Por José Roberto Torero
Diário, tem uma coisa que me incomoda mais que o meu intestino presidiário.
É o dedodurismo.
Pô, não tem nada que ficar dedurando os outros. Já não basta o tal do exame de próstata?!
No Brasil, o dedodurismo se espalha mais rápido que a covid.
Pra começar, olha os irmãos Miranda. Eles tinham que contar que tinham me contado da corrupção na compra da Covaxin? Claro que não. Deixa quieto!
Depois tem o tal de Dominghetti. Ele até parecia que ia ajudar, mas acabou incriminando meia dúzia de coronéis.
E esse vídeo do Pazuello apertando mão dos caras que iam vender a Coronavac pelo triplo do preço? Precisava espalhar? Vídeo de reunião secreta e pum em elevador a gente não solta.
Mas não é só comigo que praticam o dedodurismo. A viúva do Adriano também abriu o bico e dedurou que quem mandou matar a Marielle foi a milícia que controla a comunidade Gardênia Azul. Pô, se ela for falar tudo o que sabe do Adriano, cara que o Flavinho homenageou e que eu defendi em discurso na Câmara, isso aí vai dar problema.
Outro exemplo: a mulher do DJ Ivis precisava dedurar o cara com aquele vídeo? Pô, em briga de marido e mulher, ninguém mete a câmera! Aliás, gosto muito daquela música dele chamada “Esquema preferido”.
Tem até dedo-duro eletrônico, que é o placar de votação. A Carla Zambelli fez um discurso ótimo contra o aumento do fundo eleitoral, dizendo que aquilo era “inaceitável” e que a população “não merecia esse escárnio”. Mas aí mostraram que ela votou a favor do treco. Dedodurismo digital!
E isso sem falar nos dedoduristas históricos, como o Paulo Marinho, que contou que o Flavinho sabia da investigação da rachadinha; como o Moro, que contou que eu queria interferir na PF; e como a Joice Helmanns, que contou que eu falei, uma semana antes do negócio com o Adélio, que se eu levasse uma facada ganhava a eleição.
Diário, o dedodurismo é um mal que se espalha pelo Brasil de Nordeste a Sudeste (não é de Norte a Sul porque essas regiões aí ainda estão comigo, talkei?).
Pra encerrar bonito a página de hoje, vou colocar aqui um versículo que está na minha bíblia (porque eu escrevi ele a mão, no cantinho): “Se não conhecereis a verdade, ela não me incomodará”.
José Roberto Torero é autor de livros, como “O Chalaça”, vencedor do Prêmio Jabuti de 1995. Além disso, escreveu roteiros para cinema e tevê, como em Retrato Falado para Rede Globo do Brasil. Também foi colunista de Esportes da Folha de S. Paulo entre 1998 e 2012.
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