Apesar de ter seu programa político derrotado nas urnas eleitorais, Jair Bolsonaro segue tentando implodir definitivamente a educação no país e para esse fim nomeou nove integrantes para o Conselho Nacional de Educação (CNE), faltando menos de dois meses do término do seu governo.
As escolhas foram oficializadas no Diário Oficial da União desta terça-feira 8. Os novos indicados terão mandato de quatro anos e são nomes ligados à extrema-direita e sua ideologia, a rede privada de ensino e aliados políticos do presidente, sendo três nomes para a Câmara de Educação Básica e seis indicações para a Câmara de Educação Superior. O conselho tem um papel relevante na avaliação e formulação de diretrizes da educação. Durante a pandemia, elaborou pareceres orientando as redes a como adaptar o calendário escolar. Além disso, teve protagonismo em todas as discussões recentes sobre mudanças curriculares.
Nepotismo, ideologia de extrema-direita, empresários, preso por crime entre os nomeados
Entre as indicações está Elizabeth Regina Nunes Guedes, irmã do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Indicada para conselho é um órgão de assessoramento do Ministério da Educação (MEC) e entre as suas atribuições está a aprovação de novos cursos de ensino superior.
Elizabeth Guedes é empresária e presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares, atua em favor dos interesses do ensino superior privado. Ela representa na Anup a Fameg (Faculdade de Medicina de Garanhuns), instituição que integra a Afya, gigante do setor de cursos de medicina, idealizada por Paulo Guedes antes de assumir o cargo no governo Bolsonaro.
Além da irmã de Paulo Guedes, para a Câmara de Educação Superior foram indicados os seguintes nomes: Mauro Luiz Rabelo, atual secretário de Educação Básica do MEC e que foi preso pela Polícia do Distrito Federal em 2005 sob a acusação de envolvimento na máfia dos concursos, fornecendo gabaritos de provas a quadrilhas que fraudavam exames. Henrique Sartori, que foi secretário-executivo do MEC no governo Temer; Paulo Fossatti, reitor da Universidade La Salle, de Canoas (RS); Luciane Bisognin Ceretta, reitora da Universidade do Extremo Sul Catarinense; e o jurista André Guilherme Lemos Jorge.
Viés ideológico de extrema-direita e ligações com escândalos de corrupção
Para a Câmara de Educação Básica foram escolhidas Leila Soares de Souza Perussolo, Márcia Teixeira Sebastiani e Ilona Maria Lustosa Becskehazy Ferrão de Souza que trabalhou como secretária de Educação Básica do Ministério da Educação na gestão de Abraham Weintraub e tinha apoio da ala ideológica da pasta. Ela foi exonerada em agosto do mesmo ano, quando Milton Ribeiro assumiu como ministro. Ilona Becskehazy e Márcia Teixeira Sebastiani foram indicadas pelo deputado reeleito Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente.
Ambos trabalham com o secretário de Alfabetização, Carlos Nadalim , da ala ideológica do governo que se mantém no cargo desde o início do governo Bolsonaro
O chefe da pasta criada por Bolsonaro critica pensadores reconhecidos internacionalmente, como Paulo Freire .
O terceiro nome indicado por Bolsonaro é o de Leila Soares de Souza Perussolo, cunhada do governador reeleito de Roraima Antônio Denarium (PP), aliado do atual presidente.
Em maio deste ano, Leila Perussolo, cunhada do governador Antonio Denarium (PP), foi exonerada do cargo de titular da Secretaria de Estado da Educação e Desporto (Seed),após ser denunciada no Ministério Público Federal (MPF) e na Polícia Federal (PF) por irregularidades em processo licitatório de quase R$ 9 milhões.
Especialistas rejeitados por não se alinharem com a extrema-direita bolsonarista
Apesar de contarem com mais indicações de apoio, a educadora Maria Helena Guimarães, ex-secretária-executiva do MEC, e Mozart Ramos, que já foi secretário de Educação de Pernambuco, não foram reconduzidos ao conselho apesar de contarem com os maiores números de apoio de indicações. Maria Helena recebeu 28 indicações e Mozart, 21. A superioridade numérica de indicações dos especialistas de educação foi negligenciada para favorecer nomes ligados à ala ideológica “olavista” da extrema-direita na tentativa de aparelhar o CNE.
O Conselho Nacional de Educação e sua atuação
O CNE é considerado o órgão normativo e de coordenação superior do Sistema Nacional de Educação, dispondo de autonomia administrativa e financeira para se articular com o poder legislativo e o executivo, com a comunidade educacional e a sociedade civil organizada. O órgão coordena a política nacional de educação, articulando-a com as políticas públicas de outras áreas.
Também cabe ao CNE garantir a execução das diretrizes, prioridades e metas do Plano Nacional de Educação, interpretar a legislação de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, opinar sobre alterações de iniciativa do poder executivo e estabelecer normas para os sistemas de ensino, articulando-os com os órgãos normativos dos sistemas de educação e com as comissões de educação do Congresso Nacional. Deve, ainda, estimular a integração entre as redes de educação federal, estaduais e municipais, públicas e privadas.
Nos últimos anos o CNE foi responsável, por exemplo, por diretrizes sobre a educação de jovens e adultos e sobre o ensino em diferentes níveis em meio à pandemia da Covid-19.
O CNE também atuou na elaboração da Base Nacional Curricular Comum e da reforma do Ensino Médio, em gestões anteriores.
Críticas e possibilidade de revogação
O senador Jorge Kajuru (Podemos-GO) criticou, em pronunciamento nesta quarta-feira (09) as nomeações.
O deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR) apresentou projeto para derrubar o decreto que nomeou nove integrantes no Conselho Nacional de Educação. O parlamentar denuncia nepotismo e falta do requisito falta do requisito de reputação totalmente ilibada.
Precedente
Michel Temer (MDB) revogou as nomeações de conselheiros do CNE quando assumiu a presidência em 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT). Portanto, existe precedente para a revogação das nomeações, desde que exista justificativa para o ato.
Ainda não se sabe como o governo Lula (PT), que assumirá em janeiro do próximo ano, deverá agir diante do aparelhamento do CNE. Durante as discussões da área da Educação coordenadas pelo ex-ministro Henrique Paim, no campo da transição presidencial , o tema repercutiu negativamente, considerando o histórico dos nomeados. Também presente ao evento, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad demonstrou preocupação com as nomeações.