Paulo Gonet na PGR e Flávio Dino no STF, o que significa?

É impressionante como Lula erra pouco

Por RODRIGO PEREZ OLIVEIRA, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia

O presidente Lula demorou quase três meses para preencher as vagas geradas pelo fim do mandato de Augusto Aras na PGR e pela aposentadoria de Rosa Weber no STF. Foi um período de bastante especulação. Lula cozinhou as expectativas em fogo médio. Decidiu sem pressa. Esteve no controle do tempo.

As dúvidas eram muitas:

Depois de quatro mandatos seguindo as indicações feitas pela própria corporação, como o novo governo petista se comportaria em relação ao Ministério Público, instituição que coordenou a Operação Lava Jato? E no STF? Lula atenderia às demandas dos movimentos sociais identitários que apoiaram sua eleição e indicaria uma mulher negra para a sucessão de Rosa Weber?

O presidente ouviu, ponderou e tomou a decisão de indicar o subprocurador Paulo Gonet para a PGR e o ministro Flávio Dino para o STF. Os nomes foram aprovadas pelo Senado no dia 14 de dezembro. As duas indicações têm o mesmo significado político, que aponta para aquele que talvez seja o grande desafio do governo Lula 3. Explico.

Qualquer análise deste terceiro governo do presidente Lula será incompleta se não levar em consideração aquele que é um dos principais resultados do golpe parlamentar de 2016: o enfraquecimento da instituição Presidência da República na mesma proporção do fortalecimento dos poderes Legislativo e Judiciário.

Teto de gastos, autonomia do Banco Central, orçamento secreto, intenso ativismo político do Poder Judiciário. Ser presidente da República no Brasil nunca foi tão difícil.

O velho “presidencialismo de coalizão”, na formulação do professor Sérgio Abranches, não existe mais. O Poder Executivo não é mais a parte forte na negociação com o Congresso Nacional. Os parlamentares não se contentam mais com cargos de primeiro, segundo e terceiro escalão. Querem ter a chave do cofre, querem ter o controle do orçamento.

Hoje, portanto, para ter um mínimo de governabilidade, o presidente precisa tentar recuperar parte do território de poder perdido nesta quadra histórica, acenando ora para o STF e ora para o Congresso Nacional, ao mesmo tempo que tenta avançar sobre ambos. A operação é pra lá de complexa.

Em 23 de novembro, o senador Jacques Wagner (PT/BA) votou a favor da PEC que limita os poderes do STF. Foi uma piscadela para o Congresso Nacional. Wagner é um dos mais importantes caciques petistas, líder do governo na Casa e homem de confiança do presidente Lula. É óbvio que não agiu sozinho, por conta própria. Políticos profissionais dessa experiência nunca agem sozinhos e por conta própria. O voto foi um aceno do presidente Lula aos interesses corporativos dos congressistas, sinalizando que apoia mecanismos mais rígidos de contenção do STF.

Já a indicação de Paulo Gonet foi um afago em Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, sem dúvida os ministros mais fortes na Suprema Corte. Por motivos distintos, as gestões de Rodrigo Janot e Augusto Aras na PGR lesaram o STF. Janot permitiu que a República de Curitiba subvertesse a hierarquia no Poder Judiciário. Aras blindou Bolsonaro, dando segurança jurídica aos seus ataques aos ministros do Supremo.

Também com interesses corporativos, Xandão e Gilmar queriam Gonet. Gilmar Mendes o conhece há muito tempo, tem relações pessoais estreitas com ele. A expectativa é que depois de um longo período de tormenta, o STF tenha um aliado à frente do Ministério Público. Nunca é demais lembrar que ao Procurador Geral da República cabe o monopólio da ação penal junto aos tribunais superiores do país. Talvez seja o cargo mais poderoso da República.

Por sua vez, com a nomeação de Flávio Dino, Lula instala mais um aliado no pleno do STF. Com apenas um ano de mandato, o presidente já conseguiu indicar seu advogado pessoal e agora indica um dos seus principais ministros e aliado de longa data. O objetivo é construir a “banca presidencial” na Corte para equilibrar as relações com um Congresso Nacional cada vez mais hostil e apetitoso. O STF é parte da coalizão governamental.

Definitivamente, hoje, o jogo da coalizão é outro. Como um habilidoso enxadrista, Lula move as peças no tabuleiro. É impressionante como erra pouco!

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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