Ano encardido esse 2015, não foi? Bem, vamos ver como foi para Olegária, a empresária, para Adenor, o trabalhador, e para Glenda, do Ministério da Fazenda. Avaliar o modo como a economia se comportou no ano anterior, para os diferentes atores e setores, pode nos ajudar a entender o momento econômico presente e a criar cenários prováveis para o futuro.
Nossos personagens acabaram de saber que a economia brasileira encolheu 3,8% em 2015, ou seja, produzimos 3,8% menos bens e serviços do que em 2014. Olegária, a empresária, vendeu menos e engavetou seus projetos de crescimento: “investimento só para repor alguma coisa essencial quebrada”, determinou ela. Adenor, o trabalhador, manteve seu emprego, mas passou o ano angustiado de olho no aumento da taxa de desemprego. E Glenda, da Fazenda, viu entrar cada vez menos tributos no caixa do governo para tocar a máquina do governo e seus programas sociais e de investimento.
Todos os dias essas pessoas, e todos nós, tomamos decisões econômicas, de consumo ou de investimento. Glenda, da Fazenda, seu chefe e seus colegas têm mais um papel que é tomar decisões de política econômica e de investimento que também vão influenciar todo o processo.
As expectativas que temos do desenrolar da economia e as medições que vamos fazendo ao longo do ano vão influindo nas nossas decisões. O Produto Interno Bruto (PIB) é uma dessas medidas e, embora não seja a única, é uma das mais importantes.
O PIB, calculado no Brasil pelo IBGE, tenta estimar a soma de tudo o que é produzido no país durante um ano. É parte da contabilidade social que “congrega instrumentos de mensuração capazes de aferir o movimento da economia de um país numa determinado período de tempo: quanto se produziu, quanto se consumiu, quanto se investiu, quanto se vendeu para o exterior, quanto se comprou do exterior.”1 Medidas de distribuição de renda e de desenvolvimento humano, por exemplo, também fazem parte desse conjunto chamado contabilidade social.
O PIB de 2015
Nossos personagens se assustaram com os números finais mostrados no gráfico abaixo: o PIB e o PIB per capita, que é o PIB dividido pela população do país, ou o PIB por pessoa.
Somando-se o valor corrente de tudo que foi produzido no Brasil em 2015 chegamos a R$ 5,9 trilhões. Se dividirmos esse valor pela população brasileira, chegamos a R$ 28.876 que foi o PIB per capita em 2015 e que caiu 4,6%. Pelo gráfico é possível observar que depois de 4 anos de crescimento, de 2010 a 2013, ficamos praticamente no zero em 2014 e tivemos uma contração forte em 2015.
Adenor, o trabalhador, não esteve muito preocupado nos últimos anos. Olhando o período mais longo, percebia que crescemos na maioria dos anos desde 2000 e esse crescimento é real, ou seja, não é contaminado pela inflação, é crescimento de produção. Mesmo com a crise mundial iniciada em 2008 e da nossa queda de 2015, tivemos crescimento próximo a 44%, em termos reais, de 2003 até 2015. E o emprego, principal medida para Adenor, esteve nos índices mais baixos em décadas. Mas, “o ano passado 2015 foi osso”, reclama.
Quais setores puxaram a queda de 2015?
A tabela abaixo mostra a agonia de Olegária, a empresária. Ela tem um pequena indústria de peças para automóveis. Ela reparou que a indústria de extração mineral conseguiu crescer 4,9%, impulsionada pelo aumento da extração de petróleo e gás natural quanto pelo crescimento da extração de minérios ferrosos.
Mas seu setor foi o destaque, pelo lado negativo: a indústria de transformação fechou o ano com queda de 9,7%. Houve redução no volume da indústria automotiva (incluindo peças e acessórios) e da fabricação de máquinas e equipamentos, aparelhos eletroeletrônicos e equipamentos de informática, alimentos e bebidas, artigos têxteis e do vestuário, além de produtos de metal. O comércio (-8,9%) e construção (-7,6%) também não têm motivos para comemorar.
O que teria provocado as quedas na indústria, no comércio e na construção?
Vamos tentar uma explicação verificando o que aconteceu com o consumo das famílias, com o consumo do governo e com o investimento (que está sob a sigla FBCF – formação bruta de capital fixo). O que você vê no gráfico abaixo (as barras marrons são de 2014 e as azuis de 2015)?
Bem, o destaque vai para a queda na formação bruta de capital fixo, ou queda no investimento privado e estatal, superior a 14%. Três causas são evidentes: a incerteza reduz o investimento privado, as investigações na Petrobras, maior empresa do país, inibem fortemente seus investimentos e o ajuste fiscal pretendido pelo governo federal implica investimento público bastante menor. A decisão de não investir causa redução de atividade em todos os setores da economia, especialmente, na construção que, como vimos, registrou (-7,6%). Olegária, a empresária, certamente tomou a decisão de adiar investimentos no bojo das expectativas de queda das vendas e incerteza econômica e política. Ela aplicou seus recursos em títulos do governo e, está esperando até hoje para decidir o que fará. Ela não ficou triste com os juros que tem recebido. “Os títulos do governo são uma maravilha: têm liquidez diária, posso vender a qualquer momento, são seguros, não há no horizonte nenhum indício de que o governo vá dar um calote, e, por fim, pagam os melhores juros do mundo”, exalta Olegária, a empresária, que teve prejuízo na empresa e lucro na aplicação financeira.
Adenor, o trablhador, prestou mais atenção no consumo das famílias, (-4,0%), e no consumo do governo, (-1,0). Adenor explica que o tombo do comércio (-8,9%) tem relação com sua decisão de restringir as compras. “Se eu não sei se vou estar empregado no mês que vem, preciso me prevenir”, afirmou. Mas ele e os consumidores em geral não estão sozinhos: o quadro, predominante no ano passado, parece ter sido provocado pela conjunção das decisões: (i) das famílias de reduzir o consumo, assustadas pela deterioração do emprego e da renda, (ii) das empresas de não investir e (iii) do governo de fazer o ajuste fiscal, diminuindo seu consumo e seu investimento.
Como foi o comércio com os outros países?
Adenor, o trabalhador também reclamou que todos os importados encareceram demais. Não era para menos, a desvalorização do real frente ao dólar foi de 42%. Pela tabela abaixo, vemos que ainda conseguimos aumentar as exportações (6,1%), mesmo com um quadro débil na economia mundial, mas freamos bruscamente as compras do exterior (-14,3%), tanto para consumo quanto para investimento.
Ano duro para todos, especialmente para aqueles que não conseguiram emprego. 2016 ainda não deu nenhum sinal de que vai ser muito diferente, mas ainda é cedo. De repente, Olegária, a empresária, conclui que vai perder espaço se a indústria automobilística começar a voltar e ela não estiver preparada com maquinário mais moderno. Adenor, o trabalhador, pode ver que os preços estão baixos em vários mercados e resolve arriscar uma compra. E Glenda, da Fazenda, seu chefe e seus colegas, a seu turno, podem concluir que é preciso adiar o ajuste, que é preciso investir para a máquina voltar a girar e, só assim, recuperar a arrecadação do governo.
Puxando para o lado oposto à retomada do crescimento está o nó político, que Olegária, a empresária, Adenor, o trabalhador, e Glenda, da Fazenda, sabem que ainda está por desatar. Para piorar, eles ainda ouvem, todos os dias, na televisão que o Brasil acabou.
Se você quiser mais informações, veja os dados do Sistema de Contas Nacionais Trimestrais – IBGE em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/pib/defaultcnt.shtm
Uma resposta
Bem legal pra usar em aulas de Introdução à economia! Muito bom, valeu!
Glaucia