“Em 2022, a responsabilidade da gente é dizer que país a gente quer. De falar sobre a cultura, a educação, a política industrial que nós queremos ver. Tá na hora de assumirmos a responsabilidade de mapear o país que queremos, porque se nós nos omitirmos e dizermos que não gostamos de política, o Brasil que vai ressurgir do processo eleitoral pode ser pior do que o Brasil que reclamamos que hoje existe.”
Candidato Lula em evento realizado na universidade paulista.
Por Camilla Almeida
O primeiro dia de volta às aulas na Universidade de São Paulo (USP) contou com uma aula aberta na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) com a participação do candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Além da presença do presidente Lula, o candidato a governador de São Paulo Fernando Haddad (PT), lideranças políticas e professores da universidade também compareceram e participaram do evento.
O corpo estudantil compareceu em peso à aula, que teve um público estimado de 10 mil pessoas. Antes de começar, filas extensas de quase um quilômetro se formaram na Avenida Professor Luciano Gualberto, que dá acesso ao vão da História e Geografia da FFLCH, onde o evento ocorreu. Muitos estudantes e espectadores acompanharam as falas dos palestrantes por meio das redes sociais do candidato Lula, com um público simultâneo de quase 6 mil pessoas. A participação estudantil não se restringiu apenas à plateia: Flávia Calé, diretora da UNE e doutoranda da USP, também discursou a favor da universidade pública.
A aula abordou diversas temáticas, como o direito dos povos indígenas, desigualdade social e reforma urbana. A Carta pela Democracia da Universidade de Direito da USP também foi citada durante o evento, sendo utilizada como exemplo de como a universidade pública é fundamental na luta pela defesa da democracia e para as conquistas sociais. A pesquisa acadêmica e produções científicas universitárias também foram exaltadas pelos palestrantes.
LULA NA USP
Lula iniciou sua fala homenageando as universidades públicas brasileiras e falando diretamente aos universitários sobre o futuro do país. O ex-presidente incentivou a participação política dos jovens nas eleições de 2022 e na construção de um Brasil que tenha uma forte consciência social. Ele também fez críticas a atual gestão Bolsonaro – embora sem citar nomes – destacando dados como o do desemprego, economia e da fome.
“Não é possível que o país que seja o terceiro maior produtor de alimento do mundo, que seja o primeiro produtor de proteína animal do mundo tenha pessoas dormindo sem ter um bocado de comida. Não é possível que isso não mexa conosco.”
Presidente Lula
O candidato retomou feitos de seus antigos mandatos, como o programa de expansão das universidades federais realizado em parceria com o então Ministro da Educação Fernando Haddad (PT), que dobrou a oferta de vagas nas instituições públicas. Eram 109,2 mil em 2003 e chegaram a 222,4 mil em 2010. Lula também citou a dissolução do Ministério da Cultura e saiu em defesa de sua reconstituição, além do estabelecimento de centros culturais em todas as capitais brasileiras. “A cultura tem que ser nacionalizada para que o Brasil não viva apenas a cultura do eixo Rio-São Paulo. É preciso diversificar!”, disse o presidente.
Esta é a primeira vez que o candidato à presidência vem à USP desde o ano de 1995, que foi marcado pela morte de Florestan Fernandes, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT). Florestan, que recebeu o título de professor emérito da USP, exerceu dois mandatos como deputado federal e ficou conhecido como um dos principais sociólogos brasileiros do século XX. Seu velório aconteceu no Salão Nobre da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e contou com múltiplas lideranças do partido e intelectuais da época, incluindo Lula. No evento, foi feita uma homenagem a docentes que lutaram contra a opressão e batalharam pela universidade pública, na qual Florestan foi citado.
AULA A CÉU ABERTO
Marilena Chauí, professora titular da Faculdade de Filosofia e uma das fundadoras do Partido dos Trabalhadores (PT), reforçou os números de mortos pela Covid-19 no Brasil e o aumento no índice da fome entre o povo brasileiro. Utilizando de reflexões filosóficas, Chauí criticou o atual governo e pediu por uma reforma no judiciário, além de invocar a participação popular e estudantil nas decisões políticas do país nestas eleições.
“Nós vivemos na crueldade e no cinismo. Mas não vivemos só nisso. Vivemos também na necessidade de recuperar a república, de reinstitucionalizar a república. De refazer todo o campo dos direitos sociais. É preciso que haja uma reinstitucionalização que recupere a independência do judiciário, que desde a Lava Jato se tornou uma tarefa de luta para nós.”
Marilena Chauí
A professora geóloga e Diretora de Gênero, Relações Étnico-Raciais e Diversidades da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento da USP, Adriana Alves, discursou sobre os empecilhos sociais a serem enfrentados na busca pela plena democracia no Brasil. Adriana falou sobre a marginalização do povo preto e periférico e destacou a luta persistente do movimento negro no alcance de direitos básicos. A demora no estabelecimento da política de cotas e a falta de representatividade no judiciário e legislativo foram utilizados como exemplos pela professora para escancarar a perpetuação do racismo na sociedade brasileira.
“Seguimos lutando. Lutamos pelo direito ao voto, a propriedade. Comparo a adoção tardia de aderir a cotas na universidade a tardança de abolir a escravidão no Brasil. Por favor, não nos peçam mais para silenciar, não nos peçam mais para termos paciência, pra nós é tudo urgente.”
Adriana Alves