Projeto Futuro do Presente, Presente do Futuro #116 – Virgínia de Medeiros: Fome Cinza

Virgínia de Medeiros apresenta o 116º ensaio do Projeto Futuro do Presente, Presente do Futuro - Imagens que narram nossa história
Virgínia de Medeiros, FomeCinza11

Fome Cinza. 15/10/2020.

A violência praticada contra o meio ambiente anos a fio, os incêndios antropogênicos provocados pelo homem casualmente, programados ou desordenados; e o descaso das políticas públicas frente à situação das queimadas são fatos que ficaram ainda mais explícitos durante a Pandemia. O crime contra o meio ambiente é flagrante delito, somos testemunhas do ecocídio – espécies animais e vegetais do nosso planeta estão morrendo. Diante da dura realidade nos perguntamos: como confrontar esta catástrofe? Como criar estratégias gregárias para tratar de uma problemática que, de fato, é uma ameaça coletiva? Talvez a questão mais certeira seja: onde, como e com quem efetivar ações artísticas, levando em consideração que a experiência estética pode desencadear um fluxo de negociação, colaboração, documentação, conscientização e espraiamento dessas questões?

Em setembro de 2020, quando ocorreu o maior desastre ambiental por queimadas na região do Pantanal, a artista Amanda Melo  e o curador Marcio Harum me convidaram para participar do projeto Pantanal Agora, que mobilizou artistas a doar obras para agarrar fundos que foi revertido na formação de Brigadistas de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais. Foram formados 14 brigadistas ribeirinhos da Comunidade de  Paraguai-Mirim, Mato Grosso do Sul. A formação foi realizada pelo Ruberval Dimas do Patrocínio da Brigada Pantanal PrevFogo- MS-IBAMA com o apoio de André Luiz Siqueira que está a frente da ECOA-Ecologia e Ação (https://ecoa.org.br/).

.

Diário Virginia de Medeiros 

29/11/2020 ( após votação 2o turno das eleições municipais) há 16/12/2020

O Pantanal soava uníssono, a cantoria da natureza se resumia ao zumbindo perturbador de insetos. O canto dos pássaros é um grito alto e persistente que rasga o céu, um  contato de chamado na expectativa de ouvir uma resposta que nunca chega. O calor estava excessivo, tudo parecia extremo e hostil, cinza desolada. O Acurizal era uma grande fogueira carbonizada, senti a força de destruição dentro de mim… é preciso mudar.  Tirei os sapatos e pedir perdão pela humanidade, única espécie capaz de propagar múltiplos ecocídios.

O buraco no chão, cova de árvore frondosa, é memória de acolhida. Caí fundo no buraco, oco sombrio de mim.  A intuição artística é o contato na fundura e a arte o impulso de volta, pensei.

Voltar. Aterrar. Arear. Aguar. Foguear. Tudo se mistura, tempo consumado em combustão. Não sou mais quem vê.

No pós-fogo vem a fome cinza, o fogo é controlado mas os animais enfrentam a fome. Eles voltam para a área queimada e encontram um cenário devastado sem recursos para se alimentarem. 

Seca, fogo e fome cinzenta.

Virgínia de Medeiros, FomeCinza1
Virgínia de Medeiros, FomeCinza2
Virgínia de Medeiros, FomeCinza3
Virgínia de Medeiros, FomeCinza4
Virgínia de Medeiros, FomeCinza6
Virgínia de Medeiros, FomeCinza7
Virgínia de Medeiros, FomeCinza8
Virgínia de Medeiros, FomeCinza9
Virgínia de Medeiros, FomeCinza10
Virgínia de Medeiros, FomeCinza11
Virgínia de Medeiros, FomeCinza12
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza13
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza14
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza15
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza16
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza17
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza18
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza20
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza21
Virgínia de Medeiros, Fome Cinza22

.

Ecoa • Ecologia e Ação

Estamos nos preparando para 2021. Vai ser  bem pior que 2020, os rios estão secos como nunca aqui no Pantanal. ” André  Luiz Siqueira, que está a frente da  ECOA- Ecologia e Ação, nos alertou. Quem se sensibilizar com a causa e deseja fazer mudanças, segue na Bio o link para doação da Ecoa.

Ecoa • Ecologia e Ação. ONG ambiental criada em 1989 com atuação prioritária na Bacia do Prata, Pantanal e Cerrado | 31 anos de história em defesa da vida. DOE!

bit.ly/2ROcmwu

.

Para conhecer mais o trabalho da artista

https://virginiademedeiros.com.br/

.

O projeto Futuro do Presente, Presente do Futuro é um projeto dos Jornalistas Livres, a partir de uma ideia do artista e jornalista livre Sato do Brasil. Um espaço de ensaios fotográficos e imagéticos sobre esses tempos de pandemia, vividos sob o signo abissal de um governo inumanista onde começamos a vislumbrar um porvir desconhecido, isolado, estranho mas também louco e visionário. Nessa fresta de tempo, convidamos os criadores das imagens de nosso tempo, trazer seus ensaios, seus pensamentos de mundo, suas críticas, seus sonhos, sua visão da vida. Quem quiser participar, conversamos. Vamos nessa! Trazer um respiro nesse isolamento precário de abraços e encontros. Podem ser imagens revistas de um tempo de memória, de quintal, de rua, documentação desses dias de novas relações, essenciais, uma ideia do que teremos daqui pra frente. Uma fresta entre passado, futuro e presente.

Outros ensaios deste projeto: https://jornalistaslivres.org/?s=futuro+do+presente

COMENTÁRIOS

POSTS RELACIONADOS

A poeta e o monstro

A poeta e o monstro

“A poeta e o monstro” é o primeiro texto de uma série de contos de terror em que o Café com Muriçoca te desafia a descobrir o que é memória e o que é autoficção nas histórias contadas pela autora. Te convidamos também a refletir sobre o que pode ser mais assustador na vida de uma criança: monstros comedores de cérebro ou o rondar da fome, lobisomens ou maus tratos a animais, fantasmas ou abusadores infantis?

110 anos de Carolina Maria de Jesus

O Café com Muriçoca de hoje celebra os 110 anos de nascimento da grande escritora Carolina Maria de Jesus e faz a seguinte pergunta: o que vocês diriam a ela?

Quem vê corpo não vê coração. Na crônica de hoje falamos sobre desigualdade social e doença mental na classe trabalhadora.

Desigualdade social e doença mental

Quem vê corpo não vê coração.
Na crônica de hoje falamos sobre desigualdade social e doença mental. Sobre como a população pobre brasileira vem sofrendo com a fome, a má distribuição de renda e os efeitos disso tudo em nossa saúde.

Cultura não é perfumaria

Cultura não é vagabundagem

No extinto Reino de Internetlândia, então dividido em castas, gente fazedora de arte e tratadas como vagabundas, decidem entrar em greve.

Macetando e nocegando no apocalipse

Macetando e nocegando

O Café com Muriçoca de hoje volta ao extinto Reino de Internetlândia e descobre que foi macetando e nocegando que boa parte do povo, afinal, sobreviveu ao apocalipse.