O empresário Fifo Anspach e a elite branca paulista

Quem é o empresário Fifo Anspach, dono da Auto Miami (uma das maiores concessionárias de carros de luxo da Av. Europa em São Paulo) que mantém um Instagram aberto e público RECHEADO de postagens misóginas, racistas e lgbt+fóbicas e que grande parte da elite branca paulista segue e interage em suas publicações.

Quem é Fifo Anspach?

Dia 28 de março de 2022 uma amiga me manda o perfil um homem cuja postagem (do dia 8 de março) dizia: “Aqui todo dia as mulheres são homenageadas, Feliz Dia da Mulher X-Vídeos”. Nesta postagem misógina percebo que foi curtida pelo ex-piloto de Fórmula-1 e ex-apresentador do programa Auto Esporte da TV Globo Tarso Marques. Toda essa situação me chama atenção e começo a investigar seu conteúdo.

Imagens disponíveis nas redes sociais de Fifo Anspach

Fico completamente em choque e começo, incrédulo, a analisar tudo que estava à minha frente. Me deparo com dezenas, centenas de postagens criminosas. O conteúdo publicado é majoritariamente misógino, mas existe também conteúdo de cunho racista e lgbtfóbicos (sobretudo transfóbicas). Também existem postagens capacitistas e gordofóbicas. Uso verbo no presente porque até o momento desta reportagem TUDO que apresentarmos aqui continua aberto e público.

Descubro que se trata de SILVIO ROBERTO ANSPACH JUNIOR, proprietário da Auto Miami Prime Cars, uma concessionária de carros blindados de luxo que tem sede na Avenida Europa, veia aorta do Jardim Europa, berço da elite branca paulistana e coração do poder brasileiro. Fifo constantemente utiliza as redes do perfil pessoal para convidar pessoas para ações da marca e vender carros de alto luxo em anúncios do storys. 

Imagens disponíveis nas redes sociais de Fifo Anspach

Entro em contato com o autor da postagem por mensagem direta. Pergunto se acha bonito aqueles posts e ele me reponde: “…Eu posto coisas que acho engraçadas. Sacaneio tudo, inclusive a mim mesmo. As pessoas que me sequem gostam e se divertem. (Me falam isso CONSTANTEMENTE, por aqui e pessoalmente)…” “O mundo está muito chato. Piada é bom! Rir é bom!…” Pergunto: Você sabe que misoginia na internet é crime? Ele me manda um áudio: “Eu não sou misógino, eu sou casado e tenho uma filha e uma mãe…” Quero saber qual é o teu objetivo. Digo que se ele não apagar os posts eu iria abrir uma denúncia no Ministério Público e envio a Lei 13642/18. Ele me bloqueia.

Investigação do conteúdo

No processo da investigação das postagens descubro que o perfil dele já foi excluído e a Justiça foi acionada para o retorno – com multa diária. O autor afirmava que não iria alterar o teor das postagens ainda solicitando aos seguidores a divulgação do perfil, alegando censura e aparelhamento do Partido dos Trabalhadores nas redes sociais:

“Acionamos judicialmente, e inexplicavelmente, mesmo após ordem judicial que os obrigava a restaurar a conta, seguem ignorando, apesar da multa diária estabelecida pelo juiz de 1° instância. Não mudarei o que posto, até porque entendo que sequir (sic) ou não é opcional. Peço a quem puder divulgar, que me ajude a reconquistar os sequidores (sic) perdidos. Tks!”

Imagens disponíveis nas redes sociais de Fifo Anspach

O lazer da classe dominante branca, acrítica e paulistana.

Ao passo que analisava todo o conteúdo, fico espantando com a interação da pessoas públicas e de notoriedade nacional naquele tipo de conteúdo. Incrédulo percebo que a conta contém quase 300 contas verificadas seguindo. Dentre dos seguidores temos as seguintes personalidades:

Felipe Massa – piloto F1; Roberto Justos – executivo / apresentador; Alvaro Garnero – empresário; Donata Meireles – Editora Forbes; Flávio Rocha – Ex CEO da Riachuelo; Bruno Astuto – CCO JHSF; Cesar Filho – Apresentador; Nativoza – Influenciadora; Lala Rudge – Influenciadora; Joao Pedro – Executivo HotMart; Gianfranco – Fundador da Azul; Pedro Bartelle – CEO da Vulcabras; Antonio Camarotti – CEO Forbes; Rubens Barricello – piloto F1; Rafael Furlanetti – Socio da XP; Adib Abdouni – Criminalista; Carol Magalhaes – Influenciadora; Fernanda Maques – Arquiteta; Mafe Saad – Advogada; Rodrigo Lasmar – Medico da S. Brasileira de futebol; Camila Klein – Arquiteta; Ana Paula Siebert Justus – Influenciadora; Lydia Sayer – Joalheira; Paloma Tocci – Jornalista; Benjamim Back – Apresentador; Leo Rizzo – Empresario; Fernanda Motta – Modelo; Alex Hanazaki – Arquiteto; Daniela Filomeno – Jornalista CNN; Fabio Arruda – Influencer; Tiago Reis – empresario; Luciana Gimenez – Apresentadora; Sandra Chayo – Sócia do Grupo Hope; Monica Salgado – Jornalista; Fabiana Scaranzi – Jornalista; Moisés Lima – Atleta; Carol Paiffer – Shark Thank Brasil; Sérgio Vieira – Advogado e Conselheiro OAB; Marcio Garcia – Apresentador; Mauricio – Atleta; Stefan Schattan – Executivo Ornare.

Conteúdo misógino

O mais grave das publicações é o conteúdo misógino. São publicações bastante semelhantes aos resultados da pesquisa de Valeska Zanello – A Casa dos Homens. Postagens incluem conteúdo de tom “irônico” com o feminicídio cometido pelo atleta Bruno Fernandes (aqui) e foram curtidos pela jornalista Paloma Torci e o executivo Tallis Gomes, que é membro Conselheiro da Hope e da Espaço Laser, duas empresas com foco no público feminino. Em um outra postagem do mesmo assunto, Luciana Gimenez também curtiu. O fundador da companhia aérea Azul, Gianfranco, curtiu um publicação que claramente sexualiza uma criança, veja (aqui). O depreciamento do feminino é constante e perpassa quase todas as publicações da rede.

Imagens disponíveis nas redes sociais de Fifo Anspach
Imagens disponíveis nas redes sociais de Fifo Anspach

Conteúdo racista

Fifo Anspach refez a foto problemática que causou a saída de Donata Meirelles da editoria da Vogue. Essa imagem é o exato retrato da classe dominante brasileira: ela representa a exploração das pessoas negras na construção do país. O seu público ovaciona a foto que carrega a história do Brasil em uma simples imagem. Seguidores dizem “Parabéns por colocar o politicamente correto no lixo”; “AMEI”, “FUDIDAO”, “ARRASOU” diz Lydia Sayeg, empresária do ramo de joalheria. Esta postagem, assim como as demais neste artigo, estavam disponíveis e abertas ao público até a publicação desta matéria. Esta postagem que recria a imagem do Sinhô de engenho pode ser conferida neste link.

Imagens disponíveis nas redes sociais de Fifo Anspach

Relacionar pessoas negras ao crime, ao adultério, a sexualização dos seus corpos como nestas postagens seguintes é contribuir para a estrutura violenta do país que mais extermina jovens negros no mundo, de acordo com a Anistia Internacional. Aqui no Jornalistas Livres temos uma matéria sobre este assunto, clique aqui para ler. O racismo recreativo deste conteúdo também é crime previsto por lei no Brasil. As mesmas pessoas que gozam da impunidade são as pessoas que se divertem com o escrutínio alheio de pessoas negras.

Imagens disponíveis nas redes sociais de Fifo Anspach

Conteúdo Lgbtfóbico

O conteúdo Lgbtfóbico das postagens é basicamente transfóbico. Existem várias outras publicações que atacam personalidades progressistas, assim como também existem publicações depreciando a homossexualidade. Mas o que chama atenção nestas postagens são as curtidas das personalidades. Adib Abdouni, um advogado criminalista, gostou desta postagem transfóbica que expõe o orgão genital de uma mulher tansgênero, provavelmente fruto de uma montagem, com a hastag #ébola (veja aqui).

Já Antonio Camarotti, CEO da Forbes Brasil gostou de um postagem que faz chacota com a genitália de uma mulher trans em resposta a um assédio. Uma situação infelizmente muito constante às mulheres, sobretudo as mulheres trans no país que mais assassina pessoas trans em todo o planeta. Esta postagem pode ser conferida neste link.

Faz 500 anos

Faz 500 anos que a nossa classe dominante (que é branca cis e hétero) se comporta desta maneira. Esta é a razão por termos uma das “elites” que geram menos valor no mundo, como pode ser visto neste artigo da revista Exame: “Elite brasileira está entre as que menos geram valor no mundo“. Noam Chomsky, um pensador e ativista norte-americano, em entrevista ao portal TV 247 disse que raramente tinha visto um país onde a elite tivesse tanto desprezo pelos pobres e estas postagens são evidencias deste contexto. Jamais seremos um país do futuro enquanto a classe dominante estiver exercendo o gozo dentro das mazelas sociais que esta mesma classe produz.

Ao passo que os movimentos sociais lutam por emanciapação a elite brinca com a vulnerabilidade. Se isso acontece publicamente, imagina o que aconteceria em um grupo de WhatsApp?

Ministério Público

No dia 2 de abril de 2022, abri uma denúncia no Ministério Público Federal que logo em seguida se encaminha para o Ministério Público de São Paulo.  O Ministério Público de São Paulo arquivou a solicitação justificando “ausência de materialidade” e que “Não se verifica das provas trazidas aos autos induzimento ou incitação à discriminação em relação a qualquer raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”

Brasil, 2023

Antonio Isuperio é arquiteto brasileiro, negro, lgbt+ que mora em New York. Ativista de direitos humanos por quase 15 anos, é filho de empregada doméstica e graduado em Arquitetura pela Universidade Estadual de Goiás, com MBA em varejo pela FGV-SP. É especialista em Design de Varejo e pesquisa e tendências de futuro e membro do Núcleo Negro do Jornalistas Livres

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https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2021/08/por-que-ainda-preferimos-ser-racistas-que-capitalistas.shtml

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