Pra quem luta por moradia, lar se difere de casa

Tudo foi feito em busca de um sonho. O sonho que esbraveja a palavra que coça os ouvidos dos latifundiários do Brasil, ao verem seus terrenos em risco: CASA. E foi na busca por ela que nasceu a Ocupação Maria Bonita, fruto da união das Ocupações Maria Vitória e Maria Guerreira, de Belo Horizonte, após serem despejadas no dia 21 junho de 2016, pelo Governo do Estado de Minas Gerais. Ontem, 30 de julho, as 200 famílias que representam a Ocupação foram novamente despejadas, desta vez, diferente da reintegração de posse anterior, não houve sequer diálogo. IMG_1602

Simone da Silva (41) é integrante da Ocupação Maria Bonita, e luta por um pedaço de chão há um ano e meio, desde que se viu sem condições de pagar o aluguel e cuidar das duas filhas. Sem a ajuda do pai das garotas e nenhum auxílio do Estado, ela decidiu ir à luta. “Meu aluguel aumentou, eu não tinha ajuda e nem pensão. Eu não tinha condições de pagar R$600 de aluguel ganhando um salário mínimo. Como é que eu ia comer? Foi quando eu decidi ir para a Ocupação. Foram dois cômodos que me fizeram respirar, porque o aluguel te sufoca! Ele fica mês a mês, dormindo e acordando com você”.

Na boca de quem luta por moradia, Simone explica que a palavra não é casa, mas é lar. Questionada sobre o que é lar, ela responde tentando trazer nas palavras o que, no momento, é intangível pra ela: “Não sei explicar o que é pra você. A gente que é de baixa renda sonha em ter um lar, um lugar onde se encontra sossego; um endereço fixo onde podem te encontrar; um lugar para voltar pra casa quando sai do trabalho. O que a gente tem é isso aqui! Você vai no ‘Minha Casa, Minha Vida’ e dizem pra você que é necessário ganhar três salários. Como faz se você vive num Brasil que te paga apenas um salário mínimo?”. IMG_1684

O sonho da Simone não se realizou desta vez, mas ela gritava diante do Batalhão de Choque da Policia Militar de Minas Gerais, junto com todas as outras famílias como um ato de resistência:

Resiste Maria Bonita, 
acorda não arreda o pé.
O dia já vem raiando,
e a nossa casa já esta de pé!

IMG_1423A polícia Militar de Contagem atuou alegando flagrante. “O ato de flagrante foi legítimo, porque, pela manhã, quando chegamos, eles ainda estavam construindo num terreno privado”, afirmou o Tenente Faria do 18° Batalhão da Polícia Militar de Contagem. Questionado sobre o que já estava construído quando a PM chegou e se isso não desqualificaria o ato de flagrante, uma vez que a reportagem chegou antes mesmo da polícia, o tenente afirmou que teve como testemunha o dono do terreno e os vizinhos. Sobre a validade dos depoimentos dos vizinhos que atuaram chamando pessoas pelo WhatsApp, para virem ao local, diante da PM, e sobre as frases ditas pelos mesmos, como: “esse povo sem casa tem que morrer”; “vamos tacar fogo em tudo”, o Tenente alegou “que isso, no caso, era um problema dos vizinhos”.

Também esteve presente no local a candidata a Prefeitura de Belo Horizonte, pelo PSOL, Maria da Consolação, a fim de, segundo ela, dar apoio a Ocupação. “A história de BH e da região metropolitana se confunde com as ocupações. A luta e resistência por moradia ter forçado os governos estaduais e municipais a construírem uma política por moradia. As ocupações têm mostrado que é possível construir casas com dignidade e baixo custo, através da ação coletiva, garantindo que a terra cumpra a sua função social e não à especulação imobiliária”, disse.

Para Isabella Gonçalves, das Brigadas Populares, “o povo está determinado a lutar, e não vai deixar que mais um despejo, num estado com mais de 150 mil de déficit habitacional em sua região metropolitana, seja motivo para deixar de resistir!”.IMG_1675

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