O HORIZONTE QUE NEGAM

O desmonte da FUNAI, o relatório da CPI CIMI- INCRA, a proposição da aquisição de terras nacionais por capital  estrangeiro, a grande adesão das etnias dos povos originários ao 14º Acampamento Terra Livre, a evidência dos conflitos no campo espalhados pelo país. Dos padres e bandeirantes que em martírio abriram caminhos, do senhor das antigas senzalas, o poder segue firme se constituindo em imolação dos mais fracos fortalecendo a metrópole.

 

Por que nega-se a terra aos que a querem e a têm na alma e delas nascem e se nutrem?

 

CPI FUNAI / INCRA segue no atropelo. Até quando?

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=8349E47233C4A50750B5D54BA5D29BBE.proposicoesWeb2?codteor=1325691&filename=RCP+16/2015

Além da indicação de pessoas para serem indiciadas, o relatório formaliza uma série de proposições com impacto direto na política e na ação indigenista, desnorteando a bússola:

I – Indicação encaminhando o Relatório da CPI Funai e Incra 2 ao Excelentíssimo Ministro da Justiça e da Segurança Pública, sugerindo a reanálise, no âmbito da demarcação de terras indígenas, dos procedimentos administrativos em andamento

II – Indicação ao Presidente da República, sugerindo a propositura de Projeto de Lei para regulamentar o art. 231 da Constituição Federal de 1988

III – Ofício ao escritório da Organização Internacional do Trabalho no Brasil indicando transgressões à Convenção 169 da OIT e pedindo providências

IV – Indicação ao Poder Executivo, sugerindo a criação de órgão a funcionar como Secretaria Nacional do Índio

V – Ofício à Nunciatura Apostólica no Brasil, encaminhando relatos de atuação contrária aos princípios cristãos e à dignidade humana por parte de agentes do Conselho Indigenista Missionário

 

 

 

Bomba é solução simples para questão agrária tão arcaica. Sacam a arma de repente e se excluem das responsabilidades, criando outros marcos na semântica.

 

 

Eram apenas rapazes latino americanos, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes,vindos do interior. Belchior talvez ouvisse seus discos para a partida entre gases e ligeirezas ou já nem se lembrasse mais dos motivos de romaria tão justa, pois tudo, sei, se faz proibido,  quando  muitos, sem medo no coração do sertão, se ausentam entre a fumaça que arde nos olhos.

Vi senhoras e jovens Kaiowá, com as maracas cantando e abanando as mãos ao vento, como se espantassem demônios, dando valha-me aos males, mirando o Congresso no fim da esplanada distante. É capital o sentimento indígena na percepção do mundo e seus caprichos, e os velhos Kaiowá, apesar de tudo que morrem, ainda pronunciam orações em esperança. Brasília é cidade mouca, os plenários lá constituídos pouco ouvem de seus visitantes e donos cidadãos. Índio ou preto, sertanejo ou metalúrgico, na capital encontram sua guarda, sempre bem armada, num tabuleiro que nomeia e demite, afasta e empossa. Mas a esperança é cega e persiste. 

 

Os povos indígenas têm o direito a conservar e fortalecer suas próprias instituições políticas, jurídicas, econômicas, sociais e culturais, mantendo ao mesmo tempo seu direito de participar plenamente, se assim o desejarem, na vida política, econômica, social e cultural do Estado, diz o Artigo 5 da Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

 

“É certo que houve alguns esforços nesse sentido , por exemplo, quando da concepção e implantação dos distritos sanitários especiais indígenas (DSEIs). Alguns agentes sociais, indígenas e não indígenas, viram ali a possibilidade dos DSEIs serem embriões de estruturas políticas mais amplas, para o exercício do direito à autonomia ou ao autogoverno indígena nas questões relacionadas com seus assuntos internos e locais, e para a gestão de seus territórios e recursos naturais. Mas a esse esforço seguiram-se movimentos contrários, que por diferentes perspectivas políticas e interesses econômicos, desqualificaram ou, até, criminalizaram iniciativas que pudessem caminhar nesse sentido. Quando muito, foi aceito um multiculturalismo “bem comportado”, que se ocupa da diversidade enquanto diferença cultural, dentro de um determinado espaço (local, regional, nacional ou internacional), ao mesmo tempo em que repudia ou deixa de lado diferenças econômicas e sociopolíticas. Na prática, isso se manifesta em políticas que se “abrem” à diversidade cultural, manifestam um relativismo cultural, ao mesmo tempo em que reforçam os mecanismos de controle e domínio do poder do Estado nacional e os interesses do capitalismo global sobre os territórios e os recursos naturais.  (…) Ao final deste texto com a sensação de que estamos frente a um grande desafio. Será necessária muita criatividade, muita vontade de inovação e disposição para enfrentar os entraves administrativos, políticos e culturais que freqüentemente se interpõem ao avanço da democracia participativa no Brasil, principalmente quando se refere aos povos indígenas. Neste momento, em que se retoma no âmbito do Congresso Nacional a discussão sobre a necessidade de uma legislação específica, em substituição ao já, há muito, obsoleto Estatuto do Índio de 1973; em que se tenta conceber fórmulas alternativas ao instituto da tutela; quando o movimento indígena brasileiro busca se fortalecer e articular alianças com outros movimentos sociais, visando à transição para uma sociedade onde a plurietnicidade e a interculturalidade estejam na raiz das suas instituições.” (Ricardo Verdum INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos, 2009). 

 

Entre as mulheres na aldeia, antigas senhoras seguem o rumo da vida em velhos preceitos atentas ao leme.  Persistem porque ser livre é preciso e entre a aldeia e a cidade muitos povos somos, por mais que neguem, por mais que sufoquem.

Resistem e lamentam, gritando na avenida a sina que insiste e parta: é índio.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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