Os brasileiros estão pessimistas e se percebem como pobres (são 85% da população). 65%, ou quase sete em cada dez pessoas, avalia que a diferença entre mais ricos e mais pobres irá aumentar próximos anos no país, por causa das mudanças climáticas causadas pelo aquecimento global. Três em cada quatro brasileiros consideram que as mudanças tecnológicas ampliam as diferenças entre ricos e pobres, deixando ricos mais ricos e pobres ainda mais pobres. Além disso, grande parte da população desconhece a realidade da concentração de renda no país.
Um em cada cinco brasileiros crê que sua classe social piorou desde 2017. Esse grupo considera isso foi causado pela queda na renda, a inflação, a falta de oportunidades de trabalho e de estudo. Maiores de 60 anos moradores do Sudeste foram os mais impactados.
FALÁCIA DA MERITOCRACIA
A ilusão da meritocracia tem sido divulgada e desconstruída junto as/os brasileiras/os. A pesquisa mostra que 62% da população (ou seja, pouco mais de seis em cada dez pessoas) discorda que “uma pessoa de família pobre que trabalha muito tem a mesma chance de ter uma vida bem-sucedida que uma pessoa nascida rica e que também trabalha muito”. Pouco mais de metade da população (54%) considera que as diferenças na oferta e acesso à educação entre crianças pobres e ricas impacta diretamente nas chances de “ter uma vida bem-sucedida”.
“A meritocracia é um modelo de distribuição de recursos, prêmios ou vantagens, cujo critério único a ser considerado é o desempenho e as aptidões individuais de cada pessoa. É uma das ideias que fundamenta moralmente o liberalismo.” E é a partir desse conceito que justica-se e legitima-se “a forma como os recursos estão distribuídos na sociedade”. Quem defende a meritocracia defende que a mobilidade social deve ser “resultado exclusivo dos esforços individuais através da qualificação e do trabalho” (Betoni, C, 2014). Ou seja, desconsidera que as pessoas tem oportunidades diferentes, que se relacionam com sua cor, gênero, classe social.
Essa compreensão vai de encontro ao que traz o informe “Extrema pobreza e Direitos Humanos”, apresentado à Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2018. O documento destaca que “a concepção ultrapassada de meritocracia reduz a empatia com os grupos afetados e faz com que a desigualdade pareça um fenômeno inevitável”.
O Informe destaca que
“as crianças nascidas em famílias desfavorecidas tem negadas a igualdade de oportunidades: suas possibilidades de alcançar um padrão de vida decente na idade adulta são muito reduzidas, simplesmente por que seus pais eram pobres”. (p.2)
E, dialoga com o estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): O elevador social está quebrado? Como promover mobilidade social. A pesquisa estima que seriam necessárias nove gerações para que os descendentes de um brasileiro entre os 10% mais pobres atingisse o nível médio de rendimento do país.
E OS DESEJOS?
As três prioridades destacadas para uma vida melhor daqui para frente foram “ter emprego”, que soma 48% entre as três primeiras prioridades, “estudar” (46%) e “fé religiosa” (34%).
AS MULHERES
De um lado o estudo informa que há percepção de que o lugar de mulher é onde ela quiser estar. Por outro lado, explicita-se o entendimento de que há diferenças e desigualdades (inclusive de acesso) entre homens e mulheres em relação às condições e participação política.
A pesquisa comunica que quase nove em cada dez entrevistados (88%) “rechaça(m) o papel tradicional atribuído à mulher no ambiente doméstico”. Divergem da afirmação que “as mulheres deveriam se dedicar somente a cuidar da casa e dos filhos, e não trabalhar fora”.
Quase de sete em cada dez brasileiros (69%) admitiram que “mulheres ganham menos no mercado de trabalho por serem mulheres”.
Cerca de sete em cada dez brasileiros e brasileiras (71%) “concordam que mulheres têm menos chances de serem eleitas para mandatos no Executivo e Legislativo pelo fato de serem mulheres”
E O RACISMO, COMO ANDA?
As diferenças de oportunidades entre negros e as demais raças são claramente percebidas pela maior parte da população brasileira. O peso da cor da pele nas relações sociais impacta no cotidiano nacional; seja no acesso ao mercado de trabalho, nas chances de contratação por empresas, no comportamento do sistema de justiça, no acesso aos serviços públicos como educação e saúde, na participação política, no aumento das chances de abordagem policial, entre outros.
A pesquisa informa que três em cada quatro brasileiros apoia a Lei das Cotas para ingresso nas universidades federais e concorda que ela tem tido importante papel na redução de desigualdades. As mulheres negras formam o maior grupo que conseguiu acessar as universidades públicas do Brasil, conforme análise de dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), representando 27% dos estudantes.
A cor da pele também tem papel importante na decisão de contratação por empresas, pela percepção de três em cada quatro brasileiros (75%). Para 68% dos brasileiros, pessoas negras têm menos chances de serem eleitas para governos e legislativos pelo fato de serem negros.
O tema das abordagens policiais também explicita a percepção do racismo pela população brasileira. Quase nove em cada dez pessoas, (86%) da população, acredita que “a cor da pele influencia a decisão de uma abordagem policial”. Os jovens entre 16 e 24 anos têm essa percepção mais aguçada, 90% deles assim acreditam. A justiça também é mais dura para as pessoas negras, consideram 79% dos brasileiros (ou seja, oito em cada dez).
Alguns números
- 85% concordam que muitos ricos devem pagar mais impostos para financiar políticas sociais;
- 85% consideram que só a progresso com a redução das desigualdades
- 69% acreditam que o fato de ser mulher impacta a renda;
- 59% concordam que as pessoas negras ganham menos;
- 71% acreditam que mulheres têm menos chance de serem eleitas por serem mulheres;
- 68% acreditam que pessoas negras têm menos chance de serem eleitas por serem negras;
- 86% acreditam que a cor da pele influencia a decisão de uma abordagem policial.
- Trabalho aparece como prioridade em vários aspectos
No próximo artigo abordaremos as percepções sobre as políticas sociais e tributação.
Para acessar a pesquisa completa veja em “Nós e as Desigualdades”