Por Paulo Brondi, Promotor de Justiça do Estado de Goiás, exclusivo para Jornalistas Livres
E os jornalões anunciaram, com fanfarras e manchete triunfal, a morte do “serial killer do DF”. Estava encerrada a caçada a Lázaro Barbosa.
Os policiais que dela participaram explodiram em ovação. O governador goiano saudou a Polícia Militar, “a mais preparada do país”, pelo gran finale ao cabo de quase três semanas de cerco.
As gentes aplaudiram.
Aquele que cancelou 500.000 CPF´s zombou e ironizou. É, já se disse mesmo que a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude.
Lázaro tombou crivado de balas, algumas dezenas. Ao que consta, após troca de tiros, na qual o péssimo atirador errou todos os disparos. A PM de Goiás, sempre tão eficaz no socorro a corpos, enfiou-o numa ambulância, mas ele, contrariando todas as expectativas, chegou já sem vida ao hospital.
O Caso Lázaro é daqueles emblemáticos. Primeiro, porque de serial killer, segundo especialistas na matéria, não se tratava. Segundo porque evidenciou que nossas forças de segurança melhor sabem algemar preto e pobre com gramas de maconha do que localizar, capturar e prender um desequilibrado à solta.
Dizem que ele resistiu à prisão e ameaçou policiais; bom, quem provará o contrário?
Mais do que tudo, o Caso Lázaro indica que o bolsonarismo instituiu de vez a comemoração explícita e sem pudor da morte. O que antes se fazia às ocultas, agora se faz sem nem sequer corar. Descemos ao mais baixo nível da degradação humana.
Dizer que houve um confronto e que Lázaro foi ainda socorrido com vida é zombar da inteligência.
O aplauso ou a indiferença à morte é a legitimação da violência policial, que, cedo ou tarde, pode bater à porta de cada um e que se repete, silenciosa, no canto da periferia. “Aqueles que ainda pretendem encerrar-se em seu campo fechado, eriçados contra os outros, macerando em seu próprio fanatismo, condenam-se a si mesmos” (Voltaire).
Lázaro é morto. Cidadãos de bem celebram Brasil afora. Comemoram os machos masculinos que correriam léguas intermináveis se se deparassem com Lázaro em qualquer esquina.
Beba-se o sangue, coma-se a carne. Um novo e melhor tempo há de raiar. Foi-se o tinhoso por força e gatilho da tropa. Carcará, pega, mata e come.
Fez-se festa no lar da tradicional família sacra-cristã brasileira. Bíblia numa mão, rifle na outra.
Este agnóstico escriba, que não é íntimo do Livro Sagrado, se lembrou de uma específica e elucidativa passagem: “Então Jesus lhe respondeu: ‘Eu te asseguro hoje, estarás comigo no paraíso’” (Lucas 23:43).
Leia também: EDITORIAL JORNALISTAS LIVRES: MORTE DE LÁZARO FOI QUEIMA DE ARQUIVO, SIM!
4 respostas
Parabéns pelo artigo! Com direito à citação de La Rochefoucald.
Queria ler Clarice Lispector sobre essa morte…pensar que ela se “perplexizou” eescafundrou a alma da gente com os 13 tiros dados em Mineirinho nos anos 60….
Quem não leu leia a crônica dela à época…o nome é Mineirinho
“…Esses coágulos sociais dispersos, desorientados e massacrados, transformados em uma massa enfurecida, raivosa e intolerante. São esses os apoiadores de Bolsonaro”.
(L G Beluzzo, em Carta Capital 30/6/21, p. 49)
Retratou com perfeição obténs-te cenário. Parabéns