Por mais transparência no debate sobre o Rodoanel da Grande BH

Por que tanta pressa? Por que o governo de Minas quer usar o dinheiro da reparação de um crime socioambiental para cometer outro crime socioambiental?

Marco Antônio de Azevedo, presidente da Associação Comunitária
Regional de Casa Branca

Associações, grupos organizados, moradores, comerciantes e visitantes que frequentam Brumadinho, Ibirité e Nova Lima estão muito apreensivos pela forma como têm ocorrido os avanços para futura implementação da Alça Sul do Rodoanel Metropolitano de Belo Horizonte. O projeto da obra, que será viabilizada com recursos provenientes de um acordo entre a Vale, o governo do estado e órgãos da Justiça, foi concluído sem a participação da população diretamente atingida pela criminosa tragédia de 25 de janeiro de 2019, na Mina do Córrego do Feijão.

No dia 18 de março ocorreu a audiência pública da Alça Sul com presença limitada de pessoas por causa da pandemia. A maioria dos interessados foi obrigada a utilizar meio virtual, mas não era possível falar nem escutar, porque o som da transmissão era péssimo. Podemos dizer que, rigorosamente, não houve uma audiência pública.

Na documentação disponibilizada pela Secretaria Estadual de Infraestrutura (Seinfra) sobre o projeto (denominado 1C), não consta a realização de nenhum estudo de impacto ambiental prévio. Para piorar, a verba para a rubrica ambiental é de ínfimo 1%. Especialistas constatam que não foram feitas investigações de campo e detalhamento técnico. Além isso, não são apresentadas alternativas, embora haja referência a um projeto 1B, totalmente descartado, para o qual, no entanto, algumas sondagens chegaram a ser realizadas no passado. Seria importante conhecer esse projeto 1B e os resultados dos estudos. Tudo está bastante indefinido, dando a impressão de que há um açodamento para aprovar o projeto.

O traçado proposto prevê a construção de um túnel com forte declive e sem pista adicional, que será perfurado dentro de um aquífero muito alto, o que fere princípios básicos da hidrologia, pois há alto risco de vazamentos no interior dos túneis. A drenagem de lençóis freáticos e, consequentemente, perda permanente de nascentes, trará muitos problemas. Riscos relacionados com a toxidade também existem. O valioso minério que será retirado na
perfuração do túnel é cobiçado pelas mineradoras, mas não são feitas referências à sua destinação.

A proposta para a Alça Sul ignora ainda informações relevantes sobre o Parque Estadual da Serra do Rola Moça, a Serra da Calçada e outras áreas de proteção sobre as quais avança o trajeto. Importantes pontos de matas diversas que se tem conseguido preservar ao longo de anos e que abrigam e mantêm preciosos mananciais aquíferos que abastecem cerca de 70% da Região Metropolitana de Belo Horizonte estarão irreversivelmente comprometidos. Muitos bens de imensurável valor histórico e cultural serão destruídos, com graves prejuízos econômicos e sociais.

Lideranças locais convidaram autoridades para discutir projetos alternativos apresentados, como os da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda), do Fórum Permanente São Francisco e as contribuições da Arca Amaserra. Evidenciou-se que essas propostas, que têm muito em comum, são tecnicamente mais viáveis e baratas e menos danosas à rica fauna e flora da nossa região. Não podemos continuar pagando a conta pela irresponsabilidade de mineradoras e pela omissão do poder público, que deveria usar os recursos das compensações para preservar e desenvolver o potencial turístico natural da região de modo sustentável, em vez de gastá-lo na construção de vias mal concebidas dentro de áreas preservadas.

A comunidade interessada da região tem muito mais a dizer sobre os graves problemas do traçado proposto pelo governo, mas ainda não foi efetivamente ouvida. Casa Branca, em Brumadinho, por exemplo, corre o risco de ser duramente descaracterizada. Nossa intensão é clara: queremos paralisar o andamento da proposta do governo para debatê-la a fundo e analisá-la mais detidamente com especialistas sensíveis ao meio ambiente e comprometidos com o desenvolvimento sustentável. Sem, naturalmente, deixar de observar que os municípios vizinhos – Ibirité, Nova Lima e Belo Horizonte – também devem ser ouvidos, consideramos Brumadinho, que no Rodoanel seria uma mera passagem, como prioridade.

Por fim, alertamos para o fato de que, tal como está projetado, o Rodoanel não resolverá os problemas que precisa resolver. Muito próximo do centro urbano, repete erros do anel antigo e, em pouco tempo, estará estrangulado. Fomos informados de que, nesse sentido, a BHTrans, órgão que cuida do trânsito de Belo Horizonte, teria estudos relevantes que também estão sendo desconsiderados. Na verdade, o que teremos é um semianel, pois não contempla a alça leste. Certamente, trará muitos acidentes, pois não prevê a construção de rampas de escape em declividades muito longas de 4,5%, que é a máxima permitida pelo DNIT.

Vultuosa e cara, a obra precisa ser exitosa, o que nos obriga, nesse momento, a fazer algumas perguntas: Por que tanta pressa? Por que o governo quer usar o dinheiro obtido como reparação de um crime socioambiental para cometer outro crime socioambiental? Por que as alternativas não têm sido devidamente consideradas? A quem interessa esse traçado oficial proposto?

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