O fim da educação pública em Mato Grosso?

Depois do governo anunciar o fechamento de três escolas na periferia da região metropolitana de Cuiabá e de notícias de fechamento de mais 297 escolas, Coletivo de professores de Mato Grosso denuncia o desmonte autoritário da educação no estado

Depois do anúncio do fechamento de três escolas periféricas em Várzea Grande (veja aqui), e das notícias de fechamento de 300 unidades por todo estado, hoje o governo de Mato Grosso publicou no Diário Oficial um decreto com o planejamento de fim das aulas para classes dos primeiros anos do ensino fundamental até 2027 (veja imagem dessa matéria). Esse cenário está tirando o sono de educadores, estudantes e familiares que já sofrem com a pandemia e a inação do Ministério da Educação. Hoje também, o Túlio Ferreira, do Coletivo de professores de MT, divulgou o texto abaixo, que reflete o desalento e a falta de perspectiva para a educação no estado. Mas também há o chamado à luta e à resistência.

Confiram:

Nos encontramos no dilema do barão de Munchhausen. A história narra um feito incrível deste homem alemão que certa vez, acidentalmente, caiu num lamaçal e não conseguia sair. Sem ninguém para ajudá-lo por perto, a única opção era ele mesmo dar jeito de sair da situação em que se encontrava. Diante do desespero, na iminência da morte, atolado até o pescoço, agarrou firmemente com as mãos seus próprios cabelos e o puxou para cima, salvando-se do destino certo que o aguardava.


Neste momento, somos vários barões de Munchhausen, atolados na lama e cientes do futuro que se aproxima. Sabemos que as políticas em desenvolvimento no âmbito federal e estadual é a iminência da morte. Para ter certeza que não apregoo sensacionalismo ou alarde sem razão, vale a pena trazermos alguns fatos à tona. Estamos a menos da metade do mandato do Bolsonaro e do Mauro Mendes, quase dois anos de agonia dos serviços públicos.

Mas a jornada não começa em 2019. Se agrava pós-impeachment em 2016 e a votação da então PEC241 na Câmara dos deputados, PEC55 no Senado e atual EC95. Aí se encontra o ponto nodal de toda a situação. Nela se estabeleceu o congelamento por 20 anos (isso mesmo, 20 anos) sem gastos a mais em qualquer área pública acima da inflação. Para não delongar num texto que não há intenção de ser um artigo e sim uma convocação à resistência, partamos da EC95. Com o orçamento constitucionalmente estrangulado, desdobra-se as múltiplas ações que vão de encontro à nossa existência. Sim, a existência da classe-que-vive-do-trabalho, como diz Ricardo Antunes.


Os inimigos nos atacam em diversos front. Golpeiam a lei 7.040 (Lei da Gestão Democrática) com o seletivo para secretário e para diretores das unidades escolares, extinguindo o processo de eleição e escolha entre pares e comunidade. A portaria nº 562/2020/GS/SEDUC-MT vem para “atualizar” a LOPEB (Lei dos profissionais da educação básica); lembremos, atualizar num governo neoliberal sob a forma do Estado de Exceção, como nos lembra Giorgio Agambem, é, certamente, a destruição da carreira.

Os servidores do executivo – lógico, somente do executivo – estão sem a correção inflacionária (RGA-Revisão Geral Anual) desde 2018. Antes mesmo da lei federal 173, Mauro Mendes já se adiantava em relação a Paulo Guedes e Bolsonaro com seu pacote de maldades com o aval da ALMT que aprovava o “estado de calamidade financeira” mesmo perdoando dívidas do agronegócio no montante aproximado de R$6 bilhões de reais. Sobre a lei federal 173, versa o congelamento de qualquer aumento salarial, elevação na carreira, contagem do tempo de serviço, suspensão de férias prêmio até dezembro de 2021.

Também tem a lei 510/2013 que busca equiparar o salário dos profissionais da educação em relação as demais carreiras do poder executivo; não é cumprida em todo mandato do Mauro Mendes. Temos também a “reforma” da previdência: aumentou a alíquota de contribuição em 3% (nosso salário ao invés de subir ou ao menos estagnar, está diminuindo); trabalharemos de 5 a 7 anos a mais; aposentaremos com no máximo o teto do INSS (acabou a aposentadoria proporcional). Continuam a descontar da Dedicação Exclusiva mesmo o TJMT dando ganho de causa que é para cessar o desconto, haja vista que não entra no cálculo da aposentadoria. Mauro Mendes já solicitou ao Ministério Público um estudo que viabilize terceirizar as funções de Apoio e Técnico na educação.


Não há chamamento do cadastro de reserva dos aprovados em concurso, do edital do ano de 2017. Essas breves considerações dizem respeito tão somente à área educacional do estado de Mato Grosso, sem levar as questões na esfera federal e outras áreas como meio ambiente, segurança, mobilidade urbana, agricultura familiar, saneamento básico, privatizações, desemprego, etc. Afinal, enquanto estávamos distraídos, como disse o ministro da economia: “colocamos a granada no bolso do inimigo”. Sim, o governo nos declara inimigos e, a partir do critério político schmittiano, na dicotomia amigo/inimigo, se estabelecem as bases das políticas a serem implementadas. O inimigo deve ser eliminado!


Se tem algo que posso afirmar para vocês no dia de hoje é que o modo de vida que levamos e a maneira com que o Estado se organiza tenta nos roubar a dignidade e nos colocar em condição de pobreza. A esperança é uma virtude humana. Independente do posicionamento político, todo ser humano tem a capacidade de sonhar com um mundo diferente do que vivemos. Sonhar para frente, um sonho a ser realizado e nunca só um sonho que fica na estação sempre distante da realidade.

Por isso, a esperança enquanto imanente vontade humana de criar um horizonte que abra as possibilidades reais para um presente diferente se relaciona com a luta! “Não adianta olhar pro céu com muita fé e pouca luta, levanta aí que você tem muito protesto para fazer, você pode, você deve”. O sonho deve ser no presente, hoje!


Acredito que concordem sermos vários barões de Munchhausen. Não haverá messias para nos salvar do lamaçal, até mesmo porque o messias de hoje diz não fazer milagres. Teremos que fazer nosso próprio milagre, sem depender do auxílio divino, assim como o barão de Munchhausen contrariando as leis da física ao exercer força sobre seu próprio corpo colocá-lo em movimento.


Teremos que puxar nossos próprios cabelos, e com muita força! Essa relação com a história do barão de Munchhausen significa que dependemos somente de nós mesmos para escapar do futuro previsível que se avoluma no horizonte e, para isso, deveremos desafiar as regras. Já é suficiente as razões que temos para lutar com radicalidade, afinal, não nos situamos numa situação democrática e, se quisermos assegurar nossos direitos teremos que dispor da própria liberdade. Não se enganem com passeatas e notas de repúdio na ilusão de surtir efeitos. Teremos que ocupar e resistir com a última arma que nos restou após sermos espoliados de todos os meios, nossos corpos! Os corpos no espaço materializam os anseios alijados da esperança coletiva!


À luta!


Prof.Ms. Túlio Ferreira
Coletivo de professores do estado de MT

COMENTÁRIOS

13 respostas

  1. É este um dos “grandes” produtos gerados por uma eleição no qual a insatisfação com os governos anteriores foi mal analisada e mal avaliada por grande parte da população ! E a velha tese batida e rebatida de que o (a) brasileiro (a) não sabe votar ainda é uma verdade e infelizmente, ainda é uma grande realidade!

  2. Esse governo só visa ajudar e valorizar empresários como ele por isso fechar escola estaduais e deixar alunos sem aulas é prioridade para esse tipo de governo que não liga para a população de baixa renda

    1. Estamos voltando a um passado tão vivido em nossas lembranças,a pobreza e a miserabilidade voltando a porta de no mínimo 75% da população brasileira e como disse um cidadão nos comentários por causa de não sabermos votar estamos nesta situação é o que está acontecendo em Cuiabá onde temos o Abilio que radical e a favor dos patrões e fora as ideias descabidas contra os servidores e o Pinheiro que já tem a carteirinha de oligarquia de desvios,as opções são péssimas e o que fazer quando o país não tem democracia e sim um sistema que mantém estes produtos humanos sem caráter no poder destruindo quem paga seus salarios e suas regalias fazendo eles continuarem o massacre contra o povo,não há votação limpa e muito menos democrática pois seria democrática se ganhasse realmente quem teve votos diretos e pudesse qualquer cidadão se candidatar sem ter que ter partido político obrigatório,estamos é em um país sem democracia e sem lei,pois pobre fica preso com reconhecimento facial e rico até com dinheiro na cueca,a perícia comprovando intenção de matar e dinheiro no meio da sala não vão para cadeia e se defendem e contratam o melhores advogados com o dinheiro de quem do povo,se isto não é roubo ou falta de moral e caráter é o que?

  3. Real. Texto retrato da maldade planejada para esfacelar conquistas e retirar a dignidade do trabalhador da educação. Porém , não se enganem, todos, sem exceção, são responsáveis pela ação e omissão.
    Que chamamento!

  4. Falou tudo….Me sinto abatida e sem forças diante da situação em que nos vemos.

  5. O governo Mauro Mendes é o governo do desmonte da Educação Pública de MT e do serviço público!

    Governo eleito em cima de promessas eleitoreiras mentirosas!

    O pior governador que já tivemos nos últimos anos, tudo sob a justificativa de diminuir gastos…entao será que a história que no seu governo está tudo 100% a nível econômico é mais uma de suas mentiras?

  6. Esse e o resultado de votarmos em empresário. Só pensam em dinheiro e a classe pobre que se lasque. Eu espero que não esquecemos das atitudes dessw carrasco na próxima eleição.

  7. Bem isso, companheiros Vamos à luta!!! Senão, ao ostracismo

  8. Me desculpe a minha ignorância, mas está falando de anos iniciais, esses anos não são ofertados pelo Município? Não estou querendo defender o governo não, eu também vejo um descaso enorme dele pela educação eu só não entendi mesmo o texto acima.

  9. Fechar escolas é um terrível retrocesso!
    Querem manter o povo na ignorância e na mediocridade por ser ótima maneira de manipulação. Limitar o acesso às informações, a cultura e as tecnologias, para serem mais fáceis de serem ludibriados e continuarem como massa de manobra para formação de seus currais eleitorais. Está aí uma das estratégias destes atuais governantes, Bolsonaro/Mauro Mendes.

  10. Que situação, desconfortável! Até quando a educação irá ser penalizado? Aliás todos os outros segmentos sociais também,pois em um sistema que gerência as medidas é a célula mãe “educação”!Acorda enquanto há tempo???!

POSTS RELACIONADOS