Diário do Bolso: Não aguento mais a Mangueira

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José Roberto Torero*

Ah, Diário, no ano passado a Mangueira já tinha me enchido o saco, mas esse ano foi pior. Até o título do samba-enredo foi pra me provocar: “A verdade vos fará livre” é meu slogan de campanha, pô! Eles deviam me pagar roialte para usar.

 

E eles nem disfarçaram. Disseram na cara dura: “Não tem futuro sem partilha, nem messias de arma na mão”. Messias de arma na mão sou eu, pô! Entendi a indireta. Quer dizer, a direta. Já “futuro sem partilha” eu não tenho certeza, mas deve ser o Guedes.

 

O pior é que não foi só a Mangueira que quis me provocar:

 

  • a Viradouro falou de mulheres (não aguento mais esse mimimi de mulher, tanto que nem trouxe a Michelle aqui pro Guarujá),

 

  • a Estácio de Sá criticou o garimpo (ainda bem que não falou do nióbio, que aí eu ficava com mais raiva ainda).

 

  • a Portela falou de índio (blargh!),

 

  • a Grande Rio contou a história de um cara que era pai de santo e homossexual (pô, tem que proibir esses tipo de personagem, por que não falou do Duque de Caxias?),

 

  • e a União da Ilha foi a pior de todas, porque falou de pobre, de favela, colocou os ricos em privadas gigantes e botou até um ônibus de verdade na passarela (desfile bom é aquele que fala de rei, rainha e riqueza, talkei?).

 

Olha Diário, essa madrugada foi insuportável. Vi o desfile todo pela televisão, do lado do Hélio Negão. Nós dois ficamos xingando todo mundo. Eu disse que os foliões eram esquerdopassistas e ele disse que ia fundar o movimento “Escola de samba sem partido”.

 

Então eu tive que ir no banheiro dar uma goldenshowerzada, que eu tinha tomado umas cervejas. Mas aí, na volta, que decepção… Peguei o Hélio Negão dançando na sala e cantando:

“Mangueira, samba que o samba é uma reza,

se alguém por acaso te despreza,

teme a força que ele tem.

Mangueira, vão te inventar mil pecados,

mas eu estou do seu lado

e do lado do samba também.”

 

Ah, Diário, que tristeza que eu senti quando vi aquilo. A traição vem de todo lado e de todo mundo. Até do Negão…

Chega logo, quarta-feira de cinzas.

 

@diariodobolso

*José Roberto Torero é autor de livros, como “O Chalaça”, vencedor do Prêmio Jabuti de 1995. Além disso, escreveu roteiros para cinema e tevê, como em Retrato Falado para Rede Globo do Brasil. Também foi colunista de Esportes da Folha de S. Paulo entre 1998 e 2012.

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