Resistência do povo, com os braços, com o coração, com a revolta pela certeza da injustiça…

De: Alfredina Nery

Para: Cartas para Lula

Lula,

Meu marido e eu estivemos nas ruas, no dia 06 de abril de 2018, em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, porque fomos abraçar e defender você e nossa Democracia ameaçada tão duramente desde 2016.

A chegada já foi carregada de apreensão. A resistência do povo, por/com você estava sendo feito com os braços, com o coração, com a revolta pela certeza da injustiça… mais uma vez!

No calor do sol, uma mulher passou chorando. A gente se olhou e se abraçou, emocionadas. Desconhecidas sim, mas velhas conhecidas da gravidade da situação. “O que será que será que dá dentro da gente …” (lembra da música?)

Na grade da casa em que nos encostamos, em frente ao Sindicato, apareceu uma cachorra grande, preta,  de olhos doces que abanou o rabo pra nós. Ela também percebeu a multidão e sabia que dela pode vir carinho. Ficou conosco, em vários momentos, aliviando a nossa tensão, apenas com sua presença.

Nas conversas, em meio às falas no caminhão de som,  o tom era sempre o mesmo: o que você, Lula, significa para o país, em toda sua simbologia, construída, há mais de quatro décadas e o que significa rasgar a Constituição brasileira, em tempos tão combalidos da nossa jovem Democracia.

De repente, um casal começou a conversar conosco e aos poucos foi se revelando. Ele participou da diretoria do Sindicato, junto com você, Lula, e com você foi preso, nos idos de 1980. A mulher foi costurando, junto com ele, fios  históricos daquela cidade, do trabalho na fábrica, dos tempos da luta operária em plena ditadura e da construção do Partido dos Trabalhadores, com a simplicidade dos que sabem que “ a colheita é comum e o capinar é sozinho” (Riobaldo, personagem de Grande Sertão: Veredas de Guimarães Rosa tem razão, né?

Quando o cansaço das pernas apertou, sentamos numa mureta onde lá estava um homem jovem que começou a conversar conosco. Era de Alagoas e mora atualmente em Guaianazes/SP. Contou a miséria da infância, junto com outros 17 irmãos porque 6 dos 23 filhos que os pais tiveram morreram ainda bebês. Havia época em que a seca durava cinco anos então a fome na família era enorme e seu sonho foi sempre ter uma bicicleta, o que nunca conseguiu (e hoje até tem um carro velho, para ir trabalhar).

Foto de Celso Maldos

Contou que desde que você, Lula, chegou à presidência começaram a receber Bolsa Família, por isto sua família e outros tantos moradores do local foram, devagar, melhorando de vida. E com as cisternas, o que era pesadelo eterno tornou-se direito garantido que alterou a vida de muitos.

Contava tudo isto, no meio de breves paradas, para enxugar as lágrimas e conter o soluço. Por fim, disse que ele e vários irmãos, conforme iam conseguindo, vieram pra São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul em busca de trabalho. E hoje mandam para os que ficaram alguma ajuda porque a miséria está voltando aos rincões onde seus pais e alguns irmãos ainda vivem em Alagoas. Por isto, estava ali, solitariamente, gritando e defendendo você,  Lula, e, ao dizer isto, também chorava muito.

Uma mulher passou com três sacolas de supermercado com balas e doces que foi oferecendo, generosamente, a todos e no trajeto vagaroso, seu sorriso, emocionava, seu gesto simples e desprendido dizia tudo…Quanto coisa bonita aconteceu naquelas ruas, Lula, que olhos de ver, viram!

Encontramos também vários conhecidos do ensino público do ABC e nos abraçamos, na luta, mais uma vez e sempre! O medo e a energia da resistência caminhavam juntos.

Os movimentos sociais, ativistas culturais, partidos políticos, representantes das várias religiões brasileiras e outros tantos que falavam no caminhão de som representavam a diversidade brasileira que nos constitui, que nos orgulha, que nos enche de esperança, pela convivência democrática, em luta pela justiça social e por direitos de todas as naturezas.

De repente, você, Lula, surgiu numa das janelas do 2º andar. A multidão (meu marido e eu, incluídos) olhou pra cima, com os punhos cerrados, gritando seu nome, gritando palavras de resistência, de apoio, expressando em palavras o abraço que estava sendo dado desde ontem, na maior figura politica popular deste país.

 

LULA LIVRE

 

Alfredina Nery  em 06 de abril de 2018

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