Bagunça na economia azeda humor do mercado com Bolsonaro e coloca Guedes na berlinda

Por Renê Gardim

Estamos no precipício (e não na beirada dele) agarrado a um ramo que, provavelmente, não aguentará nosso peso. Essa é a melhor tradução do momento da economia brasileira.

Caminhamos para o desastre. As decisões e recuos do (des)governo sacudiram os mercados e conseguiram acender o sinal de alerta geral. O Bolsa Família, que ganha o nome de Auxílio Brasil para confundir quem precisa de socorro financeiro no país e passa fome, não terá lastro além das eleições de 2022. Isso se Paulo Guedes, que está com a cabeça a prêmio, conseguir os recursos necessários para os R$ 400 prometidos por Bolsonaro.

Faz sentido que milhões de brasileiros em condição de vulnerabilidade sejam atendidos neste momento. Furar o teto de gastos (que limita o crescimento da maior parte das despesas públicas à inflação registrada em
12 meses até junho do ano anterior) faz mais sentido ainda se for para socorrer aqueles que são atendidos pelo Bolsa Família com valores superiores aos atuais.

Mas o mercado, em especial os bancos, financeiras e as empresas de investimento, não gostou nem um pouco da guinada que o ministro da Economia, Paulo Guedes, guardião da austeridade fiscal rígida, deu na última semana, defendendo enfaticamente o furo do teto dos gastos e apoiando as medidas eleitoreiras do presidente da República.

Primeiro, que esse tal teto de gastos é uma aberração gestada e parida no governo golpista de Michel Temer e que tem como pai o economista Marcos Mendes, padrasto do ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Ele nada mais é do que uma “lei de responsabilidade fiscal” para o governo federal. Na realidade, o que o Brasil precisa, e com urgência, é de uma lei de responsabilidade social. Mas falaremos disso em outro artigo.

Todo esse imbróglio acontece, não por acaso, pouco tempo depois de o Pandora Papers denunciar a presença de milhões de dólares do ministro Guedes em um paraíso fiscal. Apesar de todas as tentativas de aparentar normalidade, a situação escancarou a grande fragilidade de Guedes e o Centrão, juntamente com todo o populismo eleitoreiro de Bolsonaro, aproveitou. Foi a partir daí que surgiu a nova possibilidade de se acabar com o Bolsa Família e criar o Auxílio Brasil.

É bom lembrar que o Bolsa Família é um programa de distribuição de renda permanente, premiado internacionalmente, que é estruturado e consta, há muito tempo, do Orçamento da União. Criado em 2003, e não às vésperas de uma eleição, é considerado o maior e mais eficiente programa de distribuição de renda do mundo. Já o  Auxílio Brasil tem prazo de validade. Deve durar até dezembro do próximo ano, ou seja, logo após as eleições presidenciais.

​Não estou contestando a importância de programas sociais que auxiliem os mais pobres. Ao contrário. Eles são fundamentais num país tão desigual como o nosso.
Mas existe outro problema.

O rombo no teto de gastos previstos no pedido enviado ao Congresso Nacional é de algo em torno de R$ 94,1 bilhões. Um volume que dificilmente será suficiente para pagar tudo o que está previsto. E a conta é simples: o Auxílio Brasil vai custar R$ 46,7 bilhões além do que estava previsto para o Bolsa Família para pagar R$ 400 por mês a 17 milhões de pessoas.

Tem ainda um custo extra de R$ 20 bilhões do aumento de despesa não previstas no projeto de Orçamento para 2022, enviado pelo governo ao Congresso, devido a uma inflação maior do que estimada, elevando os gastos com benefícios atrelados ao valor do salário mínimo, como os da Previdência Social.

E teremos novidades ainda. Lembrem-se do auxílio-caminhoneiro prometido por Bolsonaro, o vale-gás, já aprovado no Senado, e a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos.  Um gasto extra que deve chegar a R$ 15 bilhões.

Esses valores somam, arredondando, R$ 82 bilhões. Mas esses R$ 12 bilhões que “sobram, não serão capazes de saciar a sede dos partidos fisiologistas do Centrão, que querem turbinar o valor das emendas parlamentares em ano eleitoral”. Aquele dinheiro usado para amarrar prefeitos e vereadores à campanha de reeleição desses parlamentares. Então, o governo terá que arrumar mais dinheiro.

Esse conjunto de fatos azedou os ânimos do mercado. Até mesmo a Rede Globo, que sempre teve um grande apreço por Guedes, tem feito duras críticas às suas atuações recentes. Chegou a divulgar que dois interlocutores do presidente (não citaram quem seriam) estiveram recentemente em São Paulo sondando um nome para substituir o chefe da equipe econômica.  Portanto, vem novidades por aí, sim. E não são boas.

(*)Renê Gardim é jornalista há 36 anos. Atuou na “Folha de Londrina”, “Jornal de Londrina” e RBS. Foi editor de economia e agronegócio no DCI.

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