Em 2010 li um texto da cientista social Syntia Alvez que versava sobre Frederico Garcia Lorca e o medo do passado que cria a ignorância do presente. Dizia ela que  para violentar alguém muitas vezes é preciso mais do que crueldade, é preciso saber o que de fato é doloroso para aquele que se quer atingir. “Às vezes as agressões precisam sair do lugar comum do que conhecemos como os modos de violência, nem sempre um ataque físico ou verbal é capaz de acertar o alvo da maneira que se pretende. Isso já é sabido há muito tempo e os atos de violência têm atingido requintes surpreendentes, mas às vezes sua eficiência se deve à atuação de maneira muito simples. As ditaduras há muito já sabem o quão violento pode ser o silêncio. Não permitir que se fale, que se escute, que se pense foi uma das violências mais eficazes descobertas pelo homem. Atingir alguém pelo silêncio, pelo não dito, pela ignorância é matá-lo para os outros, é destruí-lo de forma tão eficaz quanto uma bomba atômica, que vai direto aos átomos. O ostracismo é a violência silenciosa que pode fazer desaparecer pessoas e idéias e sem gerar grandes resistências.”

Esse texto me leva a pensar nos povos indígenas isolados que se encontram a cada período da ocupação do território vasto do Brasil, áreas virgens ainda não pisadas. Não falar dessa gente é também a melhor maneira de dizimá-las e, principalmente quando circula a boca pequena em Brasília que as novas regras para identificação, delimitação e demarcação de Terras Indígenas já estão em fase adiantada de cozimento na Presidência da República, e que nelas foram incorporadas as tais condicionantes do Supremo Tribunal Federal (caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol) e o marco temporal. Dizem que a medida  será baixada na forma de lei ou decreto, e terá como efeito imediato colocar em questão mais de 90% da demanda hoje represada na Funai e no Ministério da Justiça.

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Fotografia de Guilherme Gnipper Trevisan/Hutukara, dos Yanomami isolados.

Diversas são as etnias, povos tradicionais espalhados por todo país, e vários grupos de recente contato são a todo momento apontados, a “descoberta” de mais um povo isolado. Nos habituamos com a  estratégia de esquecimento da história política e negação dos direitos. Inacreditável ainda se surpreender no Brasil nos dias de hoje. De repente um povo, mais um entre refugiados.

Me envolvo nos novelos do fantasiar, em notícia tão breve, do tamanho de uma imagem, em que homens isolados com suas famílias denunciam outras maneiras de se viver.

Em que isso tudo nos ameaça?

A indigenista Dedé Maia ensina que é na convivência com os mais velhos, entre os índios, que as crianças aprendem o jeito certo de se comportar socialmente dentro do grupo e cedo aprendem a responsabilidade que elas têm com o grupo, qual o seu lugar e a sua importância em serem pessoas produtivas e participativas dentro de seu grupo social.

Será que a ameaça é essa, aquilo que nos povos indígenas deixa o rei e os fazendeiros nus?

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SuyáNos habituamos aos escândalos, nos escandalizamos muito pouco com os escondidos, os que fogem, os que resistem, os que habitam o desconhecido em nós mesmos. Aqueles que anseiam o linchamento de seus políticos também cegam sob os campos e matas. A vergonha também pode ser agro.

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Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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