O 8M será antirracista ou não será

O 8 de março de 2018 será o dia do feminismo para os 99%. Um dia de mobilizações ao redor do mundo de mulheres jovens e velhas, das trabalhadoras, negras, cis, bi, lésbicas e trans. Das mulheres mais pobres, das trabalhadoras sexuais, das migrantes e refugiadas. Um feminismo de muitas.

No Brasil cerca de 25% da população é composta por mulheres negras, no entanto o machismo aliado ao racismo nos coloca o status de minoria social. Mulheres negras estão subrepresentadas em todos os espaços de poder e prestígio social. Por outro lado, entre aqueles índices que configuram vulnerabilidade social, nós somos maioria. Somos as primeiras nos índices de mortalidade materna, as que mais morrem por aborto inseguro, encarceramento feminino, trabalho informal. O percentual de mulheres brancas com diploma é o dobro de pretas e pardas, segundo o IBGE. Enquanto os números de feminicídio entre mulheres brancas diminui, entre mulheres negras aumentou.

Por estarmos nos postos mais precários, sofremos com a dificuldade em conciliar nosso trabalho com o acompanhamento de nossos filhos e os seus relacionamentos. Por não nos encaixarmos nos padrões brancos e elitistas, temos dificuldade em nos amar por completo. Nos sobra pouco espaço para uma vida emocional saudável e fortalecedora. O que vemos muitas vezes entre mulheres negras é um retrato da dor, de cansaço extremo e também de muita solidão, quer pela falta de suportes institucionais e familiares, ou pelo suporte emocional.

Estamos na ponta de lança dos efeitos da retirada de direitos que culmina na precarização do trabalho, da educação, da saúde pública nos afeta diretamente. A política de genocídio da população negra muito encabeçada pela política de guerra as drogas através de ações violentas do estado, mata nossos filhos, nossos companheiros, nossas crianças e a nós, temos nossas casas invadidas pela polícia nas favelas e periferias. A intervenção federal militar que acontece hoje no Rio de Janeiro é também fruto dessa lógica que torna nossas vidas e dos nossos descartáveis.

No 8M, “queremos mostrar que, se nós paramos, o mundo para”: isto é ainda mais verdade para as mulheres negras. Somos a força que mantém acesa a chama que estava justamente na origem do 8 de março, que está conectada à reivindicação por melhores condições de vida e de trabalho por mulheres brancas há mais de um século. Hoje, em pleno século XXI, a luta das mulheres negras, imigrantes e afrodescendentes, continua nesse plano de reivindicações e é por isso que a nossa força aumenta e se lança a este 8 de março para que ele cresça em sentido e radicalidade. E é por isso que o 8M será antiracista ou não será, não trará consigo a força de toda esta história e muitas outras.

Sobrevivemos ao colonialismo, à escravatura e ao tráfico de pessoas escravizadas, lutamos ainda hoje para sobreviver ao racismo e outras formas de violência. Aprendemos com nossas ancestrais e a cada nova geração utilizamos antigos e novos instrumentos de batalha e formas de resistência, mostrando a importância do feminismo negro para o combate às diversas formas de discriminação de gênero, do racismo institucional, da segregação social e habitacional. Angela Davis uma vez disse que quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela. Neste 8 de março nos movimentamos em direção às ruas contra a reforma da previdência, contra a intervenção federal, pela legalização do aborto, pela vida de todas as mulheres. Vem com a gente!

Dani Monteiro – Ativista Feminista e Antirracista

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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