O diabo veste farda

Número de homicídios no Brasil é maior do que o de países em guerra. O que a discussão que está acontecendo agora no STF sobre perfilamento racial tem a ver com isso e por que você deveria se preocupar?
O diabo veste farda
Reprodução: https://www.novoeste.com/noticias/58469/nao-acredite-em-contos-de-fardas

Por que você deve se preocupar?

O Supremo Tribunal Federal está discutindo esta semana sobre perfilamento racial, ato que invalidaria provas colhidas durante abordagens policiais.

Perfilamento racial é a abordagem com maior frequência e com truculência contra pessoas negras, feita pelos órgãos de segurança, apenas por elas serem negras. Sabe quando a polícia aborda sem nenhum motivo aparente uma pessoa negra? É sobre isso. De forma bem direta a questão é: EXISTE RACISMO NA ABORDAGEM POLICIAL NO BRASIL?

Vamos trazer dados e panoramas para explicar o quanto é importante a manifestação e engajamento neste debate, já que as consequências são devastadoras.

Para pessoas negras no Brasil, a polícia é um completo pesadelo

Regina Jackson uma ativista e intelectual americana diz que marcadores sociais de negritude, sobretudo peles negras retintas, são percebidas socialmente como uma arma letal e, por isso, as violações de direitos são constantes a estes corpos. Os órgãos de segurança pública não são antiaderentes a esta lógica da sociedade, então, mesmo instituições de segurança pública, que deveriam nos proteger, agravam esta conjuntura.

Existem códigos de conduta bem diferentes em abordagens policiais na periferia, que é majoritariamente habitada por pessoas negras. Temos percebido nas redes sociais, nos últimos anos, abordagens policiais viralizarem em bairros de elite, que são compostos majoritariamente por pessoas brancas, e como há cortesia nestas operações. Não se tem registro, por exemplo, de policiais invadindo o Jardim Europa, em São Paulo, atirando e não existe ocorrência de “balas perdidas” no Alphaville.

Os dados da Anistia Internacional de 2016 expõem que quase 80% dos jovens assassinados no país são negros. Existe um perfil de pessoa no Brasil que pode ser morto. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera calamitosa uma taxa de homicídios acima de dez para 100 mil habitantes e os resultados do Brasil são os apavorantes 25/100mil, e isso representa um jovem negro assassinado a cada 23 minutos.

Uma pesquisa do DataFolha junto com Cesesc demonstra que o percentual de pessoas negras abordadas pela polícia chega a 63% e que 1/5 já foram interpeladas mais de dez vezes pelas autoridades de segurança.

O debate da abordagem tendenciosa dos instrumentos de segurança já não é assunto novo, inclusive internacionalmente. A corte interamericana de Direitos Humanos já tratou deste tema há alguns anos. Em Nova Iorque, o ex-prefeito Bloomberg teve que pedir desculpas públicas por ter desenvolvido (durante sua gestão) um manual de segurança considerado racista. Sem contar, é claro, o emblemático caso George Floyd, cujo assassinato por policiais estadunidenses repercutiu mundialmente.

Thiago Amparo, advogado, ativista e professor, diz que as perguntas que devem ser feitas perante esta discussão do STF é: “O critério de abordagem policial, que somente pode ser feita por fundada suspeita, vale também para pessoas negras? Pessoas negras são protegidas pela lei contra o abuso policial no Brasil?” Esta é a questão que o STF terá que decidir.

Reprodução: Google Imagens

Não existe paz em estado de guerra – pra ninguém

O número de homicídios no Brasil é maior do que o de países em guerra. Na Síria, por exemplo, em quatro anos, morreram 256 mil pessoas enquanto que, no Brasil, no mesmo período, foram quase 279 mil. Em uma totalidade de 60 mil homicídios por ano, sendo que mais de 50% dessas mortes são de jovens, é como se a cada dois dias você estivesse derrubando um avião lotado de adolescentes e jovens adultos.

Não existe a possibilidade da construção de futuro de um país onde existe um desperdício da maior matéria prima que existe: o de pessoas. Um país não se constrói com minério de ferro, com vacas e nem com soja. Um país se constrói com gente e, nós, Brasil, temos um imenso talento em exterminar.

Entre nas redes do Supremo Tribunal Federal e se manifeste em relação a esta importante decisão que está sendo tomada.



Antonio Isuperio é arquiteto brasileiro, negro, lgbt+ e mora em NY. Ativista de direitos humanos por quase 15 anos, é filho de empregada doméstica e graduado em Arquitetura pela Universidade Estadual de Goiás, com MBA em varejo pela FGV-SP. É especialista em Design de Varejo e Pesquisa e Tendências de Futuro.

Nas redes: @isuperio


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