17/13, 14/12, 18/12, 19/13, 19/12, 20/12, 22/12, 28/13, 29/13, 30/13, 31/13, 32/13, 33/13, 34/13, 35/13, 82/12, 87/12, 111/11, 117/12, 191/12, 192/12, 193/12, 207/12, 75/13, 59/13, 133/13, 143/13 e 110/11, todos oriundos da Delegacia da Polícia Federal de Barra do Garças e presididos por Marcelo Xavier à época. Ressalta, ainda, que à época, por sua iniciativa, ocorreu a mensuração de danos ambientais, resultando em somas milionária para recomposição ambiental. Logo, absolutamente despropositada a tentativa de seu envolvimento na prática de atos ilícitos, os quais combateu, eis que quando lá esteve indiciou várias pessoas pela prática delitiva. 

É incompreensível essa sanha midiática em denegrir a imagem de Marcelo Xavier, recrudescida em momento pré-eleitoral, voltada para criar um ambiente social e familiar hostil, trazendo indevida repercussão na esfera criminal, ao proceder sensacionalismo irresponsável e manipular notícias falsas.

O caso que repercutiu envolve o áudio de uma ligação telefônica do investigado Jussielson Gonçalves Silva, à época Coordenador Regional da FUNAI de Ribeirão Cascalheira/MT, interceptado pela Polícia Federal, sendo o outro interlocutor o Presidente da FUNAI, Marcelo Xavier, que jamais foi investigado no caso em questão.

Foram divulgados trechos adredemente e maliciosamente selecionados de uma gravação de aproximadamente 05 minutos e deram ao caso uma narrativa totalmente insana e fantasiosa, com vinculação a fatos apurados posteriormente, dos quais o Presidente da FUNAI sequer havia ciência à época da ligação. Tratou-se de uma conversa rotineira de uma instituição na qual um subordinado lotado em região descentralizada da Sede relatava uma situação concreta de informalidade no requerimento de documentos oficiais, por autoridades policiais, sob pena de configurar crime de desobediência. 

Ao contrário do que foi veiculado de maneira deturpada, a questão tratada entre o Presidente da FUNAI e o então Coordenador Regional gira em torno da ausência de formalidade em requisição de informações por parte da Polícia Federal à FUNAI. Na ligação, Jussielson reporta ao Presidente que foi procurado por agentes da Polícia Federal, a pedido do Delegado Federal em Barra do Garças/MT, os quais requisitaram informalmente documentos que, segundo o então coordenador, tramitavam internamente na FUNAI sob o caráter sigiloso, razão pela qual ele não poderia fornecer tais documentos a terceiros sem a devida formalização. Afirmou, ainda, segundo sua versão, que foi ameaçado e coagido pelo Delegado da Polícia Federal e que achou toda a situação estranha e atípica. Por isso, o Presidente da FUNAI, entendeu que toda a questão que envolvesse o fornecimento de documentos deveria ser tratada formalmente, vez que a comunicação entre a Polícia Federal e a FUNAI é feita através do sistema SEI. Nessa senda, o Presidente orientou que Jussielson tratasse toda a questão de maneira formal, informou que Jussielson teria “toda sustentação” para que a informação entre a FUNAI e a Polícia Federal ocorresse via Sistema Eletrônico de Informações, obedecidos os aspectos formais, pois considerou inadequada a tratativa informal dada ao caso pelo Delegado da PF.

A narrativa acima encontra-se claramente delineada na degravação do diálogo assinada pelo Agente de Polícia Federal, Murilo Alves dos Reis, em 21/02/2022, da qual extrai-se a afirmação do próprio agente federal de que o diálogo interceptado refere-se a uma possível “ausência de formalidade de informações por parte da Polícia Federal ao órgão em que ambos são vinculados”. Para melhor entendimento, cumpre destacar a informação que foi omitida:

Por óbvio, a operação deflagrada pela Polícia Federal era sigilosa, razão pela qual o pedido de quebra de pedido de sigilo também se deu por sigilo processual. Isso significa que, por parte da Sede da FUNAI, em Brasília, não havia ciência de que o então coordenador se encontrava sob investigação por envolvimento com o arrendamento ilícito das áreas indígenas. O mandado de prisão preventiva em face de Jussielson foi cumprido em 17/03/2022, um mês após a interceptação telefônica.

Inclusive, a situação ilegal foi encaminhada pelo próprio Presidente da FUNAI, Marcelo Xavier, através do Ofício nº 1404/2021/PRES/FUNAI, datado de 17/09/2021, ao Departamento de Polícia Federal e também à Procuradoria da República de Barra do Garças/MT, através do Ofício nº 1478/2021/PRES/FUNAI, datado de 21/10/2021, sendo um paradoxo ululante imaginar seu envolvimento em um ato ilícito do qual solicitou a apuração. Cumpre registrar, ainda, que, em face de tais assuntos e para tratar de soluções na construção de um potencial Termo de Ajustamento de Conduta, a assessoria da Presidência da FUNAI efetuou reunião com a Procuradoria da República em Barra do Garças/MT, em 13/11/2021, ou seja, em aproximadamente 04 meses antes da deflagração da operação policial.

Ademais não é possível subsistir a falácia de que houve apoio ou amparo, pelo Presidente da FUNAI, ao servidor preso por suspeita de arrendar terras indígenas se a própria prisão do servidor ocorreu um mês depois da ligação telefônica gravada pela PF.

Levianas, portanto, as informações divulgadas que acabam chegando ao expectador de forma deturpada, o que, para um leigo, é aceito como a verdade absoluta. 

Repisa-se, ainda, que o apoio oferecido pelo Presidente da FUNAI ao então Coordenador Regional foi tão somente no âmbito administrativo, pois envolvia o envio de documentos à Polícia Federal, que, se utilizado da autoridade policial, requisitou informalmente os documentos, inclusive em prazo exíguo, sob pena de crime de desobediência. Era apenas essa a narrativa que o Presidente da FUNAI tinha conhecimento e foi sobre essa narrativa que o Presidente buscou a tomada de providências administrativas para, então, resguardar a FUNAI e os documentos oficiais e sigilosos no âmbito da FUNAI.

Pelo que se depreende, o ato ilícito foi localizado e realizado no âmbito da Coordenação Regional de Ribeirão Cascalheira/MT. É necessário esclarecer que o Presidente da FUNAI nunca questionou nenhuma investigação instaurada em desfavor do acusado, Jussielson Gonçalves Silva, bem como não mantém nenhum relacionamento e desconhece as pessoas de Enoque Bento de Souza, Gerard Maximiliano Rodrigues de Souza e Thaiana Ribeiro Viana, até porque não era de seu prévio conhecimento a existência de investigação envolvendo a apuração de alguma ilicitude praticada pelo respectivo servidor. A Coordenação Regional de Ribeirão Cascalheira/MT é Unidade Gestora, órgão descentralizado, com autonomia para firmar contratos, realizar licitações e propor indicações para as nomeações, conforme Regimento Interno da FUNAI (Portaria 666/MJSP/FUNAI/2017 e Decreto 9.010/2017), pelo que não mantemos nenhum relacionamento e desconhecemos as pessoas de Thaiana Ribeiro Viana, Gerard Maxmiliano Rodrigues de Souza e Enoque Bento de Souza.

Marcelo Xavier, portanto, não tinha ciência da Operação Res Capta, tampouco da condição de investigado de Jussielson. O Presidente da FUNAI, exatamente por ser da carreira da Polícia Federal, tem a plena ciência de que quaisquer requerimentos entre instituições, inclusive autoridade policial, deve tramitar através dos sistemas oficiais, em observância aos princípios da Administração Pública. 

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