Ocupação foi realizada na madrugada deste sábado, (7), e na noite desta segunda a reintegração foi aceita. Ocupação nasceu como resposta dos sem teto a um governo que cultiva ódio por quem luta por moradia popular
O que você faria se possuísse um terreno de 110 mil metros quadrados, sem nenhuma função social, servindo apenas de criadouro para muitos insetos, com mato nas alturas e distante, por mais de 30 km do centro da cidade? Essa é a situação do terreno ocupado na madrugada deste sábado (7), por ativistas do MTST, na zona sul de SP, uma resposta ao veto de Jair Bolsonaro ao texto do Projeto de Lei 827/2020, que suspende despejos e remoções durante o período da pandemia. Mas menos de uma semana depois da ocupação o pedido de reintegração, em velocidade surpreendente, é aceito pela justiça.
O local fica próximo ao Terminal de ônibus Varginha, no extremo sul da cidade de São Paulo, em uma rua ainda não asfaltada que era de propriedade de uma empresa do ramo agrícola e que agora é de uma construtora que absorveu a tal empresa agrícola. “Na verdade é uma construtora pequena e de pouca expressão e que provavelmente tornou-se construtora a partir da demarcação desse terreno como Zona Especial de Interesse Social (ZEIS)* para que fosse possível realizar algum tipo de negociação com o poder público ou com quem for de direito.” Disse Arthur Junqueira, um dos advogados presentes.
Como se já não bastasse a pandemia com mais de 562 mil mortes por COVID-19, e todos os males trazidos por esse tempo tão cruel, especialmente para pessoas mais pobres e periféricas, nisso incluem-se um balaio de tragédias sociais, como o desemprego e a consequente falta de moradia, a Prefeitura de São Paulo decide agora, realizar uma revisão no Plano Diretor, deixando de fazer o que realmente interessa, que é adequar o terreno para que famílias que mais precisam possam, rapidamente, ter um lugar para morar, já que o local é considerado área de interesse social e assim, deve ser destinado à moradia popular.
A ocupação realizada no último sábado tem um profundo caráter focado em outra denúncia, pois não há recolhimento de IPTU, que poderia ser destinado ao desenvolvimento da cidade. Isso porque, o local, maquiado de terreno agrícola, recolhe, até hoje, imposto rural, que é um valor ínfimo. É como se ali existisse apenas um pasto.
“O poder público precisa olhar isso, não é possível que as áreas demarcadas como zona especial de interesse social e que se quer recolhem IPTU, fiquem abandonadas, num momento como esse que vivemos, e é inacreditável que a Prefeitura queira discutir revisão do plano diretor. O MTST vem denunciando esses fatos e deseja que se cumpra a lei e a função social da propriedade.” Declarou Ramon Koelle, outro advogado que representa o MTST
Em média, ocuparam o terreno, cerca de duas mil pessoas que têm a missão de construir suas próprias casas, a partir de ações comunitárias organizadas por eles próprios.
Acompanhamos madrugada fria adentro, com 15 graus de temperatura e sensação de 10, o início da demarcação de cada pedaço de terra, em meio a tamanha escuridão e mato alto, onde nos próximos dias serão levantados os primeiros barracos. No momento, pequenas barracas feitas de bambu e lona protegem os corpos de quem sonha com um futuro melhor numa casa própria.
São em sua maioria mulheres mais velhas, vindas especialmente do Nordeste e que já moram de aluguel, em habitações muito precárias e que na pandemia, tiveram de escolher entre comer ou pagar a casa. Muitas optaram por comer e se tornaram pessoas em situação de rua, por exemplo, outras estavam na iminência de serem despejadas. Mas o fato comum é que todas viram no MTST um fio de esperança e recomeço num país de tantas desigualdades cruéis.
Agora, os advogados que acompanharam a ocupação tem a missão pressionar o poder público, e tornar pública a situação.
A reportagem dos Jornalistas Livres flagrou também o momento em que, poucas horas depois da ocupação, um grupo de jagunços apareceu no local e se apresentaram como policiais, mas não mostraram nenhuma identificação, tão pouco estavam fardados e exigiram que o advogado do movimento, Dr Ramon Koelle entrasse num carro. O advogado não concordou e os homens foram embora.
Veja o que disse, um dos ativistas do movimento e o próprio advogado sobre o ocorrido e acompanhe a seguir algumas histórias de sem teto que ocuparam hoje o terreno.
Reintegração
Na noite desta segunda-feira foi expedido e, rapidamente, aceito o pedido de reintegração de posse. Veja a nota do MTST sobre o PEDIDO feito para a nova ocupação:
URGENTE – Justiça de São Paulo quer despejar famílias na Pandemia
Na noite desta segunda-feira, dia 09/08, o juiz Antônio Carlos Santoro Filho da 11ª Vara Cível do Fórum de Santo Amaro determinou o despejo de mais de 600 famílias de ocupação organizada pelo MTST na região do Jardim Novo Horizonte, Zona Sul da cidade de São Paulo.
O terreno ocupado é uma Zona Especial de Interesse Social segundo o Plano Diretor de São Paulo e por isso deveria servir para habitação popular, mas estava abandonado há mais de 50 anos, em uma das áreas mais adensadas e pobres da cidade. A ocupação é formada por centenas de famílias despejadas durante a pandemia, agravada pelo desemprego explosivo, pela fome e pela falta absoluta de política habitacional.
Apesar do longo tempo de abandono, a ordem de despejo foi publicada em tempo recorde: uma hora após o pedido ser apresentado. Além de desumana, a decisão é arbitrária e ilegal já que viola decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 828. O MTST seguirá lutando na justiça e principalmente nas ruas para suspender o despejo.
ZEIS* – As Zonas Especiais de Interesse Social são porções do território destinadas, predominantemente, à moradia digna para a população da baixa renda por intermédio de melhorias urbanísticas, recuperação ambiental e regularização fundiária de assentamentos precários e irregulares, bem como à provisão de novas Habitações de Interesse Social – HIS e Habitações de Mercado Popular – HMP a serem dotadas de equipamentos sociais, infraestruturas, áreas verdes e comércios e serviços locais, situadas na zona urbana. O PDE definiu cinco tipos de ZEIS e demarcou seus perímetros no território, deixando muito pouco a ser tratado no zoneamento em relação às ZEIS. Ainda assim, a nova lei de zoneamento trouxe inovações ao propor a criação de duas novas zonas: a ZMIS e a ZC-ZEIS, cujo objetivo é proporcionar a promoção de atividades econômicas em territórios com pouca oferta de empregos em proporção à moradia (ZEIS1 marcada no PDE), ao mesmo tempo em que estas zonas asseguram a permanência da população de baixa renda. Importante ressaltar que as ZMIS foram demarcadas somente em perímetros de ZEIS 1 envolvendo conjuntos habitacionais que foram regularizados e urbanizados e a ZC-ZEIS foram demarcadas somente em lotes lindeiros às vias internas às ZEIS1 que têm função de articular bairros e regiões da cidade. FONTE: PREFEITURA DE SP.