O exercício militar Guardião Cibernético 4.0, organizado pelo Comando de Defesa Cibernética do Exército na semana passada – que marcou o início da campanha para as eleições de outubro -, contou com um cenário de guerra fictícia em que os participantes combateram uma organização política chamada “Ideal Proletário Pantaneiro”, identificada pela sigla IPP.
Por Paulo Motoryn, BRASIL DE FATO
No contexto geopolítico imaginário do Exército Brasileiro, o suposto regime com ideais “proletários” demanda de seus oponentes a “demarcação de reservas” que pertenceriam a seu território originalmente. De acordo com a narrativa, “o não reconhecimento desse alegado direito histórico” fez com que o IPP ocupasse militarmente a região disputada.
A investida militar dos “proletários”, segundo o exercício, “levou o Conselho de Segurança da ONU a encerar as negociações diplomáticas e a aprovar uma resolução que prevê uma intervenção militar”, comandada por uma “força militar multinacional com o intuito de derrotar o grupo paramilitar IPP”. Clique aqui para ler a íntegra do documento que baseia o cenário geopolítico.
Abertura do documento que explica cenário geopolítico fictício concebido pelos militares brasileiros Foto: Reprodução
O cenário imaginário criado pelos militares brasileiros faz parte da quarta edição do Guardião Cibernético, realizado anualmente pelo Exército para criar e apresentar um “ambiente realista” no qual as “infraestruturas críticas participantes precisam proteger dos ataques cibernéticos os seus sistemas de TI e de operação”. O evento, que reúne órgãos do governo e empresas como Cisco, Claro e Kryptus, ocorreu de 16 a 19 de agosto.
O ambiente simulado de guerra com referências a ideias de esquerda como “inimigas” foi concebido pelo Ministério da Defesa para outro exercício, a Operação Meridiano, uma simulação conjunta do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, que ocorreu no Pará, em outubro de 2021.
Uma outra simulação das Forças Armadas, realizada em 2020 e revelada pelo site The Intercept Brasil no final de 2021, teve objetivo combater uma “organização armada clandestina” que teria surgido “de uma dissidência do Partido dos Operários”, o “PO”, que “recruta e treina militantes do MLT”, o “Movimento de Luta pela Terra”.
À época, em resposta via Lei de Acesso à Informação, o Exército disse que o exercício que pintou alvos em organizações legítimas e militantes de esquerda não teve “nenhuma conotação político-ideológica nem de nacionalidade”.
Outro lado
O Brasil de Fato procurou o Exército para verificar se a denominação das organizações fictícias fazem referência a organizações de esquerda. Até o momento, não houve resposta. O espaço segue aberto para manifestações.
Questionamentos às urnas
Responsável pelo exercício, o Comando de Defesa Cibernética do Exército esteve, nos últimos meses, no centro dos holofotes da arena política brasileira. A área esteve representada pelo general Héber Portella em uma comissão criada pelo TSE para fiscalizar o processo eleitoral. No posto, seus representantes insistiram em apontar supostos riscos do sistema de votação brasileiro.
Neste ano, o Brasil de Fato revelou que o Comando de Defesa Cibernética foi responsável pela assinatura de um acordo de cooperação com a empresa de cybersegurança israelense CySource, questionado pelo Ministério Público Federal como “potencialmente lesivo” às eleições.