Por Kátia Passos e Lucas Martins
Segundo os organizadores, mais de 400 cidades aderiram aos atos nacionalmente, o que mostra uma incrível capacidade de união por sobrevivência. É uma mobilização impressionante em tempos tão difíceis de uma tragédia sanitária, causada pelo novo coronavírus, e de uma política de destruição do Estado que recolocou o Brasil no Mapa da Fome. Isso tudo é resultado das políticas autoritárias associadas ao comportamento veementemente vil, mal-caráter (e porque não dizer violento?) de Bolsonaro, principalmente quando o assunto é diferente do que pensam ele e os aliados que restam.
Em São Paulo, como em todas as partes do país, o ato foi, sem dúvida, uma enorme demonstração da força dos movimentos e organizações sociais, indígenas e partidos políticos. Mas também foram registrados casos de violência contra manifestantes e prisões. Enquanto parte da manifestação descia a Consolação, para a Praça Roosevelt, outro bloco se viu obrigado a parar no cruzamento com a Rua Matias Aires, porque o motorista de um carro de luxo não respeitou o verde do semáforo para os pedestres forçou a passagem e acabou atingindo um ciclista ali no local.
O fato fez com que os ânimos se esquentassem e uma barricada de madeiras e lixo foi incendiada, impedindo que outros veículos também cruzassem a avenida, pois a manifestação estava em pleno vigor, com parte das pessoas ainda vindo da Avenida Paulista em direção ao final do protesto.
A primeira detenção se deu pouco após a barricada. O jovem Lucas Xavier, de 19 anos, foi preso por policiais militares, na altura do 2100 da Rua da Consolação. E que antes disso, foi alvo de uma verdadeira e violenta caçada, realizada por policiais militares. Um grupo de policiais entrou na manifestação e arrastou o jovem, que tropeçou, caiu e bateu a cabeça na calçada e desmaiou imediatamente.
Um grupo de jornalistas se aproximou e foi violentamente agredido com spray de pimenta e cassetetes. Era um cenário de guerra, entre a ilha no meio da Avenida e a via da direita da Rua da Consolação. Num dos caminhões, uma mulher apelava, aos gritos no microfone, para que os policiais parassem de bater nas pessoas. (Assista aqui em 2min21 https://fb.watch/6xTW09Lsi6/)
Mas a violência não parou por aqui. Agredidos, fotógrafos e cinegrafistas independentes, tiveram que recuar, pois do outro lado da via, a menos de 20 metros, como é recomendado, um policial da Tropa de Choque apontava uma arma de balas de borracha em direção aos profissionais. E aqui, Lucas é arrastado pelo braço, por mais de 30 metros, perdendo um lado do par de tênis, e ralando as costas pelo asfalto. Na sequência, um grupo de policiais o cerca, mesmo caído no chão, impedindo que as pessoas que por ali passavam pudessem ver o jovem ou fazer qualquer tipo de contato, na esperança de saber se o garoto estava vivo. (Assista aqui: https://fb.watch/6xTW09Lsi6/ – 3min29 Lucas sendo arrastado e depois cercado no chão por policiais)
Questionamos um dos advogados da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Arnobio Rocha, sobre o estado de saúde do jovem:
“Ele apareceu ferido, bastante machucado, bateu com a cabeça no asfalto. Nós [CDH OAB] fizemos um acompanhamento do fato lá na rua, para garantir que ele teria assistência e a partir daí foi chamado o carro do resgate.”
Conversamos com testemunhas que confirmam a versão do advogado e as cenas que antecederam a caçada por Lucas. (Assista aqui: https://fb.watch/6xTW09Lsi6/ – 22min30 22min30)
Nos espantou também uma cena onde um policial do cordão que impossibilitava de ver Lucas, abriu uma bolsa ou mochila e parecia vasculhar à procura de alguma coisa. Logo depois, o jovem começou a se mexer. Nos aproximamos e aqui vimos um dos policiais pegar garrafas de vidro, madeiras e um martelo e colocar dentro de um saco branco. Questionamos o Coronel PM Prates, que acompanhava a cena, e fomos informados, como é possível ver em nossa transmissão ao vivo, que os objetos pertenciam ao jovem. O policial afirma categoricamente que o martelo e os outros objetos eram do rapaz, mesmo tendo sido pegos longe da bolsa que estava ao lado de Lucas. (Assista aqui: https://fb.watch/6xTW09Lsi6/ – 18mim58 – aparece o saco branco e policiais trazem objetos de outro lado e colocam no tal saco + entrevista com policial que afirma que os objetos são do garoto)
Contudo, depois do que parecia ser um grande arcabouço de acusações e provas contra o rapaz, soubemos já na manhã do domingo (4), que Lucas seria liberado. E isso aconteceu hoje, por volta das 18h30. O caso foi registrado no 78º DP da capital.
Mais adiante na entrada da estação Mackenzie do Metrô, administrada pela empresa privada ViaQuatro, outro jovem foi detido.
A estação tem duas entradas, uma na calçada que fica no sentido Paulista e outra no sentido centro. Alguns manifestantes entraram em confronto com os seguranças privados da ViaQuatro, que estavam postados no acesso sentido centro. O efetivo que estava do outro lado atravessou a rua. Nesse momento o confronto se intensifica e os seguranças agridem também os jornalistas. O fotojornalista Jardiel Carvalho, do UOL e Folha de SP, foi atingido por uma pedra jogada por um dos guardas contra os manifestantes e Karina Iliescu, fotógrafa free-lancer, teve a câmera destruída por um golpe de cassetete.
Enquanto os guardas retrocediam para o acesso ainda aberto, do outro lado da via, um grupo avançava. Um dos seguranças cai no chão, mas todo esse contingente, de cerca de quinze homens, consegue chegar até a entrada da estação, fechando o acesso, sobre pedras e garrafas lançadas por manifestantes. Em seguida, a Polícia Militar aparece no cenário e detém outro jovem, Matheus Machado, que até o final desta reportagem estava no 77° DP sob acusação de lesão corporal e furto de um capacete dos seguranças (Assista aqui: https://www.instagram.com/p/CQ4pt93nmjW/?utm_medium=copy_link).
De acordo com o advogado Hugo Albuquerque:
“Alegar situações e prender é possível. Mas os fatos têm que ser enfrentados ao longo do inquérito e do processo e para prová-los precisarão apresentar as imagens de câmeras e novas testemunhas. Por mais que atualmente saibamos que policiais são apresentados como testemunhas e, muitas vezes, as únicas, os depoimentos deles contra os dos réus merecem ser justamente confrontados. É um risco pelo qual todo acusado passa hoje no Brasil”.
Questionamentos importantes para os fatos e que precisam ser esclarecidos são:
- Porque os seguranças do Metrô estavam no meio da rua?
- Porque estavam num acesso fechado da estação?
- E mais, porque decidiram atravessar a via no meio da manifestação? Resultado de despreparo?
Um projeto de poder autoritário chamado Jair Messias Bolsonaro (compartilhado durante as eleições pelo governador no famigerado BolsoDória), tem nos colocado diante de um risco cada vez maior nas condutas policiais, como vimos ontem em São Paulo.
Quando um governante é o que é, no caso de um presidente que legitima as polícias que cometem ações absurdas como as relatadas aqui e provadas com imagens, fica muito difícil não associar que o fato de seres divergentes ao governo estarem nas ruas pressionando Arthur Lira a levantar de cima dos pedidos de impeachment. Sem dúvida, isso é uma verdadeira afronta ao Palácio do Planalto. Então, o uso da força se coloca como a solução para o não debate com quem não se coloca aliado a Bolsonaro. Vide a diferença de tratamento das polícias em manifestações de apoio ao presidente. Só em manifestações contrárias a Bolsonaro é que são produzidas as prisões políticas, frutos de uma polícia alinhada ideologicamente à extrema direita.
O fato é que os opressores criadores de prisões políticas num governo corrupto e em ruínas, que é o atual status de Bolsonaro, não aceitam os diferentes de modo inteligente. O que eles precisam entender é que de agora em diante os corpos das ruas não voltam mais para suas casas. Acabou a brincadeira e o povo brasileiro está definitivamente correndo atrás do prejuízo do genocídio, sem aceitar prisões políticas ou proibições. Nada será como antes e o lema dos tempos duros “é proibido proibir”, está mais vigoroso do que nunca.
2 respostas
Estes devem ser denunciados pelos organizadores da Passeata e questionarem o doriana. Não dá pra ficar no ufanismo da grandiosidade da Passeata, que foi excelente, sem denúncia pública, das violências ocorridas.
Polícia Miliciana de Doriana como toda polícia é assassina.
Todos devem ser denunciados! Os seguranças do Metrô a Polícia Federal por ser segurança privada e os PM’s a Corregedoria e a Justiça comum.