Senzala é um restaurante-lanchonete localizado no Alto de Pinheiros. Foi criado em 1972 e, segundo o próprio histórico no site do estabelecimento, “foi criado para atender as necessidades dos moradores e empresários da região”. Qual necessidade? A de escarnecer do sofrimento do povo negro escravizado enquanto servem carne a uma elite branca e empresarial?!
Hoje (28/04/2017), dia do maior movimento grevista da história do Brasil, a “chapa esquentou” para o lado deles. Os manifestantes estavam se dispersando quando avistaram aquela “iguaria do racismo genuinamente burguês”. Uma elite branca jantava no Senzala (que na verdade é ocupado, hoje, por aqueles que representam a Casa Grande) ignorando todas as reivindicações da Classe Trabalhadora que, do lado de fora, enfrentava o frio, o corte de pontos e a polícia, como sempre violenta (seria um tempero para aqueles que jantavam?), na reafirmação de seus direitos. O mundo poderia cair lá fora desde que a “propriedade privada” estivesse segura!
Mas o mundo que cai sobre nossas cabeças, com a Reforma Trabalhista e Previdenciária, resvalou para dentro do comedouro das feras racistas na forma de paus e pedras. E o que os bravos guerreiros da moral e propriedade privada fizeram? Fugiram sem pagar! Façamos justiça: alguns com menos descaramento se esconderam nos banheiros.
(Uma fonte disse que as pedras foram atacadas somente na placa, mas a narrativa do medo ainda assim nos parece verossímil).
Os “culpados”, segundo a mídia, foram os Black Blocs. Não me atentando a nomes e identidades, percebo que a maior motivação destas pessoas foi a revolta diante de uma impune e descarada violência simbólica contra gerações e gerações de negros. Um povo que não veio da senzala, mas de reinos e tribos em que eram livres, do outro lado do Atlântico.
E quem primeiro atacou a “Senzala”? Foram os escravocratas que nos atacaram com mais do que pedras: vieram com estupros, chibatas, assassinatos, extorsão de nossa força de trabalho, e uma desigualdade racial que não sai do país! A violência praticada que não limita aos fazendeiros autodesignados senhores de escravos, mas que serve como instrumento para descendentes que herdam os privilégios de pais, avós, bisavós… O genocídio negro comendo solto a carne negra e eles comem com a tranquilidade dos impunes.
Talvez você, leitor, possa estar dialogando mentalmente comigo:
– Como você é radical, Hermínio, eles só estavam num restaurante. Qual mal há neles se o nome é de mau-gosto?
Respondo: o mal banal!
A banalidade do mal não é uma “categoria a parte” do Mal, mas uma teoria que explica de forma abrangente a sua manifestação na existência humana: o da incapacidade de julgamento, de raciocínio, de empatia. Aquele que não pensa pratica o mal; o reproduz; não pensa naquele que compartilha o mundo consigo. O contrário disso é a ação baseada num julgamento mental: O que estou fazendo, e porquê? Qual o significado de meu ato? Não exige nenhum tipo de formação especial: basta não ter a visão obstruída por qualquer forma de ideologia, como a noção de raça e racismo já é um grande começo.
E já que me aproveito deste conceito de uma grande filósofa judia, como foi Hannah Arendt (1906 – 1975), deixo um questionamento:
E se fosse criado um restaurante chamado Auschwitz, em Higienópolis? O que isso representaria para pessoas cujos antepassados foram transformados em cadáveres de forma inominável? Seria aceito?
Se você acredita que é diferente, que nada tem a ver, a ideologia de superioridade de raça (Racismo!!!) ocupa uma posição perigosa em sua mente. Todos os povos devem ser respeitados. Mitigar a ofensa sobre a dignidade de uns e de outros não, é afirmar que uns são mais “humanos” que outros.
Por questão de humanidade, não [nos] devoremos feito bestas!