Quem paga no final é o povo

Por Renê Gardim

O ano de 2021 acabou e já se vai um mês de 2022. No entanto, pouca coisa mudou além do próprio ano. E existem poucas possibilidades de o brasileiro voltar a sonhar com o churrasquinho de fim de semana.

Com os preços internacionais em alta e a demanda interna definhando cada vez mais devido ao abuso nos preços da carne de boi no mercado interno, as entidades que representam o setor apostam em aumento no volume e no faturamento das exportações também neste ano. Aliás, o valor da arroba do boi está acima do praticado durante 2021.


Desde o dia 28 de novembro de 2021, o preço da carne bovina está acima de R$ 330 a arroba (15 quilos). Isso no atacado. E começamos janeiro num ritmo alucinado de preços, com o produto chegando a R$ 339 no último dia 10 de janeiro.


Depois, o mercado ensaiou uma leve queda, que não durou muito. No dia 13 de janeiro, chegou a R$ 333,70. Mas, no dia seguinte, a curva teve reversão e retomamos os aumentos. No dia 27, a arroba do boi fechou em R$ 343. Esses números estão disponíveis no site do Centro de Estudos e Pesquisas em Economia Aplicada (Cepea), órgão da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queirós (ESALQ), que pertence à Universidade de São Paulo (USP).


A favor do produtor podemos afirmar que a pecuária vive de ciclos. E os insumos, principalmente para o confinamento, subiram bastante, em especial o milho e a soja. Mas quantas cabeça de gado foram confinadas no país durante o ano passado?


De acordo com especialistas, chegamos a 6,5 milhões de animais confinados até o início de dezembro. Menos da metade das cerca de 15 milhões de cabeças abatidas durante 2021. Afinal, o país produz gado de forma extensiva, nos pastos. O confinamento ocorre principalmente no que chamam de acabamento ou terminação, que é o momento de engorda, quando a rês está pronta para ser abatida.



Portanto, a alegação de aumento de custos não é suficiente para demonstrar o motivo do aumento exorbitante e contínuo dos valores da carne no varejo brasileiro. Só é possível entender que, com a valorização do boi gordo no mercado internacional nos últimos tempos, os produtores começaram a segurar matrizes. No curto prazo, isso significa menos animais indo para o abate, o que contribui para sustentação dos preços na estratosfera.


A inépcia do governo federal, que não fez e nem faz nenhum movimento para conter os preços e garantir o abastecimento, evitando que a carne siga para os mercados externos, fazendo com que haja desabastecimento no Brasil, o que se traduz em preços mais altos, só piora a situação.


Ah! Dirão! Mas o nosso governo tem uma linha liberal na economia. Então vamos falar sobre um país “liberal”. Na semana passada, mais exatamente no dia 26 de janeiro, o subcomitê de política econômica e de consumo da Câmara dos Deputados dos EUA enviou documento às principais empresas produtoras e/ou processadoras de carne do país pedindo informações sobre o aumento dos preços e dos lucros.


Na notificação, os deputados afirmam que “embora algumas empresas possam alegar que os altos preços que alimentam esses lucros descomunais são explicados por custos mais altos de insumos, os dados de lucros contam uma história diferente”.


Mas não foi apenas o legislativo estadunidense que se ergueu contra o que consideram exagero na definição dos preços da carne. Os assessores econômicos da Casa Branca disseram que as maiores empresas de carnes, usando seu poder no altamente consolidado mercado nos EUA para aumentar os preços da carne, triplicaram suas próprias margens de lucro líquido desde o início da pandemia de Covid-19.

 
Isso também aconteceu por aqui. Basta verificar os resultados apresentados pelos grandes frigoríficos nos últimos meses.

Ainda sobre o documento do Congresso estadunidense, há um trecho que afirma que os legisladores estão ”profundamente preocupados que os conglomerados de processamento de carne possam ter se engajado em práticas comerciais predatórias, em detrimento dos consumidores, durante a pandemia”. E pede que “as empresas expliquem o que planejam fazer para baixar os preços”.

E é exatamente o que, tudo indica, está acontecendo por aqui. Mas, ao contrário do governo dos Estados Unidos, no Brasil nada é feito. Nossos governantes assistem, passivamente, o setor de proteína animal fazer suas próprias leis de mercado, ignorando os consumidores brasileiros.


As margens de lucro das maiores empresas frigoríficas cresceram exponencialmente com a pandemia, aumentando seus ganhos às custas da população brasileira.



Para piorar as coisas, o real vem sofrendo quedas constantes na comparação a outras moedas. Neste domingo, 30 de janeiro, o dólar mantinha-se em R$ 5,37. Qualquer valor da moeda norte-americana acima de R$ 5,00 torna a carne bovina muito competitiva lá fora. Tanto que a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), que reúne os frigoríficos, já informou que o setor faturou mais de US$ 8 bilhões em 2021. E planeja chegar aos US$ 10 bilhões este ano.



Tudo isso a que preço para o consumidor brasileiro???

COMENTÁRIOS

POSTS RELACIONADOS