Moro venceu? Será o fim de Lula na política?

Foto por Alice Vergueiro - 13/07/2017

por Kátia Passos e César Locatelli

 

Cena 1 – Um repórter de uma rádio da Globo pergunta, de forma bastante agressiva, ao advogado de Lula, Cristiano Zanin, se, na segunda instância, a defesa vai persistir na estratégia que se revelou perdedora de buscar a suspeição de Moro: “Vocês vão mudar a estratégia que não deu certo?” Zanin responde que usou, e usará na apelação, todos os recursos que a lei lhe permite para denunciar a falta de isenção, as ilegalidades e “todas as violações grosseiras aos direitos humanos” que foram cometidas pelo juiz. A “exceção de suspeição” de um juiz é um direito das partes quando a parcialidade do juiz é notória. Zanin repete que a sentença se baseia unicamente na delação de Léo Pinheiro, o que é insuficiente para uma condenação. Reforça que o juiz usou reportagens jornalísticas e papéis rasurados e sem assinatura como prova. A sentença formalizou a perseguição política (lawfare) que caracteriza as ações desse magistrado, conclui.

Foto por Flávia Martinelli 12/07/2017

Cena 2 – Valeska Zanin e Cristiano Zanin estavam em audiência com o juiz Sérgio Moro, em Curitiba às 15hs40 do dia 12/07/2017, quando foram comunicados da publicação da sentença condenando o ex-presidente Lula a nove anos e meio de reclusão. Ficaram impedidos, por horas, de dar início à contranarrativa, enquanto a mídia tradicional se refestelava. A sentença, de 216 páginas e 962 parágrafos, foi lida por eles na viagem de retorno a São Paulo. Às 19 hs. do mesmo dia, estavam na coletiva de imprensa em um hotel de São Paulo. A defesa argumenta que o juiz desprezou as provas apresentadas pela defesa. Especialmente a comprovação de que o apartamento está hipotecado à Caixa Econômica Federal, situação da qual não sairia a menos que houvesse um pagamento pelo valor devido à Caixa e que não ocorreu. Moro concorda que o dono formal do apartamento não é Lula e precisaria provar que Lula e Dona Marisa tiveram sua posse informal. Ele não conseguiu provar e, mesmo assim, condenou Lula, assegura a defesa.

Foto por Flávia Martinelli 12/07/2017

Cena 3 – Do lado de fora do prédio do PT nacional em São Paulo, ás 11hs05, fotógrafos conversam em roda. De repente, um carro pomposo entra na rua. Alvoroço, flashes pro nada e para tudo ao mesmo tempo. Era o maior líder político da América Latina chegando: Lula. Desde quando o ex-presidente Lula foi citado nas investigações da operação Lava Jato, fotógrafos e cinegrafistas não tiveram paz. É como se todos fizessem uma coreografia ensaiada, um verdadeiro flash mob em busca de uma imagem interessante” de Lula. Mesmo sem que eles saibam, até nesse momento é Lula quem os lidera.

Foto por Alice Vergueiro – 13/07/2017

Cena 4 – Parlamentares e membros da executiva do Partido dos Trabalhadores começam a entrar no Auditório Paulo Freire, às 11hs20 de 13/07/2017, na sede do PT Nacional em São Paulo. Todos se mostram ansiosos, falantes. Ninguém se senta nas cadeiras reservadas na mesa do pronunciamento. Alguém alerta: “olha, a imprensa vai entrar agora, então atentem-se aos celulares, as conversas.” Isso é resultado do investimento que a grande mídia fez no golpe. Os petistas estão ressabiados. Eles virarão alvo da justiça seletiva. Na lei da grande mídia, tudo pode ser usado contra um petista, até mesmo uma ligação telefônica com um familiar. Então, o alerta é sábio.

Cena 5 – Às 11hs30, o auditório já estava lotado de jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas, além de dirigentes do partido. A maior parte da militância petista ficou mesmo na rua aguardando o pronunciamento do ex-presidente Lula ser retransmitido para a calçada, através de uma caixa de som. Parecia final de Copa do Mundo. Momento de apreensão, os ouvidos aguardavam para fazer o papel de todos os sentidos.

Foto por Alice Vergueiro – 13/07/2017

Cena 6 – Após a reunião ser aberta pela presidente do PT nacional e senadora, Gleisi Hoffmann, Lula se senta à mesa, às 11hs56, para iniciar o pronunciamento. Como na cena de uma “Santa Ceia”, a mesa está posta, ocupada. Parece mesmo tempo para refletir. Para os ateus ou agnósticos talvez a descrição dessa cena não agrade. Mas é impossível não comparar. Não tinha pão, nem vinho, mas ali estava um líder, um ser humano sem formação acadêmica, humilde, semianalfabeto que fez muito pelos mais pobres em suas gestões. Quem se sentou naquela mesa entendeu o que ele fez pelo povo brasileiro. Impressionantes os olhares de admiração para Lula.

Foto por Kátia Passos – 13/07/2017

Cena 8 – Raduan Nassar trouxe um diferencial poético para a mesa do pronunciamento de Lula. Era o único apoiador ali sentado sem carreira política partidária. Ele trouxe seu doce olhar de paz, que os petistas tanto precisam agora, para o local, e a força de quem denunciou em campo golpista, ao receber prêmio literário que “vivemos tempos sombrios”. Lula, a todo momento retribuía o carinho e, certamente, a denúncia feita com sabedoria olho no olho, frente a frente, para quem está destruindo o país. O ex-presidente, brincou com Raduan, quando o chamou de “Corinthiano”, time de coração de Lula e acarinhou de forma discreta sua cabeça diversas vezes. Bonito de ver, sentir. Cenas que você só vê na esquerda.

Cena 9 – Terminado o pronunciamento, a senadora Gleisi Hoffmann, na rua, cercada pela militância que ocupou a frente da sede nacional do Partido dos Trabalhadores em São Paulo, afirma que a sentença de Moro é mais uma injustiça. No entanto, lembra a senadora, o partido nasceu para combater injustiças e vai ter forças para continuar a enfrentá-las.

Foto por Alice Vergueiro – 13/07/2017

Cena 10 – Prestes a terminar, Lula revela suas ideias econômicas para tirar o país da recessão e do desemprego, que só piorarão com os cortes de direitos impostos pelo golpe: “Quando esse país não tiver mais jeito, quando os economistas de direita não tiverem mais solução, por favor, permita que a gente coloque o pobre no orçamento outra vez: o pobre no orçamento da União, o pobre no trabalho, o pobre recebendo salário, o pobre recebendo crédito faz esse país voltar a crescer, faz o povo voltar a sorrir, faz o povo voltar a ter o otimismo que tinha durante todo o tempo que nós governamos esse país”.

Cena final – Lula conclui: “Quem acha que é o fim do Lula vai quebrar a cara, porque somente na política quem tem o direito de decretar o meu fim é o povo brasileiro”.

Foto por Alice Vergueiro – 13/07/2017

 

 

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