Siemens da Bahia mantém funcionários da fábrica depois de casos suspeitos de covid-19

Fábrica mantém funcionários mesmo com casos suspeitos e pratica assédio
Imagem de área interna da fábrica de Camaçari

A forma como a Siemens Gamesa Renewable Energy (SGRE), gigante multinacional de engenharia especializada em turbinas eólicas, está lindando com a pandemia entre seus funcionários em uma fábrica que mantém no pólo industrial de Camaçari, na Bahia, virou motivo de denúncia. Em mensagem aos Jornalistas Livres, trabalhadores contam que enquanto funcionários administrativos foram liberados para isolamento social em home-office, os operários estão sendo obrigados a comparecer na fábrica com medo de serem demitidos.

“Somos um grupo de mais ou menos 200 funcionários e já houve um caso suspeito e outro confirmado, do esposo de uma funcionária do setor de limpeza”, denuncia o grupo, preocupado com a circulação da colega que teve acesso todas as áreas da fábrica mesmo depois de avisar à multinacional que seu esposo havia sido contaminado pelo COVID-19. “Quando o resultado do teste saiu, ela voltou a comunicar e a empresa a colocou num táxi, mandou pra casa e continuou escondendo essa informação dos funcionários. Mas vazou.” O sindicato da categoria conseguiu parar a entrada dos trabalhadores por dois dias, “mas o movimento perdeu força nas negociações pela intransigência da empresa”.

Segundo dados da Secretaria de saúde da Bahia (Sesab ), até as 17 horas desta terça-feira (31), o Estado  já registrou 217 casos confirmados de coronavírus, sendo que dois destes em Camaçari, e duas mortes em salvador. Especialistas dizem ser possível um número muito maior de contaminados para cada caso confirmado.

O presidente do sindicato dos metalúrgicos de Camaçari, Júlio Bonfim Costa Filho, confirma a denúncia. Ele apresentou à Simens a possibilidade de férias coletivas, como foi acordado com outras empresas do mesmo pólo industrial, mas não houve acordo com os responsáveis. “Eles têm mantido uma atitude inflexível e mantêm a circulação das pessoas”, afirma Costa Filho.

De acordo com o advogado Hugo Albuquerque, especialista em direito constitucional, “ninguém pode ser obrigado a trabalhar em condições adversas, onde as pessoas não tenham mínimas condições de salubridade e quem tem que fornecer esse ambiente, o ecossistema de trabalho salubre é o empregador”. O advogado reitera, ainda, que o empregador não pode colocar o empregado em risco, ainda mais que no caso brasileiro temos uma questão de força maior, em relação a qualquer questão de salubridade laboral, que é a pandemia.

O advogado explica que nesse contexto o caso pode ser entendido como assédio moral, previsto na CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). “E também como crime comum, uma vez que o código penal é claro em relação a esta situação, em seu artigo 267 e 268, no qual expor alguém a perigo de contágio configura crime, seja na modalidade dolosa ou culposa.” Caso os trabalhadores expostos se tornem vetores de transmissão do coronavírus, os empregados expostos podem contaminar terceiros e essa responsabilidade é do empregador. “O caso pode ser, no mínimo, entendido como tentativa de homicídio culposo”.

A fábrica teve um grande investimento em 2019, quando aumentou a área de produção na unidade de Camaçari. De acordo com o portal Canal Energia a empresa estabeleceu quarentena do dia 12 ao 26 de março, na sede em São Paulo. Já na unidade da Bahia, mais de 120 pessoas continuam trabalhando, na área de produção, que envolve o manejo de materiais metálicos. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde) o tempo de contaminação de superfícies pode variar entre algumas horas ou até dias, variando de acordo com o tipo de material, temperatura e umidade. 

Segundo a denúncia dos funcionários, existe risco de outros casos de coronavírus entre os trabalhadores do setor.  “Um funcionário teve febre e eles mandaram ir embora. Pediram que ele tomasse cachaça pra matar o vírus. A febre passou e eles convocaram o funcionário a ir trabalhar e assim ele está lá, trabalhando.” As fontes ainda dizem que outro trabalhador estava com tosse seca e dor de garganta, sintomas da pandemia. “Eles ironizaram dizendo que deveria ser uma ‘virosezinha'”. Fontes também relatam que “três terceirizados foram mandados pra casa, com febre alta. Só mandam pra casa quando tem febre”.

A equipe do Jornalistas Livres tentou contatar, por telefone, a Siemens Gamesa Renewable Energy (SGRE), mas não obteve retorno.

 

COMENTÁRIOS

Uma resposta

  1. Não estou entendendo. Porque não entrevista as autoridades baianas? O governador tem autoridade para intervir na indústria e paralisar os trabalhos dela.

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