Nordeste sedia o melhor jogo de xadrez do Brasil

A guerra surda destas eleições pode dizer muito sobre o que teremos em 2021 e 2022 em termos de alianças no campo de centro-esquerda e embates com o bolsonarismo

Vários governadores disputam, neste momento, a liderança no maior celeiro de gestores de centro-esquerda do país. São, ao menos, três governadores em disputa na região: Flávio Dino (Maranhão, PCdoB), Rui Costa (Bahia, PT), e Camilo Santana (Ceará, PT, mas fortemente vinculado aos Ferreiro Gomes). Todos apostam em candidaturas à prefeitura da capital do seu Estado, mas poucos estão se saindo bem, embora tenham alta aprovação de seus governos. Todos com aprovação acima de 70% pelos eleitores de seus respectivas estados.

Por Rudá Ricci, cientista político e presidente do Instituto Cultiva

Esta guerra surda pode dizer muito sobre o que teremos em 2021 e 2022 em termos de alianças no campo de centro-esquerda e embates com o bolsonarismo. Lembremos que esse bloco (onde participam outros governadores, como o do Piauí, Pernambuco e Rio Grande do Norte) tem no seu calcanhar os deputados do Centrão, agora aliados de Bolsonaro. Em junho deste ano, foram eles que recepcionaram Jair Bolsonaro quando decidiu inaugurar parte da Transposição do Rio São Francisco. Bolsonaro esteve em Salgueiro, em Pernambuco, além de Juazeiro do Norte e Penaforte, na região do Cariri, sul do Ceará. Os governadores Paulo Câmara (PSB-PE) e Camilo Santana (PT-CE) não participaram da solenidade. Na oportunidade, Capitão Wagner (Pros), Pedro Bezerra (PTB), Roberto Pessoa (PSDB), Dr. Jaziel (PL) e Domingos Neto (PSD) chegaram juntos com Bolsonaro em Penaforte. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ) também estava presente, assim como os ministros Augusto Heleno (Segurança Institucional), Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) e Tereza Cristina (Agricultura).
A eleição nas capitais dos Estados governados por esses três expoentes da política nordestina revela seus potenciais e dificuldades a partir de 2021. Mais que isso, indica rearranjos das composições políticas em seu território.
A última pesquisa Datafolha (de 5 de novembro) realizada em Fortaleza indica empate técnico entre Capitão Wagner – que se afirma bolsonarista – e o candidato do PDT (que todos afirmam ser apoiado pelo governador Camilo Santana). Wagner em queda, com 29% de intenção de voto e Sarto, com 26%. Luizianne Lins, do PT, aparece com 18% de intenção de voto, mas já chegou a 25%. O candidato do PT/PDT era o bancário moderado Nelson Martins (PT), apoiado pelos Ferreira Gomes e pelo governador. Até Luizianne Lins parecia apoiar a candidatura de Martins. Contudo, o falecimento de seu pai o jogou numa profunda depressão que o obrigou a sair da cena política.
Em Salvador, o governador Rui Costa (que até pouco tempo liderava o Consórcio Nordeste) possui duas candidaturas declaradas: a do PT (com Major Denice) e a do Podemos (deputado federal Bacelar). Na última pesquisa Ibope, Bruno Reis (DEM) aparece com 61% das intenções de voto, Major Denice (PT) com 13% e Bacelar com 1%. Trackings indicam uma disputa mais acirrada entre a candidata do PT e o do Podemos. O fato é que Rui Costa não se sairá bem desta eleição na capital baiana e já se comenta mudanças na sua composição de governo para o final deste ano ou início de 2021.
Em São Luís, o candidato do governador Flávio Dino amarga um quarto lugar, segundo pesquisa Ibope. À sua frente, três candidatos do centro-direita/direita: Eduardo Braide (Podemos), com 36% de intenção de voto; Duarte Júnior (Republicanos), com 22% e; Neto Evangelista (DEM) com 16%. Rubens Júnior (PCdoB) aparece com 7%.


Como se percebe, a liderança nos seus Estados depende de um jogo acirrado que exige muito cálculo. Assim como em seus territórios não há como governar e garantir a sua liderança com seus próprios partidos, os governadores não conseguem consolidar sua imagem nacional se não ampliarem seu escopo de alianças para além de seus Estados.
É aí que entram as disputas de Recife (onde João Campos, do PSB, aparece com 31% de intenção de votos pelo Datafolha e Marília Arraes, do PT, com 21%). O PSB aparece bem em Maceió, onde seu candidato, JHC, está empatado com Alfredo Gaspar de Mendonça (MDB) em 24% de intenção de voto. Embora em terceiro lugar, o candidato do PSB também se destaca na eleição em João Pessoa. Ricardo Coutinho aparece com 10% de intenção de voto, atrás de Cícero Lucena (PP), com 21%; e Nilvan Ferreira (MDB), com 15%.
Já em Aracaju, é o candidato do PDT que aparece em primeiro lugar, com 34%. Em Teresina, o candidato do governador petista Wellington Dias aparece em quarto lugar nas intenções de voto (com 6%); situação similar do candidato do PT em Natal (Estado governado pela petista Fátima Bezerra), que aparece em quinto lugar, com 5% de intenção de voto.
O jogo de xadrez é dos mais complexos, envolvendo uma situação de disputa interna nos estados governados pelo centro-esquerda, mas, também, uma disputa entre partidos (PT, PSB, PCdoB e PDT) e entre personalidades muito distintas.
Esta é, possivelmente, a região do Brasil que exige as estratégias e atenção política mais afiadas. A disputa é quase por centímetros e, dependendo do que ocorrer em 2021 nessa região, poderemos imaginar o arco de alianças do campo centro-esquerda em 2022.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

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