Lênin estava errado?

Putin começa a guerra atacando exatamente Lênin e estes princípios. Seu móvel ideológico é a antiga grande Rússia Imperial e o chauvinismo russo, do qual Lênin era inimigo. Na Jabuticaba brasileira de hoje, leninistas abraçam Putin e não Lênin. Não a nenhuma guerra nacionalista de anexação, mesmo que a carência campista de alguns pinte esta guerra como “comunista”


O estranho caso de amor da esquerda brasileira com o chauvinismo grão-russo.

Por Roberto Ponciano

O debate sobre geopolítica no Brasil dos últimos dias virou um grande Fla x Flu de final de campeonato. Não há espaço para dúvidas, ou você defende o governo pró neo-nazista ucraniano, ou você defende o russo vingador comunista da URSS, ops, quis dizer, Rússia, e o exército vermelho, novamente justiçando a Europa e nos livrando, pela segunda vez do avanço das tropas da SS. A história se repete, mas, desta feita, como farsa. Sim, a URSS livrou o mundo do nazismo, não, a Rússia não tem como objetivo geopolítico estratégico livrar o mundo do fascismo.


Nesta discussão maniqueístas de ouvidos surdos, criticar a estratégia de Moscou pode te levar ao mármore do inferno da esquerda brasileira. Nos últimos dias você pode escolher o melhor epíteto para usar para mim e que seria a motivação ideológica de um texto contra o retorno histórico do Exército Vermelho: agente da CIA, quinta coluna, trostkysta desvairado, putinha dos EUA, crítico neoliberal ensandecido.


Como numa arquibancada ensolarada, prestes a uma decisão por pênaltis, ter uma outra opinião pode ter levado a ser linchado, por não fazer parte de nenhuma das turbas contenciosas em disputa. Outra estratégia usada é o de calar todos os que não sejam “estrategistas de geopolítica”, que no Brasil se reduziriam a meia dúzia de 3 ou 4, com voz privilegiada em canais de esquerda.


E como a coisa funciona?


Estes estrategistas dão o tom da “crítica” permitida, e esta é repetida ad nauseam como visão permitida na esquerda. O incrível desta crítica é que ela é pouco crítica. No fundo, há pouca diferença no que fala um “estrategista internacional” do PCO ou do PC do B: Ou se é pró-Putin ou se é pró-Ocidente.


Uma das coisas mais doidas que ouvi nos últimos dias foi a repetição da frase “Lênin estava errado”, e não, não escutei isto de liberais de direita, de monarquistas chauvinistas ultranacionalistas da boca para fora, de ninguém do outro lado. Eu escutei inclusive de alguns que se autoproclamam como leninistas e de marxistas que buscam abrandar o alcance do internacionalismo proletário, porque sabem que através de Lênin, este tipo de análise perderia o vigor. Até citações completamente descontextualizadas de Rosa Luxemburgo (que foi parceira de Lênin na defesa do Internacionalismo proletário) eu ouvi para, de alguma forma, defender o indefensável.


Vamos lembrar, o ano é 1914, e se dá o grande cisma da esquerda mundial. O movimento social-democrata internacional, a Segunda Internacional (lembrar que aí, social-democracia era sinônimo de comunismo) decide, diante da Primeira Grande Guerra, aprovar a palavra de ordem de “guerra defensiva” e de “defesa da pátria”. Lênin e Rosa se tornam ínfima minoria (até a Revolução Russa) na Segunda Internacional, que racha. De um lado, o que agora vai passar a ser definitivamente a Social-Democracia Internacional, que defende a guerra; do outro lado, os marxistas, comunistas, que saem da Segunda Internacional denunciando o social-chauvinismo, e adotam como estratégia a luta contra a guerra e a ideia de voltar a arma contra os opressores de classe.

Lênin e Rosa se tornam minoria (estavam do mesmo lado, senhores, não maltratem Rosa Luxemburgo assim) e denunciam corajosamente a guerra nacionalista. Lênin é perseguido (mesmo no exílio) como “traidor da pátria” e Rosa é assassinada. Ambos pagarão um preço muito alto por ser contra a guerra imperialista.


Não à toa, ao começar a guerra Putin tem que atacar Lênin. A frase “a Ucrânia é uma invenção de Lênin” mostra a clara diferença entre ambos. Putin não é comunista, aliás, sequer de esquerda ele é. É um conservador de direita, que inclusive financia partidos de direita na Europa. A carência afetiva da esquerda brasileira tem levado a um estranho novo culto à personalidade. Posso ter muitas críticas à Stálin, menos a de que ele não era um socialista partidário da luta do movimento comunista internacional. De Putin não posso falar o mesmo.

Não, a Ucrânia não é uma invenção de Lênin, cujo internacionalismo proletário levava a tratar com propriedade a questão das nações (inclusive dentro do seio do próprio partido). Era, sim, uma nação sem território, assim como o são os curdos, os bascos, os catalães, os raizal. A defesa dos comunistas sempre foi pelo princípio de autodeterminação dos povos.


Putin começa a guerra atacando exatamente Lênin e estes princípios. Seu móvel ideológico é a antiga grande Rússia Imperial e o chauvinismo russo, do qual Lênin era inimigo. Na Jabuticaba brasileira de hoje, leninistas abraçam Putin e não Lênin.


Antes que me acusem de “não saber o que é a Ucrânia”, é óbvio que sabemos que a Ucrânia hoje é um Estado fantoche, que surge de um golpe de Estado com um governo pró-fascista. Mas não, revoluções não se exportam. O princípio de auto-determinação dos povos não pode ser substituído pela ideia de que uma nação mais forte militarmente (com a qual possamos guardar alguma simpatia pelo que significou no passado mas não do que pelo que significa no presente) possa invadir, ocupar e propor uma guerra total de aniquilação da soberania da outra.


No limite da ideia do internacionalismo proletário, poderíamos saudar que a Rússia houvesse ajudado as repúblicas que se insurgiram contra Kiev, enviar tropas ou até soldados para uma insurreição nestes locais. Estaria dentro daquilo que a solidariedade socialista prega. Uma invasão total contra um governo hostil, ainda que simpático a Otan, visando a destituir o governo e, posteriormente, colocar um pró-Moscou, não difere em nada da tática da Otan, com sinal trocado e, não, não há leitura ou princípio socialista que a justifique.


Talvez a esquerda brasileira tenha se tornado ahistórica, e não tenha feito sequer o balanço de 1956 na Hungria, de 1968 na Tchecoslováquia, ou da ocupação russa no Afeganistão. Não há como se derrubar um governo sem se manter permanentemente uma ocupação militar disfarçada de soberania concedida. Assim é em Kosovo, Catalunha, ou em Porto Rico, por exemplo. A situação se mantém pela força, não pela legitimidade. Por mais prolongada que seja a ocupação, ela será sempre uma ocupação com limitação da soberania de outro país. E isto está muito longe daquilo que historicamente defendem comunistas e leninistas.


É óbvio que com o passar do tempo a euforia com a invasão vai se tornar ou um silêncio ou uma falta de análise, assim como foi a histeria de parte da esquerda brasileira com a vitória de guerrilha feudal misógina do Talibã. Uma tal de “geopolítica” manca de dialética substituiu a análise de classe dos movimentos e até das guerras, na qual os povos e as classes sociais desaparecem. A análise vira uma espécie de tabuleiro daquele joguinho War, para o qual o povo destes países e sua vontade não contam para nada. São só players: China, Rússia, EUA, e as vontades das nações e dos povos de cada local simplesmente devem ser ignorados. Isto nunca foi a análise marxista de Lênin, que nos deu o princípio do internacionalismo proletário.


A Ucrânia é muito mais do que um “acampamento de nazistas”. Boa parte da sua hostilidade contra Moscou vem da dominação centenária da “Grande Rússia Imperial”. Assim, encontrou solo fértil para todo tipo de movimento de ultradireita. Durante a Segunda Guerra ela teve autonomia política dada por Hitler a um governo pró-nazista. Ucranianos chegaram a fazer parte da Gestapo e um exército de mais de 2 milhões de voluntários marchou contra Moscou, Leningrado e Stalingrado. Esses soldados eram os mais odiados pelos russos e executados como colaboracionistas na grande guerra de libertação da humanidade contra o nazismo.


Tudo isto não justifica uma guerra de aniquilação do Estado ucraniano e de transformação dele num protetorado. Guerras de ocupação são mais rápidas no objetivo de derrubar governos do que no de mantê-los. Iraque, Afeganistão, Vietnã, os exemplos históricos pelo mundo, nos dão grande desconfiança sobre esta euforia. O diabo é perigoso não porque é mau, mas porque é velho.

Há muito se cruzou o rubicão de uma guerra defensável do ponto de vista marxista e internacionalista e a ação se transformou pura e simplesmente numa guerra de dominação de um Estado mais forte sobre o mais fraco, sempre condenável do ponto de vista marxista e internacionalista.


Minha voz dificilmente será ouvida agora. No meio da histeria sobre a ofensiva do “libertador urso russo”. Mas tenho a placidez de saber que com o passar do tempo, assim como os defensores do Talibã se calaram diante da tragédia humanitária, e preferem não falar mais sobre o assunto, o resultado de longo prazo de uma ocupação na Ucrânia não pode prometer a paz a nenhuma das nações.


Lênin estava correto e continua correto. Paz entre nós e guerra aos senhores. Não a nenhuma guerra nacionalista de anexação, mesmo que a carência campista de alguns pinte esta guerra como “comunista”. Não é!!! Não é uma revolução, muito menos uma insurreição popular do povo ucraniano.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornalistas Livres

COMENTÁRIOS

6 respostas

  1. Posso concordar em muita coisa que aqui foi exposta/colocada mas dizer que nós, os comunistas, estamos dizendo/afirmando que o Putin é de esquerda e/ou comunista é querer forçar a barra. Temos plena consciência de quem é o Putin, mas dizer que ele está errado por querer evitar que a Otan chegue mais próximo das fronteiras da Rússia discordo.
    Agora, a defesa da autodeterminação dos povos é e sempre será uma bandeira da qual não abriremos mão.
    E lembremos já fato histórico, por não ser combatido de forma rápida e eficiente que nos anos 30 do século passado que já cabo austríaco tomou o poder na Alemanha e agora é um palhaço…
    Será que as potências ocidentais não aprenderam o continuam com medo do oriente? Grandes empresas utilizaram-se do nazismo por conta da mão de obra escrava. É o que queremos novamente?

  2. Uau!!! Simplesmente o melhor texto que li até agora. Parabéns pela coragem.

  3. Diante de tantas contradições, como é bom ler um texto tão lúcido

  4. Um detalhe importante- não se trata de abraçar o Pudim, se trata defender que a Rússia continue existindo, que a Rússia se defenda.

  5. Voces tinham meu respeito e credibilidade, mas nem eu que sou marxista-lenilista de carteira e nem o próprio Lenin concordaria com a deturpação de suas ideias como vocês fizeram . Os “jornalistas liberais” alimentando a velha “teoria dos dois demônios”… Como tem tanta gente “bacana” emburrecendo outras tantas… 1, 2, soltei sua mão.

  6. Concordo com o alvo da crítica, mas dizer que o internacionalismo foi legado a nós por Lenin? Isso já existia ao menos desde a AIT original. E em geral havia não uma defesa da soberania dos estados nacionais, mas sim da autonomia dos povos federados na Internacional. Obviamente isso leva não só as mesmas conclusões desse artigo, mas também ao aprofundamento dessa crítica em direção a qual é na realidade a causa desse súbito surto da defesa de regimes de extrema direita dentro da esquerda brasileira: a raiz desta miséria intelectual está no foco da esquerda brasileira no nacionalismo, no projeto de fortalecimento do estado nacional brasileiro, omitindo o seu caráter pós-colonial (no sentido que o Estado brasileiro é não só o resulto póstumo do colonialismo ibérico, mas também sua continuidade, pois indigenas não possuíam estados imitadores de monarquias constitucionais europeias ou da república romana). Essa agenda nacionalista de boa parte da esquerda brasileira se traduz não mais em simples emanciapação, não, ela é o velho projeto chavuvinista do “Brasil potência”. Para atingir estrs objetivos, nos anos 90, a esquerda nacionalista brasileira estabeleceu como meta a reversão da globalização, e desenvolveu nos governos dos anos 2000 uma agenda geopolítica de aproximação com paises que estavam descontentes da hegemonia dos Estados Unidos, com o objetivo de se criar uma ordem multipolar. Nos anos 90 e no início dos anos 2000 isso parecia o curso natural para a esquerda pós colapso da URSS. Mas na verdade esse é um vício campista baseado tanto no revanchismo devido a derrota da URSS na guerra fria quanto na não conformidade com o fracasso da experiência soviética que se degenerou em um estado nacional – que passou a ser defendido pela esquerda enquanto estado nacional, em um afastamento cada vez maior do internacionalismo original. Obviamente no Brasil existe um espirito revanchista por causa da ditadura militar. Desse modo, se orientando por um sentimento de revanchismo nacionalista, a esquerda brasileira viu nos Estados Unidos e em sua hegemonia global, o grande outro de uma identidade nacional brasileira “não ocidental” ,apesar de compartilharmos com os estados unidos bastante coisa como passado escravista, oligarquias mafiosas que lucraram com esse passado e muito genocídio indigena – em um processo de acumulação primitiva através da expansão colonial para o interior. Os dois países tem muito mais em comum do que a esquerda brasileira gosta de admitir. Qual argumento usado para o Brasil não ser ocidental que não seria válifo para os Estados Unidos? Ambos somos ex colônias europeias, ambos são baseados em escravidão, ambos se desenvolveram a partir do comércio triangular com suas metrópoles, ambos exterminaram a população nativa, ambos receberam imigrantes para embranquecer a população, ambos foram cristianizados na marra, etc. Colonia de povoamento no norte? Mas até a independencia, Nova York era escravista. Só a Nova Inglaterra que não e olhe lá. A diferença é que estamos no sul global (mas estamos na armadilha da renda média desde os anos 70 e daí o sonho do “Brasil Potencia”), mas continuamos na parte oeste desse sul. Ser ocidental não significar ser europeu, branco e rico. Significa estar em uma sociedade que se desenvolveu a partir do Atlântico, que inclusive sofre as consequencias do legado colonial europeu nesse espaço (que é de duração muito maior do que na Ásia por exemplo e onde literalmente o colonialismo criou estados do zero a imagem e semelhança da Europa, mas enfrentando contradições profundas, cujas lutas decorrentes radicalizaram ocidente como um todo).

    Mas voltando as contradições do projeto nacionalista da esquerda brasileira, ela encontrou nos Estados Unidos um “Outro”. Essa esquerda apesar de usar da a memória da ditadura militar para construir este outro, é estranhamente omissa quando se trata de experiências autoritárias onde a interferência estrangeira não foi notada, em especial a experiência com o Varguismo. Na verdade essa esquerda hoje incorpora totalmente o projeto do Varguismo, e exatamente o hirbridismo idelógico de Vargas, seu nacionalismo econômico, seu estatismo e sua independencia geopolítuca em relação aos Estados Unidos (nessa épica significa mandar mulheres judias comunistas para o Terceiro Reich) que aproxima esta esquerda de Putin, pois Putin joga com o nacionalismo de um lado e com o passado esquerdista soviético de outro, de modo similar as manobras de Vargas para aglutinar a direita e a esquerda sobre seu controle. Putin fez o mesmo na Rússia, e o fez contra não só os Estados Unidos, mas contra a Globalização.

    E agora que as coisas ficam interessantes. Nos anos 90 a esquerda orfã da URSS, entendeu que lutar contra a globalização através do nacionalismo de esquerda era a forma de derrubar o capitalismo global e impedir a hegemonia americana. Parecia bom, mas a análise na verdade ignorava um elemento muito importante: o internacionalismo.
    A idéia passou a ser a criação de uma aliança de nações anti-globalização, que usariam a defesa da soberania nacional para promover uma agenda econômica heterodoxa e desenvolvimentista. Em conjunto com China e Rússia, isso daria origem a um novo bloco contra-hegemônico, formado não por estados neo-liberais subordinados ao capitalismo global, mas sim, “Estados Soberanos”. Foi assim que surgiram os BRICS. Mas a esquerda brasileira e suas contrapartes latino americanas e de outro lugares, se cegaram, em nome do próprio projeto, a verdadeira natureza ultra-exploratória do desenvolvimento chinês e do dumping no valor da mão de obra a nível global que isso produzia, primeiro tornando as greves na indústria infrutíferas e depois levando a própria desindustrialização – não só no norte global, mas principalmente, aqui. Outra coisa que a esquerda brasileira em seu nacionalismo revanchista se cegou, foi à natureza reacionária de Putin e de seu partido Rússia Unida. Atravez de bajulação e do culto a antigas vitórias militares, Putin cooptou o PCFR e fez com que a esquerda de países como o Brasil se cegassem para os crimes na Chechênia ou na Ossétia. Contra a globalização malvadona, era preciso de uma aliança de nações e de estados fortes, não é mesmo? Veio a crise de 2008, veio os protestos anti-austeridade, veio junho de 2013 no Brasil, vieram guerras e mais guerras, e no fim a China que tinha o PIB do Brasil nos anos 90, agora é quase do tamanho dos Estados Unidos e Putin se revelou um autocrata implacável que busca reverter de maneira reacionária a história, restaurando o Império Russo, afinal, é isso que nações fortes que se recusam a globalização fazem.
    A verdade é que o sonho da esquerda brasileira deu com os burros n’água: a desindustrialização levou a nossa economia se tornar refem dos preços das commodities, a nossa proximidade com Russia e China levaram Washington a sabotar o governo de esquerda que já estava enfraquecido por causa do sucateamento da classe trabalhadora pelo dumping chinês, que de maneira silenciosa, ia gerando uma crescente massa de insatisfeitos. Isso significou o sepultamento de qualquer projeto de desenvolvimento e a um governo reacionário que nem referencia tem e agora, a invasã da Ucrania demonstra que esse conflito nunca foi sobre o combate ao capitalismo global, mas sim o jogo revanchista da Russia e o jogo bem capitalista imperial da China de e trar de vez na disputa para a hegemonia global. Então nós não temos o mundo multi-polar utópico formado por “movimento anti-globalização de estados nação progressistas”, mas sim uma disputa interimperialista clássica no maior estilo 1870 ou 1914, só que usando estratégias modernas como proxy wars, guerra hirbrida, sanções economicas justificativas humanitárias. E obvio, não foi isso que a maioria dos brasileiros encomendou quando votou na esquerda, a maioria dos brasileiros sempre ansiou por um caminho pacífico para o “Primeiro Mundo”, sem guerras por hegemonia global, alianças exóticas, mudanças de regime e risco nuclear. O jogo interimperialosta nunca foi para nós e ele que estava sendo jogado pela Russia e pela China. Fomos apenas os palhaços que eles usaram, nos desindustrializando e nos transformando em um fazendão. Não foi Washington… Washington queria usar a ALCA para nos transformar numa maquilaria estilo México, lembram? Não que isso não fosse um projeto detestavel também…
    Mas agora, vemos qual o ponto errado da esquerda nacionalista, no Brasil, no resto da américa latina e além: não entender a globalização como o estágio de desenvolvimento último do capital. A esquerda nacionalista apostou nos estados nação e ignorou o que era discutido a 150 anos na AIT: solidariedade internacionalista de base. Nunca deveriamos ter, enquanto esquerda, visto a China como “regime amigo” em nome de uma aliança de nações? Não é a industria exploratoria chinesa que coloca o trabalhador em gaiolas, que permitiu a globalização e o neoliberalismo desde Deng Xiao Ping? O internacionalismo operário, o original, demanda o que? Que todos os paises tenham suas federações operárias unidas em uma grande Associação Internacional, de modo a não só preparar o terreno para uma revolução global, mas também para, em um nível mais cotidiano, travar greves gerais transnacionais. Uma empresa transnacional poderia ter suas operações travadas globalmente. Um país que destrói direitos trabalhistas e faz dumping de salários sofreria com greves massivas apoiadas por todos os trabalhadores do mundo. É desta maneira que os problemas e contradições da globalização capitalista seriam resolvidos. Através de uma luta final entre o internacionalismo operário e o capitalismo global. Essa luta destruiria as fronteiras nacionais, pois, o seu desenvolvimento levaria a superação dos estados nacionais e da soberania nacional pelo autonomismo democrático internacionalista e o socialismo libertário. Vimos na última década que nos países mais integrados, como os da UE, a esquerda desenvolveu uma capacidade de coordenação internacional bem importante, mas isso não era o suficiente: sem movimento operário combativo na China e nos Estados Unidos não vamos a lugar nenhum. Agora o sindicalismo volta a despertar nos Estados Unidos. Greves em empresas que nunca viram greves antes, como Amazon, Starbucks e etc. Mas e na China? Ai o internacionalista está impedido pelo grande firewall e a organização combativa dos trabalhadores é punida de maneira brutal, com capitalismo de vigilância. Agora entende, como que o projeto de fortalecimento do estado nacional levou ao reacionarismo e não ao enfrentamento estrutural?

    E porque a esquerda brasileria agora, sem entender o mundo, se posciona a favor de Putin? Simples, qualquer projeto de emancipação operaria internacional foi esquecido em prol do mantra da auto-determinação nacional – que era justo nos tempos do velho colonialismo (e ainda o é em locais como a palestina ou em países que sofrem invasões imperiais). Mas a meta da esquerda não é essa. Temos um problema aqui, onde a esquerda começou a tratar a geopolitica como luta de classes (a ideia de achar que vitorias da URSS e da China seriam vitorias para a classe operaria mundial -uma propaganda perigosa inclusive se virmos o que o dumping chinês causou). Outra é tomar luta de classes como geopolitica, então qualquer revolta contra um dos governos alinhados com o projeto anti-global, se torna explicável não pelas contradições socio-economicas, mas por uma conspiração da CIA (não que eles não se aproveitem disso, mas a gente sabe que a KGB também dava o seu passeio por esses lados do mundo na Guerra Fria, e exatamente pela falta de vontade deles em explorar as tenções de classe na base, seguindo a linha conciliatória do Krunschev, q as coisas deram errado por aqui). Enfim, esse erro de tomar uma coisa pela outra, fez a esquerda brasileira entender o mundo fora das nossas fronteiras como o mundo onde tudo só pode ser feito por estados. Desse modo a esquerda aqui ignorou o crescimento do descontentamento e da agitação social nos Estados Unidos e na Europa. Será que se esse tipo de coisa tivesse recebido atenção, não será que poderiamos estar fazendo greves de aplicativos emvátios continentes ao mesmo tempo? E agora, não poderiamos ter um movimento de guerra critico a Putin e a NATO, muito mais forte do que o atual?
    Mas agora não tem e se. A Inês é morta. Daqui para frente é entender que internacionalismo não é ficar defendendo soberania nacional e identitarismos etnonacionalistas. Internacionalismo em um mundo de disputa interimperialista significa se opor aos impérios. Internacionalismo em tempos de globalização, significa a luta direta da classe trabalhadora global contra o capital. Uma luta sem fronteiras que leva ao fim dos estados nação e do capitalismo. E para isso ser possível, a disputa interimperialista atual precisa ser parada, através do enfrentamento ao nacionalismo, cuja consequência é o fascismo e a guerra.

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